Volume 21, Número 1, Jan/Mar - 2017
PESQUISA
Alterações nos pés do idoso hospitalizado: um olhar cuidadoso da
enfermagem
Joziane Santos da Silva
1
Fátima Helena do Espírito Santo
1
Carla Lube de Pinho Chibante
1
1 Universidade Federal Fluminense. Niterói, RJ, Brasil
Recebido em 21/07/2016
Aprovado em 24/10/2016
Autor correspondente:
Fátima Helena do Espírito Santo
E-mail: fatahelen@hotmail.com
RESUMO
OBJETIVOS:
Caracterizar o perfil podológico de idosos hospitalizados nas enfermarias de
um hospital universitário; identificar as demandas de cuidados com os pés de
pacientes idosos hospitalizados; e analisar as possibilidades de atuação do
enfermeiro junto a esses idosos.
MÉTODOS:
Abordagem quantitativa, exploratória-descritiva. Realizada com 40 idosos
hospitalizados, mediante aplicação de um instrumento abordando questões
sobre exame físico dos pés e teste de sensibilidade utilizando Monofilamento
de Semmes-Weistein de 10g, submetidos à análise estatística simples.
RESULTADOS:
Identificou-se que 32 (80%) idosos tinham pele ressecada, 30 (75%)
sensibilidade diminuída, presença de calosidade em 27 (67,5%), câimbras em
22 (55%) e Hálux Valgus em 20 (50%).
CONCLUSÃO:
Os profissionais de saúde precisam reconhecer as demandas da população idosa,
incluindo os cuidados com os pés, já que alterações podais podem causar dor
e desconforto capazes de interferir no dia a dia dos idosos, gerando riscos
para agravar o adoecimento e contribuir para a incapacidade deles.
Palavras-chave: Pé; Idoso; Hospitalização; Cuidados de Enfermagem; Enfermagem Geriátrica
INTRODUÇÃO
O envelhecimento populacional continua em expansão no mundo. Para países em desenvolvimento, como o Brasil, esse evento representa cada vez mais desafios tanto na área social, quanto na econômica. Com o processo de transição demográfica, ocorre também a transição epidemiológica que agrega três mudanças básicas: substituição das doenças transmissíveis pelas Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNTs) e causas externas, dentre as primeiras causas de morte; o deslocamento da maior carga de morbimortalidade dos mais jovens para os mais idosos e a mudança da predominância da mortalidade para a predominância de morbidade.1
Doenças crônicas têm relação estreita com complicações nos pés e, como exemplo, destaca-se o Diabetes Mellitus (DM) que afeta 19,9% das pessoas de 65 a 74 anos de idade e o câncer que atinge 9,4% das pessoas de 60 a 74 anos.2
O DM tem como uma de suas principais complicações o pé diabético, responsável por grande número das hospitalizações e por contribuir para o desenvolvimento do processo de incapacidade e dependência.3 Já o câncer traz como uma das consequências do seu tratamento quimioterápico a Síndrome mão-pé que pode levar a um desconforto capaz de afetar as Atividades de Vida Diária (AVD) do paciente.4
Assim, as alterações podais podem interferir na execução das AVD, contribuindo para o desenvolvimento de incapacidades no indivíduo idoso, já que são capazes de provocar dor e desconforto, intervindo negativamente na postura e na marcha. A dor nos pés afeta entre 20% a 30% dos idosos que vivem na comunidade e está associada com o decréscimo na habilidade para executar atividades de vida diária, problemas com equilíbrio e, na marcha, aumentando o risco de quedas.5
As alterações nos pés são decorrentes de transtornos da marcha, traumatismos e maus tratos aos pés que comprometem a integridade das unhas, da pele, dos nervos e da estrutura óssea. Porém, diante de complicações como o "Pé diabético" e a "Síndrome mão-pé", é possível afirmar que os pés podem apresentar também complicações agudas ou crônicas decorrentes de DCNTs.6
Estudos já realizados identificaram que os problemas nos pés afetam, significativamente, a qualidade de vida da população idosa. Pesquisa publicada em 2014, que teve como objetivo verificar as características dos problemas com os pés em 50 idosos pertencentes à área de abrangência de uma Unidade de Saúde da Família em um município no interior do estado de São Paulo constatou alterações nos pulsos, unhas compridas, deformadas e grossas, pele seca e com hiperqueratose, diminuição da sensibilidade dolorosa e vibratória, além de dor nos pés que limitavam as atividades cotidianas em 70% dos idosos do referido estudo.7
Além de dor, incômodo, instabilidade postural e transtornos na marcha, as alterações podais, especialmente as que trazem deformidades mais evidentes, podem contribuir para o isolamento social, culminando em declínio funcional desses idosos, trazendo prejuízo na qualidade de vida dos mesmos.8
Diante disso, a avaliação podiátrica e o conhecimento dos profissionais de saúde acerca das características e alterações nos pés de idosos pode favorecer a implementação de intervenções adequadas e orientações para o autocuidado, visando prevenir a ocorrência de desfechos de alto custo psicológico, social e econômico que refletem diretamente na perda da independência de indivíduos idosos.
Assim, estratégias educativas como o uso de cartilhas e implementação de protocolos podem contribuir para minimização do problema por permitir acesso as informações que favorecem a avaliação e prevenção de problemas nos pés e a instalação de incapacidades e complicações decorrentes das mesmas.
Nesse sentido, considerando que as alterações nos pés dos idosos são causadas pelo próprio processo de envelhecimento, mas tendem a se agravar quando associadas as doenças crônicas tais como diabetes, osteoartrites, artrites, osteoporose e sobrepeso, além de hábitos do uso de calçados inadequados e déficit de cuidado com os pés é necessário uma avaliação cuidadosa do idoso, principalmente, no contexto da hospitalização, quando ele está mais vulnerável física e emocionalmente, para identificar, avaliar e prevenir possíveis alterações nos seus pés que além de aumentar o risco de quedas, podem repercutir no seu tratamento e na promoção da sua recuperação no que concerne a sua independência, autonomia e capacidade funcional.
Os objetivos deste estudo foram: caracterizar o perfil podológico de idosos hospitalizados em enfermarias de clínica médica e cirúrgica de um hospital universitário; identificar as demandas de cuidado com os pés de pacientes idosos hospitalizados; e analisar as possibilidades de atuação do enfermeiro junto a esses idosos.
MÉTODOS
Trata-se de uma pesquisa descritiva exploratória com abordagem quantitativa. Foi realizada em um hospital universitário localizado no estado do Rio de Janeiro, nas enfermarias de Clínica Médica e Cirúrgica, masculina e feminina.
Participaram da pesquisa 40 idosos internados nas referidas clínicas tendo como critérios de inclusão: idosos hospitalizados a partir de 60 anos, de ambos os sexos e com algum tipo de deformidade nos pés. E como critérios de exclusão: idosos que foram transferidos e/ou receberam alta hospitalar no período da coleta de dados.
Esta pesquisa faz parte do projeto Hospitalização do idoso: perspectivas de intervenção do enfermeiro no processo de cuidado, aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa - CEP da instituição sob o parecer nº 996.459 de 03 de outubro de 2014, baseado na Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012 do Conselho Nacional de Saúde (CNS) que normatiza as pesquisas envolvendo seres humanos.
Antes do início da coleta de dados, a pesquisadora se apresentou as enfermeiras responsáveis pelas respectivas unidades, formalizando sua presença e solicitando autorização para a realização do estudo. Todos os participantes foram orientados quanto aos objetivos e possíveis benefícios da pesquisa e quanto à assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
A produção dos dados ocorreu no período de julho a agosto de 2015 mediante aplicação de um questionário elaborado pela própria pesquisadora. O instrumento abordava questões sociodemográficas, histórico sobre os problemas de saúde desses idosos que poderiam estar relacionadas às alterações nos pés; exame físico dos pés que inclui, entre outros pontos, a palpação dos pulsos, alterações nas unhas (onicoses), presença de edemas, alterações na pele (ressecamento, fissuras, descamação); e teste de sensibilidade utilizando Monofilamento de Semmes-Weistein de 10g onde a avaliadora inspecionava dez pontos específicos nos pés (um na região dorsal e nove na região plantar).
Para investigar a frequência de incapacidade funcional associada às dores nos pés, foi utilizado o Manchester Foot Pain and Disability Index (MFPDI) - índice de Manchester de incapacidade associada ao pé doloroso no idoso. O MFPDI desenvolvido por Garrow e colaboradores e publicado no ano de 2000, é um instrumento específico para identificar e avaliar o nível de incapacidade como resultado das dores nos pés. A tradução, adaptação cultural e validação para a língua portuguesa foi feita por Ferrari e colaboradores e publicada em 2008.6
Para a etapa de organização dos dados, as fichas foram numeradas de acordo com a data de coleta em ordem crescente e classificadas conforme o sexo dos idosos. Os dados sociodemográficos, assim como os dados da aplicação do Índice de Manchester foram dispostos por características em tabela elaborada no Microsoft Office Word. Já os dados relacionados às doenças prevalentes e alterações e sintomas podais foram dispostos em uma planilha e apresentados em gráficos elaborados tipo Excel e, em seguida, tratados por meio de análise estatística simples.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Participaram do estudo 40 idosos, sendo 24 (60%) do sexo feminino e 16 (40%) do sexo masculino. A idade dos participantes variou de 60 a 93 anos, com média etária de 69,5 anos. Esse número é superior ao obtido no estudo realizado na instituição com 20 idosos, cuja média de idade foi de 68,9 anos.9
Com relação à distribuição por idade, constatou-se predominância da faixa etária de 60 a 69 anos, o que corrobora com os dados do estudo que verificou a associação entre pé doloroso e a incapacidade funcional em 114 idosos em um ambulatório de geriatria de um hospital universitário, que também obteve essa mesma faixa etária predominante. Essa faixa etária merece ser destacada como alvo de novas abordagens de promoção da saúde dos pés.10
Dentre os idosos do estudo, a maioria era do sexo feminino, o que é compatível com a literatura referente ao processo de "feminização do envelhecimento".11
Em relação ao estado civil quatro (10%) idosos eram solteiros, 18 (45%) casados, 12 (30%) viúvos, três (7,5%) divorciados e três (7,5%) vivem com companheiro (a). Destaca-se que os 12 idosos viúvos eram do sexo feminino, o que corresponde a 50% do total das mulheres do estudo, enquanto entre os homens houve predominância dos casados com 12 idosos (75% do total de homens).
A porcentagem de idosos casados foi inferior ao estudo realizado com 121 idosos atendidos em um ambulatório de geriatria de um hospital universitário,12 sendo encontrada taxa superior a 51% de idosos casados. Já a porcentagem de idosos solteiros foi próxima à obtida no referido estudo, que obteve 10,7% de idosos solteiros. Para o estado civil "viúvo" os dados deste estudo estiveram superior em apenas 1,9%, já que a porcentagem de idosos viúvos no referido estudo foi de 28,1%. Em muitos casos, esses idosos viúvos acabam ficando sozinhos e culminando no agravo dos problemas relacionados à solidão e abandono que podem incidir em agravamento dos seus problemas crônicos.
Quanto à escolaridade dos idosos, quatro (10%) eram analfabetos, 18 (45%) ensino fundamental incompleto, dois (5%) ensino fundamental completo e 16 (40%) ensino médio completo. Assim, neste estudo, constata-se que 22 (55%) idosos estão entre analfabetos e os que não completaram o ensino fundamental, evidenciando baixa escolaridade nesse grupo de estudo. As porcentagens diferem das encontradas em estudo realizado no mesmo hospital universitário, que obteve como resultados seis (30%) analfabetos, quatro (20%) com ensino fundamental completo, um (5%) com ensino médio incompleto, dois (10%) com ensino médio completo, seis (30%) com ensino superior incompleto e um (5%) com ensino superior completo.9
A baixa escolaridade representa um fator agravante para o aparecimento de complicações relacionadas às doenças crônicas como o Diabetes Mellitus, devido ao acesso limitado às informações, pouca habilidade com a leitura e para compreensão do autocuidado, haja vista, que a educação, como via de prevenção, pode reduzir a atenção primária até 50% das amputações relacionadas ao diabetes.13
Quanto à fonte de renda, 24 idosos (60%) aposentados, oito (20%) pensionistas, cinco (12,5%) não possuem renda própria sendo dependentes economicamente da família (esposo, irmãos e/ou filhos) e três (7,5%) autônomos. Esses dados contrastam com os resultados da pesquisa realizada na instituição realizada com 20 idosos, em que 16 (80%) eram aposentados e quatro (20%) não possuíam renda.9
No presente estudo, 28 (70%) idosos possuíam renda entre um e dois salários mínimos, oito (20%) recebiam de dois a cinco salários e quatro (10%) vivem com menos de um salário mínimo ou não possuem renda. Esses dados podem repercutir diretamente na condição de vida desses idosos que, em muitos casos, se encontram em classes sociais de pobreza ou extrema pobreza e, muitas vezes, são mantenedores de famílias.
Já é comprovada a forte associação entre idosos de baixa renda com pior condição de saúde e dificuldade de acesso aos serviços de saúde com sua situação econômica denotando a necessidade de medidas de suporte para que estes possam ser acompanhados nas instituições de saúde de forma integral com vistas a prevenção de agravos e tratamento de doenças, a maioria de natureza crônica, que requer uso contínuo de medicamentos e orientações para o autocuidado, envolvendo seus familiares que compõem a rede de suporte a essas pessoas.14
Em relação à companhia de outra pessoa no domicílio dos participantes do estudo, cinco (12,5%) idosos residem sozinhos, 11 (27,5%) com o cônjuge, 23 (57,5%) com a família e um (2,5%) com acompanhante. Corroborando com esses resultados, pesquisa realizada na instituição do estudo envolvendo 20 idosos, constatou que dez (50%) idosos residiam com a família.9
O fato dos idosos morarem com a família pode ser um fator protetor para ele.15 Porém, nesta pesquisa não foi possível afirmar que o fato de os idosos morarem com a família acontece porque eles necessitam de ajuda ou porque a família depende economicamente dos mesmos, uma vez que muitos desses idosos contribuem significativamente com as despesas familiares.
Quanto à religião, 20 (50%) idosos se declararam evangélicos, 13 (32,5%) católicos, três (7,5%) se dividem em outras religiões (umbanda, espiritismo e racionalismo) e quatro (10%) declararam não ter religião.
A religião e a espiritualidade podem auxiliar no enfrentamento de eventos considerados, frequentemente, estressores como a perda de entes queridos, a aposentadoria (que em muitos casos tem caráter negativo), a presença de doenças crônicas e a hospitalização, dentre outros.16
A Tabela 1 mostra as características sociodemográficas dos idosos.
Variáveis | Homens (16) | Mulheres (24) | Total (40) | |||
---|---|---|---|---|---|---|
N | % | N | % | N | % | |
Idade | ||||||
60 a 69 | 9 | 56,2 | 13 | 54,2 | 22 | 55 |
70 a 79 | 5 | 31,2 | 9 | 37,5 | 14 | 35 |
80 ou mais | 2 | 12,5 | 2 | 8,3 | 4 | 10 |
Estado Civil | ||||||
Solteiro | 0 | 0 | 4 | 16,6 | 4 | 10 |
Casado | 12 | 75 | 6 | 25 | 18 | 45 |
Viúvo | 0 | 0 | 12 | 50 | 12 | 30 |
Divorciado | 3 | 18,7 | 0 | 0 | 3 | 7,5 |
Com companheiro | 1 | 6,2 | 2 | 8,3 | 3 | 7,5 |
Religião | ||||||
Evangélico | 7 | 43,7 | 13 | 54,2 | 20 | 50 |
Católico | 6 | 37,5 | 7 | 29,2 | 13 | 32,5 |
Outras | 1 | 6,3 | 2 | 8,3 | 3 | 7,5 |
Não tem religião | 2 | 12,5 | 2 | 8,3 | 4 | 10 |
Escolaridade | ||||||
Analfabeto | 3 | 18,7 | 1 | 4,1 | 4 | 10 |
Fundamental Completo | 1 | 6,2 | 1 | 4,1 | 2 | 5 |
Fundamental Incompleto | 4 | 25 | 14 | 58,3 | 18 | 45 |
Ensino Médio Completo | 8 | 50 | 8 | 33,3 | 16 | 40 |
Fonte de renda | ||||||
Aposentado | 12 | 75 | 12 | 50 | 24 | 60 |
Pensionista | 0 | 0 | 8 | 33,3 | 8 | 20 |
Autônomo | 3 | 18,7 | 0 | 0 | 3 | 7,5 |
Sem renda | 1 | 6,3 | 4 | 16,7 | 5 | 12,5 |
Mora com | ||||||
Sozinho | 1 | 6,2 | 4 | 16,6 | 5 | 12,5 |
Com cônjuge | 8 | 50 | 3 | 12,5 | 11 | 27,5 |
Com a família | 6 | 37,5 | 17 | 70,8 | 23 | 57,5 |
Com acompanhante | 1 | 6,2 | 0 | 0 | 1 | 2,5 |
Quanto aos problemas de saúde encontrados entre os idosos do estudo, constatou-se que 27 (67,5%) tinham Hipertensão Arterial, 18 (45%) Osteoartrose, 14 (45%) Câncer, 12 (30%) Diabetes Mellitus, 12 (30%) Osteoporose, 11 (27,5%) Doenças Cardiovasculares e 7 (17,5%) Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica, conforme ilustrado no Gráfico 1.
Tais dados são próximos aos encontrados em outro estudo realizado na instituição9 que identificou como doenças prevalentes a Hipertensão Arterial em 15 idosos (75%), oito (40%) com Diabetes Mellitus, cinco (25%) com Doenças Respiratórias Crônicas e dois (10%) com Doenças Cardiovasculares.
As alterações podais dos idosos do estudo, dispostas no Gráfico 2, mostram taxas de frequência iguais ou superiores a 50% para ressecamento da pele dos pés, presente em 32 idosos (80%), sensibilidade diminuída em 30 idosos (75%), presença de calosidade em 27 (67,5%), câimbras em 22 (55%) e Hálux Valgus em 20 idosos (50%). Vale ressaltar que no período de coleta de dados, dois idosos (12,5%), do sexo masculino, passaram por amputação distal de membros inferiores em decorrência de complicações do DM e de Doença Arterial Obstrutiva Periférica (DAOP).
Tais resultados são superiores aos obtidos em estudo realizado com 50 idosos em uma Unidade de Saúde da Família de um município do interior paulista,7 em que foi constatado que 38 (76%) dos idosos apresentaram calosidade, 29 (58%) apresentavam pele seca, 20 (40%) apresentavam sensibilidade diminuída e dez (20%) Hálux Valgus.
As doenças podológicas, quando associadas com as sistêmicas como DM, doença vascular periférica e neuropatia periférica, reduzem o desempenho da deambulação ou, até mesmo, o ato de ficar em pé. Entretanto, os problemas nos pés, como hálux valgus, calos, calosidades, onicoses, deformidades nas articulações, que podem causar dor e alterações na marcha, comuns na população idosa, podem ser tratados e/ou corrigidos, minimizando a instabilidade e, consequentemente, o risco de quedas.17,18
Neste estudo, quando os idosos foram questionados se sentiam dor nos pés, 18 idosas (75% do total de mulheres) responderam que sim, enquanto apenas quatro idosos (25% do total de homens) corroboraram com a mesma resposta. Porém, ao aplicar o índice de Manchester foi possível identificar que as dores nos pés interferiram no dia a dia de todos os idosos. A média geral do índice de Manchester entre homens e mulheres foi de 20,1 pontos, sendo nas mulheres 21,5 pontos e entre os homens de 17,9.
Em um estudo que realizou o levantamento de problemas nos pés dos idosos de uma comunidade na Austrália utilizando o MFPDI, identificou média de 14 pontos, em que as mulheres obtiveram maiores pontuações, assim como observado neste estudo. Além disso, dentre as alterações podais o Hálux Valgus também foi identificado em 18 (17%) dos idosos.19
Com a aplicação do índice de Manchester constatou-se que, por causa das dores nos pés, mais de 50% das mulheres idosas evitavam caminhar longas distâncias, andar em superfícies ásperas ou irregulares, ficar de pé por muito tempo, tendendo a ficar irritadas quando os pés doem e preocupadas em relação aos pés e aos sapatos que precisavam usar. Já no grupo dos homens, mais de 50% dos idosos evitavam caminhar em superfícies ásperas e irregulares, ficam irritados quando os pés doem e preocupados em relação aos pés e aos sapatos que precisam usar.
Um estudo prospectivo que avaliou a dor nos pés e a sua incapacidade mostrou que o surgimento da incapacidade relacionada à dor no pé foi mais frequentemente associado com a dificuldade em andar longas distâncias e ficar em pé por muito tempo. Essa incapacidade aumentou com a idade, especialmente em idosos do sexo feminino.20
As mulheres desenvolvem e relatam mais problemas nos pés do que os homens. Isso pode ser atribuído à influência dos calçados de salto alto e bico fino, que aumentam a chance de desenvolvimento de problemas nos pés com o avanço da idade. Outro aspecto é a tolerância à dor. As mulheres relatam mais as dores que os homens e, consequentemente, procuram mais os serviços de saúde.21
O uso de calçados inadequados também é comum entre os idosos, assim como entre adultos jovens. A população mais jovem usa calçados inadequados por modismo e estética, a despeito do conforto, da segurança e, em longo prazo, dos danos causados aos pés. Contrária à população mais jovem, os idosos tendem a usar calçados inadequados, principalmente, porque buscam conforto, ainda que em prejuízo à segurança.
Todos os idosos do estudo apontaram como tipos de calçados mais utilizados os chinelos ou sandálias rasteiras. Uma pesquisa17 identificou que a maioria das mulheres idosas fizeram uso de calçados inadequados no decorrer da vida e hoje, muitas vezes, utilizam chinelos por serem mais confortáveis e práticos. Porém, estes não devem ser usados constantemente, pois não suportam adequadamente os pés, resultando assim, em uma postura e um caminhar instável, sendo associados ao aumento da incidência de quedas nessa faixa etária.
Quando os idosos foram questionados se frequentavam ou não serviços de podologia e por qual motivo, dois (5%) responderam que frequentavam por estética e outro por indicação médica, oito (20%) disseram que não frequentavam porque não achavam necessário e 21 (52,5%) porque não tinham condições financeiras, oito (20%) idosos relataram não ter conhecimentos sobre o assunto.
Esses achados também foram observados em outro estudo,19 em que foi identificado que uma pequena proporção da amostra de idosos procuravam serviços de podologia (13%), e as razões mais comuns eram que eles não consideravam como sendo graves o suficiente seus problemas nos pés. Além disso, questões de acessibilidade e condições financeiras também foram relatadas em outra pesquisa sobre o autocuidado com os pés em idosos.22
Nesse contexto, destaca-se a relevância do enfermeiro gerontólogo, podiatra e/ou podólogo como profissional integrante da equipe de saúde pública tendo em vista que os idosos necessitam de ajuda profissional de especialistas em saúde do pé e carecem de acesso garantido ao tratamento podológico.10
As alterações podais são, potencialmente, modificáveis por meio de prevenção, tratamento e reabilitação. Portanto, ofertar esse atendimento de maneira gratuita, pode evitar complicações que acarretam custos futuros em virtude da falta de assistência na origem dos problemas.7
Mesmo com a prevalência de alterações podais em idosos e de seus prejuízos à qualidade de vida dos mesmos, muitas vezes, esses problemas não são percebidos, já que muitos idosos consideram estes como uma condição inevitável associada ao processo de envelhecimento.10
O enfermeiro, como profissional responsável pelo cuidado técnico-científico, deve fortalecer os vínculos com esses pacientes, realizando exame físico criterioso que possa elucidar possíveis riscos para o desenvolvimento de problemas nos pés e ainda estar capacitado para assistir a esses problemas na sua base, evitando maiores complicações e diminuindo as demandas futuras de cuidado entre esses pacientes.
Dentro e fora do ambiente hospitalar, uma abordagem multidisciplinar e intersetorial entre os diferentes profissionais ligados à saúde pública, podem propor ferramentas de controle e prevenção. Nessa ótica, enfermeiros podiatras e/ou gerontólogos podem auxiliar na elaboração de cartilhas educativas que podem subsidiar o autocuidado do idoso com os seus pés, assim como auxiliar os demais integrantes da equipe de saúde quanto aos riscos à saúde e necessidades desses pacientes.
CONCLUSÃO
O desenvolvimento deste trabalho se deu a partir da necessidade de conhecer o perfil podológico de idosos hospitalizados para subsidiar estratégias de cuidados dos profissionais de enfermagem, visando a elaboração e implantação de estratégias e ferramentas educativas, como cartilhas, para incorporar no âmbito assistencial um olhar mais criterioso para integralização do cuidado às demandas do idoso frente ao processo de envelhecimento, instalação de doenças crônicas e riscos à integridade dos pés de idosos, que repercutem diretamente na sua autonomia, independência e capacidade funcional, com aumento da incidência de quedas entre os mesmos.
Constatou-se que todos os idosos participantes do estudo tinham alguma forma de alteração podal que interfere no seu dia a dia, gerando riscos para o agravamento de doenças e de restrições à mobilidade desses sujeitos. Além disso, apesar da frequência das alterações nos pés, muitos idosos continuam com práticas incorretas em relação aos mesmos, como o uso de calçados inadequados, a falta de hidratação da pele e a busca pela "maquiagem" dos problemas nos pés, postergando a busca por tratamento. Isto denota a falta de orientação desses idosos em relação aos problemas que afetam sua saúde e qualidade de vida.
Ressalta-se a relevância de um profissional capacitado para os cuidados com os pés, especialmente, na área de gerontologia, onde se verifica número significativo de alterações podais. A relevância do cuidado com os pés dos idosos confirma-se também pelas declarações de melhoria na qualidade de vida daqueles que frequentam um serviço especializado, já que estes mostraram-se mais orientados em relação ao autocuidado com os pés e relataram diminuição das alterações podais e das dores nos pés.
São necessários ações de promoção da saúde voltadas para esse público, em particular. Ações educativas com orientações que alcancem o entendimento desse grupo podem ser efetivas e o enfermeiro, ao conhecer as particularidades desses idosos, pode desenvolver papel fundamental na equipe de saúde, disseminando informações e promovendo uma assistência mais qualificada que atenda às demandas e necessidades de saúde desses pacientes.
Dentre as demandas de cuidado que precisam estar na discussão multidisciplinar e intersetorial das ações de serviços gerontológicos, está a feminização do envelhecimento e a dificuldade alegada por esses idosos na busca pelo serviço podológico gratuito.
Destaca-se ainda, a necessidade de uma abordagem integral da pessoa idosa nas unidades de saúde, com implementação de um programa de orientações para o autocuidado aliado a estratégias que favoreçam o incentivo às mudanças no estilo de vida e adoção de hábitos saudáveis demandando suporte e orientações contínuas dos profissionais de saúde, principalmente, do enfermeiro elemento fundamental na elaboração e implementação de uma assistência segura e individualizada nos serviços de saúde, mediante uma avaliação cuidadosa na perspectiva da prevenção de agravos, recuperação e manutenção da saúde da pessoa idosa.
Os enfermeiros enquanto responsáveis pelo cuidado ao idoso precisam estar capacitados para conhecer as suas demandas de saúde, incluindo o cuidado com os pés. Por ser um dos mais envolvidos no processo de cuidar, o enfermeiro deve abordar os aspectos gerontológicos de maneira holística e promover o autocuidado de seus pacientes, por meio de uma escuta sensível e conhecimento científico da saúde do paciente sob seus cuidados.
Assim, recomenda-se outros estudos que abordem essa temática, visando uma assistência integral e qualificada as necessidades e demandas do idoso na perspectiva da promoção, recuperação e manutenção da saúde, tendo como referência uma avaliação baseada nos princípios da gerontologia que incidem na preservação da autonomia, independência e capacidade funcional da pessoa idosa nas instituições de saúde.
REFERÊNCIAS