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Escola Anna Nery Revista de Enfermagem Escola Anna Nery Revista de Enfermagem
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Ministério da Educação
CAPES

Volume 3, Número 2, Mai/Ago - 1999

INTRODUÇÃO

O interesse pela temática surgiu a partir de resultados obtidos em tese de doutoramento e na observação durante a realização de estágios em maternidades das autoras, onde foi observado, num hospital-escola, no setor de consulta de pré-natal, que no cartão da gestante e na história clínica não existe, dentre a relação das doenças, informação específica em relação às anomalias congênitas nos antecedentes familiares e pessoais; esse aspecto estaria incluído no campo como "outros" sem haver, também, espaço para colocar quais são esses "outros".

Constatamos, também, que nesses instrumentos não havia espaço para registrar dados obstétricos relativos às causas, por exemplo, dos abortos espontâneos, de natimortos e dos recém-nascidos que morreram após o parto no hospital ou no lar. No caso especial da anomalia congênita, esses dados são importantíssimos para analisar o risco da gestante não só em relação à sua própria saúde como também à de seu filho com implicações biológicas e sócio -econômicas para a mulher, a família e a sociedade. Observamos também que não há registros de exposição da gestante a agentes teratogênicos como a radiação, drogas, entre outros, bem como o grau de parentesco com o parceiro, já que a "consanguinidade" aumenta a possibilidade de ter um filho com anomalia congênita.

Essa preocupação não só engloba essas informações que não foram valorizadas no atendimento no pré-natal e que consideramos importantes para uma avaliação de risco perinatal mas também porque se estende à não realização de exames que permitem um diagnóstico precoce desses danos, tais como: Ultra-Sonografia (USG), amniocentese, cordocentese, biópsia do vilo-corial, dosagens bioquímicas no sangue e ecocardiograma.

Estudos, como os de SANTOS (1995) constataram que esses exames não são realizados rotineiramente, mesmo nos casos específicos em que há indicação, seja nas maternidades federais, estaduais e municipais, por serem sofisticados, caros e exigirem profissionais preparados, assim como requerem recursos materiais compatíveis, de que normalmente não se dispõe nos serviços de saúde da rede pública em geral e, na maioria deles, na rede privada em particular.

Salienta-se que os dados identificados como ausentes no cartão da gestante bem como a não realização dos exames pode postergar o diagnóstico precoce de alguma anomalia, colocando em risco a vida do recém-nascido ou atrasando o início de uma intervenção terapêutica.

Estudo realizado por SANTOS (op.cit.) com "mães de crianças especiais" evidenciou falhas no atendimento à mulher - mãe no pré-natal, no parto , e na assistência ao recém-nascido. A autora questiona e discute o papel (compromisso ético e social) dos profissionais em relação aos encaminhamentos oportunos aos especialistas e aos serviços para melhor atender as especificidades dos problemas ou anormalidades diagnosticadas na assistência à mulher e à criança brasileira.

Constatou, também, a falta de orientação às mães ao receberem alta da maternidade quanto aos prováveis problemas que a criança poderia vir a apresentar fora do hospital, e que não são esclarecidas quanto ao diagnóstico, mesmo nos casos em que o bebê necessitava de encaminhamentos para serviços de intervenção especializados, de atendimento precoce, acompanhamento e aconselhamento genético e até planejamento familiar.

Cabe enfatizar que a situação observada, no Brasil, em um Hospital-Escola, como já referido, no que diz respeito às deficiências de registro, no cartão da gestante e da não realização de exames específico e ainda a problemática no atendimento vivenciadas pelas mães "especiais" nas maternidades, são semelhantes às situações constatadas também no Peru. Deste modo, apresentamos como objetivo do estudo analisar a percepção de mães de crianças com anomalias congênitas da assistência de saúde recebida no pré-natal e no pós-parto.

 

METODOLOGIA

Para facilitar uma melhor compreensão da percepção das mães sobre assistência recebida no pré-natal e no pós-parto, optamos pelo método de história de vida, pois permitiu uma aproximação maior com as mães de crianças com anomalia congênita, apresentando as experiências e as definições vividas e interpretadas por elas. Este método consiste em solicitar aos sujeitos da pesquisa para contar sua vida, ou seja, falar dos aspectos do seu passado que considera relevantes para a situação atual.

Para Glat (1989), o método história de vida tira o pesquisador de seu pedestal de "dono do saber" porque valoriza o que o sujeito tem a dizer sobre ele mesmo, o que ele acredita que seja importante sobre sua vida.

Para Kohli (1981), a construção de uma história de vida não é uma simples coleção de fatos da vida individual, mas sim "auto-imagens estruturadas", o modo pela qual o indivíduo representa aqueles aspectos de seu passado que são relevantes na presente situação, isto é, relevantes em termos de intenções (futuro-orientadas) pelas quais ele guia suas ações atuais.

Os cenários da pesquisa foram as Escolas Especiais: Marianne Frostig e Jesus de Nazareno, em Piura, no Peru.

Os sujeitos da pesquisa foram seis (06) mães de crianças com anomalia congênita. A maioria apresentava criança com Síndrome de Down(Cinco) e a outra criança sem diagnóstico definido. Vale ressaltar que as mães são referidas no estudo por nomes fictícios.

Todas as mães (6) encontravam-se na faixa etária entre 36 a 47 anos; eram casadas; tinham de um a oito filhos. A idade das crianças especiais variaram de 01 ano e oito meses a 17 anos. Dois eram meninos e quatro eram meninas. Cabe ressaltar que o Método adotado não estabelece a obrigatoriedade de que todos os sujeitos do estudo possuam filhos na mesma faixa etária, isto porque o método preconiza que eles falem de um determinado período de sua vida, não importando quanto tempo tenha ocorrido. E até recomendado que haja uma diversidade de situações para que se possa estabelecer com segurança como um determinado grupo analisa a mesma situação ou vivência.

Utilizou-se a entrevista aberta, preconizada pelo método. As entrevistas iniciaram sempre com a questão norteadora: fale o que você considera importante sobre a assistência de saúde que recebeu durante a realização do pré-natal ou no primeiro mês após o nascimento de seu filho com anomalia congênita.

As entrevistas foram gravadas em fita cassete, após aquiescência das mães para participar da pesquisa, garantindo-se o sigilo e o anonimato, atendendo a Resolução n°. 196/96 do CNS, que dispõe sobre Pesquisa em seres humanos.

Realizou-se uma análise Temática. Surgiram duas grandes categorias: Assistência de Saúde no Período Pré-Natal e Assistência de Saúde no Período Pós Parto.

 

ANÁLISE ASSISTÊNCIA DE SAÚDE RECEBIDA NO PRÉ-NATAL

A história de vida das mães peruanas evidenciou que as mães receberam assistência no pré-natal durante os nove meses de gravidez. Esta assistência foi prestada por médicos, não sendo relatado a atuação de enfermeiras no pré-natal. A gravidez foi conduzida e acompanhada como uma gravidez de baixo risco (normal), muito embora algumas mães apresentassem fatores de risco, fatores que sugeriam o encaminhamento às instituições de alto risco, para realização de exames específicos e para os serviços de aconselhamento genético (cariótipo e determinação do risco de ocorrência e recorrência de anomalia congênita).

A maioria (5) das mães apresentaram intercorrências obstétricas, como crescimento intra-uterino retardado e trabalho de parto prematuro, as quais foram relacionadas à presença de anomalia fetal.

Outras mães apresentaram idade materna avançada na gestação, como podemos observar a seguir:

Era minha 8ª. gravidez, tinha 39 anos tinha medo especificamente desta gravidez pela idade pelo cansaço que tinha porque minhas gestações me deixam muito cansada, tenho muitíssimas náuseas nos quatro primeiros meses e depois não assimilo bem o ferro, ...porém quando eu fui ao médico que me fez uma ultra-sonografia mensal encontravam que minha gravidez correspondia a um mês menos do que eu podia presumir porque claro te medem o diâmetro da cabecinha e a criança de síndrome de Down tem a cabecinha mais pequena e o fêmur, todos os meses que ia a fazer ultra-sonografia tinha medo de que fosse tão pequena que não pudesse sobreviver, eu fique em repouso porque me sentia muito mal, a gravidez foi até o 8º. mês... (Blanca)

As mães Ana e Elizabeth, com filhos portadores de Síndrome de Down, também apresentaram, como fator de risco na gravidez, a idade materna elevada; no entanto a gestação foi tida como gestação de baixo risco.

Essas mães tinham um risco elevado para as anomalias cromossômicas de 1/66 e no caso específico da Síndrome de Down apresentavam um risco de ter a criança com essa anomalia de 1/106, ou seja, o risco era grande, comparando com a gestante de 20 anos que é de 1/ 1.667. No entanto, nenhuma dessas mães foram encaminhadas para instituições de alto risco, para realização de exames específicos e para realização de aconselhamento genético.

Nesse sentido, recorre-se a Pueschel (1993) que afirma: algumas técnicas utilizadas no diagnóstico pré-natal acarretam riscos associados tanto para a mãe quanto para o feto, por isto, certas indicações específicas são necessárias para o uso desses procedimentos. Varios fatores foram associados ao aumento do risco de ter um filho com Síndrome de Down, dentre eles temos a idade materna acima de 35 anos.

Em termos de detecção de risco na atenção do pré-natal, a OPAS/OMS (1984:25) destaca duas medidas prioritárias e simples de saúde em matéria de genética preventiva, dirigidas à mulher grávida que podem ser aplicadas com tecnologia simples em maternidades, em consultórios de pré-natal e planejamento familiar, tais como:

1- Obtenção de uma intensa historia familiar dirigida a detectar fatores de risco genético para defeitos congênitos: consanguinidade dos pais, idade materna, filhos prévios ou outros parentes próximos com defeitos congênitos, infertilidade, abortos espontâneos ou fetos mortos, mortes sem causa definida na infância, diabetes.

2- Detecção de fatores ambientais adversos: radiações, drogas, álcool, hipertensão arterial, diabetes, infecções, má nutrição, tabaco.

Baseadas nos depoimentos maternos podemos inferir que os profissionais de saúde ainda não estão capacitados para obter e interpretar os dados da história clínica da gestante do ponto de vista genético, e/ou eles obtêm esses dados, porém os ignoram. A OPAS/OMS (op. cit.) também observou esse fato e concluíram o seguinte:

"os profissionais de saúde da área materno infantil ainda não estão completamente capacitados para obter e interpretar os antecedentes familiares, pessoais e obstétricos da história clínica de uma gestante, do ponto de vista genético, o que é muito importante para que seja possível realizar a prevenção seja em nível de prevenção primária, secundária e/ou terciária"

Para a OPAS/OMS (op. cit.): a crença de que os profissionais da saúde se formem ainda sem conhecimentos adequados de genética e, ainda, que nas faculdades onde a genética faz parte do currículo, se ensina com as matérias básicas sem nenhuma relação com a prática, é um fato que pode ser constatado no currículo das Escolas de Medicina e de Enfermagem, onde a matéria é ministrada no ciclo básico, em um período letivo. Recomendam que nessas escolas sejam incorporados o ensino do enfoque genético em saúde interligado com as matérias clínicas, a epidemiología e a medicina preventiva.

A respeito dos exames rotineiros e específicos realizados no pré-natal, a historia de vida das mães peruanas traduz que as mães, no pré-natal, fizeram exames de rotina solicitados no pré-natal normal, incluindo a ultra-sonografia comum.

Não houve nenhum relato de mãe peruana, que realizara exames específicos, que permitisse diagnosticar a presença de anomalia fetal, durante o pré-natal.

São muitas as dificuldades encontradas pelas pessoas quanto à decisão de permitir o teste de diagnóstico pré-natal. Batshaw & Perret (1990) acreditam que a possibilidade de uma terapia fetal aumentou as dimensões do debate a respeito do aborto, pois o tratamento do feto para certas desordens torna-se cada vez mais possível, consequentemente, muitas questões têm sido levantadas a respeito dos direitos da mãe e do feto como pacientes, e o feto assumiu maiores direitos; sendo assim, um dos resultados pode ser o impacto sobre a viabilidade, a legalidade e o acesso ao aborto.

Cabe enfatizar que a Constituição do Peru, que garante o direito à vida, e o Código Penal peruano consideram crime o aborto provocado, só permitindo o aborto terapéutico nos casos em que se coloca em risco a vida da mãe e em estupro comprovado, tal qual a legislação brasileira.

O Hasting Center estabelece quatro critérios para que estes exames diagnósticos pré-natais sejam respeitados:

Uma mulher que corre risco não deve ser obrigada aos diagnósticos pré-natais, pelo simples fato de ter decidido não interromper a gestação.

O aconselhamento não deve ser coercitivo e deve respeitar as diversas opiniões existentes a respeito do aborto.

Os médicos devem informar os pais a respeito de um tratamento após o nascimento se ele existir.

Todos os resultados do diagnóstico pré-natal devem ser esclarecidos aos pais.

Apresentamos parte da discussão a este respeito face ao espaço disponível para o artigo e, também, por não ser objeto de estudo da presente pesquisa; alertamos porém, a necessidade de outros estudos relacionados à questão do aborto com esta clientela por especialistas da área.

Assistência de saúde recebida no período pós-parto

A historia de vida de mães peruanas evidenciou que as mesmas tiveram o parto em maternidade e que o profissional (obstetra) que realizou o parto não foi o mesmo que a assistiu no pré-natal. Em todas, o nascimento da criança com anomalia congênita causou surpresa tanto para a mãe como para o profissional, onde não houve um preparo técnico científico e emocional.

Evidenciou-se também que a atitude do médico no momento de comunicar o diagnóstico da patologia não tem atendido às expectativas das mães. As mães queixam-se principalmente na demora e no "suspense" que o médico faz para dar a notícia; algumas vezes o médico omite o diagnóstico. A insatisfação das mães também é na forma como o médico dá a notícia do diagnóstico, queixam-se da frieza do mesmo ao dar a noticia e da falta de solidariedade e apoio emocional por parte dos profissionais de saúde.

A maioria das mães foi informada um dia após o parto, com exceção de uma mãe que foi informada três dias após o parto. Para algumas mães, o diagnóstico foi confirmado no momento do parto, já outras foram informadas da suspeita do diagnóstico sendo encaminhadas para esclarecimento de diagnóstico. Uma mãe recebeu alta da maternidade sem ter sido informada sobre o diagnóstico da criança, como podemos observar no relato abaixo:

Era clínica onde fomos atendidas e parece que os instrumentos não tinham estado em condições adequadas e também a atenção das auxiliares de enfermagem... A criança estava em outro quarto mas a traziam para mim para a amamentação e a auxiliar me confirmava que o bebê tomava o leite... no terceiro dia que me deram alta a mim e ao bebê, a Dr.ª. nos pediu para mim e meu esposo assinar um papel onde dizia que me entregavam o bebê em condições normais, e eu pensei que a criança estava dormindo, mas não ele estava desidratando, morrendo lentamente, estava pálido. Em casa, ao ver que se passava horas e horas e ele não acordava não reagia eu comecei a ficar nervosa e fomos interná-lo em outro hospital.

A comunicação à mãe do nascimento de uma criança com malformação congênita é sempre uma situação constrangedora para o profissional, que pode ter dificuldades para identificar e lidar com seus próprios sentimentos, pode ter problemas ao dialogar com os pais ou paciente, dificultando consequentemente a aceitação do diagnóstico. Gauderer (1998) acredita que o médico tem dificuldade em dizer o diagnóstico porque sente inconscientemente culpa ao fazer um diagnóstico de uma doença grave ou fatal.

Existem muitas divergências entre os profissionais de saúde quanto à hora e à forma ideal de se comunicar o diagnóstico de anomalia congênita; para Werneck (1995), num aspecto, todos os profissionais concordam: quanto mais cedo os pais souberem do diagnóstico, mesmo que não confirmado, menos alimentarão fantasias em relação ao filho por nove meses idealizado, já que a sensação de que há algo diferente com o bebê raramente passa despercebida.

Sluckin et al (1990) apontam que, num estudo realizado, a maioria das mães expressa o ponto de vista de que é melhor para elas que o médico as informem assim que eles suspeitem de algum defeito físico ou mental na criança.

A respeito dessa questão, uma mãe expõe assim sua opinião:

...Estamos num meio em que os médicos não são muito explícitos com os problemas, você tem que ficar perguntando senão eles não falam nada...(Blanca)

Podemos observar que os médicos não informam aos pais logo após o parto do diagnóstico, o que traz muito angústia para eles, pois sempre acabam notando que algo está errado com a saúde do filho pela própria atitude da equipe.

Amorin (1988) recomenda que o diagnóstico deve ser revelado aos pais o mais cedo possível, com realismo, sem rudez, com carinho, pois o infortúnio dos pais causado pelo nascimento de uma criança malformada pode ser exacerbado por uma abordagem intempestiva de um obstetra ou pediatra despreparado.

Uma outra questão que merece ser destacada trata-se da forma como a informação é dada para os pais, que para algumas mães não atendeu a suas expectativas, elas sentiram falta do apoio emocional do profissional de saúde. Como podemos observar no seguinte depoimento:

O médico umas horas depois do parto me chamou e me falou que a criança ia ter problemas ...eu perguntei "Dr. que tipo de problemas que a criança tem?", então o Dr. me falou: "não se faça de ...", eu falei "Dr. como que não me faça de que me está falando ",

então ele me perguntou: "está a Sra. preparada para receber a noticia de golpe?". "Sim, Dr. seja o que for eu estou apta ", lhe respondi; ele falou "sua filha tem uma espécie de mongolismo "... (Elizabeth)

A forma como o profissional dá o diagnóstico é muito importante, porque com certeza o perfil do relacionamento que se inicia nesse instante entre mãe-filho dependerá da forma como o profissional fornece a notícia.

Foi identificado também que as mães saíram da maternidade sem que nada ou quase nada tivesse sido comunicado para elas sobre a doença do filho, causa da doença, prováveis problemas que eles poderiam vir a apresentar, tratamento específico e intervenção precoce.

A busca de um culpado para doença do filho ficou evidente neste estudo. Os pais constantemente buscavam nas suas atitudes, nos seus antecedentes, no seu modo de vida, causas para a doença do filho. E isso era extremamente angustiante para eles. Muitas vezes, o casal chegava a fazer acusações mútuas, como podemos observar na seguinte depoimento:

Eu vivia brigando com meu esposo porque o culpava dele ter levado uma vida desorganizada quando jovem, mas eu era uma garota muito sã, então, eu falava que por mim a criança não poderia ter nascido assim e sim por causa dele, só depois que o resultado do exame genético saiu que a gente deixou de brigar... (Diana)

Existem ainda por parte dos pais algumas concepções errôneas e sem fundamento científico acerca da causa da Síndrome de Down, como pudemos observar no depoimento acima, que levam a infortúnios na família. Os profissionais da saúde devem estar preparados e evitar o sentimento de culpa dos pais esclarecendo sobre a doença e as reais possibilidades da criança, ao invés de alimentar ilusões.

Em relação aos encaminhamentos, evidenciou-se que algumas mães foram: encaminhadas para o geneticista para confirmar o diagnóstico, outras para estimulação precoce da criança, como fisioterapia, e para encontros com outras famílias que têm filhos com o mesmo problema. Como podemos observar nos seguintes relatos:

Em Talara somente indicaram que o bebê tinha, parecia ou seja não confirmaram, "parece que tinha Síndrome de Down, para confirmar tem que levá-la Lima para que façam exames com a Dr.a"... (geneticista). (Carolina)

No dia seguinte o médico me falou que eu tinha que fazer com o bebê, me falou tudo, para melhor desenvolvimento tem que começar a terapia, sabe em que momento tem que começar?, se você quiser desde hoje me falou, então a criança tinha dois dias de nascida e começou a fazer a terapia... (Elizabeth)

A estimulação precoce no desenvolvimento de qualquer criança é importante independente de ter qualquer anomalia. Mendes (1995) acredita que especificamente com a Síndrome de Down, atue de forma eficiente, porque apresenta retardo nas fases do desenvolvimento e a estimulação visa este processo.

Uma mãe refere ter sido encaminhada para conhecer outra família que tinha um filho como o mesmo problema:

Num primeiro momento não tinha nada, porém meu médico de Lima me pôs em contato com uma pessoa que tinha filho com Síndrome de Down, é uma pessoa jovem e tinha acabado de ter outra filha, a criança tinha 4 anos e o bebê estava recém nascido... ( Blanca)

Este fato aponta para a importância da convivência destas pessoas que, vivendo as mesmas situações, podem trocar experiências. A convivência é uma ótima oportunidade para estas trocas. O fato de se encontrarem em diferentes períodos da evolução da doença de seus filhos permite que se ajudem . Muitas vezes tem muito mais peso a experiência passada por quem está vivendo ou já viveu aquele problema do que a informação dada pelo médico com um certo distanciamento.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A história de vida das mães peruanas evidencia o tipo de assistência recebida no pré-natal e onde a maioria das gestantes receberam atenção durante os nove meses considerando a gestação como de "baixo risco", mesmo nos casos onde a mãe apresentava intercorrências e/ou fatores de risco para anomalia. Evidenciamos também a não realização de exames específicos, e nem encaminhamentos para instituições de alto risco quando da constatação desses fatores.

De forma específica, ainda não fica claro para as mães porque os médicos, preparados para intervir no diagnóstico e tratamento das doenças, não têm como norma na assistência pré-natal relacionar os fatores de risco a uma maior incidência de anomalias congênitas. Fatores estes que devem constar na história clínica e no cartão da gestante, uma vez que na maioria dos casos as mães não são atendidas no pós-parto pelos mesmos profissionais que as atenderam no pré-natal.

A enfermeira, embora não incluída nos relatos das mães como profissional que lhe prestou assistência ou que seria importante nessa assistência, acredita-se ser fundamental registrar que há muito com o que contribuir nessas situações especiais. Pois, com base nos relatos deduz-se que a necessidade dessas mães em termos de orientação, apoio e encaminhamentos, a enfermeira (quando não preparada pode através de programas treinamento ou educação em serviço capacitar-se para tal atividade) deve conquistar este espaço de atuação pela competência técnico-científica em identificar esses fatores de risco, registrar na história clínica, comunicar ao médico, orientar e apoiar as mães e a família.

Quanto à assistência de saúde recebida no pós-parto, todas as mães souberam do diagnóstico do filho depois do nascimento, o que implica numa situação muito crítica para elas pois, além da sua condição de ser mãe (sofre modificações inerentes ao processo da parturição e puerperal), acrescenta-se atitudes e comportamentos de choque, ao deparar-se não com um "bebê idealizado" e sim com um "bebê mal formado".

A hora e a forma de comunicação do diagnóstico continua sendo um grande problema na assistência a estas mães. E se caracteriza por indicar falta de relacionamento médico-paciente; queixam-se de frieza quando é dada a notícia e de falta de solidariedade e de apoio emocional por parte desses profissionais.

A maioria das mães, ao receberem alta, não são orientadas nem esclarecidas quanto à doença do filho, causas, prováveis problemas que as crianças possam vir apresentar. Em relação a encaminhamento, algumas mães foram encaminhadas para confirmar o diagnóstico e outras para estimulação precoce da criança. Porém nenhuma das mães entrevistadas foi encaminhada para o planejamento familiar, aconselhamento genético e nem para um suporte psicólogo.

As histórias dessas situações servem de base para delineamentos de posições, tendências e perspectivas da assistência às gestantes de alto risco que caracterizam as mães especiais e suas crianças especiais, onde as enfermeiras - como profissionais da equipe de saúde - desempenham um papel na assistência à saúde da mulher, da criança, e da família, através fundamentalmente da orientação, identificação e registro de fatores de risco, apoio psico-emocional, preparo para exames específicos e encaminhamento.

 

REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA

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