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CAPES

Volume 19, Número 2, Abr/Jun - 2015



DOI: 10.5935/1414-8145.20150030

PESQUISA

Correlação entre carga de trabalho de enfermagem e gravidade dos pacientes críticos gerais, neurológicos e cardiológicos

Ellen Maria Pires Siqueira 1
Mariana Davies Ribeiro 1
Regina Claudia Silva Souza 1
Fernanda de Souza Machado 1
Solange Diccini 2


1 Hospital Sírio Libanês. São Paulo - SP, Brasil
2 Universidade Federal de São Paulo. São Paulo - SP, Brasil

Recebido em 23/05/2014
Aprovado em 25/02/2015

Autor Correspondente:
Mariana Davies Ribeiro
E-mail: davies_epm@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Correlacionar gravidade do paciente e carga de trabalho da equipe de enfermagem, utilizando os índices Simplified Acute Psysiology Score (SAPS3) e Nursing Activities Score (NAS) e compará-los entre três subgrupos: cardiológicos, neurológicos e gerais.
MÉTODOS: Coorte prospectivo, em uma Unidade de Terapia Intensiva de hospital privado de São Paulo, entre agosto a outubro de 2011.
RESULTADOS: Foram acompanhados 195 pacientes, 57,9% do sexo masculino, mediana de idade 69 anos. Correlação moderada entre NAS e SAPS3 no subgrupo neurológico (p = 0,02; r = 0,430). SAPS3 do subgrupo geral foi maior comparado ao subgrupo neurológico (p = 0,002). O NAS foi maior no subgrupo geral quando comparado ao subgrupo cardiológico (p = 0,001).
CONCLUSÃO: Houve correlação moderada entre a gravidade de pacientes neurológicos e a carga de trabalho de enfermagem. A gravidade e a carga de trabalho de enfermagem no subgrupo de pacientes gerais foram maiores em relação aos pacientes neurológicos e cardiológicos, respectivamente.


Palavras-chave: Índice de gravidade de doença; Carga de trabalho; Enfermagem; Unidades de terapia intensiva.

INTRODUÇÃO

A carga de trabalho de enfermagem tem sido, mundialmente, discutida nas instituições hospitalares, em razão de suas implicações na qualidade da assistência aos pacientes. Nas unidades de terapia intensiva (UTI), a preocupação é crescente, devido ao impacto das novas tecnologias no cuidado, da mudança do perfil dos pacientes graves e da necessidade de mão de obra especializada1.

A utilização de índices prognósticos e indicadores podem auxiliar na alocação de equipamentos e pessoal, além de descrever a gravidade da população atendida nas UTI2.

O sistema prognóstico SAPS3 (Simplified Acute Physiology Score 3) foi recentemente desenvolvido em coorte mundial3. As variáveis são divididas em variáveis demográficas, razões pela admissão na UTI e variáveis fisiológicas. Para cada uma das variáveis analisadas confere-se um peso, conforme a gravidade do distúrbio fisiológico. Na teoria, o menor valor atribuído pelo escore é 16 e o maior é 217 pontos. Além disso, é útil para quantificar os desarranjos fisiológicos agudos e crônicos durante a admissão, estimando a mortalidade com o objetivo de corrigir os erros e melhorar o desempenho das UTI2.

O trabalho de enfermagem é constituído pelo tempo despendido pela equipe de enfermagem para realizar as atividades de sua responsabilidade, relacionadas direta ou indiretamente ao atendimento do paciente. Essas atividades sofrem a interferência do grau de dependência do paciente, da complexidade da doença, das características da instituição, dos processos de trabalho, da planta física e do perfil dos profissionais da equipe4.

A carga de trabalho de enfermagem também abrange outros fatores que englobam a educação em enfermagem (acompanhamento de estudantes, treinamento de funcionários) e trabalhos organizacionais e administrativos5. Dessa forma, a carga de trabalho de enfermagem resulta das necessidades a serem atendidas em relação ao pessoal de enfermagem disponível para satisfazê-las, que acaba por traduzir em tempo de assistência6.

Os instrumentos que servem para medir a carga de trabalho de enfermagem foram desenvolvidos em diferentes países, com a intenção de facilitar a prática clínica do enfermeiro de acordo com a demanda do pacientes, em relação ao tamanho da equipe de enfermagem necessária e a análise de custo da unidade7. Entre estes, destaca-se o Nursing Activities Score (NAS), validado em 99 UTI localizadas em 15 diferentes países8. A pontuação final obtida pelo NAS, a partir da análise de 23 intervenções de enfermagem, expressa a porcentagem de tempo gasto por enfermeiro, por turno na assistência direta ao paciente e, desta forma, contribui para a adequação da equipe de enfermagem nas UTI em relação à demanda do paciente por cuidados intensivos8. Os resultados das investigações mostraram que as variáveis demográficas e clínicas, como tempo de permanência na UTI, a mortalidade, a gravidade da doença, a idade do paciente, o tipo de admissão e intervenções cirúrgicas, analisados pelo Therapeutic Intervention Scoring System (TISS-28), são fatores associados com a carga de trabalho elevada da equipe de enfermagem em outras situações clínicas5.

Ao avaliar o trabalho de enfermagem relacionado à gravidade do paciente, alguns autores descrevem que o NAS de admissão foi associado ao maior tempo de permanência na UTI8,9. Além disso, houve associação entre mortalidade e NAS, evidenciando que os pacientes não sobreviventes resultaram em maior carga de trabalho de enfermagem10.

No sentido de alocar adequadamente os recursos humanos em UTI, priorizando a qualidade e a segurança da assistência, surge a necessidade de relacionar a carga de trabalho de enfermagem e a gravidade dos pacientes graves. Assim, o objetivo desse estudo foi correlacionar a gravidade do paciente com a carga de trabalho da equipe de enfermagem, utilizando os índices SAPS3 e NAS, respectivamente, e compará-los entre três subgrupos de pacientes: cardiológicos, neurológicos e clinico cirúrgicos gerais.

MÉTODO

Estudo de coorte prospectivo, cujos dados foram coletados na UTI de um hospital geral particular localizado na região central do Município de São Paulo, Brasil. A unidade possui 40 leitos subdivididos em quatro áreas destinadas ao atendimento de pacientes clinico cirúrgicos gerais, cardiológicos e neurológicos, sendo a equipe de enfermagem composta por 63 enfermeiros e 107 técnicos de enfermagem. A coleta de dados ocorreu nos meses de agosto a outubro de 2011 e foi iniciada após aprovação do comitê de ética em pesquisa do referido hospital (2011-09) e da assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido pelo responsável legal do paciente.

A amostra por conveniência foi constituída por pacientes admitidos no período do estudo, com idade igual ou superior a 18 anos, com primeira internação na unidade no período da coleta de dados e com período de internação superior a 24 horas. Foram considerados como critérios de perda de seguimento os pacientes transferidos da UTI para outra instituição.

Para a caracterização dos pacientes, foram coletados dados de identificação e de internação na UTI. As variáveis consideradas foram os dados demográficos (idade, sexo) e clínicos (tempo de internação na UTI, tempo de internação hospitalar, procedência, tipo de tratamento, diagnóstico inicial e desfecho). O preenchimento dos instrumentos SAPS3 e NAS no momento da admissão na UTI foi realizado por quatro enfermeiras vinculadas à pesquisa. A fonte de dados para obtenção das informações necessárias foi o prontuário do paciente e utilizou-se um instrumento, previamente, elaborado com as variáveis do estudo. Os dados foram armazenados em planilha elaborada no software Microsoft Office Excel 2010.

Para as variáveis quantitativas (idade, tempo de internação na UTI, tempo de internação hospitalar, SAPS3 e NAS) foram calculadas as medidas de tendência central e dispersão, enquanto as variáveis categóricas (sexo, procedência, tipo de tratamento, diagnóstico inicial e desfecho) foram descritas através de frequências absolutas e relativas.

A análise dos dados foi realizada pelo coeficiente de correlação de Pearson, utilizando o programa Statistical Package for the Social Science versão 17.0. Para avaliar a correlação entre os escores NAS de internação e SAPS3, utilizou-se o coeficiente de correlação de Pearson, já que houve aderência dessas variáveis à curva de distribuição normal (Kolmogorov-Smirnov). Para avaliar a diferença e comparar o SAPS3 entre os grupos, foram utilizadas à análise de variância ANOVA e o Teste de Bonferroni, respectivamente. Para avaliar a diferença e comparar o NAS entre os grupos, foram utilizados os testes de Kruskal-Wallis e de Mann-Whitney, respectivamente. Para todos os testes estatísticos foi fixado um erro alfa = 5%, isto é, os resultados dos testes foram considerados estatisticamente significantes quando p < 0,005.

RESULTADOS

Durante o período do estudo, 195 pacientes foram incluídos.

As características demográficas e clínicas dos 195 pacientes avaliados pelo NAS e SAPS3 durante o período de estudo estão descritas na tabela 1.

Tabela 1. Características clínicas e demográficas dos pacientes internados na UTI. São Paulo, 2011
Características Total n = 195
n (%)
Idade (anos) - Mediana (Mín. - máx.) 69 (25-101)
Sexo  
Masculino 113 (57,9)
Grupo diagnóstico  
Neurológico 29 (14,9)
Cardiológico 46 (23,6)
Geral 120 (61,5)
Tipo de tratamento  
Clínico 115 (59,0)
Cirúrgico 80 (41,0)
Procedência  
Centro cirúrgico 69 (35,4)
Pronto atendimento 56 (28,7)
Transferência inter-hospitalar 25 (12,8)
Unidade de internação 28 (14,3)
Semi-intensiva 12 (6,2)
Radiologia intervencionista 4 (2,1)
Outros 1 (0,5)
SAPS3 - Média (± DP) 51,5 ± 16,2
NAS - Média (± DP) 65,9 ± 16,6
Tempo de internação UTI (dias) - Mediana (Míni. - máx.) 3 (1-51)
Tempo de internação hospitalar (dias) - Mediana (Mín. - máx.) 13 (1-873)
Desfecho na UTI  
Alta 180 (92,3)
Óbito 15 (7,7)
Desfecho Hospitalar  
Alta 162 (83,1)
Óbito 29 (14,9)
Transferência inter-hospitalar 2 (2,0)

SAPS3: Simplified Acute Physiology 3; NAS: Nursing Activities Score; UTI: Unidade de Terapia Intensiva.

Tabela 1. Características clínicas e demográficas dos pacientes internados na UTI. São Paulo, 2011

A mediana de idade dos pacientes do grupo Neurológico foi 60 anos (de 26 a 87 anos). Nos grupos, Cardiológico (de 42 a 101 anos) e Geral (de 25 a 99 anos), a mediana foi 70 anos. Em relação ao sexo, eram do sexo masculino 15 pacientes (51,7%) do grupo Neurológico, 30 (65,2%) do grupo Cardiológico e 68 (56,7%) do grupo Geral.

As figuras 1, 2 e 3 mostram a análise da correlação entre o SAPS3 e o NAS nos diferentes subgrupos. Houve correlação moderada entre estas variáveis no subgrupo de pacientes neurológicos (r = 0,430).

Figura 1. Correlação entre Nursing Activities Score (NAS) e o Simplified Acute Physiology 3 (SAPS3) dos pacientes neurológicos. São Paulo, 2011. * Coeficiente de Correlação de Pearson.
Figura 2. Correlação entre Nursing Activities Score (NAS) e o Simplified Acute Physiology 3 (SAPS3) dos pacientes cardiológicos. São Paulo, 2011. * Coeficiente de Correlação de Pearson.
Figura 3. Correlação entre Nursing Activities Score (NAS) e o Simplified Acute Physiology 3 (SAPS3) dos pacientes clínico cirúrgicos gerais. São Paulo, 2011. * Coeficiente de Correlação de Pearson.

O valor médio do SAPS3 e NAS foi comparado entre os grupos de pacientes Neurológico, Cardiológico e Geral, com diferença significante nos dois escores (Tabela 2).

Tabela 2. Comparação da gravidade (SAPS3) e da carga de trabalho de enfermagem (NAS) nos subgrupos de pacientes. São Paulo, 2011
Escores Neurológico n = 29 Cardiológico n = 46 Geral n = 120 Valor de p
SAPS3 - Média (± DP) 43,31 ± 14,47 49,13 ± 13,80 54,47 ± 16,75 0,002*
NAS - Média (± DP) 62,97 ± 11,79 58,88 ± 14,87 67,94 ± 15,52 0,002+

* ANOVA;

+ Teste de Kruskall-Wallis. SAPS3: Simplified Acute Physiology 3; NAS: Nursing Activities Score.

Tabela 2. Comparação da gravidade (SAPS3) e da carga de trabalho de enfermagem (NAS) nos subgrupos de pacientes. São Paulo, 2011

Nos dois escores avaliados, SAPS3 e NAS, os pacientes do grupo Geral apresentaram valores médios maiores quando comparados aos dos outros dois grupos. As comparações dos valores médios do SAPS3 entre os grupos, utilizando o teste de Bonferroni, foram: Neurológico e Cardiológico (p = 0,364), Neurológico e Geral (p = 0,002) e Cardiológico e Geral (p = 0,158). O NAS da admissão da UTI também foi comparado entre os subgrupos, utilizando o teste de Mann-Whitney: Neurológico e Cardiológico (p = 0,223), Neurológico e Geral (p = 0,081) e Cardiológico e Geral (p = 0,001).

DISCUSSÃO

Oferecer aos pacientes internados nas UTI uma assistência de alta qualidade, com segurança e direcionada às reais necessidades, deve ser a meta de todos os processos assistenciais e administrativos que os profissionais envolvidos no cuidado à saúde almejam. Isso pode ser alcançado pelo emprego e uso corretos dos índices prognósticos e indicadores que permitem o uso racional da tecnologia, do ambiente, dos métodos e dos profissionais.

Esse assunto é de fundamental interesse, já que uma equipe superdimensionada resulta em alto custo5. Por outro lado, sabe-se que uma equipe reduzida tende a determinar prejuízo na qualidade da assistência, interferindo na segurança do paciente11 prolongando a internação e gerando maior custo12.

Portanto, buscar evidências que fortaleçam esta premissa é uma contribuição importante para o sistema de saúde. Dessa forma, este estudo correlacionou a carga de trabalho da enfermagem com a gravidade dos pacientes.

O escore obtido pela pontuação do NAS expressa diretamente a percentagem de tempo gasto pela equipe de enfermagem na assistência ao paciente grave, cuja pontuação pode variar de zero a 176,8%8, isto é, representa quanto do tempo de trabalho de um profissional o paciente requereu nas últimas 24 horas. Portanto, uma pontuação igual a 100 pontos, significa que o paciente requereu 100% do tempo de um trabalhador de enfermagem no seu cuidado, nas últimas 24 horas12. Cada ponto do NAS equivale a 14,4 minutos de assistência de enfermagem prestada1.

Nossos resultados mostraram que houve correlação moderada entre gravidade e carga de trabalho de enfermagem no subgrupo de pacientes neurológicos. A gravidade e a carga de trabalho de enfermagem foram maiores no subgrupo de pacientes clínico- cirúrgicos gerais quando comparado ao grupo de pacientes neurológicos e cardiológicos, respectivamente.

Com relação à amostra do estudo, as características demográficas e clínicas tiveram resultados comparáveis a estudos recentes realizados em pacientes graves5,9, sendo nossa média de idade ligeiramente superior se comparada a estudo realizado em hospital de ensino, consequência da mudança da qualidade de vida que proporcionou o envelhecimento da população mundial13. Alguns estudos9,13 também mostraram predomínio do sexo masculino; pacientes, em sua maioria, clínicos, e maior procedência do centro cirúrgico, como o demonstrado em nossos achados. Explicações que podem justificar esses dados são o perfil de doenças crônicas da população brasileira, o envelhecimento populacional e um aumento da incidência de câncer.

Outro dado relevante de nossa amostra é a baixa mortalidade (7,7%), que foi inferior a outros estudos13 e pode estar sendo influenciada por alguns fatores como as comorbidades presentes na população e seu manejo. O manejo adequado destas condições pode ser o responsável tanto pela baixa mortalidade como pelo tempo de permanência reduzido (3 dias) na UTI, mediana comum às de instituições privadas9. Este fato pode estar relacionado também com o local do estudo, que se constitui em referência para tratamentos de grande complexidade, possuindo um dimensionamento de recursos humanos adequados e uma cultura institucional voltada para a segurança do paciente, implicando em ocorrência menor de eventos adversos e, consequentemente, em menor tempo de internação. Em estudo conduzido em uma UTI de um hospital publico brasileiro, cujos resultados são semelhantes aos nossos. Esse fato foi atribuído a boas perspectivas terapêuticas dos pacientes, apesar da presença de doenças crônicas e idade avançada. É importante ressaltar que os pacientes de hospitais públicos são mais graves pelas suas circunstâncias sociais e econômicas, e, também, pela dificuldade de acesso aos leitos de UTI, o que agrava sua condição clínica e influencia estes indicadores14.

Em estudo recente, foram descritas diferenças na mensuração do NAS entre os pacientes de instituições públicas e privadas, sendo que os pacientes em instituições públicas apresentavam média do NAS de admissão maior (68,1) comparados aos pacientes de instituições privadas (56,0)15. No entanto, nossos achados estão mais próximos aos de instituições públicas, já que se trata de uma instituição referência em tratamentos de alta complexidade.

Nossos resultados em relação à média do NAS de admissão apontam para uma elevada demanda de cuidados de enfermagem. A Resolução 26 da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA)16, de 11 de maio de 2012, que dispõe sobre os requisitos mínimos para funcionamento de UTI e dá outras providências, preconiza a relação de um técnico de enfermagem para cada dois leitos, bem como a relação de um enfermeiro assistencial para cada dez leitos ou fração, em cada turno de trabalho. Essa proporção de profissionais por leito pode ser considerada inadequada para os cuidados dos pacientes deste estudo, pois essa alta carga de trabalho de enfermagem pode interferir na segurança e na qualidade da assistência prestada aos pacientes.

Nossos achados mostraram que, apenas nos pacientes do subgrupo com diagnóstico de admissão neurológico, há uma correlação moderada entre o índice de gravidade e a carga de trabalho. Esta correlação aconteceu, provavelmente, porque o perfil de pacientes neurológicos da unidade estudada se caracteriza, em sua maioria, por pós-operatório de cirurgias eletivas, o que repercute em curta permanência, mas em demanda de atenção maior nas primeiras 24 horas, devido a dispositivos e procedimentos assistenciais de monitoramento.

Em outro estudo com pacientes internados em UTI gerais e neurológicas observou-se que não há correlação entre o NAS e SAPS II, sendo observada apenas correlação fraca entre o NAS e tempo de permanência na UTI17. Talvez, esta correlação não esteja descrita na literatura porque o NAS está sendo associado somente à gravidade do paciente e à presença de disfunção orgânica. Deve-se considerar, além destes fatores, uma ampla gama de atividades que envolvem as dimensões clínicas, administrativas, educacionais e organizacionais. Esta hipótese confirmou uma moderada correlação entre o NAS, o APACHE II e o Sequential Organ Failure Assessment (SOFA) em estudo feito no Brasil6.

A cultura institucional pautada na gestão de qualidade, na segurança do paciente, na educação permanente e na distribuição adequada da equipe de enfermagem, são aspectos que, provavelmente, influenciaram nossos dados em relação ao desfecho dos pacientes. Mais de 80% da amostra teve alta da UTI e do hospital, com uma média de permanência hospitalar de 13 dias, mesmo com pontuação alta no NAS.

A literatura tem apontado uma ausência de estudos que confirmem a percepção de que pacientes mais graves demandam maior carga de trabalho13, mas foi observado que entre pacientes que apresentaram NAS mais elevado, a taxa de mortalidade também foi maior6. Esta condição pode ser reflexo da gestão do serviço, que não considerou a pontuação do NAS para a distribuição dos recursos humanos. As evidências não enfatizam esta necessidade, afetando tempo de hospitalização, custos e segurança dos pacientes. Outro aspecto interessante é que os pacientes que requereram carga de trabalho elevada não sobreviveram e sua permanência na unidade não foi superior a dois dias6.

Mensurar em qual domínio do NAS a demanda é maior é uma sugestão para compreender esta situação. Em investigação realizada em 2011, os autores atribuíram alta demanda de trabalho (96,2) ao tempo despendido à família e ao transporte intra-hospitalar18.

Os valores do SAPS3 (51,5) entre os participantes deste estudo são similares a estudo realizado em duas UTI cirúrgicas2 onde a média de pontuação foi de 48,5 e cujos resultados mostraram que os pacientes com pontuação menor ou igual a 57 apresentaram maior taxa de sobrevivência. Apesar do NAS alto, estes valores justificam a baixa mortalidade de nossa amostra, ou seja, os pacientes não estavam em condições clinicas muito graves. Este fato, associado a aspectos discutidos anteriormente, impacta também na ausência de correlação de gravidade e carga de trabalho nos subgrupos de pacientes gerais e cardiológicos.

Os resultados que mostraram que não há correlação entre o NAS e o SAPS3 nos subgrupos de pacientes gerais e cardiológicos, reforçam o conceito de que a carga de trabalho de enfermagem não está associada somente à gravidade do paciente e à intensidade das intervenções realizadas. Assim sendo, abrange contexto maior de atuação, que envolve as partes clínica, administrativa, educacional e organizacional de uma UTI.

CONCLUSÃO

Houve correlação moderada entre a gravidade do paciente neurológico com a carga de trabalho de enfermagem, utilizando os índices NAS e SAPS3, respectivamente. No subgrupo de pacientes gerais a gravidade e a carga de trabalho foram maiores quando comparadas aos subgrupos, neurológico e cardiológico.

Nossos resultados abrem possibilidades de realizar outros estudos que mensurem os domínios do NAS nos subgrupos de pacientes gerais, neurológicos e cardiológicos, a fim de identificar qual domínio tem maior interferência na carga de trabalho. O ponto forte deste estudo foi mostrar que em subgrupo específico de pacientes neurológicos a gravidade está correlacionada à carga de trabalho de enfermagem, a fim de assegurar melhoria na qualidade da assistência intensiva.

Algumas limitações devem ser consideradas. A principal limitação deste estudo está na realização em uma UTI de um hospital privado de referência em tratamentos de alta complexidade, com número de leitos de UTI adequado em relação ao número de leitos do hospital, localizada na cidade de São Paulo, inserida no estado com maior número de estabelecimentos com UTI no Brasil. Portanto, nossos resultados devem ser extrapolados com cuidado para instituições com características semelhantes. Além disso, não analisamos a relação do NAS com o tempo de internação e desfecho clínico.

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