Volume 1, Número 1, Jan/Abr - 1997
INTRODUÇÃO
A produção literária sobre as condições de vida das populações brasileiras, que se vinha adensando desde o início do século2, havia sensibilizado intelectuais nacionalistas e despertado a consciência dos sanitaristas para a necessidade de um movimento "Pró-Saneamento do Brasil", designação que tomou a Liga por eles fundada. Esta associação refutou várias teses colonialistas: a da inviabilidade da civilização nos trópicos e o conceito de "doenças tropicais", isto é climáticas; a do atraso do país em decorrência da composição étnica da população e da miscigenação. Criticou também o viés urbanista da saúde pública brasileira, que nada até então havia feito em relação às endemias rurais, propondo a criação de um ministério ou, pelo menos, de um departamento nacional de saúde pública ou de higiene (Costa, 1985, p.93, segs).
A inoperância dos serviços de saúde pública ficou evidente durante a epidemia de gripe espanhola, que chegou ao Rio de Janeiro em setembro de 1918 e, em menos de dois meses, atingiu mais de dois terços da população da cidade e matou quase 13 mil pessoas, tornando politicamente imperativa uma reforma sanitária3(Costa, 1985, p.86,segs e 93). A sucessão presidencial para o período 1919-1922 polarizou-se em torno das candidaturas dos nordestinos Rui Barbosa e Epitácio Pessoa; vencendo este último, candidato situacionista, estava colocada a questão do saneamento do país, que tinha destaque em sua plataforma de governo.
A favorável conjuntura econômica inicialmente observada4 ensejou um grande programa de obras públicas5, vinculado a importantes compromissos políticos internos e externos. O Brasil começou a negociar empréstimos com os Estados Unidos, que disputava com Londres uma posição como centro financeiro internacional.
O presidente eleito criou o Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP) e enviou ao Congresso uma mensagem que contemplava as principais reivindicações do movimento sanitarista (Benchimol, 1990, p.56). Carlos Chagas, a quem a descoberta do Mal de Chagas (1908) granjeara considerável fama nos meios científicos internacionais, herdeiro de Oswaldo Cruz como diretor do Instituto Oswaldo Cruz (1918-1934), nomeado diretor-geral do DNSP (1920-1934), liderou a reforma sanitária e iniciou o programa de cooperação com a Fundação Rockfeller, consequente à intensificação da penetração do capital americano em nosso país (Costa, 1985,p.101 e 118). O DNSP trouxe para o serviço público jovens sanitaristas que, passando a influir nas decisões governamentais, ascenderam politicamente e "deram consistência à estratégia de saúde pública", ao apresentá-la sob a forma de um discurso dualizado, técnico e humanitário. Assim, revestidas de prestígio científico e ideológico, suas propostas ficaram preservadas da análise política (Costa, 1985, p.99). A ação executiva do órgão federal de saúde nos estados da Federação inaugura-se mediante atividades de saneamento rural (Rodrigues, 1967, p.143). Não obstante, os princípios liberais positivistas, nos quais fundamentava-se a autonomia dos estados e a economia essencialmente agropecuária, não favoreciam uma efetiva política de saúde mais incisiva ou abrangente. Por isso, o DNSP continuava a restringir suas atividades principalmente à região do Distrito Federal (Cortes, 1984, p.33e36).
A filosofia de trabalho adotada era a de programas especializados para cada "mal" a ser combatido e de comando centralizado das ações, na Inspetoria correspondente (Fontenelle, 1941, p.6). Ao mesmo tempo em que foram criados novos órgãos relacionados à tuberculose, à lepra e doenças venéreas, bem como à higiene infantil, que ensejaram a participação de especialistas, a propaganda e a educação sanitária substituíram em grande parte as penalidades e a coação, pois os princípios liberais e democráticos, vitoriosos na 1ª guerra eram incompatíveis com o antigo conceito de "polícia sanitária" (Rodrigues, 1967, p. 114). Os sanitaristas do DNSP acompanhavam o movimento de saúde pública norte-americano, especializando-se na Universidade John Hopkins (Baltimore / EUA), onde conheceram a atuação da enfermeira de saúde pública6.
A idéia de implantar a enfermagem de saúde pública no Brasil surgiu de forma modesta, na Inspetoria de Profilaxia da Tuberculose7, qual seja a de organizar um serviço de enfermeiras-visitadoras, a serem treinadas nos próprios dispensários de tuberculose. Entre os defensores da idéia das visitadoras estava JP Fontenelle, que se baseava em sua própria experiência de inspetor de higiene, quando visitava as casas de cômodos do centro da cidade, e mais ainda no discernimento que teve, na época da epidemia de gripe espanhola, conforme ele mesmo conta, de que este não era um serviço apropriado para médicos (Fontenelle, 1941, p.5).
Tendo Carlos Chagas solicitado à Fundação Rockfeller a organização de um serviço de enfermagem no DNSP, foi criada a Missão de Cooperação Técnica para o Desenvolvimento da Enfermagem no Brasil, patrocinada pela Fundação Rockfeller8, para promover as inovações no Departamento Nacional de Saúde Pública/DNSP, consideradas necessárias à efetivação da Reforma Carlos Chagas, e que aqui permaneceria por uma década (1921-1931).
A MISSÃO PARSONS E SEU PROJETO
A Fundação Rockfeller enviou ao Brasil a enfermeira americana Ethel Parsons, para estudar a situação. Aqui constatou ela que não havia no país escolas de enfermagem que apresentassem os padrões mínimos adotados nos "países anglo-saxões" e nem enfermeiras treinadas nestes moldes; que os hospitais, de modo geral, eram bem construídos, mas viviam superlotados; que os médicos eram interessados e conscienciosos, mas que a enfermagem era feita por homens e mulheres ignorantes. No DNSP, essa enfermeira norte-americana verificou que os médicos dos serviços de tuberculose, doenças venéreas e higiene infantil haviam contratado quarenta e quatro moças que, após um curso de doze palestras, passaram a trabalhar como visitadoras. Parsons relata que os próprios médicos brasileiros reconheciam as limitações desse sistema; julgava ela que "eles queriam que a enfermagem no Brasil alcançasse os padrões dos outros grandes países do mundo". Ao contrário, como nos quatro meses de funcionamento desse serviço de visitação o número de atendimentos nas clínicas havia aumentado em 50%, os médicos daquelas repartições não só insistiam em que o serviço continuasse funcionando, mas também planejavam dobrar o número de visitadoras, de modo a ampliar o controle sanitário sobre a população. Assim, Mrs Parsons se viu na contingência de, sem interromper seu trabalho, treinar essas visitadoras, "antes que algum desastre, resultante de sua ignorância, destruísse a confiança popular na enfermagem de saúde pública" (Parsons, 1925, p.1-3). Ainda em 1922, Mrs Parsons, como chefe da missão de enfermeiras da Fundação Rockfeller e como Superintendente Geral do Serviço de Enfermeiras do DNSP, trouxe da América do Norte sete enfermeiras de saúde pública para treinar e supervisionar as visitadoras dos serviços de tuberculose, higiene infantil e doenças venéreas.
Embora Ethel Parsons desde logo reconhecesse a necessidade de adaptar a "concepção norte-americana" de enfermagem de saúde pública às condições locais, acreditava haver "uns tantos princípios fundamentais indispensáveis a toda a organização que ofereça um cuidado de enfermagem capaz, aos doentes, assim como à conservação da saúde de todos os membros da comunidade, sem atender à raça, religião, ordem ou situação econômica" (Parsons, 1927, p.202). Tais princípios tinham como matrizes o sistema nightingale, o hospital norte-americano, bem como a prática de enfermagem de saúde pública desenvolvida naquele país (Barreira, 1992, p.49).
O progresso da enfermagem nos Estados Unidos acompanhara a expansão espetacular da moderna organização hospitalar naquele país, a partir da década de 70 do século passado e na primeira década do século 20. Tanto que a maior parte das escolas de enfermagem americanas fora criada para dar suporte aos grandes hospitais que surgiam9, servindo de campo de prática às alunas que representavam mão-de-obra boa e barata (Alcântara, 1966, p.22), sendo que, em 1918, já havia mais de mil escolas de enfermagem apoiando os serviços hospitalares (Paixão, 1963, p.55).
No que se refere à saúde pública, Ethel Parsons reivindica para seu país a invenção da enfermeira de saúde pública, que se teria tornado "figura central, na luta sanitária mundial". Para sustentar seu ponto de vista, apoia-se nas declarações do Dr William Welch, diretor da Escola de Higiene e Saúde Pública da Universidade John Hopkins, que coloca a enfermagem de saúde pública "entre as grandes iniciativas dos Estados Unidos no século 20". A enfermeira de saúde pública assumiu um papel de destaque no contexto do pós-guerra, quando superados os tempos da "polícia sanitária". Agora, o que se queria era obter a colaboração das pessoas para o projeto sanitário, uma vez que "no ensinar aos indivíduos os princípios da vida sadia e no trazê-los em tempo próprio ao contato com os recursos médicos da coletividade, a enfermeira de saúde pública provou ser o agente mais útil à nossa disposição; assim, o programa da moderna higiene pública em dada coletividade pode ser muito exatamente medido pela extensão do desenvolvimento nele já alcançado pela enfermagem de saúde pública" (Ass.Am.S.P. in Fontenelle, 1941, p.35 e 36).
A primeira adaptação do sistema norte-americano ao Brasil "foi o estabelecimento de um Serviço de Enfermeiras no Departamento Nacional de Saúde Pública", que abrangia todas as atividades de enfermagem, e que estava em pé de igualdade, na estrutura administrativa do DNSP, com as inspetorias médicas; chama ela a atenção para que essa inserção no nível federal constituía-se em fato inédito na história universal da enfermagem (Parsons, 1927, p.202).
O treinamento das visitadoras, com seis meses de duração, constava de ensino teórico e prático sobre procedimentos de enfermagem e higiene do lar, além de colocar as visitadoras sob "disciplina e controle". O ensino prático era feito nas clínicas ou distritos sob a supervisão das enfermeiras americanas e o ensino teórico era feito pelos médicos, à tarde (Parsons, 1925, p.4-5).
No entanto, Ethel Parsons deixou claro tratar-se de um "curso de emergência", e que por isto as visitadoras não poderiam assumir posições de responsabilidade e deveriam trabalhar sempre sob supervisão de uma enfermeira; que na primeira oportunidade as visitadoras deveriam ser substituídas por enfermeiras graduadas, mas que elas deveriam ter a oportunidade de fazer o curso de enfermagem (Parsons, 1925, p.5).
Conforme suas mesmas expectativas, a avaliação do "curso de emergência", feita por Ethel Parsons, não foi favorável, apesar de as alunas terem "adquirido alguns conhecimentos, assim como uma melhor percepção da dignidade e valor de seu trabalho". As razões apresentadas para este resultado foram: a educação básica insuficiente de algumas alunas, o escasso tempo para sua instrução durante o curso, bem como a falta de oportunidades de aprendizagem prática no hospital e nos dispensários; além disso, a seu ver, "muitos dos cursos teóricos, embora excelentes, eram clássicos demais para a compreensão das alunas". Deste modo, propôs ela que o próximo curso, com dez meses de duração, durante os quatro primeiros meses fosse desenvolvido junto com o "curso preliminar intensivo da escola de enfermeiras do hospital de São Francisco de Assis". A partir do ano seguinte não mais foram oferecidos cursos de visitadoras (Parsons, 1923, p. 13), o que foi considerado uma vitória: "(...) os diretores dos serviços do Departamento de Saúde perceberam que os arranjos existentes foram satisfatórios apenas como uma medida de emergência e que seria preferível esperar por enfermeiras completamente treinadas (...)". Lembrava que tal decisão correspondia a um considerável progresso à situação de 1922, quando sua demanda era a de um grande número de visitadoras ligeiramente treinadas, imediatamente" (Parsons, 1924, p.21).
A inserção das visitadoras, e depois das enfermeiras, no campo da saúde pública, não se fez sem reação. O próprio JP Fontenelle conta que "a idéia de moças funcionárias públicas, para visitar as casas, era tida como "novidade americana" e "escândalo". O sanitarista defende a necessidade da nova categoria, comparando a organização sanitária de até então à "guarda nacional" instituída por D. Pedro II, composta apenas de oficiais (os médicos), sem soldados capazes; compara ainda as visitadoras àquelas antigas "brigadas mata-mosquitos" criadas por Oswaldo Cruz, sendo que, a seu juízo, a visitação seria uma atividade mais adequada às mulheres, de modo a que se pudesse aproveitar na ação da saúde pública "as vantagens físicas e morais do sexo feminino". Concluindo, afirma o sanitarista: "a enfermeira de saúde pública é a melhor propagandista, a professora mais ouvida, a instrutora mais agradável", que pode deste modo "multiplicar o trabalho dos médicos sanitários" (Fontenelle, 1941, p.8,segs, 21 e 34).
O trabalho cotidiano de uma enfermeira de saúde pública era o de visitar as famílias onde houvesse "doença, incapacidade física ou necessidade de conselhos para preveni-los", para aí cuidar dos doentes acamados; observar as condições sanitárias da casa; detectar defeitos físicos e doenças em começo; ensinar "aos membros da família ou até aos vizinhos" como cumprir as determinações do médico e as medidas de proteção; explicar o valor da higiene do meio e os princípios da boa alimentação, "pondo nisso a habilidade de uma enfermeira consumada [e] encaminhando os médicos para os doentes e os doentes para os médicos". (Fontenelle, 1941,p.9~10). Essa visão idealizada da atuação da visitadora não condizia com as precárias condições de vida daquelas famílias às quais ela procurava "ensinar" a ter saúde (como o mesmo Fontenelle já tivera a oportunidade de verificar pessoalmente). Mesmo assim, as famílias, pelo menos inicialmente, relutavam em receber suasvisitas. Se o trabalho de visitação domiciliar às famílias pobres foi desde logo reconhecido como não apropriado à profissão de médico, em seguida chegou-se à mesma conclusão a respeito do trabalho educativo nos dispensários, o que aumentou a frequência às clínicas e ampliou a área de atuação do serviço de enfermeiras.
Para a implantação de um serviço unificado de visitação, a cidade foi dividida em zonas, cada qual com uma "filial do serviço de enfermeiras", e as zonas foram divididas em distritos. Cada zona tinha uma enfermeira de saúde pública americana e cada distrito tinha uma visitadora. Embora inicialmente só tenha sido possível integrar os trabalhos de tuberculose e de higiene infantil, a meta era a de ter uma enfermeira de saúde pública em cada distrito, responsável por todos os cuidados de enfermagem e educação sanitária de que necessitassem as famílias (Parsons, 1927, p.210-211).
O NOVO ENSINO DE ENFERMAGEM
O currículo da Escola de Enfermagem do DNSP era semelhante ao currículo padrão para escolas de enfermagem dos Estados Unidos10, que propunha um curso com três anos de duração, a exigência do secundário completo como requisito de admissão, enfatizava o programa teórico e restringia o trabalho nas enfermarias a quarenta e oito horas semanais (Carvalho, 1972, p.21-22). Este modelo foi seguido "tanto quanto possível"11 (Parsons, 1923, p.8): aqui o curso tinha a duração de vinte e oito meses letivos, com duas semanas de férias anuais; exigência de diploma de escola normal ou aprovação em prova de seleção; período probatório de quatro meses; quarenta e oito horas de trabalho semanal, "excluídas as horas de instrução teórica e de estudos"; direito à residência12 e pequena remuneração mensal (Carvalho, 1972, p.27 e quadro n° 1, p.29-30).
O ensino da enfermagem hospitalar ocupava cerca de quatro quintos do curso e o ensino da enfermagem de saúde pública ocorria apenas no último quadrimestre. Essa predominância da assistência hospitalar na formação de enfermeiras destinadas ao serviço de saúde pública parecia "natural" às pioneiras, pois a seu ver, nos lares a enfermeira seria o "mensageiro da saúde", o "verdadeiro instrutor sanitário, que tratava e dava conforto ao doente com suas próprias mãos, pela experiência que adquiriu no hospital".
A diferença entre o trabalho hospitalar e o de saúde pública resumia-se a que, nos domicílios, a enfermeira tinha que improvisar o material necessário, e também "resolver sozinha as situações difíceis" que se apresentassem (Fraenkel, 1934 II, p. 5 e I, p. 15).
Inicialmente, a diretora da escola e duas assistentes fariam o ensino de enfermagem e a supervisão do trabalho das alunas, em um número progressivo de enfermarias, até que todo o hospital ficasse sob controle, quando a escola de enfermagem deveria ter em seu quadro seis professoras estrangeiras. Esta medida, além de propiciar o treinamento prático das alunas, surtiria também um efeito de demonstração das vantagens de uma enfermagem de bom padrão (Parsons, 1925, p.5-6).
O folheto de divulgação do novo curso, que se intitula A enfermeira moderna: apello às moças brasileiras, indicava desde lego tratar-se de uma profissão destinada exclusivamente às mulheres. Nesse prospecto a vida da enfermeira é comparada à vida da religiosa: "(...) quando todo o trabalho da enfermeira era feito por Irmãs de Caridade, a ele se aludia como uma vida de sacrifício, Agora, porém, deve ser chamado vida de devotamente, porquanto em nenhum outro labor (...) pode a moça encontrar (...) oportunidade de praticar a mais meiga de todas as artes da vida, encontrando ventura e propício ensejo de revelar os próprios dons e esquecer-se de si mesma (...)." Não obstante, não se deixava de assinalar, ainda que discretamente, que a enfermagem poderia representar para a mulher uma "emancipação com honra" (Brasil, DNSP, 1922, p.6). Como revelam as declarações das candidatas em suas fichas de inscrição, o curso de enfermagem poderia significar uma perspectiva de vida honesta para uma moça pobre, pois à época a profissão de enfermagem representava quase que a única oportunidade de acesso da mulher à educação, após o curso normal (Sauthier, 1996, p. 165,segs). A procura da profissão por moças de boa família era favorecida pelo excedente de mão-de-obra feminina e pela crise econômica: "com a entrada da mulher brasileira na grande atividade da vida, tendo que ganhar o auxílio para o seu sustento, ou até todo ele e, às vezes, o de outros membros da família, vão certamente aumentar as candidatas à profissão de enfermeira..." (Fontenelle, 1941, p.17).
Várias das candidatas que atenderam aos apelos humanitários e patrióticos dos médicos sanitaristas provinham da classe média-alta da sociedade, muitas delas tendo sido diretamente por eles recrutadas. Não obstante, candidatas oriundas de famílias pobres poderiamfdeveriam ser bem recebidas, mas o mesmo não ocorreia com as candidatas negras. A partir da classe de 1926, a questão da discriminação racial na seleção das candidatas passou a ser denunciada pelos jornais da oposição. Ethel Parsons reconhecia que, a exemplo da Academia Naval, a política da Escola seria mesmo a de evitar a entrada de alunas negras, para que se pudesse atrair "a melhor classe de mulheres para a nova profissão"13. Diz ela que, por insistência do DNSP, foi admitida uma moça negra, o que provocou uma onda de protestos das alunas (Parsons, 1926, p.2-3).
Ao tempo em que a Escola preparava as futuras enfermeiras para o trabalho de saúde pública ou hospitalar, também desenvolvia uma forte inculcação ideológica, segundo a mística da profissão. Do ponto de vista das enfermeiras norte-americanas a obediência à hierarquia e à disciplina eram os mais fortes referenciais na avaliação das alunas: "Após a admissão, os padrões eram mantidos altos por provas frequentes e pela estrita conformação a todas as decisões tomadas". Na opinião de Mrs Parsons, esta atitude era apreciada pelas estudantes desejáveis e servia como meio de eliminar precocemente as descontentes (...) antes que tempo e dinheiro fossem desperdiçados com elas" (Parsons, 1923, p.14).
A IMPLANTAÇÃO DA NOVA PROFISSÃO
À medida em que as enfermeiras se iam formando, eram lego integradas ao projeto sanitário, aperfeiçoando e ampliando o trabalho que já vinha sendo executado. O fato de as enfermeiras diplomadas chegarem a substituir completamente as visitadoras mereceu citação do presidente Washington Luiz em sua mensagem ao Congresso Nacional. Por outro lado, as enfermeiras brasileiras selecionadas para bolsa de estudos nos Estados Unidos, ao voltar, passaram a substituir as colegas americanas na chefia de zonas de enfermeiras distritais.
A preocupação em relação à receptividade dos empregadores à nova profissional é demonstrada pela satisfação com que se registrou no primeiro relatório anual o fato de que: "de todo o Brasil chegam pedidos de enfermeiras treinadas para ocuparem cargos de responsabilidade ..." (Parsons, 1922, p.7). O esforço em divulgar o valor do trabalho da enfermeira, de modo a formar uma opinião pública favorável à profissão, era constante: "Todos os tipos de publicidade, para educar os brasileiros sobre o valor de uma enfermagem de saúde pública do mais alto padrão, foram usados em toda sua amplitude" (Parsons, 1923, p.15).
A partir de 192614, pode dizer-se que estava sendo criada uma nova mentalidade sobre a profissão de enfermeira no Brasil: "o crescimento continuado do respeito e confiança no Serviço de Enfermagem e no futuro da profissão nas mentes do povo brasileiro foi um dos mais importantes desenvolvimentos de todo o programa de saúde, e foi particularmente gratificante, não somente porque reflete a atitude de médicos, funcionarios e pacientes, mas também porque isto levou, indubitavelmente, principalmente durante o final do ano, a um expressivo crescimento do número de moças de cultura e educação que se candidatam à Escola de Enfermagem" (Parsons, 1925, adendo, p.5).
A alta prioridade conferida pela Missão Parsons à implantação da escola de enfermagem pode ser avaliada pelo relatório de 1925, quando, diante do corte de verbas do projeto, decorrente da crise do país, colocou-se o dilema de reduzir as atividades do serviço de enfermeiras ou prejudicar o desenvolvimento da escola, optou-se por preservar a Escola, ainda que mediante a drástica redução das atividades de saúde pública: "(...) concordou-se que o desenvolvimento da escola era a parte mais importante do programa e não deveria sofrer falta de fundos". Em consequência, doze das 47 visitadoras foram dispensadas; as visitas aos tuberculosos foram limitadas aos casos abertos, as atividades relacionadas ao pré-natal e às crianças maiores de dois anos, apesar dos protestos dos médicos, foram suspensas, até que a próxima turma de alunas se graduasse. Com a entrada de novas visitadoras na escola de enfermagem, seu número ficou reduzido a 26; também uma epidemia de varíola desviou enfermeiras e visitadoras para o hospital de isolamento, o que obrigou a diminuir mais ainda o número de visitas realizadas (Parsons, 1925,p.24-25, 28-29 e adendo p.4).
Antes que os destinos da Escola passassem às mãos de enfermeiras brasileiras, foi regulado o exercício da enfermagem no Brasil15. Apesar do estudo elaborado sobre a incorporação da escola à universidade (Carvalho, 1976, p. 15), tal não ocorreu, pois como consta no preâmbulo desse decreto, apesar de que "nos povos mais adiantados" venham sendo outorgadas a escolas de enfermagem "regalias de escolas superiores", tal medida, naquele momento, não atenderia a "conveniências de ordem sanitária". No mesmo documento legal a Escola de Enfermeiras Anna Nery foi considerada a escola oficial padrão para efeito de equiparação e reconhecimento de outras escolas de enfermagem que viessem a ser criadas, com o propósito declarado de garantir um alto nível de formação profissional de enfermagem no Brasil16(Baptista & Barreira, 1994, p.9).
Em 1931, retira-se a Missão Parsons. Durante os dez anos de sua permanência (de 2/9/21 a 3/9/31) não surgiu, no Brasil, outra escola de enfermagem. Mas logo após a saída das enfermeiras norte-americanas da direção da Escola Anna Nery, trátense de atenuar os efeitos de sua instituição como escola oficial padrão, o que se chocava com interesses das corporações militares e religiosas17(Baptista, 1995, p.33-34).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A implantação da enfermagem moderna no Brasil foi uma das maiores realizações da reforma Carlos Chagas. Ele mesmo viria a declarar, de público, que "a criação de uma escola de enfermagem no Brasil é um evento que marca época em sua história e não tem menor importância do que a eliminação da febre amarela por Oswaldo Cruz" (Parsons, 1924,p.21). No entanto, o objetivo mais imediato desta iniciativa foi o de suplementar o trabalho dos médicos sanitaristas e representar a autoridade sanitária na intimidade do tecido social.
Ao contrário da expectativa de grande parte dos médicos do DNSP, que desejava apenas ver resolvidos os problemas mais prementes de sua prática cotidiana, o projeto da Missão Parsons tinha como propósito lançar bases sólidas para a introdução de um novo profissional no campo da saúde. A Missão Parsons transplantou para o Brasil um modelo de enfermagem que resultara de um processo adaptativo de meio século18impondo assim a assimilação de técnicas e valores sociais estranhos à nossa cultura. Até porque os motivos e circunstâncias do surgimento da enfermagem profissional nos dois países foram distintos. No Brasil, a emergência da nova categoria profissional foi "consequência de medida governamental e não produto de consenso social", uma vez que, com exceção do grupo do DNSP, "a sociedade brasileira da época não possuía noções definidas nem sobre o significado e nem sobre a utilidade de uma escola de enfermagem" (Alcântara, 1966, p.21-22).
Dada a divergência entre as necessidades sentidas pelos médicos do DNSP e o projeto das enfermeiras norte-americanas, caberia a Mrs Parsons o desafio de convencê-los de que era não somente possível, mas também essencial que os altos padrões da enfermagem norte-americana fossem aqui adotados. No entanto, cabe considerar que, além deste trabalho de convencimento, havia outras forças em jogo: a Superintendente-Geral do Serviço de Enfermeiras do DNSP estava subordinada diretamente ao Diretor Geral, o Dr Carlos Chagas, mas também ao diretor do Conselho Sanitário Internacional da Fundação Fockfeller no Brasil; e que os cargos de diretora da escola e do serviço de enfermagem do hospital foram acumulados pela mesma enfermeira americana19, que portanto também tinha dupla subordinação, ou seja, ao diretor do hospital20 e à Superintendente-Geral. Tais arranjos possibilitaram à chefe da missão de enfermeiras da Fundação Rockfeller o exercício de poderes extraordinários, durante dez anos (1921-1931), o que lhe possibilitou a realização de um projeto para o qual havia, pelo menos nos primeiros anos, escasso apoio por parte das pessoas que participariam, de uma forma ou de outra, de sua execução.
Também o decisivo apoio do diretor do DNSP ao projeto de implantação da enfermagem moderna no Brasil e o prestígio que tinham as enfermeiras da missão eram anunciados publicamente: ao dar posse ao novo diretor do Hospital São Francisco de Assis, o Dr Carlos Chagas enfatizou no seu discurso que sua escolha havia sido decidida pelo interesse demonstrado por este médico pela escola de enfermeiras, visto que "o principal propósito do hospital era o de servir como laboratório de treinamento para as enfermeiras e que todas as facilidades deveriam ser oferecidas à escola" (Parsons, 1924, p.21).
O serviço de visitação, tarefa considerada imprópria ao trabalho médico, exigia um grande investimento pessoal, pela oposição (de cunho moral ou político-filosófico) de certos setores da sociedade e pela relutância das famílias em receber a visita sanitária. A presença da enfermeira de saúde pública nos lares das famílias pobres, mesmo que prestando uma ajuda efetiva, tinha uma forte carga ideológica. Tal trabalho, consideradas as condições em que se fazia, pode ser caracterizado como "trabalho de mulher", dada a escassa recompensa, quer em termos monetários21, quer em termos de satisfação pessoal, baseando-se muito mais em gratificações de ordem moral (Barreira, 1992, p.52).
A criação da Escola Anna Nery, fora da esfera de influência do clero, provavelmente apresentou-se como uma ameaça ao poder e prestígio das ordens religiosas. Tanto assim que à redução da influência das enfermeiras norte-americanas nos destinos da enfermagem nacional, segue-se o reconhecimento das irmãs de caridade como enfermeiras, em 1932, e a criação, em 1933, da primeira escola a formar enfermeiras religiosas no Brasil22. Seitas evangélicas também trataram de proteger seus interesses. Duas escolas foram criadas por iniciativa de igrejas evangélicas, ambas no estado de Goiás23. Essas escolas de caráter religioso estavam vinculadas a hospitais, ao contrário do que preconizava a Missão Parsons. Parece então que o "alto padrão" de ensino de enfermagem adotado pela Escola Anna Nery, em moldes considerados científicos, não correspondería à mentalidade brasileira da época (Baptista, 1995, p.34-35).
A idéia de criar uma escola de enfermeiras e um hospital-escola, nos moldes nightingaleanos, e um serviço de enfermeiras de saúde pública, nos moldes norte-americanos, veio no bojo do plano de trabalho da Missão Parsons, como um fenômeno de universalização de uma cultura considerada legítimamente dominante. Deste modo, a implantação da enfermagem moderna no Brasil representou "uma luta simbólica pela produção e imposição da visão de mundo legítima" (Bordieu, 1989, p.140), no caso a inserção de uma nova categoria profissional feminina, até então inexistente no país e que correspondeu, não a uma aspiração da sociedade e nem mesmo a um consenso dos médicos do DNSP, mas a uma decisão das autoridades brasileiras constituídas.
O processo de constituição desses sujeitos sociais corresponde a uma nova identidade social, ou seja, uma nova categoria profissional feminina, consubstanciada em uma nova prática social, e sua articulação com a política sanitária da época.
Esta luta pela construção de uma identidade de enfermeira, implicava no exercício de uma violência simbólica que se iniciava pelos critérios de recrutamento e seleção das candidatas, quando se procurava evitar aquelas que apresentassem estigmas, inscritos no próprio corpo ou revelados pelo comportamento, que pudessem desacreditar a nova profissão perante as elites dominantes. Durante seu treinamento operava-se uma drástica transformação do habitus das postulantes à profissão; condições para a permanência no curso, ou no emprego, eram o devotamente ilimitado ao serviço e obediência estrita às ordens e decisões.
A estratégia adotada, no processo intencional de transição das expectativas iniciais dos médicos do DNSP para a efetivação do plano idealizado pelas enfermeiras norte-americanas, foi a do atendimento imediato das necessidades por eles sentidas, acompanhado por um forte efeito de demonstração de natureza contraditória: ao mesmo tempo em que se procurava evidenciar as melhorias alcançadas pelo trabalho realizado (aumento do comparecimento da clientela, volume de trabalho realizado, diminuição de custos), fazia-se uma avaliação negativa dos seus resultados, enfatizando a necessidade de elevar os padrões de treinamento, aumentar sua duração, institucionalizar órgãos de enfermagem de comando centralizado, etc. Deste modo o trabalho avançava por meio de aproximações sucessivas (e de eventuais recuos) da prática concreta ao projeto inicialmente idealizado, à medida em que, no interior do DNSP, eram produzidas novas categorias de percepção e de apreciação do trabalho de enfermagem.
Os esforços no sentido de dar visibilidade à nova profissão, visavam a criar imagens mentais e manifestações sociais conformes às propriedades assim representadas, que se estenderiam aos seus portadores, ou seja, alunas de enfermagem e enfermeiras. As situações de crise, como surtos epidêmicos, falta de pagamento das enfermeiras por problemas orçamentários, nas quais as enfermeiras se sacrificaram "voluntariamente", foram utilizados para demonstrar "o espírito da enfermagem" e os altos designios morais e espirituais das novas profissionais.
O êxito da implantação da enfermagem moderna no Rio de Janeiro, e a certeza de sua perenidade, consistiu na passagem, através do tempo, da enunciação de uma crença afirmada como correta, ou seja, o que deveria ser a enfermagem neste país, para um estado de realização desta norma, que passa a ser considerada normal, evidente, natural.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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BAPTISTA, Suely de S., BARREIRA, leda de A. Trajetória das escolas de enfermagem na sociedade brasileira. In: SEMINÁRIO NACIONAL DE PESQUISA EM ENFERMAGEM, 7., Fortaleza: ABEn, 1994.
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1. Este trabalho foi realizado com o apoio do CNPq e da sub-reitoria de ensino para graduados e pesquisa (SR-2 / UFRJ) e corresponde ao resumo departe do relatório en viado ao CNPq referente ao projeto integrado "Os primórdios da enfermagem no Brasil: sanitaristas brasileiros e enfermeiras norte-americanas".
2. Notadamente "Os sertões", de Euclides da Cunha (1903) e o Relatório de Arthur Neiva e Belisário Penna, pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz, sobre a viagem científica que fizeram, a cavalo, pelos estados da Bahia, Pernambuco, Piaui e Goiás (1916).
3. A imprensa denunciava a ineficácia dos serviços públicos e a distorção das informações oficiais sobre asituação; após a epidemia, eclodiram no Rio movimentosgrevistas, a insurreição armada dos anarquistas e acirrou-se o debate sobre a questão social e o papel do Estado, à sombra dos desdobramentos da Revolução Russa, pois o advento do regime socialista colocava em cheque as políticas sociais dos países capitalistas (Costa, 1985, p. 86,segs e 93).
4. O preço do café estava em alta, devido ao aumento da demanda externa, decorrente do término da Iªguerra e à diminuição da oferta, ocasionada pela perda da safra; noentantojánofinalde 1920, seguiu-se uma violenta recessão, como reflexo da política de contenção de gastos dos países centrais, que incluiu, ao mesmo tempo, a suspensão dos empréstimos externos e a drástica redução das importações, com efeitos devastadores nopreco do café (Fritsch, 1993, p.4~6).
5. Entre as quais os preparativos para as comemorações do Centenário da Independência (1923), que tinham como ponto alto a realização de uma Exposição Internacional; para preparar condignamente a cidade foram construidos vários prédios, inclusive o Hotel Sete de Setembro e urbanizado o centro da cidade, o bairro de Ipanema e a lagoa Rodrigo de Freitas.
6. A Inglaterra eos Estados Unidos vinham utilizando, desdea virada do século, embora sob denominações distintas, "enfermeiras visitadoras" nos seus programas de saúde.
7. Sendo seu diretor o sanitarista Plácido Barbosade quem era assistente o sanitarista e jornalista JP. Fontenelle, grande divulgador da enfermagem moderna, em seus primórdios no Brasil.
8. Dela tomaram parte 31 enfermeiras, das quais 26 da América do Norte e cinco da Europa, estas últimas todas vinculadas à Escola e ao Hospital (Fraenkel, 1934, p. 6).
9. Havia outros grupos que buscavam uma maior autonomia, em relação à instituição hospitalar e ao controle médico, bem como o desenvolvimento daqueles fundamentos nightingaleanos relacionados ao planejamento do trabalho com base em dados estatísticos, na observação clínica e na avaliação científica, que levariam à emergência da pesquisa de enfermagem (Sauthier, 1996, p. 43 e segs.)
10. Standard Curriculum for Nursing Schools, publicadoNational League of Nursing Education, em 1917 (ver Carvalho, 1972, quadro 1, p. 29-30).
11. No mesmo ano do início do funcionamento da escola de enfermeiras do DNSP, foipublicado nos Estados Unidos o Relatório Goldmark (Report of the Committee for the Study of Nursing Education), que apontou as falhas no sistema de ensino de enfermagem daquele país e recomendou o ingresso de algumas escolas nas universidades (Carvalho, 1972, p.22~23).
12. A primeira residência foi em uma casa vizinha ao Hospital São Francisco, com capacidade para dezesseis alunas, e de 1924a 1926em uma casa para 26 estudantes, na Tijuca; neste ano foi cedido à escola o exhotel Sete de Setembro, na Av. Rui Barbosa, em Botafogo (Parsons, 1923, p.8 e 1924, p. 17).
13. tinham sido selecionadas por "outras boas razões", mas quejá havia na Escola três estudantes que, apesar de brancas, apresentavam traços de "sangue negro".
14. Três anos depois de inaugurada, a Escola de Enfermeiras do DNSP, devido à influência da Cruz Vermelha Brasileira (Parsons, 1926, apêndice, p.2), passou a denominarse Escola de En fermeiras D. Anna Nery. Decretenº20109, de 15/6/31.
15. Devido a isso, as enfermeiras diplomadaspassaram a ser conhecidas como enfermeirasananeri,passando o nome dessa escola a adjetivara designação da profissão, como símbolo de qualidade.
16 Em março de 1932, foram criados o quadro de enfermeiros do Exército e o Curso de Enfermeiros da Escola de Saúde do Exército, com duração de um ano; no mesmo ano, foram conferidos às irmãs de caridade direitos iguais aos das enfermeiras "padrão Ana Neri", desde que apresentassem atestados provando quejá contavam naquela data com seis ou mais anos de prática efetiva de enfermeira.
17. A partir da implantação do sistema nightingale nos Estados Unidos, em 1873.
18. Miss Clara Louise Kieninger, substituída em 1925por Miss Loraine Dennhardt, substituída em 1928 por Miss Bertha Lucille Pullen (Carvalho, 1976, p.l4~15e21).
19. Dr Garfield de Almeida, substituído em 1924pelo dr Thompson Motta.
20. Sua remuneração, embora acima dos salarios pagos às mulheres à época, não chegava a ser compensadora, quando comparada a dos médicos inspetores de higiene, que antes delas faziam o trabalho de visitação domiciliar (Fontenelle, 1941, p.31).
21. A nova Escola teve como patrono Carlos Chagas, criador da Escola Anna Nery, e como primeira diretora LaisNetto dosReys - ex-aluna desta Escola, e utilizava como campo de estágio um hospital da ordem de. São Vicente de Paula, em Belo Horizonte.
22. A Escola Florence Nightingale (1933), em Anápolis e a Escola de Enfermagem Cruzeiro do Sul, em Rio Verde (1937).