ISSN (on-line): 2177-9465
ISSN (impressa): 1414-8145
Escola Anna Nery Revista de Enfermagem Escola Anna Nery Revista de Enfermagem
COPE
ABEC
BVS
CNPQ
FAPERJ
SCIELO
REDALYC
MCTI
Ministério da Educação
CAPES

Volume 17, Número 4, Set/Dez - 2013



DOI: 10.5935/1414-8145.20130017

PESQUISA

Rede social de apoio ao desenvolvimento infantil segundo a equipe de saúde da família

Ana Paula Dezoti 1
Ana Maria Cosvoski Alexandre 2
Vanessa Aparecida Bida Tallmann 3
Mariluci Alves Maftum 4
Verônica de Azevedo Mazza 5


1 Universidade Federal do Paraná. Curitiba - PR, Brasil
2 Universidade Federal do Paraná. Curitiba - PR, Brasil
3 Universidade Federal do Paraná. Curitiba - PR, Brasil
4 Universidade Federal do Paraná. Curitiba - PR, Brasil
5 Universidade Federal do Paraná. Curitiba - PR, Brasil

Recebido em 01/11/2012
Reapresentado em 05/03/2013
Aprovado em 27/05/2013

Autor correspondente:
Ana Paula Dezoti
E-mail: anadezoti@uol.com.br

RESUMO

O objetivo deste estudo foi identificar as redes sociais de apoio às famílias para a promoção do desenvolvimento infantil na perspectiva da equipe Estratégia Saúde da Família.
MÉTODOS: Pesquisa qualitativa descritiva. Foram sujeitos doze profissionais de saúde, sendo três de cada categoria profissional: enfermeiro, médico, auxiliar de enfermagem e agente comunitário de saúde que atuam nas unidades de saúde do estudo. Os dados foram coletados por meio de entrevista semiestruturada e analisados segundo análise categorial temática.
RESULTADOS: Os resultados evidenciaram três categorias empíricas: Elementos da rede social de apoio; Funções de apoio às famílias; Dificuldades e lacunas na rede social de apoio às famílias.
CONCLUSÃO: Considera-se que as redes sociais têm importante papel na vinculação das famílias, fortalecendo seu potencial para o desenvolvimento infantil saudável. Recomenda-se que os profissionais de saúde articulem ações que possam influenciar esses elementos de maneira que promovam o desenvolvimento infantil adequado.


Palavras-chave: Família; Enfermagem; Desenvolvimento infantil; Apoio social.

INTRODUÇÃO

Com a instituição do Sistema Único de Saúde (SUS), pelo qual a saúde é um direito social do cidadão, torna-se importante a participação popular no controle social e na construção de um novo modelo de atenção à saúde. Nesta concepção, para aumentar a resolutividade do sistema, há o enfoque das práticas na atenção primária à saúde e na interação entre os diferentes sujeitos envolvidos para responder às novas demandas de saúde, que exigem um novo processo de trabalho e uma prática multiprofissional, interdisciplinar e intersetorial. Essas práticas pautam-se nos princípios de universalidade, equidade e integralidade, transcendendo a dimensão curativista do modelo biomédico. Assim, é preciso pensar a saúde para além do enfoque da cura, com vistas à sua promoção, proteção e recuperação com a descentralização e a participação social1.

A promoção da saúde, como um modo de pensar e de operar articulado às demais políticas e tecnologias desenvolvidas no sistema de saúde brasileiro, contribui na construção de ações que possibilitam responder às necessidades sociais em saúde. Esta é uma estratégia de articulação transversal na qual se confere visibilidade aos fatores que colocam a saúde da população em risco e às diferenças entre necessidades, territórios e culturas presentes no País, visando à criação de mecanismos que reduzam as situações de vulnerabilidade1.

Neste contexto, tem-se, como porta de entrada da demanda em saúde, a Atenção Primária em Saúde (APS), que se caracteriza por um conjunto de ações de saúde, desenvolvidas pelo exercício de práticas gerenciais, sanitárias, democráticas e participativas, sob a forma de trabalho em equipe, dirigidas a populações de territórios delimitados, pelas quais assume a responsabilidade sanitária, considerando a dinamicidade existente no território em que vivem essas populações. A APS considera o sujeito em sua singularidade, complexidade, integralidade e inserção sociocultural, buscando a promoção de sua saúde, a prevenção e tratamento de doenças e a redução de danos ou de sofrimentos que possam comprometer suas possibilidades de viver de modo saudável2.

Desta forma, a APS tem como uma das ferramentas a Estratégia Saúde da Família (ESF), que preconiza a família e o território, correlacionando-os ao processo saúde-doença como foco de suas práticas3. Entender e estender esse olhar sobre a família em todos seus aspectos e complexidades, crenças e potencialidades torna-se importante na atenção à saúde da criança, pois é nesse ambiente que ela se desenvolve em toda a sua multidimensionalidade.

A família tem sido reconhecida nos últimos anos como uma instituição que desempenha papel relevante na vida social dos indivíduos, pois é no ambiente familiar que se promove a maior parte do cuidado com ações positivas que interferem na saúde dos sujeitos4, sendo que ela assume o principal papel no contexto do desenvolvimento infantil3.

Diante disso, a família passou a ser considerada um sistema em que os indivíduos interagem para o cuidado à saúde de seus membros. É permeada por um conjunto de valores, crenças e conhecimentos que, envolvidos, promovem a proteção à saúde e a prevenção de doenças e, em situação de doença, são responsáveis pelo cuidado dos seus membros4. Estudos apresentam efeitos protetores das redes sociais das famílias para a saúde e bem-estar das crianças. A coesão social entre vizinhanças pode promover processos sociais no ambiente familiar que contribuem para a melhoria da saúde das crianças e dos adolecentes5. Nesta conjunção, é preciso reforçar o poder das políticas públicas que tenham alcance nos microespaços e contar com os diferentes setores da sociedade para o fortalecimento das famílias para que, dessa maneira, possam promover o desenvolvimento infantil saudável2.

Assim, as redes sociais de apoio podem contribuir com as famílias neste cuidado, auxiliando-as em ações que possam apresentar dificuldades para serem feitas, propiciando diferentes tipos de apoio - financeiro, material, companhia social, guia cognitivo e conselhos, jurídico, entre outros. A rede social é entendida como a soma de todas as relações que o indivíduo percebe como significativas ou diferenciadas da massa anônima da sociedade. Essas relações definem quem é membro de uma família e quem não é. Dentro de cada nicho cultural e socioeconômico, haverá um perfil normativo das redes sociais dos indivíduos, com o seu ciclo de vida previsível, em harmonia com o ciclo de vida de outros membros e vicissitudes dos membros da família nuclear e seu contexto6.

Potencializar o cuidado existente nas relações sociais das famílias e da comunidade pode contribuir para uma melhor qualidade de vida de seus integrantes, diminuir o desgaste em relação à saúde e reduzir a mortalidade infantil7. Para tanto, é necessário o olhar do profissional de saúde sobre as famílias e as redes sociais de apoio para ampliar suas ações e práticas diárias de cuidado à família e à criança, almejando um desenvolvimento infantil saudável e compatível com a realidade social e econômica em que se encontram essas famílias.

Sendo assim, a enfermagem, ao atuar considerando a rede social, deve estar atenta a todos os fatores que englobam não só a criança, mas também o cuidador/família. Aponta-se para a necessidade de os profissionais da saúde atuarem como um real apoio às famílias, mais do que orientando a realização do cuidado, como a escuta qualificada, também investindo nas relações interpessoais, para efetivamente qualificar a assistência8. Neste aspecto, ainda existem lacunas entre os elementos da rede que a família reconhece como relevante e os que a enfermagem tem utilizado com suporte para ela. A família utiliza-se dos espaços de solidariedade e afetividade da subjetividade das relações desta rede e os enfermeiros pautam-se na dimensão institucional destas.

Diante do exposto, tem-se como objetivo neste trabalho identificar a rede social de apoio às famílias para a promoção do desenvolvimento infantil na perspectiva da equipe Estratégia Saúde da Família.

METODOLOGIA

Pesquisa descritiva com abordagem qualitativa, realizada em três unidades ESF, em um município da região metropolitana de Curitiba, no período de abril a novembro de 2010. Optou-se pelas unidades com ESF em razão das ações integradas que elas desenvolvem com as famílias. As três Unidades Saúde (US) escolhidas contemplam a diversidade geográfica do município, localizando-se uma em cada Distrito Sanitário, tendo sido selecionadas pelo maior número de crianças na faixa etária de zero a cinco anos, na sua área de abrangência.

Por tratar-se de estudo qualitativo, optou-se pela utilização da amostra intencional, por conveniência, de modo a selecionar os sujeitos com maior probabilidade de oferecer informações pertinentes à temática. Foram sujeitos desta pesquisa 12 profissionais de saúde, representantes de cada categoria profissional -enfermeiro, médico, auxiliar de enfermagem e agente comunitário de saúde - de cada uma das três US inclusas. Utilizou-se como critério de inclusão atuar em uma das unidades de saúde selecionadas e ser profissional médico, enfermeiro, auxiliar de enfermagem e ACS. O critério de exclusão correspondeu aos profissionais afastados ou de licença.

Os dados foram coletados por meio de entrevista semiestruturada, gravada e, posteriormente, transcrita. Os eixos temáticos que orientaram a entrevista foram os tipos de apoio oferecidos pela comunidade às famílias no cuidado à criança; as dificuldades das famílias no cuidado à criança; e as atividades que o serviço de saúde oferece às famílias que contribuem para o desenvolvimento infantil.

Os dados foram analisados segundo análise categorial temática, organizada em três etapas: pré-analise ou organização do material; exploração do material por meio de agrupamento por categoria; e a inferência e interpretação dos dados. A categorização foi realizada por meio de classificação, diferenciação e reagrupamento de elementos constitutivos, elaborando classes que reúnem grupos de elementos comuns, que fornecem representações dos dados brutos9. Para organização e interpretação dos dados, como suporte teórico, utilizou-se o Mapa Mínimo de Relações (MMR), proposto por Sluzki6, cuja aplicabilidade é acessível a diferentes culturas, situações econômicas, níveis de instrução e considera o significado individual atribuído aos componentes da rede social de apoio. O MMR propõe o agrupamento dos elementos de uma rede social de apoio em quatro grupos: Família, Amizades, Trabalho/Escolares e Relações Comunitárias e Credo, subdividida em Sistemas de Saúde e Agências Sociais. Os quadrantes são subdivididos em três círculos concêntricos que indicam o grau de proximidade das relações, sendo o primeiro representante das relações com maior grau de compromisso; o círculo intermediário, das relações com menor grau de compromisso; e o externo, das relações ocasionais.

Figura 1. Mapa Mínimo de Relações proposto por Suzuki6

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética da Universidade Federal do Paraná, sob o registro CAAE: 3145.0.000.091-09, tendo os participantes assinado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Para manter o anonimato dos sujeitos, eles foram identificados como: MÉD.1, 2 e 3; ENF. 1, 2 e 3; AUX. 1, 2 e 3; e AG 1, 2 e 3.

RESULTADOS

As redes sociais de apoio às famílias foram reconhecidas pelos profissionais de saúde e indicadas como auxílio para a promoção do desenvolvimento infantil. A partir dos resultados obtidos, ordenaram-se os dados em três categorias empíricas: Elementos da rede social de apoio; Funções de apoio às famílias; e Dificuldades e lacunas na rede social de apoio às famílias.

Elementos da rede social de apoio

Os elementos da rede social de apoio familiar estão em constante evolução relacional. Este processo de evolução inclui membros da família, amigos e conhecidos, conexões de trabalho e estudos e as relações decorrentes da participação em organizações formais e informais, podendo ser religiosas, recreativas, políticas e relacionadas à saúde6.

Esses elementos da rede incluem todos aqueles com quem a família se relaciona e que a distinguem e, reciprocamente, são distinguidos da multidão, sendo então identificados por ela sem jazer no anonimato. Os membros da família nuclear são os elementos essenciais dessa rede durante os primeiros anos de vida, expandindo-se de forma substancial no momento em que a criança estabelece relações com outros membros da comunidade6.

Segundo os profissionais de saúde, os elementos pertencentes à Rede Social de Apoio Familiar que auxiliam as famílias no cuidado às crianças são mães, pais, avós, tios e irmãos, conforme os discursos a seguir:

[...] às vezes é o irmãozinho mais velho que cuida do irmãozinho mais novo [...] (MÉD. 3)

[...] Os pais, os avós, tios aqui na nossa unidade, têm muitos que ficam com a família [...] (AUX. 1)

Neste grupo, destaca-se a questão de gênero, enfatizada por meio da figura materna, tida como um elemento fundamental e principal no papel de cuidadora, seguida pelas avós maternas e paternas, como nas falas a seguir:

[...] as crianças geralmente ficam com as mães [...] (AG. 3)

[...] a mãe é a principal [...] (MÉD. 1)

[...] o cuidado mesmo envolve as mães, avós [...](AG. 1)

[...] é a mãe. Em alguns casos a avó, mas mais é a mãe mesmo [...] (AG. 2)

Os elementos pertencentes à rede social de apoio de amizade, indicados pelos profissionais como apoio às famílias, são os amigos e compadres, caracterizados por meio de relações voluntárias não consanguíneas, conforme as falas a seguir:

[...] os pais, a avó, em último lugar é a madrinha [...] (AUX. 1)

[...] a família, tem toda essa rede, no caso vai contar com os pais, avós da criança, amigos [...] (ENF. 1)

Os elementos pertencentes à rede social comunitária de apoio e de credo, reconhecidos pelos profissionais de saúde, são: os setores de saúde, representados pelas unidades de saúde (US); os vizinhos; os programas governamentais de inclusão social Bolsa Família e Programa do Leite; e a instituição religiosa, representada pela igreja e pela Pastoral da Criança.

A Unidade de Saúde é reconhecida pelo trabalho desenvolvido pelos profissionais de saúde que ali atuam, entre eles, agentes comunitários, enfermeiros, médicos e auxiliares de enfermagem, como nas falas a seguir:

[...] tem a própria unidade da saúde [...] (ENF. 2)

[...] existem os apoios que é a unidade [...] (ACS. 1)

[...] o apoio vem da equipe, de toda a equipe de ESF [...] (MÉD. 2)

[...] a unidade de saúde [...]. Sempre auxilia de alguma maneira [...] (AUX.3)

Os programas governamentais Bolsa Família e o Programa do Leite são reconhecidos como parte integrante da rede de apoio às famílias, como explicitado nas falas a seguir:

[...]o programa do leite funciona, esse programa eu acho que é muito válido para essas famílias que são bem carentes [...] (MÉD.3)

[...] tem esses projetos do governo, Bolsa Família que o governo fornece e que auxilia [...](MÉD. 2)

A instituição religiosa é referida como elemento de apoio às famílias no cuidado às crianças, vinculada às ações desenvolvidas pela Pastoral da Criança.

[...] a igreja também ajuda, tem o programa da multimistura, que é com a Pastoral da Criança [...] (AG. 1)

[...] A igreja, a Pastoral da Criança [...] (AUX. 1)

Outro elemento referido pelos profissionais de saúde que apoia as famílias no cuidado às crianças são os vizinhos, como na fala a seguir.

[...] tem os vizinhos também [...] (AUX. 3)

Na rede social de apoio de Trabalho/Estudo, os profissionais reconhecem a creche como elemento relevante de suporte às famílias no cuidado às crianças:

[...] nós temos uma creche aqui no bairro que também auxilia bastante as crianças [...](AG. 3)

[...] a creche auxilia, além da unidade de saúde [...] (ENF. 2)

Funções de apoio às famílias

Os tipos de apoio ofertados pelos elementos da rede social de apoio às famílias, reconhecidos pelos profissionais de saúde, foram classificados de acordo com a proposta por Sluski6 que as nomina "Funções de apoio", distribuídas em Companhia Social, Guia Cognitivo e Conselhos, Ajuda Material e de Serviço. Companhia Social refere-se à realização de atividades conjuntas ou ao simples estar junto; Guia Cognitivo e Conselhos é relativo às interações destinadas a compartilhar informações sociais e pessoais, esclarecer expectativas e proporcionar modelos de papéis; e Ajuda Material e de Serviço refere-se à colaboração específica com base em conhecimentos de especialistas ou ajuda física6.

A função de Companhia Social é ofertada pelos elementos da rede social familiar, principalmente as mulheres, como nas falas a seguir:

[...] cuidado mesmo é a teia familiar, é o pai, a mãe, os avós; têm muitos avós que ajudam a cuidar dos netos [...] (ENF. 1)

A criança fica [...] com os parentes, os avós geralmente. [...] (ENF. 2)

[...] a gente vê muito as crianças com as mães, às vezes as avós ajudam a cuidar para as mães trabalharem [...] (AG. 3)

Alguns elementos da Rede Social Comunitária e de Trabalho/Estudo também auxiliam as famílias no cuidado direto às crianças, como os vizinhos e a creche, desempenhando a função de Companhia Social, conforme exemplificado nas falas a seguir:

[...] até os vizinhos cuidam [...] (AUX. 3)

[...] tem a creche, que acolhe essa criança quando a mãe está trabalhando [...] (MÉD. 2)

[...] tem as creches aqui que cuidam para as mães que vão trabalhar [...] (ENF. 3)

Em relação à função de Guia Cognitivo e Conselhos, foram considerados os elementos que oferecem apoio em relação ao cuidado indireto à criança e orientações/informações relacionadas ao cuidado.

Desempenha esta função a US, reconhecida pelas ações desenvolvidas pelos profissionais da ESF, como o acompanhamento nos programas ministeriais, entre eles o atendimento nutricional e a puericultura, que recebem destaque, referidos em todos os discursos como recurso importante dessa rede no auxílio indireto às famílias e na promoção do desenvolvimento infantil.

[...] quem acompanha é a enfermeira, médico, dentista e auxiliares de uma forma geral e o ACS nas visitas [...] (ENF. 1)

[...] aqui a gente tem o programa de puericultura, fazemos acompanhamento das crianças menores, tanto com a enfermagem quanto com a consulta com o médico, a gente faz esse acompanhamento [...] (MÉD 3)

[...] tem a puericultura, que é muito importante [...] (MÉD. 1)

[...] a puericultura que a gente acompanha, em todos os aspectos [...](AUX. 2)

Além deste atendimento, a US também faz mensalmente a pesagem das crianças para o Programa do Leite e o Programa Bolsa Família, a fim de acompanhar seu crescimento e desenvolvimento, também considerado função de Guia Cognitivo e conselhos.

[...] o acompanhamento da pesagem do Programa Bolsa Família e do leite[...] (AUX. 3)

A Pastoral da Criança também é indicada na função de Guia Cognitivo e conselhos pela oferta de ajuda e orientações quanto à alimentação e cuidado das crianças, além da pesagem para acompanhar o crescimento e o desenvolvimento corporal.

[...] eles da Pastoral da criança pesam e têm uma conversa com as mães, uma orientação com relação ao peso [...] (AG. 1)

A função de apoio Ajuda Material e Serviço foi considerada ofertada pelos programas ministeriais do Programa Bolsa Família e Programa do Leite, que oferecem às famílias auxílio financeiro mensal e fornecimento de um litro de leite diário às crianças de seis meses aos três anos de idade, almejando garantir uma nutrição mínima. Esta ação é desenvolvida também pela Pastoral da Criança, com o fornecimento da multimistura, alimento que complementa a alimentação diária das crianças.

[...] E também o Programa Bolsa Família, que é pra família bem carente[...] (AG. 1)

O programa do leite também, que dá leite para criança que está abaixo, está desnutrida; (MÉD. 2)

[...] Tem o programa da multimistura, que é com a pastoral da criança [...] (AG. 1)

Dificuldades e lacunas na rede social de apoio às famílias

Segundo os profissionais de saúde, áreas de lazer e recreação são importantes para as famílias na promoção do desenvolvimento infantil, todavia referiram de maneira uniforme a ausência deste tipo de apoio para as crianças moradoras da região.

[...] não tem nada de parques aqui no município, em um parque a criança pode brincar na areia, conhecer outras crianças, fazer amizade com outros coleguinhas [...](AG. 3)

[...] se tivesse talvez um lugar para recreação, voluntários que pudessem fazer algum esporte [...] (AG. 2)

[...] a nossa região acaba não oferecendo outro tipo de atividade, não tem um parquinho adequado, não tem uma atividade [...] (ENF. 2)

Ao pensar em rede e na integralidade da atenção, foi referida a necessidade de melhorar a articulação intersetorialidade entre os diferentes elementos da rede para promover um apoio coerente com a realidade e a necessidade das famílias.

[...] eu havia comentado a dificuldade que a gente tinha de estar trabalhando com outra secretária [outro setor...] (ENF. 1)

[...] tem que ser assim, não só dentro da unidade ou fora, acho que tinha que ter um somar ao outro [...] (AUX. 2)

Todavia referiram como uma das dificuldades que o número de profissionais disponíveis é insuficiente e consideraram que um excedente contribuiria de forma efetiva nesta interação e no apoio às famílias.

[...] uma estrutura melhor aqui na unidade, mais funcionários que pudessem atender melhor os programas como a puericultura [...] (AG. 1)

[...] a estrutura da unidade talvez, nos faltam profissionais, mais profissionais na equipe [...] (AUX. 3)

A insuficiência de creche para atender a população local é referida de forma unânime pelos profissionais de saúde.

[...] o bairro é muito grande [...]. Uma creche só é muito pouco, não tem condição de atender nem metade das crianças [...] (AG. 3)

[...] uma creche é insuficiente, porque tem muitas crianças que estão esperando há muito tempo, tem um tempo de espera muito grande [...] (ENF. 3)

[...] na creche não tem vaga, tem muitas pessoas na fila, uma fila enorme de espera [...] (AG. 1)

DISCUSSÃO

O reconhecimento por parte dos profissionais dos diversos elementos familiares que auxiliam no cuidado à criança mostra uma visão ampliada da rede social de apoio, mediante a qual o profissional pode estender suas orientações e cuidados, aumentando a chance de promoção do desenvolvimento infantil com a contribuição de toda a rede social de apoio da família.

Para os profissionais, a rede social de apoio familiar é composta por diversos elementos, como a família nuclear, mães, pais, avós, tios e irmãos, e também aqueles que integram a rede expandida, com a qual a criança estabelece relações durante o seu desenvolvimento. A compreensão destes elementos sobre a rede social de apoio que influencia no cuidado à criança é importante porque pode estabelecer ações que promovem o desenvolvimento infantil. O conhecimento dos elementos que compõem a rede social de apoio faz com que os profissionais de saúde respeitem as características individuais de cada criança, a qual esta envolvida em um contexto sócio-histórico-cultural diversificado.

Um estudo aponta que na opinião dos enfermeiros, a rede de apoio procura ver a pessoa em sua integralidade, oferecendo-lhe apoio e ajuda de acordo com suas necessidades, provendo meios para o enfrentamento das situações presentes10.

Os participantes da pesquisa referiram que a figura feminina é o elemento central da rede de apoio às famílias, podendo contribuir de maneira positiva para a promoção do desenvolvimento infantil. Esse panorama também foi referido em outro estudo que citou que as mulheres continuam a valorizar seu papel de provedora do cuidado ou "chefe da casa" no que diz respeito à afetividade e cuidados domésticos, enquanto a figura do pai permanece associada ao papel de "chefe da família", responsável pela rentabilidade familiar11,12.

O cuidado proporcionado pelas avós envolve diversos aspectos, como ser figura feminina que a mantém ligada ao papel materno, a busca do seu cuidado devido à confiança que se tem neste elemento da rede. Outra função que as avós desempenham é a de apoio material, pois cuidam da criança e não cobram nada por isso, resultando essa ação em economia familiar 7,13.

Os profissionais de saúde envolvidos neste estudo reconheceram que a rede social de apoio é composta também por amigos e vizinhos, que desempenham a função de Companhia Social. Esta função pode proporcionar às crianças oportunidades diferenciadas pela sua influência no seu dia a dia. Para tanto, os profissionais devem reconhecer esse espaço cultural, social e de relações comunitárias, utilizando seu potencial positivo para o incremento de ações de promoção à saúde da criança e família.

O apoio ofertado pelos amigos às famílias é considerado importante, uma vez que faz parte da rede social do ser humano, e a relação afetiva e o apoio instrumental proveniente desta rede auxiliam as famílias no cuidado à criança. Estas relações podem contribuir para o bem-estar físico e psicológico dos indivíduos13, porém as necessidades de saúde das famílias requerem uma rede de recursos que ultrapassem aqueles encontrados na rede intrafamiliar7. Um estudo com famílias com crianças portadoras de doenças crônica apresentou a influência positiva da rede de apoio social, na qualidade de vida dos pais, especialmente na função de apoio emocional14.

Nesta perspectiva, uma das políticas públicas que tentam articular os recursos necessários é a Estratégia Saúde da Família (ESF), que tem centrado suas ações na família, e com o passar dos anos tem assumido várias formas que vão além da nuclear, ampliando suas redes de relações, direcionando, assim, as políticas públicas à promoção do apoio necessário para cuidar da saúde além da cura e da reabilitação15. A promoção de ações direcionadas à família é uma das questões da ESF que vêm sendo discutidas no meio acadêmico devido às dificuldades que permeiam este trabalho, como a falta de qualificação profissional16.

Neste estudo, os profissionais de saúde apontaram a ESF e as ações nela desenvolvidas como uma das redes de apoio às famílias. Foram citadas como funções desta rede a consulta de puericultura, o peso para acompanhamento nos Programas do Leite e do Bolsa Família e orientações que, se articuladas de maneira estratégica, apoiam as famílias na promoção do desenvolvimento infantil. Esses elementos são citados como recursos importantes dessa rede no auxílio indireto às famílias e se referem à função de Guia Cognitivo e Conselhos, ofertando ajuda e orientações em relação à alimentação e ao cuidado das crianças.

Esses dados vão ao encontro de outro estudo, o qual refere que os programas governamentais apontados pelos profissionais como elementos de apoio às famílias, quando utilizados, podem ser um potencializador para a autonomia das famílias no cuidado de seus membros em especial no cuidado às crianças7.Em termos de prevenção e promoção da saúde, os pais deveriam ser estimulados para manter e investir nas suas redes sociais de apoio14.

Em outro estudo, a participação do setor saúde também foi referida como importante, pois, ao acompanharem o crescimento e o desenvolvimento da criança, os profissionais têm condições de iniciar um diagnóstico da situação da comunidade, o que lhes permite nortear trabalhos de prevenção e promoção da saúde17.

Os resultados desta pesquisa divergem de outros estudos, que trazem a igreja, na condição de apoio espiritual, moral e emocional das populações, como uma instituição com credibilidade para as famílias das classes menos favorecidas10.

Neste estudo, o apoio das instituições religiosas refere-se às atividades da Pastoral da Criança, considerada uma ação que pode contribuir para o desenvolvimento infantil, uma vez que os profissionais de saúde podem utilizá-la como espaço para o desenvolvimento de suas atividades voltadas à prevenção de doenças e à promoção à saúde de crianças e famílias.

Os profissionais expressaram nesta pesquisa a compreensão de que o desenvolvimento infantil necessita da participação de outros setores da sociedade e que, para tanto, suscita maior integração entre os diferentes elementos que compõem o apoio social das famílias para a promoção da saúde da criança. Entre todos os fatores envolvidos neste processo, salientam-se as atividades de lazer, que podem tornar as crianças mais sociáveis e promover seu desenvolvimento. Porém, os profissionais de saúde deste estudo referem que há lacunas e dificuldades na rede social de apoio às famílias, como falta de áreas de lazer e recreação, dificuldades de comunicação entre os diferentes elementos da rede e número insuficiente de profissionais. Estas lacunas comprometem o desempenho de ações/atividades para a promoção do desenvolvimento esperado na infância.

Estudos apontam o reconhecimento do lazer como parte importante do desenvolvimento infantil pelos profissionais de saúde, pois o brincar e a socialização promovem um desenvolvimento saudável. A falta de espaços públicos com área verde, parques, praças e pontos específicos para prática de esportes acaba por afrontar um dos direitos de toda criança - o de brincar. Entre as vantagens desses espaços estão a socialização, a convivência com outras pessoas e a resolução de problemas, entre outros, que fazem do direito a esses espaços o favorecimento da promoção do desenvolvimento infantil saudável7.

Se o profissional de saúde reconhecer as funções da rede, ele poderá atuar de maneira significativa para o desenvolvimento infantil. Estes profissionais precisam ir além da sua concepção do processo saúde-doença, utilizando elementos que permeiam a rede familiar na sua prática de cuidado para a promoção de saúde, indo além do prescritivo, otimizando o referencial familiar na sua prática profissional.

Em síntese, nesta pesquisa, o reconhecimento da rede de apoio das famílias ficou centrado no próprio serviço e nos programas institucionais implementados pelas políticas públicas. Considera-se limitada esta percepção que perde a dimensão das relações sociais contidas no espaço comunitário, espaço de vida. Os resultados de um estudo sobre capital social e saúde das crianças sugerem que a presença de interação social entre vizinhos traz benefícios, especialmente para a saúde das crianças, e, portanto, requer mais atenção5.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O reconhecimento dos elementos pertencentes à rede social de apoio às famílias para o desenvolvimento infantil, na perspectiva dos profissionais de saúde, possibilita reconhecer o potencial de cuidado desta rede às crianças, subsidia o projeto de intervenção profissional, permite reconhecer os limites e potencialidades para a promoção do desenvolvimento infantil, além de instigar nos enfermeiros uma reflexão sobre as ações que vêm desenvolvendo na dimensão do cuidado para a promoção do desenvolvimento infantil.

Destaca-se que, além das práticas de cuidado à criança, as redes sociais têm importante papel na vinculação das famílias em um processo de desenvolvimento de habilidades que auxiliem e fortaleçam seu potencial para o desenvolvimento infantil saudável em todas as suas dimensões. O reconhecimento dos diversos elementos que compõem a rede social de apoio às famílias favorece a atuação dos profissionais de saúde, que podem utilizar, articular ou potencializar os diferentes elementos, favorecendo a promoção do desenvolvimento infantil.

Diante disso, sugere-se que os profissionais de saúde articulem ações que possam influenciar esses elementos da rede de maneira que promovam o desenvolvimento infantil adequado.

Neste estudo, foram elencados elementos de apoio presentes na comunidade, que dão suporte às famílias no cuidado às crianças e são reconhecidos pelas equipes de ESF. No entanto, estes elementos não podem ser generalizados, por, apresentarem compreensões de um determinado grupo social.

Ademais, é necessário que se promovam investigações, visando à ampliação do conhecimento sobre os eventos que compõem o cuidado e sobre as relações familiares com base nas experiências dos sujeitos. Apesar das limitações e das perdas, o estudo buscou registrar a relevância dessa temática para a enfermagem por se tratar de uma profissão que tem, em sua essência, o cuidado ao explorar questões subjacentes ao processo de cuidar do familiar e às relações envolvidas.

Propõe-se instigar novas produções acerca desta temática para aprofundar as discussões sobre ela que possam confirmar o desenvolvimento de ações para o desenvolvimento infantil.

REFERÊNCIAS

Ministério da Saúde (Brasil). Política Nacional de Promoção da Saúde. 3. ed. Brasília (DF): Editora MS; 2010.
Ministério da Saúde (Brasil). Atenção Primária e Promoção da Saúde. Brasília (DF): CONNASS; 2011.
Cianciarullo IT. Compreendendo a Família no Cenário de Uma Nova Estratégia de Saúde. In: Cianciarullo IT, Gualda DMR, Silva da RTG, Cunha ICKO, organizadores. Saúde na Família e na Comunidade. São Paulo: Robe editorial; 2002. p.17-32.
Serapioni M. O papel da família e das redes primárias na reestruturação das políticas sociais. Cienc. Ciênc. saúde coletiva (Online). 2005 Dez [Citado 2012 Abr 20]. 10(supl.):243-53. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/csc/v10s0/a25v10s0.pdf>
Veerle V, Bart De C, Veerle S, Costongs C, Barbareschi G, Jónsson SH et al. Does neighbourhood social capital aid in leveling the social gradient in the health and well-being of children and adolescents? A literature review. BMC Public Health. 2013 [Citado 15 Ago 2013]. 13:4-18. Disponível em: <http://www.biomedcentral.com/1471-2458/13/65>.
Sluzki CE. Personal Social Networks and Health: Conceptual and Clinical Implications of Their Reciprocal Impact.Families, Systems and Health. 2010 Mar; 28(1):1-18.
Alexandre AMC, Labronice LM, Maftum MA, Mazza VA. Map of the family social support netword for the promotion of child development. Rev. Esc. Enferm. USP (Online). 2012 [Citado 05 Mai 2013]. 46(2):272-79. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0080-62342012000200002&script=sci_arttext>.
Bolla BA, Fulconi SN, Baltor MRR, Dupas G. Cuidado da criança com anomalia congênita: a experiência da família. Esc Anna Nery. 2013 Abr-Jun; 17(2):284-290.
Bardin L. Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70; 2011.
Marcon SS, Zani AV, Waidman MAP, Radovanovic CAT, Decessaro MN, Carreira L. Rede social e família: o olhar sensível dos enfermeiros da prática. Ciênc. cuid. saúde. [Intenet]. 2009 Dez; [Citado: 08 Jan 2012]. 8(suplem.): 31-39. Disponível em: <http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/CiencCuidSaude/article/view/9715/5528>.
Dessen AM, Braz PM. Rede social de apoio durante transições familiares decorrentes do nascimento de filhos. Psic.: Teor. e Pesq [Internet]. 2000 Dez. [Citado 2012 Jan 12]. 16(3):221-31. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/ptp/v16n3/4809.pdf>.
Sarti CA. A Família como Espelho: um estudo sobre a moral dos pobres. São Paulo: Cortez; 2007.
Faquinello P, Marcon SS. Amigos e vizinhos: uma rede social ativa para adultos e idosos hipertensos. Rev. Esc. Enferm. USP. 2011 Dez; 45(6):345-52.
Hatzmannj M H, Heymans H S, Grootenhuis M A. A predictive model of Health Related Quality of life of parents of chronically ill children: the importance of care-dependency of their child and their support system. Health Qual Life Outcomes. 2009 Jul; 28(7):72.
Andrade GRB, Vaitsman J. Apoio social e redes: conectando solidariedade e saúde. Ciênc. saúde coletiva. 2002 Dez; 7(4):925-34.
Lopes MCL, Marcon SS. Assistência à família na atenção básica: facilidades e dificuldades enfrentadas pelos profissionais de saúde. Acta. Sci. Health [Internet]. 2012 Jan [Citado: 2012 Mai 26]. 34(1):85-93. Disponível em: <http://periodicos.uem.br/ojs/index.php/ActaSciHealthSci/article/viewFile/7624/pdf>.
Campos RMC, Ribeiro CA, Silva da CV, Saparolli ECL. Consulta de enfermagem em puericultura: a vivência do enfermeiro na Estratégia de Saúde da Família. Rev. Esc. Enferm. USP. 2011 Jun; 45(3):566-74.

© Copyright 2024 - Escola Anna Nery Revista de Enfermagem - Todos os Direitos Reservados
GN1