Volume 20, Número 1, Jan/Mar - 2016
PESQUISA
Contribuições da equipe de saúde visando à promoção da
segurança do paciente no cuidado intensivo
Ana Paula Minuzzi
1
Nádia Chiodelli Salum
1
Melissa Orlandi Honório Locks
1
Lúcia Nazareth Amante
1
Eliane Matos
1
1 Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis-SC, Brasil
Recebido em 30/06/2015
Aprovado em 24/12/2015
Autor correspondente:
Ana Paula Minuzzi
E-mail:
annaminuzzi@yahoo.com.br
RESUMO
OBJETIVO:
Apresentar as recomendações dos profissionais de saúde de uma Unidade de
Terapia Intensiva para a melhoria da cultura de segurança do paciente.
MÉTODOS:
É um estudo descritivo-exploratório, com abordagem quantitativa, resultado da
aplicação do questionário Pesquisa Sobre Segurança do Paciente em Hospitais
com 59 profissionais da equipe, entre novembro de 2013 e janeiro de
2014.
RESULTADOS:
Obteve-se 124 recomendações que foram categorizadas de acordo com os aspectos
do instrumento. Destacando-se recomendações relacionadas ao apoio da gestão
hospitalar para a segurança do paciente, em especial, ao suprimento de
recursos materiais; e também ao aprendizado organizacional e melhoria
contínua, com sugestões de treinamentos e implementação de protocolos,
visando à padronização da assistência.
CONCLUSÃO:
O estudo permitiu elencar expressivas recomendações de melhorias da segurança
do paciente, e possibilitou identificar as dimensões da cultura de segurança
que apresentam mais vulnerabilidades.
Palavras-chave: Cultura; Segurança do Paciente; Unidades de Terapia Intensiva
INTRODUÇÃO
O movimento em busca de segurança e qualidade nos serviços de saúde tem ocupado posição de destaque em nível mundial. Apesar de não ser um assunto novo, em nenhuma outra época houve tantas publicações sobre essa temática como no século XXI.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) já tem esse tema como prioridade desde 2002, porém, em 2004, deu-se maior ênfase a partir da criação da Aliança Mundial para a Segurança do Paciente1. Em 2008, destaca-se o pioneirismo e a preocupação da enfermagem no que tange a segurança do Paciente, que se expressa por meio da Rede Brasileira de Enfermagem e Segurança do Paciente, com o objetivo de fortalecer a assistência de enfermagem segura e com qualidade2. Atualmente, evidencia-se a criação do Programa Nacional de Segurança do Paciente, no ano de 2013, revelando-se uma importante ação governamental para a segurança do paciente no Brasil1.
Com vistas a facilitar a compreensão do presente estudo, apresenta-se a definição de importantes termos relacionados à segurança do paciente. Assim, evento adverso é definido pela OMS como um incidente que resulta em danos não propositados, decorrentes da assistência, e que não possui relação à evolução natural da doença de base do paciente. Enquanto que erro é reconhecido como sendo a falha em executar um plano de ação, conforme pretendido3.
Ainda de acordo com a OMS, segurança do paciente é a "redução do risco de danos desnecessários associados aos cuidados de saúde a um mínimo aceitável"3:15. A partir desse conceito infere-se que é dever de toda instituição de saúde, reduzir a probabilidade da ocorrência de agravos aos pacientes, provenientes da prestação de assistência à saúde.
Nesse contexto, destaca-se a cultura de segurança, na qual o foco está na correção dos processos de trabalho, por meio da adoção de um modelo de assistência baseado no princípio não punitivo, com a intenção de prevenir a recorrência de eventos indesejáveis, defendendo que, na maioria das vezes, os erros são consequências de uma sequência de eventos e não de um único ato isolado.
A cultura de segurança pode ser definida como sendo atitudes e valores incorporados que devem encorajar e recompensar a identificação, a notificação e a resolução dos problemas relacionados à segurança; promover o aprendizado organizacional a partir da ocorrência de incidentes; e proporcionar recursos, estrutura e responsabilização para a manutenção efetiva da segurança4.
A segurança do cuidado prestado é um dos indicadores de maior impacto na qualidade da assistência à saúde. Não há como proporcionar uma assistência médico-hospitalar de qualidade, se esta não for realizada de maneira segura.
Dentre os diferentes cenários de assistência à saúde, destaca-se a Unidade de Terapia Intensiva (UTI), como sendo um local onde os eventos adversos (EA) merecem uma atenção especial. As UTI são reconhecidas como setores vulneráveis à ocorrência de erros e EA, tendo em vista que o cuidado ao paciente crítico é prestado de maneira rápida, envolvendo alta tecnologia e diversos procedimentos, com produção intensa de informações5.
Diversos estudos nacionais6,7,8 e internacionais9,10,11 também apontaram a cultura de segurança do paciente sob a óptica dos profissionais de distintos ambientes, nos quais se presta assistência em saúde, cada qual apresentando resultados de acordo com suas respectivas realidades.
Estudos internacionais têm se concentrado em medir os danos e compreender as causas dos eventos adversos. A realização, dessas pesquisas, tem sido muito maior nos países desenvolvidos, do que nos países em desenvolvimento2. Em termos de Brasil, dentre os diversos estudos publicados, no que tange a segurança do paciente, alguns também tem abordado a avaliação da cultura de segurança do paciente6,7,8,12. Essas pesquisas apresentam resultados que a médio e longo prazo, ajudam a nortear os rumos das políticas de segurança e, consequentemente, aperfeiçoar a segurança do paciente nas diversas instituições de saúde2.
Com vistas à melhoria da segurança do paciente é imprescindível permitir que os profissionais manifestem suas opiniões em relação à cultura de segurança do paciente. Conhecer e avaliar a cultura de segurança institucional permite identificar as possíveis fragilidades no processo e suas potencialidades, bem como sensibilizar os profissionais sobre a temática9.
Para tanto, torna-se relevante a realização de um diagnóstico do ambiente de trabalho, a partir da percepção dos próprios profissionais envolvidos no processo, possibilitando que identifiquem as possíveis áreas de melhorias, com vistas a realizar um levantamento das ocorrências, para o adequado planejamento de uma assistência segura. Para tanto, objetivou-se neste estudo, apresentar as recomendações dos profissionais de saúde em uma Unidade de Terapia Intensiva para a melhoria da cultura de segurança do paciente.
MÉTODOS
Trata-se de um estudo descritivo-exploratório com abordagem quantitativa, realizado na UTI de um hospital geral público, de médio porte, de nível terciário de complexidade para atendimento de adultos, referência em neurotraumatologia no estado, situado no sul do País.
Quanto aos critérios de inclusão, definiram-se os profissionais de saúde de ambos os sexos que estiveram atuando nessa UTI durante o período da coleta de dados, prestando assistência direta aos pacientes e que possuíam um tempo de atuação nessa unidade de no mínimo seis meses. Como critério de exclusão, definiu-se não incluir os profissionais que se encontravam afastados do trabalho no período de coleta de dados por motivos de licença para tratamentos de saúde, gestação ou férias. Nesses critérios, 67 profissionais da equipe de saúde estavam aptos a participar da pesquisa. Dos quais 59 responderam ao questionário e desses, 41 contribuíram com recomendações de melhorias.
A coleta de dados ocorreu no período de novembro de 2013 a janeiro de 2014 e deu-se por meio da aplicação de uma versão, traduzida e validada para o Brasil, do questionário Pesquisa sobre Segurança do Paciente em Hospitais (HSOPSC)12. Trata-se de um questionário com perguntas fechadas e abertas que abrangem as dimensões da cultura de segurança do paciente e que possibilita identificar os aspectos positivos e as áreas que necessitam de melhorias.
O instrumento foi constituído por variáveis sociodemográficas, e por 12 dimensões da cultura de segurança do paciente que se subdividem em: variáveis de dimensão da cultura de segurança no âmbito da unidade (trabalho em equipe na unidade, expectativas e ações de promoção da segurança do paciente do supervisor/gerente, aprendizado organizacional e melhoria contínua, feedback e comunicação a respeito de erros, abertura para as comunicações, pessoal e respostas não punitivas aos erros); variáveis de dimensão da cultura de segurança no âmbito da organização hospitalar (apoio da gestão hospitalar para a segurança do paciente, trabalho em equipe entre as unidades hospitalares, transferências internas e passagens de plantão); e variáveis de resultado (percepção geral de segurança do paciente e frequência de eventos relatados)12.
Esse questionário continha também uma questão aberta, a qual solicitava ao sujeito que citasse três recomendações para melhorar a segurança do paciente na UTI em questão. Assim, o presente estudo explora e descreve as recomendações apontadas pelos profissionais respondentes, acerca da melhoria da segurança do paciente, de acordo com as 12 dimensões da cultura de segurança do paciente.
Para realização da coleta de dados, os profissionais da equipe de saúde foram convidados; e ao concordarem em participar da pesquisa, assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. O questionário foi aplicado pela pesquisadora, que oportunizou lugar calmo e reservado para o preenchimento, a fim de que se garantisse o anonimato dos respondentes. A devolução do instrumento deu-se por meio da disponibilização de uma urna identificada e lacrada, que permaneceu na sala da chefia de enfermagem da UTI até o término da pesquisa.
A partir da leitura das informações contidas nos questionários procedeu-se o agrupamento dessas recomendações por similaridade, de acordo com as 12 dimensões da cultura de segurança, anteriormente citadas. Os dados coletados foram inseridos em planilha no programa Excel® for Windows® e, posteriormente, foi calculada a frequência em termos absolutos e percentuais de cada dimensão. Foram realizadas análises descritivas dos dados. Com relação aos dados sociodemográficos, estes também foram analisados por meio de estatística descritiva.
Para a apreciação dos dados, no intuito de preservar o anonimato dos participantes, foi realizado agrupamento das categorias profissionais em que houve apenas dois respondentes. Sendo assim, formaram-se três subgrupos: enfermeiros; médicos e fisioterapeutas; e técnicos e auxiliares de enfermagem.
Os aspectos éticos da pesquisa foram respeitados com base nas diretrizes da Resolução nº 466 de 12 de dezembro de 2012, do Conselho Nacional de Saúde13, sendo aprovado pelos Comitês de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da UFSC, sob o parecer n. 388.522/2013, em 09 de setembro de 2013; e do Hospital em estudo sob o parecer 2013/0027, em 11 de novembro de 2013.
RESULTADOS
Dos 41 respondentes, dois eram auxiliares de enfermagem (4,87%), nove enfermeiros (21,95%), dois fisioterapeutas (4,87%), 11 médicos (26,82%) e 17 técnicos de enfermagem (41,46%), representantes da equipe multidisciplinar da UTI, que foram agrupados em três subgrupos, conforme descrito anteriormente.
Quanto às características sociodemográficas dos profissionais da equipe de saúde, os resultados obtidos são apresentados na Tabela 1.
Dados Sociodemográficos | Enfermeiros (9) | Médicos e Fisioterapeutas (13) | Técnicos e Auxiliares de enfermagem (19) | Total (41) |
Faixa Etária | ||||
Até 20 anos | 0 | 0 | 1 (5,26%) | 1 (2,43%) |
21 a 30 anos | 1 (11,11%) | 2 (15,38%) | 4 (21,05%) | 7 (17,07%) |
31 a 40 anos | 5 (55,55%) | 5 (38,46%) | 10 (52,63%) | 20 (48,78%) |
41 a 50 anos | 1 (11,11%) | 4 (30,76%) | 2 (10,52%) | 7 (17,07%) |
> 50 anos | 2 (22,22%) | 2 (15,38%) | 2 (10,52%) | 6 (14,63%) |
Sexo | ||||
Feminino | 7 (77,77%) | 7 (53,84%) | 15 (78,94%) | 29 (70,73%) |
Masculino | 2 (22,22%) | 6 (46,15%) | 4 (21,05%) | 12 (29,26%) |
Tempo de trabalho no hospital | ||||
Menos de 1 ano | 2 (22,22%) | 4 (30,76%) | 7 (36,84%) | 13 (31,70%) |
1 a 5 anos | 1 (11,11%) | 3 (23,07%) | 1 (5,26%) | 5 (12,19%) |
6 a 10 anos | 2 (22,22%) | 2 (15,38%) | 8 (42,10%) | 12 (29,26%) |
11 a 15 anos | 1 (9,99%) | 0 | 0 | 1 (2,43%) |
16 a 20 anos | 1 (9,99%) | 2 (15,38%) | 2 (10,52%) | 5 (12,19%) |
> 21 anos | 2 (22,22%) | 2 (15,38%) | 1 (5,26%) | 5 (12,19%) |
Tempo de trabalho na UTI | ||||
Menos de 1 ano | 2 (22,22%) | 5 (38,46%) | 7 (36,84%) | 14 (34,14%) |
1 a 5 anos | 2 (22,22%) | 2 (15,38%) | 3 (15,78%) | 7 (17,07%) |
6 a 10 anos | 2 (22,22%) | 2 (15,38%) | 8 (42,10%) | 12 (29,26%) |
11 a 15 anos | 0 | 0 | 0 | 0 |
16 a 20 anos | 1 (11,11%) | 2 (15,38%) | 1 (5,26%) | 4 (9,75%) |
> 21 anos | 2 (22,22%) | 2 (15,38%) | 0 | 4 (9,75%) |
Carga horária semanal | ||||
< 30 h/semana | 1 (9,99%) | 7 (53,84%) | 2 (10,52%) | 10 (24,39%) |
De 30-40 h/sem | 6 (66,66%) | 2 (15,38%) | 12 (63,15%) | 20 (48,78%) |
De 40-60 h/sem | 1 (9,99%) | 4 (30,76%) | 5 (26,31%) | 10 (24,39%) |
> 60 h/semana | 1 (9,99%) | 0 | 0 | 1 (2,43%) |
Tempo de trabalho na profissão | ||||
1 a 5 anos | 2 (22,22%) | 3 (23,07%) | 4 (21,05%) | 9 (21,95%) |
6 a 10 anos | 3 (33,33%) | 3 (23,07%) | 5 (26,31%) | 11 (26,82%) |
11 a 15 anos | 1 (9,99%) | 1 (7,69%) | 5 (26,31%) | 7 (17,07%) |
16 a 20 anos | 0 | 3 (23,07%) | 3 (15,78%) | 6 (14,63%) |
> 21 anos | 3 (33,33%) | 3 (23,07%) | 2 (10,52%) | 8 (19,51%) |
Grau de Instrução | ||||
2º grau comp. | 0 | 0 | 10 (52,63%) | 10 (24,39%) |
Superior incom. | 0 | 0 | 4 (21,05%) | 4 (9,75%) |
Superior comp. | 1 (11,11%) | 2 (15,38%) | 3 (15,78%) | 6 (14,63%) |
Pós-graduação | 8 (88,88%) | 11 (84,61%) | 2 (10,52%) | 21 (51,21%) |
Vínculos empregatícios | ||||
1 vínculo | 4 (44,44%) | 2 (15,38%) | 13 (68,42%) | 19 (46,34%) |
2 vínculos | 3 (33,33%) | 5 (38,46%) | 6 (31,57%) | 14 (34,14%) |
3 ou mais vínc. | 2 (22,22%) | 6 (46,15%) | 0 | 8 (19,51%) |
Os resultados apontam para o perfil de profissionais com destaque para a faixa etária entre 31 e 40 anos, com predominância do sexo feminino nos três subgrupos. Em relação ao tempo de trabalho no hospital, e tempo de atuação na UTI, constata-se que aproximadamente um terço tem menos de um ano de atuação na instituição e também no setor de cuidados intensivos.
Com relação ao tempo de trabalho na profissão, tem-se uma predominância de profissionais com 6 a 10 anos de experiência profissional. Prevalecem os profissionais com carga horária de trabalho entre 30 e 40 horas na instituição; com apenas um vínculo empregatício; e grau de escolaridade superior com pós-graduação.
No que tange as recomendações dos profissionais, a partir da leitura e organização das respostas, obteve-se um total de 124 recomendações visando melhorar a segurança do paciente na UTI. Essas foram categorizadas entre as 12 dimensões da cultura de segurança do paciente, conforme seguem descritas nos Quadros 1, 2 e 3.
Dimensão | Recomendações | Nº de citações | Total de citações N - (%) |
Aprendizado organizacional e melhoria contínua | - Realizar capacitações periódicas sobre segurança do paciente; | 13 | 25 (20,16%) |
- Elaborar e implementar protocolos operacionais padrão e check list para a padronização de rotinas; | 7 | ||
- Aprimorar o treinamento aos funcionários novos, com responsabilização dos enfermeiros no repasse das rotinas do setor; | 3 | ||
- Elaborar manual sobre segurança do paciente; | 1 | ||
- Corrigir práticas inadequadas no serviço, evitando sua adoção por profissionais recém-admitidos. | 1 | ||
Pessoal | - Ampliar o quantitativo de profissionais; | 7 | 15 (12,10%) |
- Reduzir a carga horária semanal de trabalho; | 2 | ||
- Evitar jornadas de plantão inferiores à 6 horas e superiores à 12 horas ininterruptas; | 2 | ||
- Reduzir a rotatividade dos profissionais; | 1 | ||
- Melhorar a remuneração salarial dos profissionais; | 1 | ||
- Promover igualdade de direitos e deveres entre os profissionais; | 1 | ||
- Criar normativas que regulem o comportamento dos profissionais no ambiente de trabalho. | 1 | ||
Abertura para comunicações | - Intensificar a comunicação/diálogo entre a equipe; | 4 | 10 (8,06%) |
- Realizar reuniões periódicas com toda a equipe; | 3 | ||
- Promover discussões interdisciplinares de casos clínicos; | 2 | ||
- Realizar discussões sobre os EA e sobre as situações de risco para a segurança do paciente. | 1 | ||
Trabalho em equipe na unidade | - Comprometer-se com a equipe, cooperar, ter responsabilidade e respeito entre os profissionais; | 4 | 09 (7,26%) |
- Melhorar as relações hierárquicas internamente na enfermagem; | 2 | ||
- Promover uma boa comunicação entre os profissionais e um clima bom no ambiente de trabalho; | 2 | ||
- Assegurar, através da supervisão a implementação dos cuidados prescritos pelo enfermeiro. | 1 | ||
Expectativas e ações de promoção da segurança do paciente do supervisor/gerente | - Ampliar a supervisão dos enfermeiros e da chefia de enfermagem à equipe técnica; | 2 | 07 (5,65%) |
- Elogiar e valorizar os profissionais que se preocupam com a segurança do paciente; | 2 | ||
- Estar apto para assumir o cargo de supervisor; | 1 | ||
- Repassar as orientações quanto às normas e rotinas aos demais profissionais; | 1 | ||
- Apoiar a implementação de medidas voltadas à segurança do paciente. | 1 | ||
Feedback e comunicação | - Comunicar os eventos adversos; | 1 | 02 (1,61%) |
- Realizar feedback das ocorrências. | 1 | ||
Respostas não punitivas ao erro | - Não punir os profissionais em virtude da notificação de eventos adversos. | 2 | 02 (1,61%) |
Dimensão | Recomendações | Nº de citações | Total de citações N - (%) |
Apoio da gestão hospitalar para a segurança do paciente | - Melhorar as condições de trabalho, disponibilizando material permanente e de consumo com qualidade adequada e em quantidade suficiente; | 10 | 28 (22,58%) |
- Disponibilizar leitos hospitalares que garantam a segurança dos pacientes; | 8 | ||
- Trocar das bombas de infusão utilizadas por modelo de melhor qualidade e segurança para os pacientes; | 3 | ||
- Promover manutenção periódica dos equipamentos; | 1 | ||
- Adquirir macas de transporte mais seguras; | 1 | ||
- Criar comissão multidisciplinar de segurança do paciente na UTI; | 1 | ||
- Ampliar a distância entre os leitos na unidade; | 1 | ||
- Viabilizar a manipulação e o preparo de medicações diretamente no box do paciente; | 1 | ||
- Capacitar permanentemente os profissionais que ocupam cargos de chefia, direção e gerência; | 1 | ||
- Aproximar a direção hospitalar à UTI, a fim de se familiarizar com os problemas da unidade. | 1 | ||
Transferências internas e passagem de plantão | - Realizar uma passagem de plantão de qualidade; | 3 | 06 (4,83%) |
- Prover cuidados seguros na transferência de pacientes entre os setores; | 2 | ||
- Realizar a passagem de plantão dos técnicos de enfermagem em conjunto com os enfermeiros. | 1 | ||
Trabalho em equipe entre as unidades | - Não houve recomendações. | -- | 0 |
Dimensão | Recomendações | Nº de citações | Total de citações N - (%) |
Percepção geral da segurança do paciente | - Atentar para as cinco certezas na administração de medicamentos, observando o horário, diluição e tempo de infusão destes; | 2 | 14 (11,29%) |
- Realizar procedimentos seguros ao paciente; | 1 | ||
- Ter como foco principal o paciente e não o servidor; | 1 | ||
- Tomar medidas de segurança com base em evidências e com o apoio da gerência; | 1 | ||
- Conscientizar os profissionais quanto à exposição do paciente à contaminação; | 1 | ||
- Cuidar da higienização e limpeza do ambiente, com atenção especiais para o box do paciente; | 1 | ||
- Manter cuidados como a troca de luvas e higienização das mãos na retirada da urina, a cada paciente; | 1 | ||
- Realizar mudança de decúbito nos horários indicados; | 1 | ||
- Realizar a aspiração traqueal do paciente sempre que necessário; | 1 | ||
- Padronizar a obrigatoriedade de manter as grades dos leitos elevadas; | 1 | ||
- Estabelecer protocolo para pacientes em desmame de ventilação mecânica; | 1 | ||
- Estabelecer critérios de higienização de pacientes politraumatizados e/ou com hipertensão intracraniana; | 1 | ||
- Reduzir o fluxo de visitantes no hospital. | 1 | ||
Frequência de eventos relatados | - Elaborar impresso de comunicação de eventos adversos: claro, específico e de fácil preenchimento; | 3 | 06 (4,84) |
- Estimular e orientar equipe multidisciplinar para a notificação de eventos adversos; | 2 | ||
- Notificar todos os eventos adversos ocorridos na UTI. | 1 |
O Quadro 1 apresenta as recomendações no âmbito da unidade, distribuídas em sete dimensões, com destaque para aquelas relativas à dimensão aprendizado organizacional e melhoria contínua, seguido da dimensão pessoal.
No Quadro 2 estão descritas as recomendações da equipe de saúde no âmbito do hospital, que se distribuem em três dimensões, apresentando expressivo número de sugestões para a dimensão apoio da gestão hospitalar para a segurança do paciente.
Por último, o Quadro 3 descreve as recomendações no âmbito de resultados da cultura de segurança, que se apresentam em duas dimensões, com ênfase nas sugestões relativas à dimensão percepção geral da segurança do paciente.
DISCUSSÃO
A análise dos resultados, quanto ao perfil dos participantes, demonstra um contingente de profissionais jovens/maduros, com predominância do sexo feminino nas diferentes categorias. Em relação ao tempo de trabalho no hospital e tempo de atuação na UTI constata-se que aproximadamente um terço da equipe é nova na instituição e da mesma forma na UTI, o que leva a crer que a admissão desses profissionais se deu diretamente nessa unidade.
Relacionando esses dados ao tempo de trabalho na profissão, tem-se um período superior, o que indica certa experiência profissional, muito relevante em setores de tratamento intensivo. A maioria dos profissionais possui apenas um vínculo empregatício e, talvez, por isso realizam uma jornada maior de horas de trabalho semanal. Em termos de grau de instrução, há destaque para o elevado número de profissionais com pós-graduação, denotando uma equipe que busca a formação além da exigência do seu cargo.
No que se referem às recomendações que objetivam a segurança do paciente, os participantes do estudo apontam um elevado número de sugestões. Na análise dessas, destaca-se a predominância de recomendações relacionadas às dimensões: apoio da gestão hospitalar para a segurança do paciente, aprendizado organizacional e melhoria contínua, pessoal e percepção geral da segurança do paciente.
Algo que merece ênfase nos resultados encontrados é o fato de que muitas das recomendações apresentadas pelos profissionais são relacionadas a preceitos científicos e éticos da profissão e que, portanto, deveriam estar implícitos na prestação da assistência à saúde.
Demonstra-se no estudo, na dimensão apoio da gestão hospitalar para a segurança do paciente, a relevância que os participantes dão às condições de trabalho, à disponibilização em quantidade e qualidade do material permanente e de consumo, bem como a necessidade de readequar o espaço físico da UTI, quando se trata de segurança do paciente. Dados dessa natureza aparecem em outro estudo, que trata sobre o tema, em que os profissionais, também, sugerem a necessidade de melhoria da quantidade, qualidade e manutenção de materiais e equipamentos e melhoria da estrutura física do ambiente de trabalho7.
Dentre as características que têm sido elencadas como primordiais para que uma cultura de segurança seja eficaz, destaca-se, inicialmente, o engajamento e o apoio dos líderes e gestores, pois há o entendimento de que a cultura começa com a liderança14. Nesse sentido, acredita-se que o envolvimento dos gestores com as situações cotidianas, conhecendo as dificuldades que os profissionais enfrentam, diariamente, cria um canal de comunicação mais efetivo na resolução dos problemas e na busca pela segurança do paciente.
Na dimensão aprendizado organizacional e melhoria contínua, as expressivas recomendações de treinamentos e capacitações periódicas sobre segurança do paciente, e a adoção de protocolos e check list, visando à padronização da assistência à saúde, tem respaldo na literatura científica. Assegurar e garantir a utilização de protocolos que padronizem a assistência em saúde são elementos fundamentais para qualidade dos serviços15. A utilização de barreiras físicas e administrativas de defesa tende a interceptar o erro e bloquear a trajetória de um incidente.
Quanto à dimensão pessoal, os respondentes sugerem a ampliação do quantitativo de profissionais, a redução da sobrecarga de trabalho e a diminuição da carga horária semanal. Essa condição tem estado presente em diversos estudos que tratam do processo de trabalho em saúde e da segurança do paciente9,10,16. O dimensionamento adequado de pessoal representa um importante indicador de segurança do paciente.
Sobre esse aspecto, estudo realizado na Índia, com 175 médicos e 60 enfermeiros concluiu que do ponto de vista de 76% dos entrevistados, a sobrecarga de trabalho é uma importante justificativa para a ocorrência de EA, e que há necessidade de dimensionamento adequado dos profissionais que trabalham na assistência à saúde10.
Em relação à percepção geral da segurança do paciente, a equipe de saúde expôs as mais diversas recomendações voltadas aos procedimentos e aos processos de trabalho, com vistas à prevenção e a redução dos EA. Indicando a compreensão de que os EA têm origem em múltiplos fatores e, portanto, exigem medidas diversas. Nesse sentido, as sugestões foram desde a tomada de atitudes voltadas à padronização de procedimentos, à implementação de técnicas e rotinas básicas da assistência, e até mesmo a conscientização e o comprometimento da equipe na prestação de um cuidado seguro.
Essa concepção dos participantes do estudo vai ao encontro de pesquisas5,16 que abordam a segurança do paciente como um grande desafio e defendem que a causa dos erros e EA são multifatoriais e que os profissionais de saúde estão suscetíveis a cometer erros, quando os processos técnicos e organizacionais são complexos e mal planejados. Nesse sentido, o entendimento de que sistemas falham e permitem que as falhas dos profissionais se tornem EA, possibilita a organização hospitalar rever os seus processos e reforçar suas barreiras de defesa17.
Quanto às recomendações relacionadas às expectativas e ações de promoção da segurança do paciente dos supervisores/gerentes, os profissionais remetem à necessidade de ampliação da supervisão e orientação da chefia à equipe técnica, o preparo desta para assumir o cargo e a importância da chefia, promover o reconhecimento aos profissionais que executam suas atividades tendo em vista à segurança do paciente.
O incentivo, o exemplo e o elogio são recursos fundamentais que a chefia pode utilizar a fim de promover a segurança do paciente. Pois esta, além de funcionar como canal de comunicação entre hierarquias superiores e profissionais da linha de frente e vice-versa, pode exercer importante atuação junto às equipes, demonstrando atitudes voltadas para a segurança do paciente e incentivando o cuidado seguro16.
Quanto à dimensão trabalho em equipe na unidade, foram elencadas recomendações que sugerem a necessidade de ampliar o comprometimento, cooperação, responsabilidade e respeito entre os membros da equipe, observar a hierarquia, promover uma boa comunicação entre os profissionais e, consequentemente, um clima bom no ambiente de trabalho.
Corroborando com essa percepção, um estudo realizado em Taiwan com 788 profissionais, apontou que o fato dos profissionais sentirem-se respeitados no seu local de trabalho, torna-os mais propensos a cooperar com seus colegas para o bom andamento do trabalho18. Um clima harmonioso entre a equipe de saúde é primordial para que o atendimento ao paciente seja satisfatório. Se os profissionais se sentem importantes e respeitados na equipe, tendem a prestar um cuidado de qualidade.
Na dimensão abertura para comunicações, ocorreram sugestões para a melhoria do diálogo entre a equipe de saúde; para a promoção da interdisciplinaridade, por meio de reuniões com as diferentes categorias profissionais da UTI; e ainda para a realização de encontros entre essa equipe, com o intuito de discutir casos clínicos dos pacientes da UTI.
Nesse aspecto, apresenta-se um ponto positivo, pois é relevante que os profissionais atuem pró-ativamente e que percebam que há abertura para colaborar com suas observações, ideias e sugestões. Uma linguagem clara, estruturada e com técnicas corretas de comunicação é essencial para a promoção de uma cultura de segurança do paciente14.
Houve poucas recomendações quanto à dimensão feedback e comunicação a respeito dos erros e estas foram relativas à importância dessa comunicação, bem como do retorno quanto as medidas tomadas. Em um estudo realizado no Líbano foi possível identificar que a ampliação de feedback, levou ao aumento na comunicação de EA11. Promover feedback e criar laços de confiança entre os membros da equipe é uma importante propriedade da cultura de segurança7.
Ademais, o trabalho em equipe sobre o erro pode ser uma alternativa para modificar e transformar o erro em oportunidade de discutir e desenvolver o pensar crítico sobre as ações de cuidado e as atitudes do profissional frente ao próprio erro e ao erro do colega, a fim de impedir novos eventos relacionados a mesma causa6.
A dimensão respostas não punitivas aos erros também apresentou um número diminuto de recomendações. A cultura punitiva bloqueia a comunicação dos erros e, consequentemente, impede que o processo seja revisto e que barreiras sejam instituídas. Na assistência em saúde há uma tendência a perceber o erro como uma irregularidade, em que a solução reside na culpa e vergonha do indivíduo que supostamente cometeu a falha, a fim de garantir que o erro não volte a acontecer10.
Paradoxalmente, essa abordagem não apenas desencoraja os profissionais a relatar os EA, mas desvia a atenção das melhorias sistêmicas, que podem de fato reduzir os incidentes relacionados à assistência à saúde10.
A dimensão do trabalho em equipe entre as unidades, embora não tenha recebido nenhuma recomendação de melhoria, é um aspecto que, na avaliação da equipe de saúde dessa UTI, apresenta fragilidades, tais como a falta de respeito, coordenação e cooperação entre os profissionais, pré-requisitos básicos para a execução do trabalho em equipe e do cuidado seguro.
Achados semelhantes foram apresentados em um estudo, que utilizou esse mesmo instrumento e foi aplicado em uma realidade semelhante, assinalando à necessidade de intervenções, visando melhorar a comunicação e o relacionamento entre as equipes nos diferentes setores do hospital7. É essencial promover uma boa interação entre os diferentes setores do hospital, com vistas à prestação de uma assistência segura e de qualidade ao paciente.
Alguns profissionais demonstraram preocupação com a dimensão que aborda as transferências internas e passagem plantão. Corroborando com essa percepção, outro estudo aponta que problemas relacionados as transferência e as passagens de plantão estão significativamente associados ao aumento na ocorrência de eventos adversos11. Quando se trabalha com distintos turnos de trabalho, e diferentes unidades hospitalares, o repasse adequado das informações relativas aos pacientes em cuidados intensivos são essenciais na continuidade de uma assistência segura.
Apresenta-se ainda a frequência de eventos relatados, onde foi apontada a necessidade de estímulo às notificações de EA, e dentre as sugestões, a readequação do instrumento atual de forma a torná-lo mais prático e dinâmico. Um estudo realizado em um hospital da Arábia Saudita identificou que a ampliação do feedback e a comunicação a respeito dos erros aumentam a adesão dos profissionais a relatarem os eventos adversos11. Nesse sentido, há uma necessidade de instigar os profissionais de saúde a relatar os EA, tendo em vista o impacto positivo dessa atitude na melhoria da segurança do paciente. Tal medida pode se dar, entre outras maneiras, a partir da reformulação do formulário de notificação.
Ao fim dessa análise, infere-se que é fundamental abrir espaço às colocações dos profissionais, expondo suas opiniões e preocupações no que se refere à segurança do paciente. Dessa forma, possibilitando o diagnóstico das fragilidades, bem como elencando as recomendações de ações voltadas à promoção da segurança do paciente nessa UTI, visando melhorias no cenário atual, no sentido de oferecer condições dignas e seguras a quem recebe os cuidados e ao cuidador.
CONCLUSÕES E IMPLICAÇÕES PARA A PRÁTICA
Os resultados obtidos neste estudo permitiram elencar expressivas recomendações para a melhoria da cultura de segurança do paciente, na perspectiva da equipe de saúde de uma UTI.
A categorização dessas recomendações possibilitou identificar as áreas que apresentam mais fragilidades e, por conseguinte, necessitam de um olhar mais atento, como é o caso da dimensão apoio da gestão hospitalar para a segurança do paciente, com sugestões de melhorias nas condições de trabalho, no material disponibilizado e no espaço físico; e da dimensão aprendizado organizacional e melhoria contínua, com propostas de capacitações sobre o tema, adoção de protocolos e check list, visando à padronização da assistência.
Na sequência, houve também destaque para a dimensão pessoal, com a indicação de ampliação do quadro de pessoal, redução da sobrecarga e da jornada semanal de trabalho; e para a dimensão percepção geral da segurança do paciente, com diversas recomendações relacionadas aos procedimentos e a processos de trabalho voltados à segurança do paciente.
Há que se apontar que este estudo apresenta uma realidade contextualizada, inviabilizando a generalização dos dados apontados. Assim sendo, recomenda-se novas pesquisas, que enumerem sugestões de outras realidades, de acordo com suas áreas de força e áreas com potencial de melhorias, possibilitando assim, nortear as ações e cuidados voltados às respectivas especificidades.
Por fim, há o entendimento de que a formação de uma cultura de segurança do paciente envolve o engajamento de toda a instituição, partindo dos problemas, na busca pelas respectivas soluções, propiciando um ambiente onde os profissionais sintam-se empoderados a participar, colaborando com suas sugestões e identificando, assim, a necessidade de rever o processo, em prol de uma assistência segura. Dessa forma, direcionando as ações e atitudes dos profissionais a fim de induzir mudanças comportamentais desejáveis, tendo em vista à cultura de segurança do paciente.
REFERÊNCIAS