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CAPES

Volume 16, Número 3, Jul/Set - 2012

PESQUISA

Consumo alcoólico entre universitários(as) da área da saúde da Universidade Federal do Rio Grande/RS: subsídios para enfermagema

Larissa Zepka Baumgarten1
Vera Lúcia de Oliveira Gomes2
Adriana Dora da Fonseca3

1. Enfermeira. Mestre em enfermagem. Doutoranda em Enfermagem pelo programa de Pós-Graduação em Enfermagem da Escola de Enfermagem da Universidade Federal do Rio Grande. EEnf/FURG. Membro do Grupo de Estudos e Pesquisas sobre Enfermagem Gênero e Sociedade/GEPEGS.Rio Grande - RS. Brasil. E-mail: larissa.baumgarten@gmail.com.
2. Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora Titular da EEnf/FURG. Líder do GEPEGS. Tutora do Programa de Educação Tutorial PET/Enfermagem, FURG-RS. Rio Grande - RS. Brasil. E-mail: vlogomes@terra.com.br.
3. Enfermeira. Doutora em Enfermagem. Professora Adjunta e Diretora da Escola Enfermagem da FURG. Líder do GEPEGS. Rio Grande - RS. Brasil. E-mail: adriana@vetorial.net.

RESUMO

Objetivou-se conhecer os fatores associados e as consequências do uso de bebidas alcoólicas entre universitários da área de saúde da Universidade Federal do Rio Grande/RS. A amostra foi composta por 351 estudantes do primeiro e do penúltimo anos de cada curso. Aplicou-se um questionário sociodemográfico e o AUDIT na coleta de dados. Na análise utilizaram-se testes estatísticos. Verificou-se que 202 (57,5%) estudantes bebiam habitualmente; desses, 196 (97,0%) tinham familiares usuários(as) de álcool. Segundo o AUDIT os estudantes foram classificados em baixo risco, 147 (41,8%), e de uso problemático, 49 (14,0%). Como consequências detectaram-se apagões, coma alcoólico e acidentes automobilísticos. Constatou-se que 171(48,7%) estudantes não utilizaram preservativo nas últimas relações sexuais e 37 (10,5%) tiveram três a dez parceiros (as) nos últimos 12 meses. Evidenciou-se a necessidade de implementação de estratégias de cunho preventivo no âmbito universitário, para detectar precocemente o potencial para uso abusivo, bem como oportunidade de tratamento aos(às) que fazem uso problemático do álcool.

Palavras-chave: Estudantes. Consumo de bebidas alcoólicas. Enfermagem. Saúde pública.

INTRODUÇÃO

Nas sociedades atuais, o hábito de ingerir bebidas alcoólicas de forma abusiva está classificado entre os dez comportamentos de maior risco à saúde, sendo responsável por cerca de 1,8 milhões de mortes no mundo, das quais 5% vitimizam jovens com idade entre 15 e 29 anos1. Isso ocorre porque o álcool é considerado uma substância lícita e aceita pela sociedade, cujo consumo "é estimulado pela falta de fiscalização e inobservância das restrições legais para sua venda"2:567. Além disso, propagandas incentivando o consumo dessas bebidas são assistidas livremente por crianças e adolescentes. Recente revisão da bibliografia internacional aponta evidências convincentes de que o "marketing de bebidas alcoólicas tem efeito no comportamento de beber dos jovens"3:368.

No final da adolescência, frequentemente, começa a ocorrer uma série de mudanças na vida dos(as) jovens, como a pressão pela escolha da profissão, o vestibular e a maioridade. Nessa etapa da vida, com a transição da escola para a universidade, grande parte deles(as) passa a residir longe das famílias, liga-se a novas amizades e inaugura um período de maior autonomia que lhes possibilita novas experiências. Esse fator tem sido apontado por pais, mães, educadores(as) e demais autoridades como motivo de preocupação, que encontra respaldo em pesquisas realizadas com estudantes universitários, cujos resultados "levam a crer que morar longe da família aumenta a chance de uso de drogas"4:1028, ou seja, viver fora de casa e adotar comportamentos de risco são situações que andam juntas.

As atividades culturais da juventude geralmente são celebradas com festas, onde há consumo de álcool que, por si só, já pode propiciar a experimentação de outras drogas, além da adoção de comportamentos de risco5. Entre os fatores que interferem no consumo de bebidas alcoólicas, citam-se a influência do grupo de amigos(as) ou colegas, o padrão de consumo, incluindo-se o tipo de substância consumida, a frequência, o horário, a associação com alimentos e petiscos.

Avaliando os locais em que os(as) acadêmicos(as) costumam consumir bebidas alcoólicas, independentemente de ser a primeira vez ou usos subsequentes, um estudo realizado em Passo Fundo, no Rio Grande do Sul, com acadêmicos(as) de Enfermagem, identificou que os bares/danceterias/boates continuam sendo os preferidos com um percentual de 52,2%, seguido do próprio domicílio com 20,0%. As companhias mais frequentes para o consumo foram os(as) amigos(as) (68,0%) e os familiares (13,0%)6.

Visando compreender os motivos que levam os(as) jovens a iniciarem o consumo de bebidas alcoólicas, foi realizada uma pesquisa com estudantes dos cursos de educação física, fisioterapia, nutrição e psicologia de uma universidade particular do Paraná7. Entre os motivos mais citados identificaram-se diversão ou prazer, quebra da rotina, curtição dos efeitos causados, redução da ansiedade e do estresse. Confirmando os resultados de outros estudos5, os(as) amigos(as) e colegas foram apontados como companhia mais frequente nesse processo de introdução e continuidade no uso de substâncias psicoativas8.

Cabe ressaltar que as consequências do consumo de bebidas alcoólicas não afetam somente o(a) usuário(a), mas seus familiares e toda a comunidade devido a violência e acidentes frequentemente ocasionados. Até mesmo o consumo eventual pode expor os(as) jovens a problemas como acidentes de trânsito, comportamento sexual de risco, gravidez não planejada, violência, ferimentos não intencionais, problemas com o desempenho acadêmico, entre outros9.

Os comportamentos de risco relacionados à sexualidade e a acidentes de trânsito no contexto universitário foram estudados entre acadêmicos(as) de medicina da Universidade de São Paulo5. Os autores revelaram que estudantes do sexo masculino, quando estão sob o efeito de álcool ou outras drogas, têm, com maior frequência, relações sexuais desprotegidas e com diferentes parceiros(as).

O mesmo estudo evidenciou que, entre os(as) universitários(as), 23,5% dirigiram após terem consumido bebidas alcoólicas; destes, 17,0% envolveram-se em acidentes de trânsito. Quanto à violência, 16,5% dos(as) estudantes já brigaram por estarem sob efeito de álcool e outras drogas e 21,0% já ameaçaram pessoas com armas de fogo5.

Assim, apesar do maior conhecimento sobre os efeitos do álcool e outras drogas no organismo, os(as) graduandos(as) dos cursos da área da saúde consomem-nas em proporções semelhantes aos demais jovens de mesma idade na população geral10. Considerando-se que na Universidade Federal do Rio Grande há cinco cursos na área da saúde e que os egressos serão promotores de saúde na comunidade, optou-se por realizar o presente estudo com o objetivo de conhecer os fatores que se associam ao uso e abuso do álcool entre esses acadêmicos e relacionar o uso e abuso do álcool com as consequências desse hábito.


METODOLOGIA

Trata-se de um estudo com abordagem quantitativa, de caráter descritivo e delineamento transversal. A população da pesquisa foi composta por estudantes do primeiro e penúltimo ano dos cursos de Ciências Biológicas Bacharelado, Ciências Biológicas Licenciatura, Educação Física, Enfermagem, Medicina e Psicologia, da Universidade Federal do Rio Grande (FURG).

A coleta dos dados foi realizada de agosto a setembro de 2010, após aprovação do projeto pelo Comitê de Ética em Pesquisa na Área da Saúde (CEPAS) da instituição, sob parecer Nº 71/2010.

O agendamento do horário e local da coleta de dados foi realizado em acordo com os(as) coordenadores(as) dos cursos da área da saúde. Precedendo a coleta, os(as) acadêmicos(as) receberam informações acerca dos objetivos, metodologia, bem como dos riscos e benefícios da pesquisa. Os(as) que aceitaram participar do estudo assinaram, em duas vias, o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Nesse documento garantiram-se o sigilo das informações obtidas individualmente e a liberdade para se recusarem ou desistirem da pesquisa, em qualquer momento, sem que isso pudesse causar-lhes algum prejuízo.

Os critérios de inclusão foram: ter ingressado na FURG no ano de 2010 ou estar cursando o penúltimo ano do curso; estar presente na sala de aula no momento da coleta dos dados e aceitar a participação no estudo, assinando o TCLE.

Para obtenção dos dados foram utilizados dois questionários: um com abordagem sociodemográfica e o AUDIT11, que tem como finalidade identificar precocemente clientes com necessidade de reduzir ou abster-se do uso de bebidas alcoólicas. O referido teste é composto por dez questões pontuadas com valores entre zero e quatro pontos. O somatório dos valores atribuídos a cada questão gera um escore que pode variar de zero a 40 pontos. Com ele é possível classificar o consumo alcoólico em quatro categorias, ou seja, uso de baixo risco (zero a sete pontos), uso de risco (oito a 15 pontos), uso nocivo (16 a 19 pontos) e provável dependência (20 ou mais pontos)11.

Com vistas a facilitar a interpretação e análise dos dados coletados, utilizou-se a estatística descritiva. A Análise de Variância possibilitou a realização da comparação dos escores médios dos resultados dos questionários. Empregaramse também as Tabelas de Contingência e o Teste G. Por meio das tabelas foi possível verificar a existência ou não de associação entre duas variáveis categóricas comparando suas frequências de ocorrências. Neste estudo usou-se o nível de significância de 5%.


RESULTADOS

Do total de 503 estudantes matriculados(as) nos cursos da área da saúde da FURG, 351 participaram deste estudo, o que representou 69,8%, sendo 209 (59,5%) acadêmicos(as) do primeiro e 142 (40,5%) do penúltimo ano. No que se refere ao curso frequentado, 41 (11,7%) estudantes cursavam Ciências Biológicas Bacharelado; 35 (10,0%), Ciências Biológicas Licenciatura; 42 (11,9%), Educação Física; 83 (23,6%), Enfermagem; 98 (27,9%), Medicina; e 52 (14,8%), Psicologia (Quadro 1).




Dos 351 informantes que participaram deste estudo, 238 (67,8%) eram mulheres e 113 (32,2%) homens, 302 (86,0%) solteiros(as), 29 (8,3%) casados(as), 17 (4,8%) viviam em união estável e 3 (0,8%) eram viúvos(as). A idade média foi de 23,1 anos; com mínima de 17 e máxima de 50 anos. Moravam com os pais 166 (47,3%) estudantes; 81 (23,1%) moravam com amigos(as) ou colegas, 58 (16,5%) sozinhos(as) e 46 (13,1%) com cônjuge ou em união consensual. Observou-se que 324 (92,6%) não tinham filhos.

Pais, mães ou outros familiares foram citados como responsáveis pela manutenção financeira de 297 (84,6%) acadêmicos(as). No entanto, observou-se que no curso de enfermagem 25 (52,1%) estudantes do primeiro ano tinham trabalho formal ou informal, meio pelo qual garantiam seu sustento.

Sobre o número de parceiros(as) sexuais nos últimos 12 meses, 278 (79,2%) tiveram de um a três e 17 (4,8%) afirmaram ter se relacionado sexualmente com mais de dez parceiros(as). Ainda, 52 (14,8%) não tiveram relações sexuais no período questionado e quatro (1,2%) não informaram. Ao serem questionados(as) sobre o uso de método contraceptivo na última relação sexual, apenas 180 (51,3%) referiram ter utilizado preservativos.

Dentre os(as) participantes deste estudo, 239 (68,1%) ingeriram bebidas alcoólicas pela primeira vez antes dos 17 anos, 32 (9,1%) entre 18 e 25 anos e 78 (22,2%) referiram não lembrar da idade em que experimentaram essa substância. Dois (0,6%) estudantes mencionaram nunca ter experimentado álcool. Não se encontrou associação entre as variáveis sexo e idade de início do consumo (p = 0,753).

No tocante ao ambiente do primeiro episódio de ingestão de bebidas alcoólicas, 165 (47,0%) referiram a própria residência, 57 (16,2%) festas, comemorações de aniversário e shows, 17 (4,8%) a casa de amigos(as) ou namorado(a), 12 (3,4%) apontaram shoppings, churrascos, praia e bares, 10 (2,9% ) citaram a rua ou praças, 88 (25,1%) não informaram. Ao serem questionados(as) sobre as companhias desfrutadas na experimentação do álcool, 188 (53,6%) dos(as) estudantes mencionaram amigos(as), 71 (20,2%) familiares, 4 (1,1%) namorado(a). Apenas um(a) (0,3%) estudante referiu estar sozinho(a) quando experimentou bebida alcoólica e 85 (24,2%) não lembravam.

Em relação aos locais de consumo de bebidas, 246 (70,2%) relataram festas e churrascos, 86 (24,5%) a própria moradia e 17 (4,8%) bares e restaurantes próximos à universidade. Quanto aos motivos da ingestão, 118 (33,6%) mencionaram a busca por descontração em festas e socialização, 85 (24,2%) procuravam relaxamento e prazer, e quatro (1,1%) consumiam-nas como acompanhamento das refeições. Salienta-se ainda que 142 (40,5%) justificaram o uso por apreciá-las.

Dentre os(as) participantes, 202 (57,5%) tinham o hábito de ingerir bebidas alcoólicas e 149 (42,5%) não bebiam de forma habitual. Dentre aqueles que responderam afirmativamente, 186 (92,1%) tinham amigos(as) ou colegas usuários(as) dessa substância, e 196 (97,0%) mencionaram o uso de álcool entre o(as) familiares. Com base no AUDIT, 147 (41,8%) foram classificados(as) como usuários(as) de baixo risco e 49 (14,0%) de uso problemático, o que mostrou associação estatisticamente significativa entre as variáveis uso de álcool pela família e consumo de álcool (p=0,0042).

No que se refere às consequências advindas da ingestão alcoólica, 56 (27,3%) informantes relataram a ocorrência de tonturas e quedas, 20 (9,9%) de apagamentos e 6 (3%) casos de coma alcoólico. Ferimentos ou danos a si ou a outra pessoa após ingestão de álcool foram relatados por 45 (12,8%) dos informantes. Acidentes automobilísticos ocorreram com cinco (1,4%) estudantes; desses(as), três foram considerados(as) usuários(as) de baixo risco, um de médio risco e um de uso nocivo. Ainda, 178 (50,7%) revelaram ter tido problemas gastrointestinais, tais como náuseas e vômitos; desses(as), 153 (86%) eram bebedores(as) de baixo risco. Referiram ter sido aconselhados(as) a parar de beber 24 (13,5%) estudantes do estudo.

No que concerne ao comportamento sexual, encontrouse significância entre o padrão de consumo alcoólico e o número de parceiros(as) nos últimos 12 meses (p < 0,0001). Evidenciou-se que na última relação sexual 180 (51,3%) utilizaram preservativo, enquanto 171 (48,7%) não se preveniram. Constatou-se, ainda, que 37 (10,5%) sujeitos referiram ter tido de três a 10 parceiros(as) nos últimos 12 meses e, desses, 19 (51,3%) foram classificados(as) como bebedores problema.

Comparando os escores médios de AUDIT11 dos(as) estudantes dos cinco cursos da área da saúde investigados, não se encontrou diferença estatisticamente significativa (p=0,067) no consumo de bebidas alcoólicas, da mesma forma que a comparação dos escores de acadêmicos(as) do primeiro e do penúltimo ano (p=0,423). Assim, o conhecimento acerca dos efeitos do álcool no organismo adquirido na universidade, independentemente do curso frequentado, não interferiu no comportamento dos(as) estudantes.


DISCUSSÃO

O presente estudo evidenciou que 202 (57,5%) acadêmicos (as) da área da saúde da FURG tinham o hábito de ingerir bebidas alcoólicas. A iniciação do uso dessas substâncias ocorreu na faixa dos 10 aos 17 anos. Tais dados corroboram outro estudo, em que a iniciação ocorreu aos 14 anos10. O autor associou o consumo de álcool nessa idade ao livre comércio do produto nas festas, postos 24 horas e mercados frequentados por jovens12.

No entanto, é necessário enfocar a influência da mídia no consumo alcoólico precoce, pois "as estratégias de propaganda são bem-sucedidas não apenas por associarem de forma direta o consumo de seu produto com uma série de imagens agradáveis, tornando a mensagem alegre, bonita, erótica ou engraçada, mas porque essa correlação está voltada à criação de memórias afetivas positivas, ou âncoras para qualquer tomada de decisão"3:363. Pesquisadores da Nova Zelândia referem que a agradável lembrança de propagandas de álcool aumenta tanto a expectativa de beber quanto a frequência atual de ingestão dessas substâncias.3

Outro fator influente para o consumo de bebidas alcoólicas pelos(as) estudantes foi o consumo por parte dos familiares. Esses achados corroboram os resultados publicados por alguns autores que referiram ocorrer um maior consumo de álcool e alcoolismo entre os(as) adolescentes com histórico familiar6.

A influência dos(as) amigos(as) no consumo de bebidas alcoólicas foi descrita em investigações recentes, fundamentada na premissa de que jovens procuram seguir o comportamento do grupo6 ao qual estão inseridos, buscando, dessa forma, status e a sensação de pertencimento10.

Cabe ressaltar ainda que o ingresso na universidade, o afastamento da família e a ligação com novas amizades fazem parte de uma fase de mudanças que pode colocar o(a) estudante em maior vulnerabilidade para o uso do álcool e outras drogas12.

Alguns autores afirmam que o ambiente acadêmico torna-se favorável para a experimentação de drogas, uma vez que nessa fase da vida participam de diversas comemorações, dentre elas, festas para recepção de calouros(as), festas com bebidas liberadas, eventos para arrecadar fundos para formaturas, enfim, vários momentos atrativos para o uso do álcool com amigos(as) da faculdade12. Convém destacar que nesses ambientes torna-se comum o envolvimento de jovens com comportamentos de risco, tais como dirigir embriagado(a) e ter relações sexuais sem preservativo13. Demonstrando que esses comportamentos podem ter uma base comum, o Primeiro Levantamento Nacional sobre o Uso de Álcool, Tabaco e Outras Drogas entre Universitários das 27 Capitais Brasileiras fundamenta-se em estudos que denunciam a relação entre o uso de álcool e o aumento do risco de violência, da multiplicidade de parceiros sexuais e da prática sexual desprotegida(14). Pelos padrões da Organização Mundial de Saúde (OMS), é saudável ter até três parceiros(as) sexuais por ano15.

Em relação a outras consequências físicas e sociais, identificaram-se a ocorrência de apagões (blackouts) e tonturas, quedas e coma alcoólico e, por fim, os acidentes automobilísticos16. Essas situações confirmam os resultados obtidos em alguns estudos que também constataram tais danos decorrentes do consumo abusivo de álcool na juventude5. Atentase para a necessidade de sensibilização e conscientização dos(as) jovens sobre o risco de beber e dirigir e as consequências de tal ato9.

Outro estudo também detectou que os locais mais frequentados pelos estudantes para o consumo de bebidas alcoólicas foram as festas, churrascos, a própria moradia17, e bares ou restaurantes próximos à universidade. Apesar da Política Nacional do Álcool (PNA) proibir o comércio de bebidas alcoólicas a indivíduos menores de 18 anos e próximo às instituições de ensino13, parte dos informantes do presente estudo consumiu álcool em estabelecimentos próximos da universidade. Acredita-se que uma das dificuldades para o cumprimento dessa determinação centre-se na convivência de universitários(as) menores de 18 anos com outros mais velhos, os quais adquirem a bebida e a compartilham com os(as) de menor idade. Essa situação, muitas vezes, foge ao controle dos vendedores, além de propiciar o acesso ao álcool em nível domiciliar e festas particulares.

A bibliografia tem apontado que jovens no mundo inteiro têm feito uso dessa substância precocemente e, muitas vezes, em locais perto de onde estudam..Para revertê-la, faz-se necessário, além de advertir consumidores e comerciantes, intensificar a fiscalização e a punição de infratores13, bem como proibir a entrada de estudantes com idade inferior a 18 anos em estabelecimentos que comercializem bebidas alcoólicas.

Finalmente, constatou-se que o conhecimento acumulado ao longo dos anos acadêmicos, acerca dos malefícios do álcool no organismo humano, não interferiu no consumo entre os(as) estudantes investigados(as). Um levantamento realizado com universitários(as) da área de Ciências Biológicas em São Paulo demonstrou resultado semelhante; nele foi detectado que o álcool era utilizado por 84,7% dos(as) estudantes5 Outra pesquisa revelou que o consumo alcoólico entre universitários(as) da área da saúde é semelhante ao de outros (as) jovens de mesma idade10.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Verificou-se que foi na faixa dos 10 aos 17 anos de idade que os(as) acadêmicos(as) começaram a consumir bebidas alcoólicas e que o uso dessas substâncias por familiares e amigos(as) pode influenciá-los(as). Ainda, as festas e a própria moradia foram referidos como principais locais de iniciação e consumo habitual de bebidas alcoólicas.

Entre os problemas causados pelo beber problemático, identificou-se a ocorrência de apagões, coma alcoólico e acidentes automobilísticos. Nesse sentido, acredita-se que sejam de extrema importância a realização e a implementação de programas educativos para os estudantes, alertando-os(as) a respeito dos limites de consumo de baixo risco, dos problemas que podem ser causados pelo abuso, e de sugestões para, caso queiram continuar consumindo bebidas alcoólicas, que o façam com responsabilidade.

Percebeu-se a necessidade de investimento nas políticas que controlam a venda de bebidas alcoólicas para a população de jovens universitários(as). Ressalta-se a importância do controle das festas com bebidas liberadas e da venda de álcool com preços reduzidos em eventos estudantis, assim como em bares próximos aos campi universitários.

Além disso, sugere-se a inserção de discussões nas disciplinas acadêmicas acerca da Política Nacional do Álcool e demais legislações relacionadas, buscando-se, assim, conscientizar os(as) jovens sobre as leis em vigor, suas proibições e punições, caso desrespeitadas. Considera-se que a educação para o uso responsável de álcool associada a políticas públicas que limitem o acesso e a oferta de bebidas alcoólicas possam ser importantes estratégias para reduzir o uso problemático dessa substância.


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NOTA

Nossos agradecimentos à Dra. Ceres Braga Arejano e à Dra. Ana Maria Volkmer de Azambuja da Silva pelas críticas e sugestões a esta pesquisa durante a Banca de Sustentação de Mestrado na Universidade Federal do Rio Grande.

a Trabalho originado de dissertação de mestrado intitulada "Padrão de Consumo de bebidas alcoólicas entre acadêmicos (as) dos cursos da área da saúde", 2010

 

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