ISSN (on-line): 2177-9465
ISSN (impressa): 1414-8145
Escola Anna Nery Revista de Enfermagem Escola Anna Nery Revista de Enfermagem
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Ministério da Educação
CAPES

Volume 18, Número 1, Jan/Mar - 2014



DOI: 10.5935/1414-8145.20140025

Pesquisa

Avaliação das competências dos professores de enfermagem para administrar programas educativos para adultos

Patricia Bover Draganov 1
Maria Cristina Sanna 1


1 Universidade Federal de São Paulo. São Paulo - SP, Brasil

Recebido em 29/01/2013
Reapresentado em 28/06/2013
Aprovado em 12/07/2013

Autor correspondente:
Patricia Bover Draganov
E-mail: patricia.bover@ig.com.br

RESUMO

O objetivo deste estudo foi avaliar o desempenho que o enfermeiro docentede enfermagem atribui a si nas competências para administrar programas educativos para adultos.
MÉTODOS: Estudo descritivo, comparativo, transversal e quantitativo, desenvolvido com 226 docentes enfermeiros de cursos de graduação em enfermagem paulistanos. Os dados foram colhidos com escala de Likert, lançados em planilha Excel® e analisados por estatística descritiva e testes não paramétricos de Wilcoxon e Friedman.
RESULTADOS: A população tinha predominantemente entre 46 e 55 anos (87/38,49%), eram mulheres (198/87,61) e mestres (180/79,65%). Os professores consideraram-se distantes das competências que almejavam alcançar, como administrar programas, o que requer domínio de políticas, orçamentos e marketing, o rol de mais baixo desempenho em comparação aos demais.
CONCLUSÃO: Administrar programas educativos para adultos ainda é algo pouco explorado e pouco experenciado por esses docentes.


Palavras-chave: Enfermagem; Educação superior; Docentes de Enfermagem; Modelos educacionais; Competência profissional.

INTRODUÇÃO

O processo de educação de adultos sempre esteve articulado às transformações sociais, à evolução do homem, à percepção que este tem sobre si e de seu amadurecimento. A Andragogia é uma teoria que surgiu nesse contexto; esse termo consagrou-se em 1968, quando Malcom Shepherd Knowles passou a utilizá-lo para nomear a teoria e a prática da educação de adultos1,2.

Nos países latino-americanos, o uso da Andragogia iniciou-se com o projeto da Fundação W. K. Kellogg, denominado "Uma Nova Iniciativa na Formação dos Profissionais de Saúde: União com a Comunidade - UNI", que estimulou o intercâmbiode metodologias de ensino entre países latino-americanos, a partir da década de 19903, abrangendo cursos de enfermagem. Pesquisas sobre a andragogia na saúde e na enfermagem demonstraram que se trata de um tema impactante e que deverá se manter em destaque no futuro4,5.

Em 1981, Knowles publicou um instrumento denominado "Escala de Classificação Autodiagnóstica para a Educação de Adultos", com base em três categorias de competências que o professor deveria desenvolver para atuar com adultos: a de facilitador da aprendizagem, a de desenvolvedor e a de administrador de programas educativos para adultos2 (Figura 1). No presente texto, será abordada a competência dos professores para administrar programas educativos para adultos.

Figura 1. Mapa conceitual sobre as competências para educação de adultos, segundo Knowles Fonte: Draganov PB. Avaliação das Competências Andragógicas dos Enfermeiros Docentes do Curso de Graduação em Enfermagem do Município de São Paulo [dissertação]. São Paulo, Universidade Federal de São Paulo, Escola de Enfermagem, 2011. 117 p.

A categoria de competências dos professores para administrar programas educativos para adultos envolve compreender o desenvolvimento e manutenção organizacional, e a a administração de programas. Programas educativos para adultos, por sua vez, compreendem a provisão de procedimentos e recursos para facilitar que aprendizes adquiram competências1. Cada categoria se subdivide em habilidades, as quais serão comentadas a seguir.

Na dimensão de compreender o desenvolvimento e manutenção organizacional, o educador de adultos deve descrever e aplicar teorias e usar constatações de pesquisas sobre comportamento, gerenciamento e renovação organizacional. A formulação de políticas internas que transmitam definição da missão, filosofia social, compromisso educacional de organizações e a avaliação da eficácia organizacional, bem como a condução dos processos continuados de autorrenovação também são habilidades requeridas nessa área. A missão deve ser descrita com clareza e convicção, e a filosofia deve ser comprometida com o valor, crescimento humano e autorrealização2.

Ainda nessa área, as decisões administrativas devem ser compartilhadas e descentralizadas, sendo conveniente a formação de comitês, conselhos e forças-tarefa. Para selecionar, supervisionar, treinar e avaliar a performance da equipe, Knowles sugere que se deve considerar o entusiasmo para ensinar, o sucesso na área em que se atua, a capacidade para aprender, a personalidade amistosa, humilde e bem humorada, a liderança, e criatividade para criar métodos, técnicas e materiais. Deve-se, então, adaptá-los às diversidades e dominaras diferenças entre adultos e crianças, expressando interesse em trabalhar com a educação dos primeiros1,2. Por fim, saber analisar e interpretar as legislações que afetam a educação de adultos, descrever políticas e práticas financeiras na área de educação de adultos e usá-las como guias de referência para estabelecer as próprias políticas e práticas são competências essenciais ao gestor de serviços de educação de adultos2.

Outra dimensão nessa área envolve a compreensão da administração de programas de educação de adultos, que inclui o desenho, a aplicação e o monitoramento de programas financeiros, inclusive aqueles com orçamentos limitados; ou seja, os limites orçamentários devem ser claros e detalhados, passíveis de financiamentos externos, e os administradores devem ser capacitados para obter outras fontes de renda2. Manejar abordagens modernas de educação de adultos e influenciar mudanças políticas são fundamentais ao administrador, que deve focar a manutenção e o desenvolvimento individual, processual e organizacional. Para tanto, ele também deve ter habilidades em marketing educacional (promoções e estratégias publicitárias, patrocínios e fontes de financiamentos). Nessa dimensão, também é fundamental compartilhar ideias e descentralizar o poder, garantindo, assim, a heterogeneidade de visões que facilitem a obtenção de melhores resultados1,2.

Diante do exposto, questiona-se: o enfermeiro docente de escolas de nível superior paulistanas domina a competência necessária para administrar programas educativos para adultos na perspectiva andragógica?

Vale ressaltar que o índice de crescimento de escolas de formação de enfermeiros no Brasil aumentou consideravelmente desde 19916. Conforme dados do Ministério da Educação (MEC)7, de 1991 a 2010, em São Paulo, houve crescimento de 645,28% no número de cursos e, como consequência, o número de docentes aumentou para atender à demanda. Questiona-se se esse aumento súbito foi suficiente para estimular esses docentes a se formarem com todo o elenco das competências necessárias para educar adultos, na graduação em enfermagem, de acordo com as diretrizes curriculares do curso de graduação de enfermagem8, o que também pode ter impulsionado a busca pela formação docente.

A estrutura das escolas também é uma preocupação, uma vez que os dados do MEC, com relação ao Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes (Enade), permitiu observar que há problemas na formação de enfermeiros, visto que a média geral da Enfermagem (31,9%) foi inferior à média geral da Saúde (32,3%), em 20047.

O comportamento do Enade7 de 2007 foi semelhante ao de 2004: o resultado geral mostrou que o rendimento médio geral ficou abaixo do desejado, indicando situação preocupante e necessidade de reflexão sobre a efetividade das práticas educativas. As notas do Enade objetivam refletir o desempenho dos estudantes e o grau de domínio das diversas competências, saberes e conteúdos previstos nas Diretrizes Curriculares Nacionais8. Notas baixas podem indicar formação profissional de enfermeiros aquém das recomendações do MEC e das competências necessárias para atuar profissionalmente. Mais tarde, essa formação certamente irá se refletir negativamente no desempenho dos processos de trabalho do enfermeiro, sendo que sua formação só pode se dar, com qualidade, em escolas que tenham essa preocupação.

Escolas que promovem boa formação são representadas por pessoas que desejam ensinar (docentes) e outras que desejam aprender (alunos); por esse motivo, olhar para o professor e para as competências que este deve deter, no contexto atual, é tão importante. Bons enfermeiros são formados por docentes competentes, no caso, que detenham, entre outras, as competências para desenvolver programas educativos para a aprendizagem de adultos.

Por fim, ressalta-se que há na literatura brasileira poucos estudos que abordem competências de professores para desenvolver programas educativos para a educação de adultos. Na Enfermagem, não há estudos que mensurem as competências de professores enfermeiros que atuam na graduação de enfermagem na perspectiva andragógica, com esse foco. Assim, justifica-se a realização da presente pesquisa, cujos objetivos são: 1) Caracterizar a população de enfermeiros docentes de enfermagem que atuavam em cursos presenciais de graduação em enfermagem no município de São Paulo em 2010; 2) Identificar como o enfermeiro docente de enfermagem avaliou as suas competências para administrar programas educativos para adultos e quais considerava ideal ter.

MÉTODO

Estudo descritivo e comparativo, transversal, com abordagem quantitativa, que foi desenvolvido junto aos cursos de Graduação em Enfermagem presenciais, autorizados e funcionantes no município de São Paulo em 2010. Segundo dados do MEC9, nesse ano havia 27 cursos nessa condição. Concordaram em participar do presente estudo 20 dessas instituições de ensino superior.

A população do estudo compreendeu enfermeiros professores de cursos de graduação presenciais em Enfermagem que estavam localizados e funcionando no município de São Paulo que tivessem, no mínimo, um curso de graduação presencial em Enfermagem com pelo menos dois anos de funcionamento, estivessem em atividade e autorizassem, por meio de seus diretores/coordenadores, a abordagem do corpo docente. Os docentes que compuseram a população assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) não estavam afastados de suas atividades e exerciam a atividade docente, no nível superior, por um período superior a seis meses.

O contato com o corpo docentepartiu da informação fornecida pelos coordenadores dos cursos, sobre o número total de docentes, somando 653 sujeitos. Foram distribuídos 653 questionários e retornaram 226 (34,61%) instrumentos respondidos e com TCLE assinados.

O instrumento de coleta de dados foi composto de duas partes: dados de caracterização da população e escala de medida tipo Likert, sobre competências para o papel do educador/instrutor de adultos. A escala utilizada foi proposta e testada por Malcom Shepherd Knowles, e a permissão de seu uso é garantida sem limitações1. Denominado "Escala de Classificação Autodiagnóstica de Competências para o Papel do Educador de Adultos", o instrumento compõe-sede três agrupamentos de competências que somam 54 asserções. O agrupamento para desenvolver programas educativos para adultos compõe-se dos domínios: I - compreensão do planejamento do processo com quatro habilidades e II - planejamento e aplicação de programas, com cinco habilidades.

A cada descrição de habilidades correspondia uma escala de medida de seis gradações, em que o docente sujeito da pesquisa anotou, utilizando a letra "A", o ponto em que avaliava se encontrar atualmente, e com a letra "D", onde desejava estar. Tratou-se de uma autoavaliação sobre as competências atuais e desejadas do professor, para desenvolver programas educativos.

A coleta de dados iniciou-se em junho de 2010, após a obtenção da autorização dos diretores/coordenadores dos cursos e mediante a assinatura do TCLE, pelos docentes, e encerrou-se em fevereiro de 2011.

As informações foram coletadas por meio do instrumento descrito e transcritas para um banco de dados construído com a ferramenta Excel®, composto por 119 colunas, com os dados de caracterização da população e resultados da escala. Depois de preenchido o banco, os dados da planilha foram transportados para software para tratamento estatístico denominado Minitab® versão 16. No presente texto, apenas os dados de caracterização da população e a parte da escala referente às competências em foco foram relatados. Os demais podem ser aferidos na obra de Draganov10.

A análise dos dados de caracterização da população do estudo empregou estatística descritiva - frequência simples (número absoluto) e relativa (porcentagem), medidas de tendência central e de variabilidade, ou seja, média, mediana, desvio-padrão, valor mínimo e máximo.

Os dados da Escala de Avaliação Autodiagnóstica para o Papel de Educador de Adultos foram tratados em três etapas, com foco na administração de programas educativos: 1) Os níveis atual e desejado dos docentes enfermeiros para cada habilidade que compõe um domínio da competência em foco, 2) Os níveis atual e desejado dos docentes enfermeiros para cada um dos domínios da competência em foco e 3) Os níveis atual e desejado dos docentes enfermeiros de todos os domínios de uma vez. Assim, cada linha da escala foi tratada separadamente, utilizando estatística descritiva - soma, proporção (%), média, desvio-padrão, mínimo, mediana e máximo, e, após, para a comparação entre os níveis de competência atual ("A") e desejado ("D"), utilizou-se o teste não paramétrico de Wilcoxon para a primeira e segunda etapa, e Friedman para a terceira. O índice de significância, que determinou se o grau de diferença entre elas era ou não relevante, foi considerado para os valores de p < 0,05 ou 5%.

O projeto obedeceu à Resolução 196/96 do Conselho Nacional de Saúde do Ministério da Saúde (MS), de 1996, e foisubmetido ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), sendo aprovado sob o número 1620/10.

Por fim, os dados que resultaram da análise descrita foram confrontados com a literatura científica sobre o assunto para discussão dos resultados.

RESULTADOS

Os professores tinham entre 27 e 67 anos, sendo que 119 (52,65%) tinham entre 41 a 55 anos e eram, na maioria, 198 (87,61%), do sexo feminino. Uma boa parte, 158 (69,91%), trabalhava de 31 a 40 horas semanais e tinha de seis a 10 anos de docência. 176 (77,88%) atuavam em disciplinas teóricas e práticas; 122 (53,98%) se formaram em escola pública, 201 (88,94%) fizeram especialização, principalmente em Educação, Administração e Saúde Materno-infantil, 180 (79,65%) fizeram mestrado, principalmente em Enfermagem em Saúde do Adulto e também em Administração, 77 (34,07%) professores eram doutores, principalmente em Enfermagem, apenas três (1,33%) declararam serem livres-docentes e 28 (12,39%) cursaram outra graduação. Esses dados podem ser apreciados nas Tabelas 1 e 2.

Tabela 1. Docentes enfermeiros segundo variáveis sociodemográficas, tempo de atuação, carga horária e tipo de disciplina que ministra. São Paulo, Brasil. 2011
Variável Frequência (total =226) Percentual (%)
Faixa etária
41 a 55 anos 119 52,65
Sexo    
Feminino 198 87,61
Carga horária e tempo de docência
31 a 40 horas/ 6 a 10 anos 158 69,91
Tipo de disciplina    
Teórica e prática 176 77,88
Tabela 1. Docentes enfermeiros segundo variáveis sociodemográficas, tempo de atuação, carga horária e tipo de disciplina que ministra. São Paulo, Brasil. 2011
Tabela 2. Docentes enfermeiros segundo formação e educação permanente. São Paulo, Brasil. 2011
Variável Frequência (total =226) Percentual (%)
Formação
Escola pública 122 53,98
Escola privada 101 44,69
Não informado 3 1,33
PG lato sensu 201 88,94
PG stricto sensu
Mestrado 180 79,65
Doutorado 77 34,07
Livre-docência 3 1,33
Outras graduações
Sim 28 12,39
Tabela 2. Docentes enfermeiros segundo formação e educação permanente. São Paulo, Brasil. 2011

Os resultados (Figura 2) permitiram observar que, com relação à competência de administrador, no domínio "compreensão do desenvolvimento e manutenção organizacional" (I), a maior habilidade e também o maior desejo de desenvolver-se foi para avaliar a performance da equipe (média A = 3,16 e média D = 4,69), e a menor habilidade, e também o menor desejo, foi para descrever políticas e práticas financeiras na área de educação de adultos e usá-las como guias de referência para estabelecer as próprias políticas e práticas (média A = 2,16 e média D = 4,36). Com relação ao domínio compreensão da administração de programas (II), a menor habilidade e também o menor desejo esteve em planejar e utilizar promoções, publicidades e estratégias de relações públicas de maneira adequada e eficaz (média A = 2,14 e média D = 4,26). A maior habilidade, e também o maior desejo, foi para "desenhar e aplicar programas dentro de uma estrutura de orçamento limitado" (média A = 2,71 e média D = 4,53).

Figura 2. Resultados sobre a competência Administrador, relação entre domínios, nível atual e desejado para educação de adultos, segundo os docentes enfermeiros que atuam na graduação em enfermagem no município de São Paulo, 2011.

A relação entre as questões de cada domínio permitiu identificar, pela relação entre média e mediana de cada um, que os docentes estavam aquém do que desejavam alcançar (índice de significância 0,0000), concentrando as respostas na escala Likert em três para atual e cinco para desejado.

O índice de significância na comparação entre os dois domínios demonstrou que houve relevância na relação entre os domínios da competência de administrador de programas educativos para adultos.

DISCUSSÃO

Caracterização da população

Trata-se predominantemente de uma população feminina, de meia-idade, com pós-graduação, que atua em regime de aproximadamente 40 horas semanais e que ministra disciplinas teóricas e práticas. A Enfermagem apresenta predominância de mulheres,e era esperado que os professores dessa área fossem desse sexo. O fato de boa parte ser de meia-idade pode relacionar-se à necessidade da docência de nível superior de requerer experiência profissional prática prévia e exigência de pós-graduação para ingresso nessa carreira. Embora nem todos os egressos de escolas públicas busquem a carreira docente, terem se formado nessas escolas pode ter oferecido mais oportunidades de desenvolvimento em pesquisa do que para os que se graduaram em escolas particulares,onde nem sempre há tradição em pesquisa e pós-graduação. A quantidade de horas semanais corresponde à jornada de trabalho da maioria dos trabalhadores brasileiros e atende aos requisitos legais.

Os resultados dos dados sobre a titulação dos sujeitos dessa pesquisa apresentaram compatibilidade com a prescriçãoda Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9394/96 e o Decreto nº 2.207/978. Isso posto, entende-se que os professores são legalmente qualificados para o exercício da docência, pois atendem aos requisitos exigidos de formação. Nesse contexto, oque qualifica o professor para o exercício da docência é a pós-graduação stricto sensu e, nesse aspecto, o mundo acadêmico revela o valor maior que dá às atividades de pesquisa, em comparação com as atividades de ensino.

É importante ressaltar que o preparo para o exercício da docência envolve competências diferentes do preparo para o desenvolvimento da atividade de pesquisa e que essa atividade é mais valorizada na cultura universitária. Assim pensando, pode-se imaginar que o professor em foco tenha seguido modelos profissionais de docentes de sua história pessoal, isto é, tenha como base as experiências que vivenciou ao longo de sua formação estudantil e que, por isso, valorize mais a pesquisa e não busque a inovação no ensino, pois são raros os professores que vivenciaram, como alunos, experiências inovadoras de ensino-aprendizagem11.

Quanto às competências para desenvolver programas de educação de adultos, para todos os domínios, a maior parte dos professores declarou desempenho moderado e desejo máximo de desenvolver-se. A seguir será discutido cada domínio.

Competências para administrar programas de educação de adultos

Compreensão do desenvolvimento e manutenção organizacional

Esse domínio reúne dez habilidades. A maioria dos professores declarou desempenho atual moderado e desejo máximo para descrever e aplicar teorias comportamentais, gerenciais e de renovação organizacional, formular filosofia administrativa e adaptá-la a várias situações, formular políticas que definam claramente a missão, filosofia e compromisso educacional, avaliar a eficácia organizacional e guiar processos continuados e de autorrenovação, planejar com outros, compartilhar responsabilidades e tomada de decisão, selecionar, supervisionar e oferecer treinamentos, avaliar a performance da equipe, analisar e interpretar legislações sobre educação de adultos, descrever e usar políticas e práticas financeiras e executar papel de agente de mudança.

Grande parte dos sujeitos da presente pesquisa fez pós-graduação (lato e stricto sensu) em administração, e era esperado que dominassem os temas gerenciais; no entanto, a maioria declarou ter domínio apenas moderado de habilidades administrativas aplicadas à docência.

A administração de programas de ensino é diferente da administração da assistência e de serviços de enfermagem, estes últimos, inclusive, são trabalhados na formação. A administração de programas educativos é um trabalho complexo e que contém assuntos que não são abordados regularmente na formação de mestres e doutores. Além disso, o professor não compartilha da mesma autonomia que um enfermeiro no exercício dos processos de trabalho assistir e gerenciar. Assim, administrar programas educativos é um tema pouco comum tanto nas disciplinas da pós-graduação como na prática profissional de professores. Talvez esse seja o motivo de os professores declarem moderado domínio desse agrupamento de habilidades, mesmo grande parte tendo formação em administração.

O agrupamento de competências para compreender o desenvolvimento e manutenção organizacional prevê habilidades com teorias comportamentais, gerenciais e de renovação organizacional. Sobre essa competência, a literatura12 traz algumas contribuições importantes, quando afirma que grande parte dos professores de adultos focam as habilidades interpessoais, sem ser culturalmente sensíveis e psicologicamente conscientes. Programas de desenvolvimento de professores deveriam compor-se de módulos para desenvolvimento de autoconceito, manejo de habilidades psicológicas, para que o professor possa compreender o aluno e estimular que ele descubra suas potencialidades e desenvolva competências. A formação de grupos de adaptação às mudanças que trabalhem com treinamentos sobre novos processos de ensino e aprendizagem também é muito importante. Os grupos são ainda fundamentais para compartilhar experiências12. O administrador deve prever o desenvolvimento dessas habilidades no grupo de docentes que compõe seu quadro de colaboradores e, para conhecer o sucesso dessa medida com esse grupo, deve avaliar os processos de intervenção.

A administração de programas educativos também deve contemplar a autoavaliação e avaliação do sucesso no cumprimento de metas, bem como dos estilos de ensino utilizados pelos professores, considerando o envolvimento do corpo docente nas propostas de aperfeiçoamento13.

A interpretação e aplicação das políticas de educação é outro requisito para o administrador. Assim, os administradores de processos de ensino devem estabelecer ligações claras entre as disposições legais para atuação e exercício profissional e o programa de ensino, pois isso irá aumentar as possibilidades de sucesso do programa, por estreitar as relações entre o ensino da prática com a realidade dos serviços de enfermagem14. Ressalta-se que não basta conhecer, é necessário saber interpretar e aplicar as legislações que influenciam as práticas educativas e de saúde, esta última no caso do ensino na Enfermagem.

A sociedade está em constante mudança e adaptar-se à dinâmica social previne o obsoleto e mantém a instituição competitiva no mercado. Os administradores de programas de ensino devem estar preparados e ser hábeis com mudanças na enfermagem. O contexto de saúde envolve transformações e adaptações constantes, decorrendo de questões tais como crescimento demográfico, maior expectativa de vida e envelhecimento da população, doenças infectocontagiosas, envolvimento crescente com drogas e, por outro lado, uma população cada vez mais consciente sobre temas de saúde, a deficiência dos sistemas de atendimento em saúde, atecnologia e os avanços da ciência nesse campo. O aumento da intensidade e complexidade do atendimento, por enfermeiros, exige programas de formação que comportem o preparo do aprendiz para adaptar-se e para gerenciar as mudanças sociais15. O administrador deve ter consciência dessa realidade e ter habilidades para infundir essa transformação nos desenhos dos currículos.

O administrador de programas de ensino, nesse contexto, deve administrar programas que desenvolvam conhecimentos, habilidades e atitudes articulados ao contexto social, ou seja, que se transformem de acordo com a demanda de aprendizagem. Isso significa formar enfermeiros competentes que se adaptem continuamente. A realidade social, hoje, não comporta enfermeiros formados com enfoque tecnicista. Enfermeiros devem ser formados para aprender a aprender, o que implica entregar poder ao aluno, ou seja, estimular a autodireção e processos de reflexão. O professor assume, nessa realidade, o papel de facilitador e consultor, denominado hoje como tutor ou preceptor, desenvolvendo ações de ensino, aconselhamento e apoio1. O administrador de programas deve ter essa visão e traduzi-la para o currículo do curso e para os professores.

Compreensão da administração de programas

Esse domínio reúne seis competências e, nesse caso, teve resultado diferente dos anteriores, já que a maioria dos professores declarou baixo domínio atual e desejo máximo nas tarefas para elaborar e monitorar planos e procedimentos financeiros, traduzir, de forma persuasiva, abordagens modernas de treinamento e elaboração de políticas, planejar e utilizar promoções e publicidade adequadamente, preparar propostas de patrocínios e identificar fontes de financiamento, além de fazer uso de consultores.

Em apenas uma dimensão, a população estudada declarou ter domínio moderado: para a habilidade de desenhar e aplicar programas com orçamentos limitados. A realidade da maior parte das escolas, principalmente por serem na maioria particulares, é controlar rigidamente seus gastos. Além disso, a educação em enfermagem sofre influência das políticas públicas de saúde e educação, que envolvem o controle de recursos financeiros. O estilo gerencial em enfermagem sofre processos de contração e expansão que estão, muitas vezes, conectados a verbas limitadas. No ensino de enfermagem isso não é diferente. Essa é uma realidade tanto em escolas públicas quanto em escolas particulares, e envolve tanto a administração quanto o ensino16. Talvez por esses fatos, os professores declararam dominar moderadamente essa competência. As demais ações são pouco desenvolvidas por professores em sua prática profissional, pois poucos assumem atividades administrativas e, além disso, trata-se de conteúdos que não são trabalhados na formação de graduação e tampouco na pós-graduação.

Comparação entre os dois domínios das competências para administrar programas de educação de adultos

Comparando os domínios das competências para administrar programas de educação de adultos, observou-se que o índice de significância foi relevante. A habilidade de menor ênfase foi a de planejar e aplicar programas de ensino e a maior ênfase coube à compreensão de programas de ensino. O desejo em desenvolver-se teve menor ênfase no planejamento e aplicação de programas de ensino e maior ênfase para acompreensão de programas de ensino.

Assim, os professores registraram que detinham e pretendiam desenvolver a compreensão das habilidades administrativas mais do que aplicá-las na prática, isto porque talvez não tivessem tido experiência nessa área e desejassem, inicialmente, conhecer o assunto; embora grande parte tenha declarado ter pós-graduação na área de administração.

Um estudo17 constatou que grande parte dos profissionais de saúde não detém experiência com a administração de programas de ensino e também não demonstrousatisfação com esta área, voltando seus interesses para a prática profissional.

Um dos caminhos para que educadores desenvolvam competências para administrar programas é o envolvimento com estes temas. Assim, o envolvimento com a formulação e implementação de políticas melhorará a aquisição de conhecimentos e habilidades e influenciará positivamente o desenvolvimento profissional pessoal e da empresa, gerando impactos imediatos no ambiente de trabalho. Uma experiência nesse sentido mostrou que os profissionais envolvidos se tornaram mais conscientes e responsáveis pelos processos de gestão e desenvolveram competências nessa área17.

Relação entre os três agrupamentos de competências: facilitador da aprendizagem, desenvolvedor e administrador de programas

Os professores perceberam ter maior domínio para facilitar a aprendizagem do que para administrar e desenvolver programas educativos para adultos. O mesmo não foi observado para o desejo de desenvolver-se, ou seja, a diferença entre as competências desejadas não foi significativa (p = 0,110),e, assim, ficou patente que grande parte dos professores desejava desenvolver-se no mais alto grau de todas as competências.

Na pedagogia tradicional e na cultura organizacional das escolas de educação de adultos no Brasil, é frequente o controle do processo educativo por meio de definição rígida de conteúdos disciplinares e apresentação prévia de planos de aula para a coordenação, entre outras situações. Esse fato tolhe a criatividade e a autonomia do professor para intervir em situações que envolvam alterações maiores no planejamento, como o desenvolvimento e administração de programas educativos. Poucos professores administradores têm experiência nesse campo e, desses, poucos dão autonomia para que um grupo de professores ou, menos ainda, para que um grupo de alunos colaborem nesse trabalho.

O professor deve ir além da prática conteudista, para atender à demanda de formação de enfermeiros compatíveis com os requisitos sociais. Ele deve ampliar seus horizontes, buscando habilidades com a facilitação da aprendizagem, o desenvolvimento e administração de programas educativos para adultos.

A necessidade de investir na formação de professores que detenham, além de conhecimentos técnicos, também valores éticos e políticos, está fundamentada em questões legais de cumprimento das diretrizes curriculares emanadas da LDB, além do compromisso de formar profissionais competentes e cidadãos que possam contribuir para um mundo mais justo e para o reconhecimento social da profissão18.

Os limites desse estudo devem ser considerados pelos leitores e pesquisadores, visto que se trata se um trabalho realizado em escolas e agrupamentos de professores característicos da cidade de São Paulo e que não cabem em outras realidades diferentes desta.

CONCLUSÕES

O presente estudo avaliou as competências dos docentes que atuavam em cursos de graduação de enfermagem paulistanos, para desenvolver programas educativos para adultos, por meio da Escala de Classificação Autodiagnóstica de Competências Andragógicas para o Papel do Educador de Adultos, desenvolvida por Knowles.

O instrumento demonstrou que é capaz de avaliar o perfil dos professores com relação às competências para atuar na educação de adultos e pode ser empregado em outros estudos. É desejável a realização de outros estudos que pretendam replicar essa pesquisa em outras realidades, pois podem dar um panorama ampliado desta característica, o que poderia contribuir consideravelmente para os cursos de formação de professores, visto que há poucos referenciais nessa área, que é carente e necessita de avanços.

Os sujeitos do estudo eram predominantemente mulheres maduras, formadas em escolas públicas, mestres, com jornada de trabalho de 40 horas semanais, que atuavam entre 6 a 10 anos na docência, em disciplinas teóricas e práticas.

Com relação às competências para administrar programas de educação de adultos, os professores afirmaram dominar moderadamente e desejar desenvolver a compreensão das habilidades administrativas mais do que executá-las.

Em resumo, o grupo de docentes sinalizou, de maneira geral, estar em nível intermediário em comparação ao máximo que desejava atingir dos agrupamentos de habilidades de administrador de programas, ou seja, grande parte dos docentes enfermeiros que atuavam na graduação em Enfermagem no município de São Paulo em 2010 encontrava-se distante do ideal de nível máximo de competência que almejava. Assim, como esse grupamento valoriza e influencia consideravelmente o sucesso da aprendizagem na Enfermagem, sugere-se a intervenção nos processos de formação e aperfeiçoamento do professor de enfermagem, nessas competências, para a melhoria do ensino.

A análise global dos resultados indicou ainda que, antes que qualquer intervenção que considere a Andragogia como fundamento para a formação de professores seja implementada, há que se mensurar o nível atual de competências desses indivíduos. Isso foi feito na presente pesquisa justamente porque não há, na Enfermagem, mensurações de competências na perspectiva andragógica proposta por Malcom Shepherd Knowles.

Considera-se, no entanto, que o estudo será útil para facilitar o planejamento de programas para desenvolvimento individual e institucional de professores e de instituições de ensino estudadas, e para os administradores, com relação às competências relevantes para aumentar a performance de docentes e atender melhor os alunos.

REFERÊNCIAS

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