Volume 21, Número 2, Abr/Jun - 2017
PESQUISA
Fatores associados às práticas preventivas de quedas em idososa
Ana Carolina Macri Gaspar
1
Rosemeiry Capriata de Souza Azevedo
2
Annelita Almeida Oliveira Reiners
2
Priscila Aguiar Mendes
2
Neuber José Segri
2
1 Universidade do Estado de Mato Grosso. Tangará da Serra, MG, Brasil
2 Universidade Federal de Mato Grosso. Cuiabá, MG, Brasil
Recebido em 19/12/2016
Aprovado em 13/02/2017
Autor correspondente:
Ana Carolina Macri Gaspar
E-mail: anacarolinamacri@hotmail.com
RESUMO
OBJETIVO:
Analisar a prevalência de práticas preventivas de quedas em idosos e os
fatores associados.
MÉTODOS:
Estudo transversal com 557 idosos atendidos nas unidades de saúde da família.
A amostragem foi probabilística estratificada proporcional. Os dados foram
coletados por meio de entrevista estruturada. A variável dependente é a
prática preventiva de queda. As associações foram esti madas por meio da
regressão de Poisson com variância robusta.
RESULTADOS:
A prevalência de práticas preventivas de quedas foi de 35,7%. Após os ajustes
as variáveis que se associaram ao desfecho foram: sexo (p =
0,003), autoavaliação de saúde ótima/boa (p = 0,035),
regular (p = 0,012) e escolaridade (p =
0,039).
CONCLUSÃO:
A prevalência de práticas preventivas encontrada foi maior entre os idosos do
sexo masculino, com autoavaliação de saúde ótima/boa e regular e com 5 anos
ou mais de estudo. Esta pesquisa contribui para auxiliar o enfermeiro no
planejamento de intervenções para prevenção de quedas em idosos.
Palavras-chave: Acidentes por quedas; Prevenção de acidentes; Prevenção de doenças; Aceitação pelo paciente de cuidados de saúde
INTRODUÇÃO
A queda é considerada uma síndrome geriátrica por apresentar alta prevalência em idosos, promover alterações na sua funcionalidade global, altos índices de morbimortalidade e institucionalização.1 Além disso, é a principal etiologia de morte acidental em pessoas com mais de 65 anos.1 De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), 30% dos idosos sofrem quedas anualmente. Essa prevalência aumenta para 40% em idosos com 80 anos ou mais e 50% para os institucionalizados.1,2 Além de afetar a saúde física do idoso, causar depressão e isolamento social, as quedas provocam alterações na estrutura familiar pela necessidade de um cuidador, demanda por hospitalização ou institucionalização e traz impacto significativo para os serviços de saúde.2,3
Estudos evidenciam que algumas práticas possuem o potencial de reduzir a prevalência de quedas em idosos, como realizar exercício físico, suplementação com vitamina D e organizar o ambiente domiciliar.4,5 Outros estudos apontam as mudanças no comportamento e modo de vida dos idosos, por exemplo, evitar subir/descer escadas, caminhar lentamente, utilizar órteses de apoio quando necessário, fazer uso correto dos medicamentos, não consumir bebida alcoólica, atravessar a rua na faixa de pedestre e usar lentes corretivas.2,6
Pesquisas em países desenvolvidos têm avançado na produção de conhecimento sobre práticas preventivas de quedas entre os idosos, assim como têm investigado a adesão e engajamento dessas pessoas aos programas de prevenção de quedas.6-8
Estudo de revisão sistemática, no qual se investigou a adesão de idosos a intervenções preventivas de quedas, verificou que a participação deles varia conforme o tipo de atividade. Uma proporção de ≥ 80% aderiram à suplementação de cálcio e vitamina D, ≥ 70% aos exercícios físicos coletivos, 52% a exercícios individuais, 60 a 70% à terapia nutricional e intervenções para melhorar o conhecimento, 58 a 59% às modificações no ambiente. Nas intervenções multifatoriais, a adesão foi de ≥ 75%.7
Contudo, pesquisas têm mostrado também que, ao longo do tempo, após a implementação dessas intervenções, há redução do engajamento dos idosos às práticas preventivas de quedas. Após 12 meses, em média, somente metade dos participantes das pesquisas continua aderindo às intervenções preventivas.7 Outros estudos também evidenciam a baixa participação dos idosos em exercícios preventivos de quedas.8,9
Alguns fatores têm sido associados às práticas preventivas de quedas pelos idosos, como idade, sexo, escolaridade, nível socioeconômico, arranjo familiar, condição de saúde, alteração cognitiva, mobilidade, presença de humor depressivo, experiência anterior com a queda e o conhecimento sobre a mesma.8,10-12
Considerando que há necessidade de ampliar as investigações sobre a participação dos idosos em práticas preventivas de quedas e que, antes de propor intervenções preventivas, deve-se conhecer os fatores que estão associados a essas práticas, este estudo tem por objetivo analisar a prevalência de práticas preventivas de quedas em idosos e os fatores sociodemográficos e de saúde associados.
MÉTODOS
Estudo transversal analítico, realizado no Município de Tangará da Serra, localizado na região Sudoeste do estado de Mato Grosso (MT). A amostra do estudo foi de 557 idosos, calculada por meio de amostragem probabilística estratificada, a partir da população de 5096 idosos atendidos nas dez Unidades de Saúde da Família (USF) cadastradas no Conselho Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES). No cálculo amostral, foi considerada a fórmula para amostra de população finita com nível de confiança de 95%, erro de amostragem de 4% e frequência do fenômeno de 50%. Os estratos foram compostos pelas USF.
A seleção dos participantes em cada estrato foi aleatória, por meio de sorteio, de acordo com a proporcionalidade da população total de idosos atendidos em cada USF. Foram incluídos no estudo idosos sem alteração cognitiva avaliada pela aplicação do Mini Exame de Estado Mental (MEEM) ou sem alterações na fala e linguagem, e excluídos idosos institucionalizados. Idosos que não foram encontrados após três tentativas de busca ou, nos casos de óbito, foram substituídos realizando-se novo sorteio.
A coleta de dados foi realizada no período de fevereiro a maio de 2015, após teste piloto, por meio de entrevista com os idosos em suas residências, após assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Utilizou-se questionário estruturado com questões abertas e fechadas sobre características sociodemográficas e condições de saúde dos participantes e práticas preventivas de quedas. Para a elaboração dessas últimas, utilizou-se como referência o Relatório Global da Organização Mundial da Saúde sobre Prevenção de Quedas na Velhice.2
A variável dependente do estudo foi práticas preventivas de quedas, considerada como um grupo de atividades preventivas descritas no Relatório Global da Organização Mundial da Saúde sobre Prevenção de Quedas na Velhice2 e em uma revisão sistemática sobre intervenções de múltiplos componentes que previne quedas em idosos.5 As práticas preventivas de queda foram determinadas por perguntas sobre ações realizadas pelos idosos que previnem as quedas, sendo necessário que o idoso afirmasse realizar um conjunto de três tipos de atividades concomitantes, porém, que envolvesse pelo menos uma ação correspondente em cada um dos três domínios diferentes e específicos como: atividade física (caminhada, ginástica, pilates, exercícios, entre outros), correção de comportamentos de risco (uso de sapatos antiderrapantes, suplementação de vitamina D, evitar subir/descer escadas/banquinhos, não utilizar bebida alcoólica, ser cauteloso ao caminhar, utilizar a faixa de pedestre) e cuidados com o ambiente domiciliar (não usar tapetes nos ambientes, usar o tapete antiderrapante nos banheiros, instalar barras de apoio nos banheiros, evitar o piso molhado, não passar cera no piso, organizar os objetos no ambiente, manter o ambiente bem iluminado).
As variáveis independentes foram: fatores sociodemográficos (sexo - masculino/feminino; faixa etária - 60 a 69 anos/70 a 79 anos, 80 anos ou mais; estado civil - casado ou união estável/viúvo/separado/solteiro; anos de estudo - não estudou/1 a 3 anos de estudo/e 4 anos ou mais de estudo; arranjo familiar - sozinho/família e outros/cônjuge ou companheiro; situação ocupacional - aposentado/trabalhando/aposentado e trabalhando/não trabalha; renda individual - não possui renda/até 1 Salário Mínimo(SM)/de 2 a 3 SM/de 3 ou mais SM; renda familiar - sem renda/até 1 SM/de 1 a 3 SM/de 3 ou mais SM); condições de saúde (autoavaliação de saúde - ótima/boa/regular/ruim/péssima; uso de fumo - sim/não; uso de bebida alcoólica - sim/não; possui algum problema de saúde autorreferido - sim/não; número de problema de saúde autorreferido - nenhum/um problema/dois ou mais; alteração de visão autorreferida - sim/não; alteração da audição autorreferida - sim/não; uso de medicamento autorreferido - sim/não; queda no último ano - sim/não; humor depressivo - sim/não; dependência funcional - sim/não; medo de cair - sim/não; condição nutricional - baixo peso/eutrófico/sobrepeso.
A variável humor depressivo foi avaliada por meio da aplicação da Escala de Depressão Geriátrica Abreviada (Geriatric Depression Scale - GDS-15), instrumento que possui 15 perguntas sobre como o idoso se sente na última semana. A classificação do humor dos idosos foi: humor normal (0 a 5 pontos) e humor depressivo (6 a 15 pontos).13
A variável dependência funcional foi avaliada por meio da escala Index de Barthel, que permite avaliar atividades de vida diária e o nível de funcionalidade dos idosos (escore de 0 a 100 pontos). Neste estudo, foi classificado como idoso independente àquele que apresentou o escore igual a 100 pontos.14
A variável medo de cair foi avaliada por meio da Escala de Eficácia de Quedas (FES-1), que possui 16 perguntas sobre a preocupação do idoso com a queda ao desenvolver atividades no seu cotidiano (escores de 16 a 64 pontos). Foi considerado com medo de cair o idoso que alcançou a pontuação maior que 16 pontos.15
A variável condição nutricional foi obtida por meio do cálculo do Índice de Massa Corporal (IMC), após a mensuração do peso (uso de balança digital) e altura (fita métrica) no momento da entrevista. Os participantes foram classificados como baixo peso (IMC < 22), eutrófico (IMC = 22-27) e sobrepeso (IMC > 27).1
Os dados obtidos foram organizados em um banco com auxílio de um programa estatístico com dupla digitação para verificação de discordâncias. Foi realizada inicialmente análise descritiva por meio de tabelas com valores relativos e absolutos. Para análise bivariada, foi utilizado teste de qui-quadrado de Pearson com nível de significância de 5% para identificar associação entre a variável dependente e independente (p < 0,05). Para análise bivariada, as variáveis sociodemográficas (faixa etária, estado civil, anos de estudo, arranjo familiar, renda do idoso e renda da família) e as variáveis de condições de saúde (número de problema de saúde e sintomas depressivos) foram dicotomizadas. A variável autoavaliação de saúde foi modificada para três categorias autoavaliação ótima/boa, regular, ruim/péssima.
Foram estimadas as prevalências, as Razões de Prevalências (RP) brutas e ajustadas, bem como os respectivos intervalos de confiança (95%) das práticas preventivas de quedas. Para identificar os fatores associados às práticas preventivas de quedas, utilizou-se o modelo de regressão múltipla de Poisson com variância robusta e com método stepwise forward. Somente as variáveis que apresentaram p < 0,20, na análise bivariada, foram consideradas para a construção do modelo múltiplo final. O projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa sob parecer número 921.129 em 17 de Dezembro de 2014. A pesquisa foi desenvolvida sem financiamento.
RESULTADOS
Participaram do estudo 557 idosos atendidos nas USF do Município de Tangará da Serra, MT. A maioria dos idosos é do sexo feminino (61,8%) e possui idade entre 60 e 69 anos (50,8%). São casados (54,2%), católicos (57,6%) e a maior parte é analfabeta (42,2%). A maioria possui renda de até 1 salário mínimo (64,6%) proveniente de aposentadoria (67,7%) e renda familiar de 1 a 3 salários mínimos (65%). Cerca de 60% dos idosos moram com a família e/ou outra pessoa.
Em relação às condições de saúde dos idosos, 39,5% disseram ter caído no último ano e quase 44% avaliaram sua saúde como regular, 83,3% afirmaram fazer uso de algum tipo de medicamento, 92,1% referiram ter dois ou mais problemas de saúde, dos quais a alteração da visão (87,1%) foi a mais frequente. Aproximadamente, 10% dizem fumar e 21,7% usam bebida alcoólica.
A avaliação das condições nutricionais, de funcionalidade, de humor e de medo de cair mostrou que 47% dos idosos apresentam sobrepeso, 75,6% são independentes, 77,2% possuem humor normal e 98,2% têm medo de cair.
Neste estudo, a prevalência de práticas preventivas de quedas encontrada foi de 35,7% (IC95%: 31,7-39,7). Os resultados da análise de associação entre práticas preventivas de quedas e variáveis sociodemográficas (Tabela 1) permitiram identificar associação significativa com as variáveis: sexo (p = 0,004), renda do idoso (p = 0,039) e renda familiar (p = 0,035).
Variáveis | n | Prevalência (%) | RP bruta (IC95%) | Valor de p* |
---|---|---|---|---|
Sexo | ||||
Feminino | 107 | 31,1 | 1,00 | 0,004 |
Masculino | 092 | 43,1 | 1,38 (1,11-1,73) | |
Faixa etária | ||||
60-69 anos | 093 | 32,7 | 1,00 | 0,152 |
70 anos e mais | 106 | 38,7 | 1,17 (0,94-1,47) | |
Estado civil | ||||
Viúvo/solteiro/separado | 082 | 32,8 | 1,00 | 0,106 |
Casado/união estável | 117 | 38,7 | 1,20 (0,96-1,51) | |
Escolaridade | ||||
0 a 4 anos de estudo | 167 | 34,4 | 1,00 | 0,098 |
5 ou mais de estudo | 032 | 44,4 | 1,29 (0,96-1,72) | |
Situação ocupacional | ||||
Aposentado | 148 | 37,3 | 1,22 (0,87-1,69) | 0,649 |
Não trabalha | 029 | 30,5 | 1,00 | |
Trabalha | 013 | 33,3 | 1,09 (0,63-1,87) | |
Aposentado e trabalha | 009 | 34,6 | 1,13 (0,61-2,08) | |
Renda idoso | ||||
Até 1SM | 006 | 18,7 | 1,00 | 0,039 |
Mais de 1SM | 193 | 36,8 | 1,96 (0,94-4,07) | |
Renda familiar | ||||
Até 2SM | 040 | 28,4 | 1,00 | 0,035 |
Mais de 2SM | 159 | 38,2 | 1,34 (1,00-1,80) | |
Arranjo familiar | ||||
Sozinho | 029 | 34,5 | 1,00 | 0,803 |
Acompanhado | 170 | 36,0 | 1,04 (0,76-1,43) |
IC 95%: intervalo de 95% de confiança; RP: razão de prevalência.
* Teste de associação qui-quadrado.
A prevalência de práticas preventivas de quedas de idosos do sexo masculino foi maior que nas idosas (RP = 1,38; IC 95%: 1,11-1,73). A prevalência de práticas preventivas de quedas entre os idosos com renda familiar maior que dois SM foi 34% maior que a prevalência daqueles com renda de até dois SM. Foi encontrada também associação significativa com a renda do idoso (p = 0,039) (Tabela 1).
Quanto às variáveis de condições de saúde, encontrou-se associação significativa entre a variável dependente e as variáveis autoavaliação de saúde ótima/boa (p = 0,018), capacidade funcional (p = 0,017) e humor depressivo (p = 0,017) (Tabela 2).
Variáveis | N | Prevalência (%) | RP bruta (IC95%)* | Valor de p* |
---|---|---|---|---|
Autoavaliação de saúde | ||||
Ótima/boa | 087 | 35,4 | 1,77 (1,10-2,86) | 0,018 |
Regular | 098 | 40,0 | 1,88 (1,15-3,07) | |
Ruim/péssima | 014 | 21,2 | 1,00 | |
Problema de saúde autorreferido | ||||
Sim | 195 | 35,4 | 1,00 | 0,234 |
Não | 004 | 57,1 | 1,61 (0,84-3,09) | |
Número de problemas de saúde | ||||
Nenhum/1 problema | 009 | 24,3 | 1,00 | 0,145 |
2 ou mais problemas | 186 | 36,4 | 1,49 (0.83-2,65) | |
Alteração na visão autorreferida | ||||
Sim | 177 | 36,5 | 0,84 (0,58-1,22) | 0,326 |
Não | 022 | 30,5 | 1,00 | |
Alteração na audição autorreferida | ||||
Sim | 047 | 37,6 | 0,93 (0,72-1,21) | 0,620 |
Não | 152 | 35,2 | 1,00 | |
Uso de medicamentos | ||||
Sim | 169 | 36,4 | 0,88 (0,64-1,22) | 0,444 |
Não | 030 | 32,3 | 1,00 | |
Queda no último ano | ||||
Sim | 083 | 37,7 | 0,91 (0,73-1,14) | 0,426 |
Não | 116 | 34,4 | 1,00 | |
Medo de cair | ||||
Sim | 194 | 35,5 | 1,00 | 0,342 |
Não | 005 | 50,0 | 0,71 (0,38-1,33) | |
Capacidade funcional | ||||
Independente | 162 | 38,5 | 1,41 (1,05-1,91) | 0,017 |
Dependente | 037 | 27,2 | 1,00 | |
Humor depressivo | ||||
Sim | 034 | 26,8 | 1,00 | 0,017 |
Não | 165 | 38,4 | 1,43 (1,05-1,95) | |
Condição nutricional | ||||
Baixo peso | 015 | 24,6 | 1,00 | 0,080 |
Eutrófico | 093 | 39,7 | 1,61 (1,01-2,58) | |
Sobrepeso | 091 | 34,7 | 1,41 (0,88-2,26) | |
Uso de fumo | ||||
Sim | 013 | 24,5 | 1,00 | 0,074 |
Não | 186 | 36,9 | 1,50 (0,92-2,44) | |
Uso de bebida alcoólica | ||||
Sim | 043 | 35,5 | 1,00 | 0,961 |
Não | 156 | 35,8 | 1,00 (0,77-1,32) |
IC 95%: intervalo de 95% de confiança; RP: razão de prevalência.
* Teste de associação qui-quadrado.
Em relação às condições de saúde, idosos cuja percepção de saúde foi "ótima/boa" apresentaram prevalência de práticas preventivas de quedas 77% maior quando comparados àqueles que avaliaram sua saúde como "ruim/péssima". Naqueles que percebem sua saúde como "regular" a prevalência foi 88% maior (Tabela 2).
A prevalência de práticas preventivas de quedas dos idosos independentes é de 1,41 vezes a prevalência dos idosos que são dependentes. Entre os idosos com humor normal, a prevalência de práticas preventivas de quedas é 43% maior que a prevalência dos idosos com humor depressivo (Tabela 2).
Na análise de regressão de Poisson, foram incluídas todas as variáveis com p < 0,20 na seguinte ordem: sexo, humor depressivo, capacidade funcional, autoavaliação de saúde, renda familiar, renda do idoso, uso de fumo, condição nutricional, escolaridade, estado civil, número de problemas de saúde e faixa etária. No entanto, permaneceram no modelo final, as variáveis: sexo, autoavaliação de saúde, renda do idoso, uso de fumo, escolaridade e faixa etária.
Na Tabela 3, encontra-se o modelo múltiplo final com as seguintes variáveis significativas: sexo, autoavaliação de saúde e escolaridade, ajustado por renda, uso de fumo e faixa etária. Foi realizado teste de bondade de ajuste, mostrando que o modelo é adequado (p = 0,921).
Variáveis e categorias | RP bruta (IC95%) | RP ajustada* (IC95%) | Valor de p |
---|---|---|---|
Sexo | |||
Feminino | 1,00 | 1,00 | 0,003 |
Masculino | 1,38 (1,11-1,73) | 1,38 (1,11-1,72) | |
Autoavaliação de saúde | |||
Ótima/boa | 1,77 (1,10-2,86) | 1,66 (1,03-2,66) | 0,035 |
Regular | 1,88 (1,15-3,07) | 1,82 (1,14-2,90) | 0,012 |
Ruim/péssima | 1,00 | 1,00 | |
Renda do idoso | |||
Até 1SM | 1,00 | 1,00 | 0,110 |
Maior que 1SM | 1,96 (0,94-4,07) | 1,81 (0,87-3,76) | |
Uso de fumo | |||
Sim | 1,00 | 1,00 | 0,054 |
Não | 1,50 (0,92-2,44) | 1,59 (0,99-2,56) | |
Escolaridade | |||
0 a 4 anos de estudo | 1,00 | 1,00 | 0,039 |
5 ou mais de estudo | 1,29 (0,96-1,72) | 1,35 (1,01-1,81) | |
Faixa etária | |||
60 a 69 anos | 1,00 | 1,00 | 0,198 |
70 anos e mais | 1,17 (0,94-1,47) | 1,16 (0,92-1,46) |
IC 95%: intervalo de 95% de confiança; RP: razão de prevalência.
* Ajustada para renda, uso de fumo, faixa etária e demais variáveis da Tabela pelo método de Regressão de Poisson.
A maior prevalência de práticas preventivas de quedas foi entre os idosos do sexo masculino, que autoavaliaram sua saúde como ótima/boa e regular e com cinco anos ou mais de estudo (Tabela 3).
Os idosos do sexo masculino tiveram prevalência de práticas preventivas de quedas 38% maior quando comparados às idosas, independente das demais variáveis do modelo. A prevalência de práticas preventivas de quedas dos idosos com autoavaliação de saúde ótima/boa e regular foram, respectivamente, 66% e 82% maiores que a encontrada nos idosos com autoavaliação ruim/péssima, independente da renda, uso de fumo e faixa etária.
Nos idosos que possuem cinco anos ou mais de estudos, a prevalência de práticas preventivas de quedas é 35% maior que a dos idosos com até quatro anos de estudo, ajustado por renda, uso de fumo, faixa etária e demais variáveis do modelo de regressão.
DISCUSSÃO
A prevalência de práticas preventivas de quedas em idosos (35,7%) é um dos principais achados encontrados neste estudo. A comparação direta com os resultados de outros estudos semelhantes é difícil, uma vez que se tem conhecimento apenas das prevalências de práticas preventivas de quedas encontradas em estudos que avaliaram a participação de idosos em intervenções específicas de prevenção, por exemplo, exercícios físicos. Em comparação com esses estudos, constata-se que a prevalência desta pesquisa foi maior que a prevalência (3%) de um estudo8 e menor que em outros estudos11,16,17 - 64%, 73,1%, 59,1%, respectivamente.
Provavelmente, a menor prevalência de práticas preventivas de quedas deste estudo ocorra devido às diferenças nas populações estudadas. Neste estudo, as práticas preventivas são dependentes apenas de iniciativa própria dos idosos. Nos estudos em que a prevalência foi maior, houve a oferta de um programa estruturado de intervenções com acompanhamento e avaliação de profissionais nas atividades e, em algumas, havia a interação com outros idosos. Estudos têm mostrado que possíveis benefícios do programa, recomendações dos profissionais de saúde, suporte dos cuidadores, amigos e familiares, bem como atividades que proporcionam o convívio social e prazer, são fatores que afetam a participação de idosos em programas de prevenção de quedas.18,19
A maior prevalência de práticas preventivas de quedas nos idosos do sexo masculino encontrada neste estudo, provavelmente pode ser explicada pelo fato de que os homens idosos estão se percebendo mais vulneráveis. Isto pode significar que mais homens têm se interessado por atividades de prevenção, inclusive as de quedas.
Geralmente, as mulheres são as que mais frequentemente buscam os serviços de saúde, inclusive para prevenção de problemas de saúde.20,21 Referente às quedas, estudos têm mostrado que as idosas são mais propensas a procurar assistência médica que os homens após uma queda ou procuram mais informações sobre prevenção de quedas que os homens.21,22 Entretanto, com o avançar da idade, as diferenças de gênero para as demandas por serviços de saúde diminuem devido ao surgimento de doenças crônicas em ambos os sexos, consequentemente aumento da vulnerabilidade.23
Corroborando com o resultado deste estudo, algumas pesquisas têm mostrado que, quanto às atividades físicas, uma das práticas preventivas de quedas mais importantes, a proporção de idosos do sexo masculino que as realizam é maior do que a das idosas.24,25 As mulheres ao longo do processo de envelhecimento tendem a reduzir a prática de atividades físicas que favoreçam o crescimento de massa muscular.2 Nos programas de prevenção de quedas, tem-se encontrado também que há maior participação de homens idosos comparada à de idosas.10,11
A maior prevalência de práticas preventivas de quedas em idosos cuja autoavaliação da saúde é ótima/boa encontrada neste estudo está em consonância com pesquisas anteriores.8,11 Esse resultado sugere que a avaliação positiva que os idosos fazem de sua saúde motiva-os a adotar comportamentos saudáveis, como a realização das práticas preventivas de quedas.
A autoavaliação de saúde é um indicador utilizado para verificar a saúde das populações. A maioria das pessoas acima de 60 anos autoavalia sua saúde como ótima, boa ou regular.25 Quando ela é positiva, indica que o idoso possui autonomia, mobilidade e capacidade funcional preservadas, assim como o desejo de manter-se ativo e independente em suas atividades diárias,26 condições importantes para o desenvolvimento de práticas preventivas de quedas.
A maior prevalência de práticas preventivas de quedas entre os idosos com autoavaliação de saúde regular é similar à encontrada em outro estudo27 e pode indicar que mesmo os idosos com percepção "insatisfatória" de sua saúde preocupam-se em desenvolver comportamentos saudáveis. Pode ser que esses idosos tenham o objetivo de melhorar ou ainda manter sua saúde e autonomia ao prevenir as quedas.
Por outro lado, idosos interpretam o processo de envelhecimento e o adoecimento de forma distinta. Por se considerarem saudáveis, idosos com autoavaliação de saúde ótima/boa e regular podem não se perceber em risco para quedas e assim não adotar comportamentos de prevenção.28
Semelhante aos achados de outros estudos,8,11,27 os idosos com maior nível de escolaridade praticam mais atividades preventivas de quedas como neste estudo. Isto pode ser explicado pela possibilidade que pessoas de melhor escolaridade têm de adquirir informações além de poder entendê-las melhor.
A escolaridade pode ser considerada como um dos determinantes sociais de saúde e pode influenciar a busca por saúde, bem como hábitos de vida das pessoas.29 Nos indivíduos com maior escolaridade, a aquisição de conhecimento e a compreensão das orientações dos profissionais no cuidado com sua saúde podem tornar-se mais fáceis, levando-os a adotar comportamentos saudáveis.30
No caso das quedas, estudos mostram que o conhecimento dos idosos sobre esse evento, suas consequências e fatores de risco influenciam na realização de práticas preventivas.12,18 Idosos com maior escolaridade tendem a buscar as redes de cuidado, como também adquirir informações que auxiliem na prevenção de quedas.2
Uma limitação deste estudo é que a prevalência das práticas preventivas de quedas encontrada foi analisada com base em atividades que os idosos referem realizar no dia a dia, mas que nem sempre são aplicadas com a motivação de prevenir as quedas. Contudo, são atividades eficazes para a prevenção de quedas em idosos comprovadas por estudos.4,5
CONCLUSÃO
Neste estudo, a prevalência de práticas preventivas de quedas em idosos foi de 35,7%. Os fatores sociodemográficos e de saúde associados às práticas preventivas de quedas foram sexo, escolaridade e autoavaliação de saúde. Observou-se maior prevalência de práticas preventivas de quedas em idosos do sexo masculino, com maior nível de escolaridade e com autoavaliação de saúde ótima/boa e regular. É importante desenvolver propostas de intervenção para prevenção das quedas principalmente aos idosos do sexo feminino, com autoavaliação de saúde ruim/péssima e com baixa escolaridade.
REFERÊNCIAS
a Extraído da dissertação "Práticas preventivas de quedas realizadas por idosos das unidades de saúde da família e fatores associados", Programa de Pós-graduação em Enfermagem - Mestrado em Enfermagem da Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Mato Grosso, Brasil, 2016.