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ISSN (impressa): 1414-8145
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Ministério da Educação
CAPES

Volume 17, Número 3, Jul/Set - 2013

PESQUISA

O recém-nascido com dor: atuação da equipe de enfermagem

Edilaine Assunção Caetano 1
Natália Romana Ferreira Lemos 2
Samara Macedo Cordeiro 3
Fernanda Maria Vieira Pereira 4
Denis da Silva Moreira 5
Soraia Matilde Marques Buchhorn 6


1 Mestre em Ciências pelo Programa de Pós-graduação Enfermagem em Saúde Pública. Departamento de Enfermagem Materno-infantil e Saúde Pública. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto/ Universidade de São Paulo (EERP/USP). Ribeirão Preto - SP. Brasil. Email: dipatinga@hotmail.com;
2 Enfermeira. Mestranda em Ciências da Saúde pelo Programa de Pós-graduação em Enfermagem da Escola Paulista de Enfermagem (EPE). Departamento de Enfermagem Pediátrica. Universidade Federal de São Paulo/SP (UNIFESP/SP). São Paulo - SP. Brasil. Email: nataliarflemos@gmail.com;
3 Enfermeira. Mestranda em Enfermagem pelo Programa de Pós-graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG). Alfenas - MG Brasil. Email: samaramacedocordeiro@yahoo.com.br;
4 Doutoranda em Ciências pelo Programa de Pós-graduação em Enfermagem Fundamental. Departamento de Enfermagem Geral e Especializada. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto/Universidade de São Paulo (EERP/USP). Ribeirão Preto - SP Brasil. Email: fernanddamaria@hotmail.com;
5 Enfermeiro. Doutor em Enfermagem pelo Programa de Pós-graduação em Enfermagem em Saúde Pública. Escola de Enfermagem de Ribeirão Preto/Universidade de São Paulo (EERP/USP). Professor Adjunto da Escola de Enfermagem. Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG). Alfenas - MG
6 Enfermeira. Doutoranda em Ciências pelo Programa de Pós-graduação em Enfermagem. Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo (EE/USP).Professora Assistente da Escola de Enfermagem. Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG). Alfenas - MG. Brasil. Email: soraiamm@terra.com.br.

Recebido em 15/07/2011
Reapresentado em 11/01/2012
Aceito em 06/03/2012

RESUMO

Estudo quantitativo, descritivo e transversal realizado com profissionais de enfermagem que atuam em neonatologia nos três hospitais de Alfenas-MG. Objetivou descrever as formas de avaliação de dor do recém-nascido utilizadas pela equipe de enfermagem e analisar a prática da enfermagem quanto ao manejo da dor do neonato. A coleta de dados foi feita por meio de formulário semiestruturado, de agosto a setembro de 2008, com 42 profissionais. A análise foi feita pelo software SPSS utilizando estatística descritiva e teste de correlação. Os entrevistados acreditam que o recém-nascido é capaz de sentir dor e a avaliam por meio de alterações fisiológicas e comportamentais, e que não há utilização de escalas de avaliação álgica padronizadas nas instituições. Para o manejo, realizam intervenções farmacológicas e não farmacológicas. Há necessidade de capacitar os profissionais, contribuindo para a avaliação e o manejo da dor, e promovendo o cuidado integral ao neonato.


Palavras-chave: Recém-nascido; Dor; Enfermagem; Neonatologia

INTRODUÇÃO

O fato de os neonatos não verbalizarem a dor que sentem agravava a crença que se tinha, até meados dos anos de 1970, de que o recém-nascido (RN) era incapaz de sentir dor, em virtude da imaturidade neurológica, das vias nervosas não totalmente mielinizadas ou da ausência de função cortical suficientemente integrada para interpretar ou recordar as experiências dolorosas. Entretanto, estudos recentes mostram que a mielinização incompleta é compensada pelo distanciamento interneuronal menor, que aumenta a velocidade média de condução nervosa, e que o RN apresenta todos os componentes anatômicos, funcionais e neuroquímicos necessários para a recepção e para a transmissão do estímulo doloroso.1

Porém, mesmo nos dias atuais, encontramos profissionais que ainda duvidam da capacidade do RN de sentir dor, ou avaliam o fenômeno álgico de forma empírica, o que reflete no cuidado prestado aos neonatos. 2 Nesse sentido, acredita-se que essa divergência entre o conhecimento científico e a conduta na prática clínica se deve, provavelmente, à dificuldade de avaliação e de mensuração da dor de recém-nascidos. Esse fato aponta para a necessidade de investimentos em novos estudos sobre o tema, bem como do incremento de rotinas/protocolos para avaliar e manejar a dor nessa população.

Ao lidar com pacientes pré-verbais, em diferentes fases de desenvolvimento cognitivo, e que expressam de forma similar as suas reações aos mais variados estímulos, pode-se deparar com dificuldades na avaliação das respostas à dor, o que pode impedir um cuidado adequado e eficiente, tendo em vista que o estímulo doloroso pode ter repercussões orgânicas e emocionais, afetando a qualidade de vida futura desses pacientes.(1)

A enfermagem desempenha papel fundamental no controle da dor e na minimização do sofrimento do RN, visto que permanece junto ao doente grande parte do tempo de internação, além de ser diretamente responsável por procedimentos invasivos e, consequentemente, dolorosos, tão presentes em ambientes de unidades de cuidados neonatais. 2

Dessa forma, compreende-se que uma assistência de qualidade e humanizada e o tratamento adequado às necessidades do neonato dependem, em grande parte, da sensibilização da equipe de enfermagem, que deve se valer de estratégias para o cuidado integral ao RN sujeito potencialmente a sofrer dor.

Alguns estudos mostraram que, em uma unidade de terapia intensiva neonatal, um recém-nascido pode ser submetido durante os cuidados diários a cerca de uma centena de procedimentos potencialmente dolorosos. 2,3 Assim, a compreensão do processo álgico e a atenção para a manifestação da dor do RN devem fazer parte do cotidiano dos cuidados executados pela equipe de enfermagem, pois tal atitude minimizará os efeitos nocivos da dor sobre o desenvolvimento do neonato.

As estratégias de cuidado para identificar a dor neonatal consistem em parâmetros fisiológicos e comportamentais. As respostas comportamentais a serem avaliadas são: choro, mímica facial, movimentação corporal, agitação, irritabilidade e alterações do sono. 1,2

As respostas fisiológicas dos RNs são evidenciadas por alterações cardiorrespiratórias (aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial e diminuição da saturação de oxigênio); sudorese palmar; aumento da pressão intracraniana por alterações hormonais (liberação de catecolaminas, cortisol, glucagon, glicemia, dentre outros) e metabólicas (aumento do lactato, piruvato, corpos cetônicos e alguns ácidos graxos). Essas medidas, embora objetivas, não são especificamente relacionadas à dor, pois podem ocorrer alterações similares após um estímulo nociceptivo ou depois de um estímulo desagradável, mas não doloroso. 1

Dessa forma, os parâmetros fisiológicos são úteis para avaliar a dor na prática clínica, mas não podem ser usados de forma isolada. Assim, a avaliação comportamental do neonato diante de um procedimento, fundamentada na modificação de determinadas expressões, tais como a resposta motora, a mímica facial e o choro, é preponderante para constatar processos álgicos. 2

Atribui-se importância crescente a essas medidas comportamentais, uma vez que elas parecem representar uma resposta mais específica às manifestações dolorosas do RN. Entretanto, a falta de objetividade e um olhar mais preciso por parte do cuidador podem dificultar a mensuração das respostas comportamentais, por isso elas devem ser avaliadas em conjunto com as respostas fisiológicas. 4

Assim, aliados a essas observações, têm sido elaborados instrumentos de avaliação do fenômeno álgico no intuito de se decodificar a linguagem da dor nos neonatos. 3 Esses instrumentos - as escalas - contribuem para uma comunicação mais efetiva entre o RN e a equipe de enfermagem, possibilitando o reconhecimento, a quantificação e o manejo da dor.

As escalas mais utilizadas na atualidade são: o Sistema de Codificação da Atividade Facial Neonatal (NFCS, Neonatal Facial Coding System), que avalia a dor por observação da expressão facial com oito parâmetros quantificados como zero ou um, e o escore máximo de oito pontos; considera a presença de dor quando três ou mais movimentos faciais aparecem de maneira consistente durante a avaliação. É também bastante adotada a Escala de Avaliação da Dor Neonatal (NIPS, Neonatal Infant Pain Scale). Ela é composta por sete parâmetros comportamentais e fisiológicos, com pontuação zero ou um, e o escore total pode variar de 0 a 7, em escala crescente de dor. 3

A conscientização dos profissionais sobre a capacidade do RN de sentir dor e a correta avaliação por meio de instrumentos adequados afirma a necessidade da adoção de medidas para o manejo do fenômeno álgico. Para a analgesia em neonatos podem ser utilizadas medidas farmacológicas e/ou não farmacológicas. 1,2

As intervenções não farmacológicas são estratégias que objetivam, principalmente, prevenir a intensificação do processo doloroso, a desorganização do neonato, o estresse e a agitação, ou seja, minimizar as repercussões da dor. Elas são eficientes com a maioria dos recém-nascidos quando utilizadas individualmente nas dores de leve intensidade, porém deverão ser acrescidas às intervenções farmacológicas diante da dor moderada ou severa. 2,5

Os métodos farmacológicos, ou seja, fármacos analgésicos que têm por finalidade cessar o fenômeno doloroso, são utilizados, na prática clínica, quando se pretende controlar a dor advinda de procedimentos dolorosos e invasivos que ocasionam dor severa e intensa; a literatura relata os não opioides e os opioides como os mais utilizados. 6

O controle da dor do recém-nascido é imprescindível à qualidade da assistência prestada pela equipe de enfermagem, que deve ter conhecimento suficiente para avaliar e promover o adequado manejo da dor por meio de medidas farmacológicas e não farmacológicas e seu emprego correto de acordo com a condição de cada paciente.

Diante de algumas situações vivenciadas durante a prática acadêmica em serviços de neonatologia, e com o propósito de contribuir na melhoria da assistência de enfermagem prestada ao RN nas unidades neonatais, surgiu o interesse em pesquisar esse tema.

Assim, o presente estudo teve por objetivo descrever as formas de avaliação de dor do recém-nascido utilizadas pela equipe de enfermagem e analisar a prática da enfermagem quanto ao manejo da dor do neonato.

MATERIAL E MÉTODO

A pesquisa apresenta uma abordagem metodológica quantitativa de caráter descritivo, tipo exploratório e transversal. A escolha do método quantitativo se deu devido ao fato de os pesquisadores o considerarem o mais apropriado para atingir os objetivos propostos no estudo, na medida em que puderam quantificar a opinião da população sobre a temática, além de propiciar a descrição da prática do cuidado ao RN hospitalizado desenvolvida pela equipe de enfermagem.

A investigação foi realizada nos três hospitais do município de Alfenas - MG, que é considerada polo de ensino em saúde na região sul do Estado, com serviços que envolvem desde a atenção ao neonato sadio até o atendimento de alta complexidade ao RN patológico.

A coleta de dados foi feita por meio de formulário semiestruturado, tendo como principais variáveis: dados gerais e profissionais dos participantes (dados de identiûcação como: nome, idade, sexo, tempo de formação proûssional, tempo de atuação na área neonatal e local de formação acadêmica); crença sobre dor no recém-nascido; parâmetros de avaliação do fenômeno álgico - uso de escalas; emprego de métodos farmacológicos e não farmacológicos para o alívio da dor em neonatos. O instrumento foi elaborado e aplicado, pelos próprios pesquisadores, aos profissionais da equipe de enfermagem que trabalhavam na área de neonatologia, no período de agosto a setembro de 2008, após aprovação das respectivas administrações dos hospitais e autorização do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de Alfenas (UNIFAL-MG) - Protocolo n° 23087.001170/2008-60, de acordo com a Resolução do Conselho Nacional de Saúde (CNS) 196/96.

Como critério de inclusão dos participantes da pesquisa, era necessário que eles tivessem tempo de experiência em serviços de neonatologia de no mínimo 6 meses atuando no cuidado direto ao RN, o que garantiu total envolvimento com as rotinas do cuidado ao neonato hospitalizado e como critério de exclusão profissionais que exerciam atividade exclusivamente administrativa.

Todos os profissionais do município que atenderam a esses critérios foram convidados a participar do estudo, totalizando 47 profissionais; cinco não aceitaram participar.

Assim, a população do estudo foi composta por 42 profissionais da equipe de enfermagem. Após os sujeitos serem esclarecidos sobre os objetivos, a justificativa e sobre a metodologia da pesquisa, foi entregue o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, que foi assinado por todos.

Por ser um único instrumento para três categorias profissionais distintas e de escolaridades diferentes, foi realizado um teste-piloto com profissionais das três categorias a fim de observar a adequação quanto à forma, ao conteúdo e à interpretação das perguntas pelos entrevistados, sendo eles excluídos do estudo.

Após a coleta dos dados foi estruturado um banco de dados na planilha do excel (Windows 2007). A dupla digitação e a validação dos dados foram realizadas para a identificação de possíveis erros.

A análise estatística foi feita por meio do software Statistical Package for the Social Science (SPSS), versão 15.0, utilizando estatística descritiva e teste de correlação.

RESULTADOS

Quanto ao perfil da população estudada, à exceção de 1 (2,4%) enfermeiro, todas as demais informantes foram do sexo feminino, 41 (97,6%). Com relação a categoria profissional, os enfermeiros totalizaram 14 (33,3%), os técnicos de enfermagem, 18 (42,9%) e os auxiliares de enfermagem, 10 (23,8%).

Quanto aos setores hospitalares em que estavam alocados, 10 (23,8%) atuavam em berçário; 12 (28,6%), berçário e Unidade de Tratamento Intensivo Neonatal (UTIN); 16 (38,10%), em UTIN e Unidade de Cuidados Intermediários Neonatal (UCIN); e 4 (9,5%), em pediatria. Ressalta-se que os RNs doentes em uma das instituições pesquisadas são internados no setor da pediatria.

Para a idade, 1 (2,4%) profissional enquadrou-se na faixa etária de 20 e 25 anos; 11 profissionais (26,2%), de 25 e 30 anos; 3 (7,1%), de 30 e 35 anos; 9 (21,4%), de 35 e 40 anos; 7 (16,6%), de 40 e 45 anos; e 11 (26,2%), 45 anos ou mais.

Para o tempo de formação, 19 (45,2%) dos profissionais responderam ter sido há menos de 5 anos; 11 (26,2%), de 5 a 10 anos; 5 (11,9%), de 10 a 15 anos; 3 (7,1%), de 15 a 20 anos; e 4 (9,5%), 20 anos ou mais de formação.

Com relação ao tempo de atuação em neonatologia, 3 (7,1%) dos profissionais responderam atuar de 6 meses a 1 ano; 20 (47,6%), de 1 a 5 anos; 8 (19,0%), de 5 a 10 anos; 4 (9,5%), de 10 a 15 anos; 2 (4,8%), de 15 a 20 anos; e 5 (11,9%), de 20 anos ou mais de atuação. Os profissionais enfermeiros com formação específica em neonatologia somaram 2 (4,8%).

Inicialmente, os participantes foram questionados se, para eles, os RNs são capazes de sentir dor, e 42 (100%) responderam que sim.

No momento de avaliar a dor, apenas 1 (4,2%) informou que fazia essa suposição utilizando escalas próprias de avaliação; 11 (26,0%), pela mímica facial; 15 (35,0%), por meio do choro; 11 (26,0%), observando a movimentação corporal; 4 (9,0%), avaliando parâmetros fisiológicos.

Os entrevistados mencionaram a quais métodos não farmacológicos recorrem para o manejo da dor do RN: terapia do toque, 15 (35,7%); ninho, 12 (28,6%); sucção não nutritiva, 6 (14,3%); soluções glicosadas, 2 (4,8%); musicoterapia, 4 (9,5%); massagens, 3 (7,1%); nenhum deles relatou utilizar a glicose pura administrada via oral, uma opção que constava do instrumento de coleta de dados.

Dentre os fármacos utilizados na fase neonatal, as respostas apontaram que os mais prescritos no serviço foram os analgésicos, 31 (72,6%); opioides, 8 (19,6%); e os benzodiazepínicos, 3 (7,8%).

Na análise de Pearson, para o item ter formação específica em neonatologia, obteve-se correlação positiva (r=0,308; p=0,47) com o método de avaliação da dor por meio de escalas.

DISCUSSÃO

Houve predomínio do sexo feminino, 41 (97,6%) dos profissionais. Este resultado corrobora outros estudos realizados com profissionais de enfermagem, uma vez que as mulheres constituem a maioria nesta categoria profissional. 7

Os técnicos de enfermagem compreenderam a maior parte dos profissionais (42,9%). Com isso, verifica-se a importância de orientação dos enfermeiros acerca da assistência de enfermagem prestada, uma vez que os profissionais de nível médio são os principais responsáveis no cuidado direto ao neonato. 8

O tempo de atuação profissional prevalente correspondeu a igual ou inferior a cinco anos. Em geral, o tempo de atuação específica na neonatologia é recente na maioria das instituições de saúde do interior do Brasil, pois se trata de uma especialidade até então restrita aos grandes centros urbanos, mas, nos últimos anos, com a proposta de descentralização da saúde, com o investimento governamental em estrutura física, em recursos tecnológicos e o fortalecimento dos hospitais, tem ganhado espaço nas instituições hospitalares do interior. 9

Todos os 42 profissionais (100%) responderam que acreditam que o RN sente dor; tal resultado também foi encontrado em outros estudos 1,2, o que indica uma mudança de paradigma, pois até a década de 1970, o conceito prevalente entre profissionais da área de saúde era de que o neonato não sentia dor. A provável explicação para essa mudança de pensamento vem sendo atribuída às pesquisas publicadas acerca do assunto, o que possibilita um melhor conhecimento por parte dos profissionais de saúde a respeito da presença da dor no período neonatal.

Quanto ao uso de escalas que orientem a detecção e graduem a intensidade da dor, somente 1 (4,2%) profissional respondeu utilizá-la e referenciou a Escala NIPS. Destaca-se esse achado, uma vez que as escalas para avaliar a dor no recém-nascido estão disponíveis desde o final da década de 1980 e vêm sendo amplamente referidas e recomendadas na literatura; porém, como se observa nesta pesquisa, o seu uso ainda é restrito nestas instituições, fato que pode ter contribuído para a não utilização das escalas pelo profissionais entrevistados, uma vez que não há uma política institucional de estímulo para o seu uso e também não é contemplado em protocolos assistenciais. Esses dados são igualmente encontrados pelos autores do estudo 9 que investigaram a avaliação da dor em RN prematuro em UTIN de um hospital público de uma cidade do interior da Bahia.

Assim, ressalta-se a necessidade de implantação do uso padronizado de escalas que possibilitem uma avaliação apropriada da dor no RN, uma vez que a introdução de instrumento para avaliação de dor neonatal reflete a preocupação em se elaborar um controle sistematizado e efetivo desse fenômeno.

Somente 2 (4,8%) dos profissionais responderam ter pós-graduação em neonatologia. Esta variável apresentou correlação positiva estatisticamente significante (r=0,308; p=0,47) quando comparada com o método de avaliação da dor por meio de escalas, ou seja, a formação específica favorece a identificação da dor em neonatos.

Este dado corrobora os achados de outros estudos e refletem a necessidade de treinamento dos profissionais e a ampla divulgação nas instituições de saúde dos métodos padronizados que auxiliam o prestador de cuidados em sua conduta diante do neonato com dor. 2,9

As escalas de dor têm sido elaboradas nos últimos anos com o intuito de atenuar a subjetividade das medidas comportamentais como parâmetros de avaliação de dor e facilitar o seu uso clínico. Essas escalas atribuem pontos a determinados parâmetros comportamentais, descritos da maneira mais objetiva possível, resultando em uma pontuação final que pode ajudar a equipe que assiste o paciente a decidir se há necessidade de intervenção analgésica. 3

Dos profissionais, 37 (88,0%) baseiam-se em alterações comportamentais dos RNs para avaliar a presença da dor. Esse fato é preocupante, pois nem sempre um evento estressante é necessariamente doloroso.

Assim, os principais parâmetros comportamentais citados foram choro (35,0%), mímica facial (26,0%) e movimentação corporal (26,0%). Esse achado corrobora os de autores que demonstraram em seus estudos o grande valor atribuído ao choro no momento da avaliação da dor do paciente pré-verbal. 10

Contudo, na prática, a utilização do choro é questionável, tendo em vista que, quando isolado, não fornece informações suficientes, podendo indicar fome e/ou desconforto, além do que neonatos farmacologicamente comprometidos e entubados são incapazes de vocalizar o choro. 4

Pesquisadores 10,11 têm realizado estudos para verificar as características do choro e suas relações com a dor. Sabe-se que o choro do neonato, de maneira geral, apresenta uma fase expiratória definida, seguida por uma breve inspiração, um período de descanso e, de novo, uma fase expiratória. Além disso, tem um padrão melódico e frequência de 80 db (decibéis).

Assim, apesar de o choro ter sido relatado pela maioria dos entrevistados no momento em que avaliam a dor do RN, é importante que os profissionais sejam devidamente treinados para avaliá-lo com acurácia quando reflete dor do neonato.

Portanto, o choro, como medida de avaliação da dor, parece ser um instrumento útil, quando analisado no contexto do que está ocorrendo com a criança e associado a outras medidas de avaliação de dor. Desse modo, ele não fornece isoladamente informações para a decisão terapêutica a respeito da necessidade de analgesia na prática clínica.

A mímica facial é um método não invasivo de avaliação de dor, sensível e útil na clínica diária e também específico para a avaliar a dor em RNs prematuros e a termo. 2

Entretanto, as alterações da mímica facial não trazem informações a respeito da qualidade ou da intensidade do fenômeno doloroso. É difícil, portanto, a utilização apenas da movimentação da face na tomada de decisões terapêuticas. Além disso, sabe-se que podem ocorrer alterações da mímica facial em resposta aos estímulos dolorosos agudos, mas não se sabe o que acontece diante de um estímulo prolongado ou repetitivo. 1,12

A análise isolada da movimentação corporal, citada pelos profissionais (26,0%), torna-se um método sensível de avaliação da dor, pois os neonatos demonstram um repertório organizado de movimentos após a estimulação sensorial. No entanto, quando a atividade motora é analisada em conjunto com outras variáveis fisiológicas e comportamentais, a avaliação da dor torna-se mais segura e permite a discriminação entre a dor e outros estímulos não dolorosos. Além disso, parece haver uma variação individual de cada recém-nascido na amplitude da resposta motora. 1

Em menor proporção, do total de profissionais, 9,0% referiram se basear em parâmetros fisiológicos para avaliação da dor do RN. Na avaliação fisiológica, verifica-se frequência cardíaca, pressão arterial sistêmica, frequência respiratória, aumento da temperatura corpórea, queda na saturação de oxigênio, entre outros. 13

Porém, as variações nos parâmetros fisiológicos somente podem ser utilizadas para a avaliação da dor do RN quando inseridas no contexto ambiental em que se encontra o neonato e sempre acompanhadas por métodos comportamentais ou multidimensionais, escalas, de avaliação de dor. 14

Várias são as medidas comportamentais (não farmacológicas) que podem ser realizadas com o intuito de prevenir a dor nas unidades neonatais e também para tornar o ambiente mais humanizado para os pacientes e para seus familiares.

A terapia de toque, que correspondeu à maior porcentagem de respostas (35,7%), diretamente ligada a um cuidado humanizado, beneficia o RN em várias dimensões, incluindo o crescimento e o desenvolvimento. Logo, o toque é importante para o desenvolvimento emocional saudável e para a comunicação entre pais e os neonatos porque também promove o vínculo afetivo, fornecendo conforto e segurança. 2

O toque, o aconchego, o ambiente acolhedor devem fazer parte das unidades neonatais, e cabe aos enfermeiros promovê-los, buscando capacitar sua equipe para que, no momento oportuno, possam implementar estratégias não farmacológicas do manejo da dor, a fim de contribuir para o bem-estar do RN. 8

Para os profissionais (28,6%), o ninho foi a medida não farmacológica adotada para o manejo da dor. O ninho (envolver o RN em manta) é retratado na literatura como uma abordagem diversas vezes implementada nas unidades de neonatologia como estratégia de conforto para promover a organização corporal do RN. Estudos demonstram a indicação de contenção do neonato em um ninho improvisado, feito de lençóis que facilitam extremidades em flexão, aproximam as mãos da boca, melhorando o tônus e a postura. 2,15

Assim, essa intervenção não farmacológica de controle de dor auxilia na maturação das funções cerebrais por promover a organização fisiológica e comportamental do RN, diminui a agitação desnecessária e o estresse, evitando o direcionamento de suas reservas energéticas para o choro e irritabilidade, utilizando-as para seu crescimento e desenvolvimento. Em nossa prática acadêmica e profissional, percebeu-se que as crianças a quem se proporciona o ninho são geralmente mais calmas, exigem menos medicação analgésica e apresentam ganho de peso mais rapidamente.

A administração de sucção não nutritiva (14,3%) constitui-se em medida coadjuvante para o tratamento da dor. Esta estratégia não farmacológica diz respeito, nas instituições pesquisadas, à chupeta ou ao dedo enluvado, utilizada pelo profissional de saúde. Apesar de não apresentar propriedades analgésicas intrínsecas, pode diminuir a agitação do neonato e ajudá-lo a se reorganizar. 1,2,6

Por outro lado, a chupeta pode influenciar o desmame precoce. Uma revisão multidisciplinar da literatura, com o intuito de fornecer aos profissionais da saúde subsídios para o uso da chupeta, revelou mais efeitos deletérios do que benéficos no uso dessa medida não farmacológica. Aos pais, deve ser oferecido o direito de escolha, contudo, essa decisão deve ser diretamente assistida por um profissional habilitado, após esclarecimentos dos seus riscos. A estimulação realizada no dedo enluvado pode ser uma alternativa para não provocar a confusão de bicos e contaminação, mas há escassez de estudos que utilizaram essa técnica. Deve-se considerar o risco de rompimento do látex e asfixia do RN. 16

Para RNs, a estimulação da sucção não nutritiva é indicada na transição da alimentação por gavagem para alimentação oral. 16 Portanto, dever ser realizada por profissional capacitado, que promova o acompanhamento, e estimulada de maneira seletiva em populações específicas de neonatos.

Nos últimos anos, vem-se discutindo a utilização da água com açúcar (glicose via oral diluída) como analgésico, pois ela inibe a hiperatividade e modula o desconforto, liberando serotonina durante os movimentos rítmicos de sucção, e o açúcar, pela ação nas papilas gustativas, pode promover analgesia por meio da liberação de opioides endógenos.6,13 Neste estudo, o relato da sua utilização não foi preponderante (4,8%).

A musicoterapia (9,5%) e a realização de massagens (7,1%) foram citadas como estratégias para o manejo da dor. Alguns estudos enfatizam que a estimulação sensorial e a massoterapia constituem medidas efetivas para aliviar a dor em RNs. 2,10,16 Porém, nos casos de neonatos portadores de doenças potencialmente dolorosas e submetidos a procedimentos invasivos, cirúrgicos ou não, a utilização de agentes farmacológicos deve ser considerada. 1,17

Para a terapia farmacológica, os analgésicos totalizaram o maior número de respostas dentre os profissionais (72,6%). Os analgésicos são indicados para dor leve, como adjuvante no tratamento da dor moderada e intensa, ou quando a dor está associada a algum processo inflamatório. 6 Assim, sua utilização não está restrita a UTIN, sendo administrada também em UCIN, onde os profissionais deste estudo estavam alocados.

Corroborando a literatura, os opioides obtiveram uma porcentagem considerável de respostas neste estudo (19,6%). Essas substâncias, derivadas do ópio, são classificadas em naturais ou sintéticas, de acordo com sua natureza química. Quanto à intensidade de sua ação farmacológica, são classificadas em fracos ou fortes, sendo os primeiros indicados para dor moderada e os últimos, para dor intensa ou severa. 6,17

Os opioides apresentam efeitos colaterais em que a depressão respiratória é a complicação mais grave. Também induzem à tolerância, que corresponde ao aumento progressivo das doses para que se consiga o mesmo efeito analgésico, e à dependência física, que ocorre pelo uso continuado do fármaco por período acima de uma semana. Pondera-se que esses fatos também contribuíram para a sua utilização em menor escala que os analgésicos não opioides. 18

Esses efeitos, contudo, podem ser minimizados com ajustes adequados da dose, com diminuição gradativa e criteriosa da dose diária, respeitando as características farmacocinéticas e farmacodinâmicas para o período neonatal. 1

Os benzodiazepínicos, com 7,8% das respostas dos profissionais, são os fármacos indicados para sedação, ansiólise e indução hipnótica. Não apresentam qualquer atividade analgésica e podem, inclusive, exercer efeito antianalgésico. Podem levar ao aparecimento de depressão respiratória, à obstrução de vias aéreas, à hipotensão arterial e à excitação paradoxal, sendo que seus efeitos são potencializados pelos opioides. 6 Sua utilização em UTIN limita-se à promoção de sedação, sendo associado a opioides para promover analgesia, o que justifica sua citação pelos profissionais neste estudo, mesmo não sendo classificados como analgésicos.

O principal pré-requisito para utilização de sedação e analgesia em RNs é a monitorização, sem a qual não devem ser realizadas; este requisito deve desprender especial atenção. Para a indicação da sedação, deve-se levar em consideração: o tipo de procedimento (se doloroso ou não), a duração do procedimento (para escolher o sedativo apropriado) e a condição clínica do paciente.

Embora os enfermeiros não possam prescrever medicações, a não ser mediante protocolos clínicos instituídos, o conhecimento desses princípios essenciais ajuda na implementação adequada das medicações analgésicas prescritas e na discussão, com outros profissionais, das possíveis estratégias para melhor manejo da dor, sem consequências para a saúde dos RNs.

Independentemente do método de alívio da dor utilizado pela equipe multiprofissional, a humanização da assistência deve ser o principal foco das atividades de cuidado, buscando minimizar os traumas causados pelo processo de hospitalização.

Para que a qualidade do cuidado ao RN hospitalizado seja alcançada, faz-se necessário também o preparo da equipe, bem como seu engajamento e sua conscientização da importância de uma correta avaliação das respostas comportamentais e fisiológicas expressas pelos neonatos.

CONCLUSÕES

Concluiu-se que, apesar de acreditar e tomar atitudes diante do RN com dor, a equipe de enfermagem ainda não tem a real consciência da importância do seu papel na assistência ao neonato, e permanece avaliando a dor do RN com base em crenças pessoais, de uma forma empírica, sem tomar conhecimento dos avanços científicos na área.

Neste estudo, observou-se que não há padronização na avaliação e no manejo da dor dos neonatos nas instituições pesquisadas, isto é, o controle da dor ainda é realizado de forma empírica e individual pelos profissionais de enfermagem. Apesar de vários estudos sobre o tema, a prática assistencial ainda necessita de mudanças, e, para tanto, é importante o treinamento formal dos profissionais de enfermagem, em todos os níveis de formação, e a adoção de rotinas e protocolos.

Assim, novos estudos são necessários para agregar conhecimentos sobre o tema e subsidiar a prática no controle efetivo da dor, tão necessário à qualidade e à humanização da assistência de enfermagem.

A equipe de enfermagem desempenha importante papel nesse processo, tendo em vista que passa mais tempo ao lado do paciente. A criação de protocolos e rotinas de atendimento, bem como a adoção de instrumentos validados para a avaliação da dor em RN podem contribuir para a sistematização da assistência de enfermagem e para a melhora da qualidade da prestação de cuidados aos neonatos.

REFERÊNCIAS

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