Volume 17, Número 3, Jul/Set - 2013
PESQUISA
Estrutura organizacional da atenção pós-parto na estratégia saúde da família
Daniela do Carmo Oliveira
1
Edir Nei Teixeira Mandú
2
Áurea Christina de Paula Corrêa
3
Janete Tamami Tomiyoshi
4
Renata Cristina Teixeira
5
1
Enfermeira. Mestranda do Curso de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Cuiabá - MT. Brasil. E-mail: dani_carmo@hotmail.com
2
Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Docente da Graduação e Pós-Graduação em Enfermagem da UFMT. Cuiabá - MT. Brasil. Email: enmandu@terra.com.br
3
Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Docente da Graduação e Pós-graduação em Enfermagem da UFMT. Cuiabá - MT. Brasil. Email: aureaufmt@gmail.com
4
Enfermeira. Doutora em Ciências da Saúde. Docente da Graduação e Pós-graduação em Enfermagem da UFMT. Cuiabá - MT. Brasil. Email: tominaka2003@hotmail.com
5
Enfermeira. Mestre em Enfermagem. Docente substituta da Graduação em Enfermagem da UFMT. CuiabáMTBrasil. Email: renata_teixeirra22@hotmail.com.
Recebido em 20/06/2012
Reapresentado em 15/10/2012
Aceito em 15/07/2013
RESUMO
Objetivou-se descrever atributos da estrutura organizacional da atenção pós-parto
na Estratégia Saúde da Família, a partir de quesitos presentes na política de saúde
nacional, relativos à infraestrutura, pessoal e a ações assistenciais e de gestão.
Estudo quantitativo, descritivo e transversal, realizado em 55 unidades da Estratégia
Saúde da Família de Cuiabá, Mato Grosso, mediante entrevista e análise estatística
descritiva. A maioria das unidades contempla quesitos de infraestrutura física e de
oferta de ações no pós-parto. Há limitações na oferta de consultas de enfermagem,
de educação grupal e de anticoncepcional oral de uso no pós-parto. Nem sempre há disponibilidade
de material para o preventivo de câncer de colo uterino e de médicos nas unidades.
O agendamento da consulta pós-parto não é rotineiro, e dados do sistema de informação
não são habitualmente usados no planejamento dessa atenção. É necessário investir
na melhoria da estrutura organizacional para que a atenção pós-parto ganhe qualidade.
Palavras-chave: Estrutura dos serviços; Período pós-parto
INTRODUÇÃO
O pós-parto é uma experiência essencialmente feminina, mas também diz respeito ao homem e às famílias que o partilham. Na mulher, essa fase da vida reprodutiva corresponde à regressão física gravídica e à passagem ao exercício da maternidade. Nela se entrelaçam mudanças orgânicas, psicoemocionais, comportamentais, relacionais e socioculturais. No homem, ela abrange a vivência da paternidade e de repercussões que o nascimento traz à vida deste e à família, incluindo novas responsabilidades, preocupações, sentimentos, valores, comportamentos.1 Na família, o período caracteriza-se por mudanças associadas à inserção do novo membro familiar, que afetam sua organização e dinâmica cotidiana.2
No pós-parto, mulheres, homens e famílias, envolvidos na experiência, apresentam diversas necessidades de saúde. Apesar de se esperar que ela seja saudável, podem surgir problemas de ordem física, subjetiva, relacional e social. Os problemas e as vulnerabilidades que os geram devem ser considerados pelos serviços de saúde, em especial os de atenção básica, que têm a responsabilidade social de promover a saúde familiar e, como parte desta, a saúde reprodutiva de seus membros.
A política de saúde brasileira estabelece diretrizes, ações e estratégias específicas de atenção à saúde reprodutiva3-7, voltadas à mulher, ao recém-nascido e ao homem, situando o que cabe à atenção básica no cuidado pós-parto, e indicando a correspondente estrutura e organização assistencial e gerencial.
Nesse sentido, apresenta várias proposições sobre: infraestrutura física e material; pessoal; ações assistenciais; organização do acesso, inclusive a outros serviços da rede de saúde; e medidas de gestão das equipes, da assistência e dos meios que a viabilizam.3-9
A adequada infraestrutura física e material propicia boas práticas assistenciais, já que a qualidade destas é sensível às condições ambientais e de estrutura. A garantia de espaço, de mobiliários, equipamentos e recursos materiais favorece a execução das ações adequadas e resolutivas, além de suprir condições de trabalho.10
Para promover a saúde da mãe e de seu filho, e evitar o óbito destes, é necessária uma rede de atenção à saúde reprodutiva e sexual suficiente, integrada e regulada, com um amplo suporte em recursos físicos, materiais, humanos, técnicos e financeiros. Recursos apropriados são um dos requisitos para efetivar a integralidade.7
O Ministério da Saúde (MS) brasileiro sugere uma dada estrutura física, de assistência, de apoio técnico, administrativo e logístico, para as unidades da Estratégia Saúde da Família (ESF), de acordo com o número de equipes e cobertura populacional. Nomeadamente, para as atividades de assistência, para unidades com uma equipe, prevê minimamente, como parte da estrutura física, uma sala específica para procedimentos, pelo menos dois consultórios, sendo um com banheiro, e área específica para atividades de educação em saúde8. Esses requisitos são considerados indispensáveis à boa assistência no período pós-parto.7
Nesse sentido, as unidades da ESF também devem dispor de material de aferição de dados vitais (esfigmomanômetro e estetoscópio clínico); mensuração de peso/altura (balança para adultos com régua antropométrica); realização de exame ginecológico e coleta de material biológico para Colpocitologia Oncótica - CCO (mesa ginecológica, foco de luz, escada de dois degraus, pinças de Cheron).
Além disso, as unidades devem dispor de medicamentos e insumos como anticoncepcional oral de uso no pós-parto, sulfato ferroso, vacinas (a dupla tipo adulto - dT, tríplice viral e hepatite B), de material de apoio logístico, como instrumentos de registro de dados (ficha perinatal, ficha de registro no Sistema de Informação do Pré-Natal - SISPRENATAL) e de troca de informações (cartão da gestante/puérpera).5
Na ESF, a equipe deve ser composta minimamente por um médico, um enfermeiro, dois auxiliares e/ou técnicos de enfermagem e Agentes Comunitários de Saúde (ACS) para a cobertura das áreas territoriais. Esses trabalhadores devem ter vínculo estabelecido com as famílias que se encontram sob sua responsabilidade assistencial e vice-versa.9 Para atuar em saúde reprodutiva, a equipe deve estar tecnicamente preparada para o manejo de tecnologias da área e para a realização de ações humanizadas, de suporte clínico à mulher no pós-parto e de apoio psicoemocional e social à maternidade e paternidade.3-7
A assistência pós-parto na atenção básica inclui: acolhimento; vinculação da mulher, do homem e da família ao serviço local; ações clínico-educativas de acompanhamento das mudanças orgânicas da mulher; ações de planejamento familiar, de prevenção do câncer de mama, do câncer de colo uterino e das doenças sexualmente transmissíveis; apoio continuado à amamentação e ao cuidado do recém-nascido; apoio psicoemocional à maternidade e paternidade; informação e educação voltadas à saúde no pós-parto; e ações sociais de promoção da saúde reprodutiva.3,5-7
Para a realização da assistência pós-parto, o MS 5,7 propõe a "Primeira Semana de Saúde Integral", voltada ao cuidado clínico-educativo da mulher e do recém-nascido na primeira semana pós-parto. Para isso, recomenda a visita domiciliar pelos ACS e/ou enfermeiro na primeira semana pós-alta do recém-nascido ou nos primeiros três dias pós-alta em caso de classificação de risco. Nesse primeiro contato pós-nascimento, a mulher deve ser orientada ao retorno ao serviço para consulta entre sete e dez dias e consulta até 42 dias após o parto. Para o homem, o MS6 postula a organização e oferta de ações de apoio à paternidade e ao planejamento reprodutivo.
Para que essas ações sejam efetivadas com boa qualidade, esse órgão3,5,7,10 preconiza sua gestão, valorizando a produção e análise de informações em saúde reprodutiva que permitam identificar necessidades de saúde importantes, e monitorar condições dos serviços e a qualidade das ações realizadas; o estabelecimento de mecanismos sistemáticos de avaliação dos serviços, das ações e do desempenho das equipes; e o planejamento sistemático e participativo de metas, ações e estratégias.
Para o acesso à assistência, o MS prevê, dentre outras coisas, o acompanhamento precoce da mulher em pós-parto pelo serviço local e a vinculação dela a este, a garantia da referência e contrarreferência na rede de serviços de saúde à continuidade das ações assistenciais e resolutividade de problemas.3,5,7,9
A despeito dessas proposições políticas, há evidências de que a assistência ao pós-parto no país não vem sendo adequadamente realizada, aspecto este associado ao importante problema da morte materna.7 O acompanhamento do pós-parto pelos serviços locais de saúde no país não tem se dado de forma sistemática, por possíveis limitações na estrutura, gestão e assistência dos serviços11,entre outros aspectos.
Faz-se necessário, então, apreender e discutir peculiaridades relacionadas à qualidade da atenção no pós-parto no Sistema Único de Saúde, evidenciando, entre outras coisas, a estrutura ou capacidade operativa dos serviços locais de saúde, os seus componentes assistenciais e gerenciais e, ainda, os resultados obtidos.
Recortando um aspecto específico das peculiaridades, esta pesquisa, realizada no cenário da ESF em Cuiabá, objetiva descrever atributos da estrutura organizacional da atenção pós-parto, olhando e discutindo a incorporação de certos quesitos recomendados na política de saúde nacional, relativos à infraestrutura física e material, à pessoal e a ações assistenciais e gerenciais.
METODOLOGIA
Pesquisa descritiva, quantitativa, transversal, realizada a partir de dados coletados em março de 2011, em 55 unidades da ESF de Cuiabá, Mato Grosso, do total das 65 então existentes.
O critério de inclusão de unidades adotado foi: ter no mínimo um ano de funcionamento, tempo considerado necessário à sua estruturação; e situar-se na área urbana. O enfermeiro de cada unidade foi o informante principal da pesquisa. Participaram 55 enfermeiros. Foram excluídas duas unidades das 57 que se enquadravam nos critérios acima, não estando esse profissional disponível para participar da pesquisa.
Apenas as informações sobre capacitação técnica do médico foram colhidas junto a este profissional, participando 43 deles. As informações sobre capacitação técnica de auxiliares e/ou técnicos de enfermagem e de autoavaliação acerca de seu preparo para ações assistenciais pós-parto foram colhidas com 102 deles. Participaram auxiliares e/ou técnicos e médicos em atividade nas unidades da ESF no período de coleta de dados.
Em Cuiabá, as unidades da ESF possuem estruturas físicas individuais (exclusivas) ou conjugadas, com áreas compartilhadas entre duas unidades. Em cada unidade há uma equipe mínima, conforme proposta pelo MS, atuando em 8 horas diárias de segunda a sexta-feira, cujo cumprimento da jornada atrela-se a um valor salarial adicional.
Os dados foram coletados mediante entrevista, com instrumento estruturado, elaborado e testado previamente, contendo questões fechadas sobre infraestrutura física e material, pessoal, ações ofertadas, organização do acesso e ações de gestão, relacionadas a requisitos de atenção pré-natal e pós-parto selecionados dentre os propostos pelo MS.3-9 No artigo, foram trabalhados os quesitos a seguir, relacionados diretamente à assistência.
Acerca da infraestrutura física, considerou-se a disponibilidade e indisponibilidade de espaços, diferenciando os específicos (usados apenas para os fins a que se destinam) dos adaptados (locais considerados impróprios) e os de uso exclusivo da unidade dos de uso compartilhado entre unidades conjugadas. Investigaram-se os elementos físicos mínimos previstos para a assistência clínico-educativa no pós-parto5,7,8: sala específica de procedimentos para realização da pré-consulta; sala específica para vacinas; existência de dois consultórios (médico e de enfermagem), e de pelo menos um com banheiro; e área específica para grupos educativos.
Em relação aos materiais permanentesa de uso na assistência pós-parto5,7 averiguou-se a disponibilidade contínua, a disponibilidade descontínua, e a indisponibilidade de: estetoscópio e esfigmomanômetro, balança adulto, mesa de exame, mesa ginecológica, foco auxiliar para exame ginecológico, escada de dois degraus junto à mesa de exame e mesa ginecológica. Tomaram-se como disponíveis apenas os materiais considerados em condições apropriadas de uso.
Quanto a materiais de consumo, medicamentos, insumos e impressos usados na assistência pós-parto de rotina5, consideraram-se a disponibilidade contínua, a disponibilidade descontínua, e a indisponibilidade de: material para coleta de CCO (luvas, espéculo de todos dos tamanhos, espátula, escova, lâmina, fixador), anticoncepcional oral de uso no pós-parto, sulfato ferroso, vacina Hepatite B, vacina dT, ficha de registro de atendimentos no SISPRENATAL, ficha específica de atendimento pré-natal/pós-parto criada pela equipe ou pela Secretaria Municipal de Saúde (SMS), e cartão da gestante-puérpera.
Em relação à pessoal, levantaram-se os quesitos7,9: disponibilidade ou indisponibilidade temporária no quadro de pessoal, no ano de 2010, do médico, do enfermeiro, de dois auxiliares/técnicos de enfermagem, e de ACS para todas as microáreas; mudança, ou não, do profissional médico, do enfermeiro, de auxiliares e/ou técnicos de enfermagem e ACS, nesse mesmo ano; especialização dos profissionais médico e enfermeiro em saúde da família ou saúde coletiva. Investigou-se, ainda, a participação, ou não, do médico, do enfermeiro e dos auxiliares e/ou técnicos em capacitação técnica sobre temas da assistência à saúde reprodutiva, nos anos 2009 e 2010, de no mínimo 16 horas (considerado o mínimo necessário à abordagem introdutória de aspectos clínico-assistenciais do pós-parto). Procedeu-se à autoavaliação do enfermeiro sobre seu preparo para o cuidado pós-parto, em relação à avaliação física da mulher, de seu estado nutricional, riscos, vulnerabilidades e aspectos emocionais, avaliação do recém-nascido, abordagem do pai e família, ações de promoção da saúde, educação em saúde reprodutiva, interação e acolhimento. Também se procedeu à autoavaliação de auxiliares e/ou técnicos de enfermagem, a respeito de seu preparo para a verificação de peso, altura e pressão arterial, imunização, educação em saúde, interação e acolhimento no pós-parto.
Sobre os cuidados pós-parto ofertados pela ESF, investigou-se a realização contínua, descontínua, ou a não realização das ações3,5-7: visita domiciliar na 1ª semana pós-parto pelo ACS e/ou enfermeiro; consulta de enfermagem na unidade até dez dias pós-parto; consulta médica na unidade até 42 dias pós-parto; ação educativa individual e grupal; cuidados específicos ao pai e família; cuidados à amamentação; busca de mulheres faltosas às consultas de pós-parto.
Na apreciação da organização do acesso da atenção pós-parto3,5,7,9 considerou-se a realização, ou não, do agendamento prévio da consulta pós-parto e de continuidade no acompanhamento, pela USF, de mulheres em pós-parto encaminhadas a serviços de referência; e a existência, ou não, de dificuldades na garantia de referência a outros serviços de mulheres em pós-parto.
Na apreciação de quesitos de gestão da atenção pósparto3,5,7,9, pesquisaram-se a adoção, ou não, de protocolo clínico pós-parto; a realização, ou não, de ações sistemáticas de avaliação e planejamento da atenção pós-parto pela equipe, baseados em dados/informações dos sistemas de informação; e a referência, ou não, em metas a serem alcançadas na assistência pós-parto.
O banco de dados da pesquisa foi construído com o auxílio do Epi-Info, versão 3.5.1. Utilizou-se a análise estatística descritiva das variáveis, através de medidas de frequência (frequência absoluta e relativa). As medidas de frequência das quatro dimensões estudadas (infraestrutura física e material, pessoal, ações, organização do acesso e gestão) são apresentadas nas Tabelas 1 a 5.
Estrutura Física | Disponível | Indisponível | |||
|
|||||
Espaço específico, de uso exclusivo por uma única unidade | Espaço adaptado, de uso exclusivo por uma única unidade | Espaço específico, de uso compartilhado entre duas unidades | Espaço adaptado, de uso compartilhado entre duas unidades | n(%) | |
n(%) | n(%) | n(%) | n(%) | ||
Sala de pré-consulta | 22 (40,0) | 17 (30,9) | 07 (12,7) | 05 (9,1) | 04 (7,3) |
Sala específica para vacina | 17 (30,9) | - | 38(69,1) | - | - |
Consultório com banheiro | 52 (94,6) | - | 01 (1,8) | - | 02 (3,6) |
Consultório médico e de enfermagem | 55(100) | - | - | - | - |
Áreas para grupos educativos | 03(5,5) | 09 (16,3) | 03 (5,5) | 20 (36,3) | 20(36,4) |
Materiais Permanentes | Disponível | Nem sempre disponível | Indisponível | |
n(%) | n(%) | n(%) | ||
Estetoscópio | 51 (92,7) | 04 (7,3) | - | |
Esfigmomanômetro | 48 (87,3) | 07(12,7) | - | |
Foco | 54(98,2) | 01(1,8) | 01(1,8) | |
Balança adulto | 54(98,2) | 01(1,8) | - | |
Mesa ginecológica | 54(98,2) | 01(1,8) | 01(1,8) | |
Mesa de exame | 55(100) | - | - | |
Escada de dois degraus | 55(100) | - | - | |
Materiais de consumo, medicamentos e insumos | ||||
Material CCO | 13(23,6) | 42 (76,4) | - | |
Anticoncepcional oral de uso no pós-parto | 18(32,7) | 37 (67,3) | - | |
Sulfato ferroso | 49(89,1) | 06(10,9) | ||
Vacina hepatite B | 53 (96,4) | 02 (3,6) | - | |
Vacina dT | 52 (94,6) | 03 (5,5) | - | |
Impressos | ||||
Cartão da gestante-puérpera | 54(98,2) | 01(1,8) | - | |
Ficha de registro de atendimentos no SISPRENATAL | 52 (94,6) | 03 (5,5) | - | |
Ficha específica de pré-natal/ pós-parto | 26 (47,2) | 04(7,3) | 25 (45,5) |
Disponibilidade do profissional* | Sim | Não | |
n (%) | n (%) | ||
|
|||
1 Enfermeiro | 54 (98,2) | 01 (1,8) | |
1 Médico | 42 (76,4) | 13 (23,6) | |
2 Técnicos ou auxiliares de enfermagem | 49(89,1) | 06(10,9) | |
Nº completo de ACS | 23 (41,8) | 32 (58,2) | |
Rotatividade do profissional no ano* | |||
Enfermeiro | 04 (7,3) | 51 (92,7) | |
Médico | 26 (47,3) | 29 (52,7) | |
Técnicos ou auxiliares de enfermagem** | 58(56,9) | 44 (43,1) | |
ACS | 04 (7,3) | 51 (92,7) | |
Especialização em Saúde da Família ou Saúde Coletiva | |||
Enfermeiro | 39 (70,9) | 16(29,1)**** | |
Médico*** | 16(29,1) | 27 (49,1)***** | |
Capacitação técnica****** | |||
Enfermeiro | 54(98,2) | 01(1,8) | |
Médico*** | 15(27,3) | 28(50,9) | |
Técnicos ou auxiliares de enfermagem** | 31 (30,4) | 71 (69,6) | |
Percepção do enfermeiro sobre seu preparo para o cuidado pós-parto | |||
Avaliação física da puérpera | 53 (96,4) | 02 (3,6) | |
Avaliação do estado nutricbnal | 55 (100) | - | |
Avaliação do risco e vulnerabilidades | 51 (92,7) | 04 (7,3) | |
Avaliação de aspectos emocionais | 52 (94,5) | 03 (5,5) | |
Abordagem do pai e família | 54 (98,2) | 01 (1,8) | |
Ações de promoção da saúde | 54 (98,2) | 01 (1,8) | |
Avaliação do recém-nascido | 54 (98,2) | 01 (1,8) | |
Educação em saúde reprodutiva | 55 (100) | - | |
Interação e acolhimento | 55 (100) | - | |
Percepção do auxiliar ou técnico de enfermagem sobre seu preparo para o cuidado pós-parto** | |||
Verificação de peso e altura | 102 (100) | - | |
Verificação da pressão arterial | 102 (100) | - | |
Imunização | 99 (97,1) | 03 (2,9) | |
Ações de educação em saúde | 94 (92,2) | 08 (7,8) | |
Interação e acolhimento | 98(96,1) | 04 (3,9) |
* Dados relativos a 2010.
** n=l02.
*** n=43.
**** Dos 16 enfermeiros, 9 possuem outra especialização, além da Saúde da Família ou Saúde Coletiva.
***** Dos 27 médicos, 8 possuem outra especialização, além da Saúde da Família ou Saúde Coletiva.
****** Na área de saúde reprodutiva nos anos 2009 e 2010, de no mínimo 16 horas
Ações à puérpera e família | Sim/Sempre | Nem sempre | Não |
n(%) | n(%) | n(%) | |
Visita domiciliar na 1ª semana pós-parto pelo ACS | 54 (98,2) | 01 (1,8) | - |
Visita domiciliar na 1ª semana pós-parto pelo enfermeiro | 49 (89,1) | 04 (7,3) | 02 (3,6) |
Consulta de enfermagem na unidade de 7 a 10 dias pós-parto | 27 (49,1) | 12(21,8) | 16(29,1) |
Consulta médica na unidade até 42 dias após o parto | 48 (87,3) | 06(10,9) | 01 (1,8) |
Ação educativa individual | 53 (96,4) | 02 (3,6) | - |
Ação educativa grupal | 13 (23,6) | 11 (20,0) | 31 (56,4) |
Cuidados específicos dirigidos ao pai e família | 34 (61,8) | 16(29,1) | 05 (9,1) |
Cuidados dirigidos à amamentação | 53 (96,4) | - | 02 (3,6) |
Busca de faltosas | 50 (90,9) | 04 (7,3) | 01 (1,8) |
Acesso e Gestão* | Sim | Não |
n(%) | n(%) | |
Agendamento prévio da consulta pós-parto | 27 (49,1) | 28 (50,9) |
Continuidade do acompanhamento pela USF de puérperas de maior risco, referidas a outros serviços | 51 (92,7) | 04 (7,3) |
Dificuldade no referenciamento de puérperas | 04 (7,3) | 51 (92,7 |
Adoção de protocolo clínico de atenção pós-parto** | 46 (83,6) | 09 (16,4) |
Avaliação e planejamento local sistemático da atenção pós-parto, pela equipe | 37 (67,3) | 18(32,7) |
Uso sistemático de dados dos sistemas de informação | 30 (54,5) | 25 (45,5) |
Referência em metas a serem alcançadas em relação à assistência pós-parto | 51 (92,7) | 04 (7,3) |
O estudo respeitou os preceitos éticos em pesquisa com seres humanos e foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário Júlio Muller (HUJM), parecer nº 883/CEP-HUJM/2010.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Em relação à estrutura física, observou-se que a maioria unidades da ESF de Cuiabá possui sala de pré-consulta, consultório médico e consultório de enfermagem com espaço específico e de uso exclusivo de uma única unidade, havendo pelo menos um consultório com banheiro na maioria das unidades. Entretanto, é relevante o número das unidades que possuem áreas adaptadas às atividades de pré-consulta, e das unidades que não possuem áreas para educação em saúde grupal.
A grande maioria das unidades da ESF tem estetoscópio, esfigmomanômetro, foco auxiliar ginecológico, balança adulto, mesa ginecológica, mesa de exame e escada de dois degraus junto à mesa de exame e ginecológica, em condições de uso. Rotineiramente há sulfato ferroso, vacinas dT adulto e hepatite B, o cartão da gestante e puérpera, e a ficha de registro de atendimentos no SISPRENATAL. Porém, há uma limitação importante em relação à disponibilidade contínua de materiais de consumo para realização do preventivo de câncer de colo uterino, de anticoncepcional oral de uso no pós-parto e da ficha específica de atendimento pré-natal/pós-parto criada pela equipe ou pela SMS.
A condição imprópria de infraestrutura física associa-se ao fato de que grande parte das unidades da ESF do município foi alocada em imóveis que não foram construídos com esse fim. Isso é favorecido pelo fato de os critérios nacionais de implantação das equipes de SF não incluírem a exigência de estrutura física adequada a parâmetros estabelecidos.
A pré-consulta de enfermagem constitui, na ESF de Cuiabá, o primeiro momento assistencial do usuário no serviço. Por meio dessa prática, além da produção prévia de algumas informações clínicas preconizadas para a consulta pós-parto, e da apreciação de situações que requerem acesso imediato, o atendimento deve acolher a puérpera e sua família e buscar ampliar o seu acesso às ações do serviço. Para isso, é essencial a existência de um espaço exclusivo no qual os usuários sejam atendidos com privacidade e com a disponibilidade de tempo a essa abordagem.
A educação grupal em saúde figura entre ações priorizadas na política nacional de saúde reprodutiva.4-7 Ela é vista como imprescindível à promoção da saúde voltada à emancipação dos envolvidos na reprodução, sendo um espaço de troca de experiências e saberes entre si e com os profissionais de saúde13. Para sua realização, dentre outras coisas, é importante a existência de espaço e recursos apropriados. A falta deles não a inviabiliza, mas dificulta o uso de uma abordagem educativa participativa e dialógica e a sua sistematicidade, aspectos esses coerentes com a assistência ao pós-parto em uma perspectiva de integralidade e humanização.
É positivo o fato de a grande maioria das unidades da ESF de Cuiabá dispor de materiais permanentes, medicamentos e insumos recomendados para a assistência ao pós-parto. Mas é um problema importante a falta de regularidade na disponibilidade de materiais de consumo necessários para a realização do preventivo de câncer de colo uterino, cuidado este altamente recomendado na assistência pós-parto à mulher.3,5 De igual modo, a oferta irregular de anticoncepcional de uso no pós-parto compromete o adequado suporte ao planejamento gestacional e ao recomendado intervalo interpartos.5
Um estudo9 que aborda como enfermeiros de unidades tradicionais de saúde de Cuiabá percebem a infraestrutura local e sua influência em suas práticas aponta que a inadequação da estrutura física e material acarreta redução do acesso do usuário ao serviço e da resolutividade das ações; desumanização e descontinuidade da assistência; e inviabilização da oferta de certas ações, como as educativas. Essa característica ainda compromete a autonomia profissional, gera insatisfações no trabalhador e conflitos com usuários. Além disso, dificulta o planejamento e o alcance de metas assistenciais.
Um ponto consensual com outros estudos14,15 é a afirmação de que fragilidades de infraestrutura e de organização dos serviços de saúde, em qualquer de seus aspectos, propiciam desumanização da atenção, repercutem negativamente no processo de trabalho, e comprometem a qualidade da assistência e o alcance de seus objetivos.
De acordo com a política nacional de saúde10, é da responsabilidade da gestão municipal atender exigências locais de organização da rede de atenção básica à saúde, o que inclui a disponibilidade de recursos de infraestrutura necessários à efetivação da atenção à saúde reprodutiva3,7 e, especificamente, ao pós-parto.
Em relação à pessoal, identificou-se que há elevado índice de disponibilidade e permanência do enfermeiro nas unidades da ESF e a maioria é especialista em saúde da família ou saúde coletiva. Quanto ao médico, há uma importante rotatividade e interrupção em sua disponibilidade nas unidades, além de baixo índice de especialização em saúde da família ou saúde coletiva e de participação em capacitação em saúde reprodutiva. São também expressivas a existência de quadros incompletos de ACS nas equipes das USF, a rotatividade e a não especialização em saúde da família ou saúde coletiva de auxiliares e/ou técnicos de enfermagem.
No município estudado, os trabalhadores locais de saúde convivem com certa precariedade do vínculo empregatício, com baixos salários, descontinuidade da gestão central e com limitada valorização da atenção básica, expressa, dentre outras coisas, na falta de uma política de investimento no desenvolvimento de recursos humanos.
Para a atenção pós-parto, tal como prevê a política de saúde reprodutiva4,6,7, todos os trabalhadores precisam ter acesso à capacitação sistemática, tendo em vista atender com qualidade e especificidade as necessidades de saúde da mulher, do pai e família, ainda mais considerando as novas mudanças projetadas para a ESF.10
Condições salariais e de trabalho inapropriadas, somadas a aspectos de realização profissional do médico, são fatores que têm desestimulado a permanência desse trabalhador na ESF, gerando grande rotatividade, dificuldades à criação do vínculo com a população, e descontinuidade das ações assistenciais.16
A falta do número mínimo de ACS e a rotatividade de auxiliares e/ou técnicos de enfermagem nas equipes também comprometem a continuidade das ações e o estabelecimento de vínculo entre usuários e unidades locais. Pela falta de vínculo efetivo, as pessoas deixam de fazer acompanhamento regular17 e perpetuam-se os atendimentos eventuais.
Na ESF, todos os membros da equipe são importantes à assistência apropriada ao período reprodutivo, sendo a equipe interdisciplinar um dos eixos do novo modelo.10 Sua relevância é ressaltada para a integralidade do cuidado à saúde, uma vez que esta é propiciada pela articulação de olhares e práticas dos vários profissionais das equipes. Deficiências nesse quesito são consideradas empecilhos à atenção humanizada à reprodução.18
No que se refere à assistência à mulher, homem e família no pós-parto, encontrou-se na pesquisa que, de maneira geral, as unidades da ESF disponibilizam as ações recomendadas nas políticas nacionais.
Há referência à oferta rotineira da visita domiciliar na 1ª semana pós-parto, pelo ACS e/ou enfermeiro, de cuidados à amamentação e de busca de puérperas faltosas. Entretanto, existe importante percentual de não realização da ação educativa grupal tendo em vista o pós-parto, das ações específicas ao pai e à família e de consultas de enfermagem nas unidades. As consultas médicas pós-parto também não são práticas sistemáticas em todas as unidades.
A educação em saúde é uma ação estratégica à inovação da assistência na ESF, configurando-se como uma importante tecnologia de promoção da participação ativa das mulheres, pais e famílias no cuidado pós-parto, e de promoção de sua saúde. Ela também é uma ação essencial para o direcionamento das ações de acordo com a realidade de vida e a subjetividade dos envolvidos.13
É importante que a consulta de enfermagem no pós-parto seja feita de forma sistemática. Ela não só possibilita o seguimento clínico-educativo da mulher e do recém-nascido, como também propicia o acolhimento que favorece a vinculação da mulher, do pai e família ao serviço e a abordagem de suas necessidades.
Em relação à organização do acesso, encontrou-se um percentual reduzido de unidades da ESF realizando o agendamento prévio da consulta pós-parto; mas a grande maioria faz o seguimento das puérperas de risco em acompanhamento em serviços de referência e diz não apresentar dificuldade no seu referenciamento a outros serviços.
No que diz respeito à gestão do cuidado pós-parto, verificou-se que grande parte das unidades da ESF adota protocolo clínico de cuidado pós-parto e as equipes avaliam e planejam localmente a atenção nessa fase. Mas há um baixo percentual de unidades que, para isso, utilizam dados de sistemas de informação.
Para garantir o início precoce do pré-natal é importante o agendamento da primeira consulta logo após a confirmação da gravidez. Ao término, o agendamento da consulta pós-parto também é imprescindível, para a continuidade das ações iniciadas no pré-natal e para a garantia da continuidade da assistência, sobretudo, à mulher.3,5,7
A política de saúde reprodutiva3-5,7 valoriza a garantia do referenciamento, baseado na formalização de sistemas de referência, e a continuidade do acompanhamento pela unidade de ESF de mulheres de maior risco referidas a outros serviços, tendo em vista propiciar a continuidade e longitudinalidade das ações, o vínculo e a resolutividade dos problemas.
O vínculo, a continuidade e longitudinalidade devem contribuir de forma interdependente para a redução de barreiras ao acesso, à própria ESF e a outros serviços, para ações diagnósticas e de cura em saúde reprodutiva necessárias. A ESF tem a função de organizar fluxos e contrafluxos de seus usuários na rede, devendo responsabilizar-se por sua saúde em quaisquer espaços de atenção à saúde, tanto ordenando quanto acompanhando seu trânsito na rede.17,18
O planejamento, como prática de gestão, dever contribuir para organizar ações de saúde de forma próxima das necessidades locais, especialmente se apoiado em informação específica e na avaliação da assistência. Isso se aplica à atenção à saúde reprodutiva18 e, portanto, à atenção pós-parto.
A produção e o uso da informação nessa área é um instrumento essencial de planejamento, avaliação e gestão dos serviços de saúde, pois permite o conhecimento do perfil epidemiológico local, o reconhecimento específico de necessidades e a avaliação da qualidade do que se realiza, propiciando a tomada de decisão apropriada18. A avaliação possibilita aos gestores e trabalhadores monitorar o andamento das ações em saúde reprodutiva, seu impacto, e redefinir ações necessárias.3,4,7,10
A infraestrutura adequada constitui-se em um aspecto positivo à implementação de ações previstas para a assistência à mulher, ao homem, ao recém-nascido e à família no momento específico do pós-parto. Ao contrário, as fragilidades da estrutura organizacional dessas unidades, referentes à pessoal, organização do acesso e gestão, configuram limitações à efetivação das políticas de atenção local à saúde no pós-parto.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo permitiu concluir que a maioria das unidades da ESF em Cuiabá apresenta condições adequadas de infraestrutura e a oferta rotineira de ações de assistência pós-parto, embora também apresente condições inadequadas de disponibilidade e qualificação de pessoal. O agendamento da consulta pós-parto não é rotineiro, e dados do sistema de informação não são habitualmente usados no planejamento dessa atenção.
Localiza-se um contraponto entre a fragilidade encontrada em aspectos de organização do acesso e gestão da assistência pós-parto e a implementação das ações assistenciais, identificada na maioria das unidades da ESF do município, sugerindo certa desarticulação entre gestão e assistência. A aproximação desses dois aspectos é essencial para que as ações possam ser desenvolvidas conforme as necessidades de saúde vivenciadas pela mulher, recém-nascido, pai e família no pós-parto.
Em função de o estudo focalizar quesitos gerais recomendados para a assistência pós-parto, sugere-se a realização de pesquisas que detalhem aspectos da estrutura organizacional da assistência pós-parto na ESF e investiguem fatores relacionados aos problemas encontrados.
Esforços técnico-políticos devem ser feitos para melhorar a qualidade da estrutura organizacional da atenção pós-parto, especialmente considerando a implementação de ações assistenciais recomendadas na política e sua vinculação a práticas gerenciais que as instrumentalizem.
REFERÊNCIAS