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Escola Anna Nery Revista de Enfermagem Escola Anna Nery Revista de Enfermagem
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Ministério da Educação
CAPES

Volume 6

INTRODUÇÃO

A tarefa de implantar o Sistema Único de Saúde - SUS, inscrito na Constituição Federal de 1988, criado sobre os pilares da universalidade, integralidade e eqüidade, é o desafio central no setor saúde que se impõem aos políticos, gestores, educadores, estudantes, técnicos e sociedade, como modo de superar o hiato entre necessidade da população e oferta de serviços pelo poder público, produzido ao longo de um século (1889/1990) através de práticas assistenciais apoiadas em compreensões restritivas sobre saúde.

Para Moraes (1996), a partir da Constituição Federal de 1988, a doutrina jurídica permite considerar genericamente a saúde como um direito social próprio ao Estado do Bem-Estar Social, além de propor sua inserção no novo âmbito dos direitos de terceira geração, ou seja, como vinculada ao caráter de solidariedade e, como tal, atrelada ao direito ao desenvolvimento. Dessa forma, podemos pensá-la como um interesse que incorpora um conjunto não identificável de titulares, tal qual os interesse ditos difusos e, assim, a veremos como promoção da saúde, e não apenas como cura ou prevenção de doenças. Nessa perspectiva, teríamos como núcleo central a idéia de qualidade de vida, podendo-se ver a saúde como um dos elementos da cidadania, como um direito à promoção da vida das pessoas, um direito de cidadania que projeta a pretensão difusa e legítima a não apenas curar/evitar a doença, mas a ter uma vida saudável, expressando uma pretensão de toda a sociedade a um viver saudável, como direito a um conjunto de benefícios que fazem parte da vida urbana.

Desse modo, a interpretação constitucional permite que, quando se fala em saúde, não se tenha em mente a sua relação com a doença e, conseqüentemente, com a morte. Ao contrário, é preciso adotar uma posição auto-reflexiva da saúde relacionada com ela mesma e, por conseguinte, com a vida; vida caracterizada como mera sobrevivência, mas uma vida qualificada pelo acesso aos benefícios da cidade. (MORAES, 1996).

Para Carvalho & Ribeiro (1998), modelo assistencial é definido "como a maneira como são organizadas e combinadas, em sociedade concreta, as diversas ações de intervenção no processo saúde-doença". Esta organização e combinação por sua vez, pautadas pelo conceito de saúde vigente, irão refletir através das políticas públicas, o comprometimento e priorização de cada país com os direitos fundamentais de cidadania.

Segundo Mendes (1999a), a concepção do processo saúde-doença tem evoluído, consideravelmente, desde a maior vinculação com as doenças e a morte (aproximações negativas), até concepções mais vinculadas à qualidade de vida de uma população, um ponto de encontro, um produto social, portanto, uma aproximação positiva. O autor ampara "aproximações negativas" nas explicações oferecidas no bojo do desenvolvimento da microbiologia - concepção monocausal, em que os problemas de saúde se explicam por uma relação agente/hospedeiro, passando pela multicausalidade com ampliação de variáveis (idade, raça, sexo, renda, entre outras), porém permanecendo a lógica anterior de enfrentamento dos problemas. O aspecto "aproximações positivas" para ele, guarda estreita relação com condições de vida numa abordagem mais globalizante.

Acompanhando atentamente e participando de algum modo da implantação do SUS, desde 1990, podemos observar que as dificuldades são de várias ordens, destacando-se entre elas: o financiamento das ações de saúde; o modelo de gestão e a definição clara de função para os três entes governamentais (federal, estadual e municipal) e a substituição do modelo assistencial hegemônico - baseado na doença e em ações curativas individuais - por um conjunto de práticas consubstanciadas por um novo pensar-atuar em saúde numa perspectiva mais ampla de base coletiva, com sustentação nos pilares da solidariedade e da co-responsabilização.

Considerando a atualidade do tema e a oportunidade de registrar o conteúdo de minha participação no importante veículo de divulgação da Enfermagem Brasileira - Escola Anna Nery - Revista de Enfermagem, busquei acrescentar um pouco mais de informações ao que falei, dando ênfase a questão do modelo assistencial, por acreditar que essa é a dimensão que faz mais conexões com os principais elementos do meu trabalho como enfermeira e docente, o ensino-serviço em saúde.

Depois da Conferência de Alma Ata, em 1978, cujo pacto Saúde para Todos no Ano 2000 foi assinado também pelo Brasil, e sob a influência da Reforma Sanitária Brasileira dos anos 70-80, os programas editados desde a década de 20 no país, tanto àqueles destinados às distintas etapas do ciclo vital - Saúde da Mulher, Saúde da Criança, Saúde do Adolescente, Saúde do Trabalhador, Saúde do Idoso, como ao controle de agravos - Hipertensão, Diabetes, Tuberculose, Hanseníase, DST/AIDS etc, foram reformulados e alguns ampliados.

Seus resultados, no entanto, não significaram melhoria nas condições de saúde da população brasileira: a mortalidade infantil continuava fora dos padrões preconizados pela Organização Mundial de Saúde (OMS). No ano de 1980, a mortalidade infantil no Brasil era de 85,6 por 1000 nascidos vivos, e na Região Nordeste atingia o valor de 120 por 1000 (MARANHÃO, JOAQUIM & SIU, 1998); em 1984, a taxa nacional era de 81,5 por 1000 nascidos vivos, e a da região Nordeste de 88,9 por 1000. (BRASIL, 1997b). No Ceará, naquele ano, em cada 1.000 crianças nascidas vivas, 107 morriam.

Nesse contexto surgiram, como iniciativa governamental, programas de extensão de cobertura desenvolvidos com agentes de saúde em vários estados do Brasil, como o projeto Montes Claros/MG, o PIASS e o projeto DEVALE - experiência do Vale do Ribeira/SP (PAIM, 1999b). Contemporáneamente, na região Nordeste, iniciou-se uma experiência com Agentes Comunitários, trazidos ao Brasil pelas mãos do UNICEF, a partir de um trabalho que esta instituição já desenvolvia em países africanos. Tais iniciativas ofereceram ao Ministério da Saúde os fundamentos para a formulação do PACS - Programa de Agentes Comunitários de Saúde.

O trabalho com a UNICEF começou com um programa voltado para a atenção materno infantil, no Estado de Pernambuco sob responsabilidade do Instituto Materno Infantil de Pernambuco (IMIP). Em 1984, o UNICEF criou, junto com a Secretaria de Estado de Saúde do Maranhão, uma proposta de atuação em três municípios: São Luís, São José do Ribamar e Passo do Lumiar. Os agentes, em número de 400, eram voluntários e coletavam dados sobre crianças desnutridas, saneamento básico, renda percapita e escolaridade.

Em 1987, em função da grave seca que assolou o Estado do Ceará, e de sua já citada alta taxa de mortalidade, o governo estadual, com recursos federais, iniciou um trabalho voltado para o combate da mortalidade infantil com Agentes Comunitários de Saúde (ACS). Em meados de 1988, sem recursos federais, porém diante de resultados favoráveis, o poder estadual assumiu a experiência como uma ação de governo e passou a adotá-la em todo território cearense.

O Programa Agente de Saúde do Ceará, implantado de 1987 a 1990, obteve maior visibilidade política na medida em que melhorou a cobertura vacinal das crianças e o atendimento às gestantes (PAIM, 1999b). A mortalidade infantil foi reduzida em 32%, levando o Estado do Ceará a receber, em 1991, o Prêmio Maurice Pate conferido pelo UNICEF como reconhecimento pelo resultado alcançado. Em outros estados - Paraná, Mato Grosso do Sul, também de forma isolada e focalizada, segundo Viana & Dal Poz (1998), o programa se desenvolveu como uma política estadual.

Assim, em 1991, o Ministério da Saúde decidiu implantar nacionalmente o Programa de Agentes Comunitários de Saúde - PACS, cuja área de atuação inicial foi a Região Nordeste, assumindo como prioridade a educação em saúde e a atenção ao grupo materno-infantil. Na região Norte, dada a epidemia de cólera, a implantação do PACS ocorreu em caráter emergencial e voltado à população de modo geral.

A partir daí, o programa foi gradativamente estendido a outras regiões, chegando em junho de 2002 com 166.487 ACS em ação, prestando acompanhamento a cerca de 88 milhões habitantes.

Com a implantação do PACS, começou a ser desenvolvida no país uma experiência de trabalho centrada nos princípios da territorialização e da adscrição de clientela, segundo os quais os ACS são responsáveis por microáreas (pequenos territórios dentro de um bairro) e acompanham 150 famílias. Além disso, o PACS prioriza a existência de vínculo com a comunidade, razão pela qual ser residente local é condição obrigatória para o trabalho do ACS.

Outro princípio importante do PACS é o controle social. A participação da população é considerada imprescindível na discussão dos problemas de saúde da comunidade e na avaliação da qualidade dos serviços de saúde. As ações do PACS estão orientadas para a vigilância à saúde das famílias acompanhadas, ficando a capacitação e orientação dos ACS sob a responsabilidade do enfermeiro instrutor-supervisor.

Embora a Constituição Federal de 1988 tenha sido concebida no bojo dos direitos humanos, as ações implementadas nos diversos setores - educação, saúde, lazer, meio ambiente - continuaram a gerar programas verticalizados, desintegrados, isolados e competitivos que, na sua grande maioria, tinham apenas o indivíduo como foco de atenção. A partir da experiência do PACS, inicialmente voltado para a área materno-infantil, a família começa a ser compreendida como objeto de atenção e passa também ser introjetada a idéia da vigilância num sentido mais abrangente.

Com base na aceitação e resultados do PACS e visando atender às reivindicações dos secretários municipais de saúde que queriam apoio para implementar ações de atenção básica, o Ministro da Saúde Henrique Santillo, em 1993, ano que antecede ao escolhido pela OMS como Ano Internacional da Família, convoca uma reunião para discutir as bases de expansão do Programa de Agentes Comunitários de Saúde. Participaram desta, técnicos do Ministério, Secretários Estaduais e Municipais, consultores internacionais e especialistas em Atenção Primária em Saúde - APS.

Em 1994, o Programa Saúde da Família - PSF, hoje denominado Estratégia Saúde da Família, foi lançado com o propósito de colaborar decisivamente na organização e institucionalização do SUS, com a seguinte afirmação do Ministro da Saúde (BRASIL, 1994b):

"ao contrário do modelo tradicional, centrado na doença e no hospital, o PSF priorizará as ações de proteção e promoção dos indivíduos e da família, tanto adultas quanto crianças, sadios ou doentes, de forma integral e contínua. A equipe de saúde em regime de dedicação exclusiva e vivendo no local, atenderá uma comunidade entre 800 a 1000 famílias, possibilitando um conhecimento profundo, um bom relacionamento, favorecendo a humanização do atendimento e o desenvolvimento de responsabilidade mútua."

Quanto à operacionalização inicial, o programa passou pelo processo de adesão, através de convênios formalizados entre o Ministério da Saúde e os Estados. Onde não houvesse esta adesão, os municípios interessados encaminhavam suas propostas à Comissão Intergestores Bipartite - CIB, de modo que o Ministério da Saúde pudesse contemplar os municípios a serem beneficiados pelo PSF no SIA/SUS, segundo a NOB 01/93.

Para a gestão do PSF, foi criada pelo Ministério da Saúde uma Coordenação de Saúde da Comunidade - COSAC, vinculada à Fundação Nacional de Saúde -FNS, cuja gerência específica estava articulada à do PACS, de Parteiras Tradicionais e de Interiorização do SUS. Foi sugerida pelo Ministério da Saúde a criação de uma Coordenação no nível estadual articulada com programas e ações afins. O financiamento inicial para o PSF, proposto aos municípios, se deu com recursos do SIA/SUS, mediante convênios, e para os Estados, o Ministério da Saúde se propôs a repassar recurso financeiro para a execução das atividades de planejamento, capacitação e supervisão das equipes.

Em 1995, o Ministro da Saúde Professor Adib Jatene transferiu o PSF da Fundação Nacional de Saúde (FNS) para a Secretaria de Assistência à Saúde - SAS/MS. Segundo estudo de Viana & Dal Poz (1998) algumas razões dessa transferência são o sucesso do PACS em resultados e no desenvolvimento de novas práticas e novas abordagens profissionais (agente com supervisão de enfermagem); a experiência do programa de Médico de Família de Niterói e a experiência do programa Metropolitano de Saúde em São Paulo, na década de 80.

Nessa época, a discussão sobre mudança na forma do financiamento da Atenção Básica começa a ganhar força na Secretaria de Assistência a Saúde - SAS/MS. O PSF veio ao encontro desse pensamento, contribuindo efetivamente para romper com a lógica de pagamento por procedimento no âmbito da Atenção Básica, à medida que os resultados de sua implantação tornavam cada vez mais claro que, para uma prática assistencial cujos princípios são a territorialização e a adscrição da clientela, o mais coerente é um financiamento em bases per capita bem como incentivos a respostas que refletissem melhorias da qualidade de vida.

Com a reformulação da estrutura do Ministério da Saúde em 2000, o PSF vai para a Secretaria de Políticas de Saúde e ganha status de Departamento de Atenção Básica, agregando-se a ele outros programas. Soma-se a isso, os avanços produzidos pelas Normas Operacionais Básicas de 1996 e de 1999 e a Norma Operacional da Assistência em 2000, tanto no que se refere a questão do financiamento quanto da gestão. Assim, em junho de 2002, o número de equipes do SF chega a marca de 15.523 equipes em 4.114 municípios atendendo 53 milhões de pessoas.

Para concluir essa etapa da abordagem, gostaria de enfatizar que no processo de reforma do setor saúde que culminou com a implantação do SUS pela Constituição Federal de 88, a Estratégia Saúde da Família é um movimento com respostas efetivas na melhoria de alguns indicadores de saúde, dentre os quais destacam-se as reduções da mortalidade infantis e maternas, e também se constitui, na atualidade, na grande referência para transformação do modelo assistencial brasileiro.

Cabe a uma equipe de Saúde da Família composta por 1 médico, 1 enfermeiro, 1 auxiliar de enfermagem e de 5 a 6 agentes comunitários de saúde a responsabilidade sanitária de uma área onde vivem cerca de 1.000 famílias ou 3.450 pessoas. O processo de trabalho das equipes se caracteriza pelas seguintes ações principais: a) cadastramento de todas as famílias residentes em sua área de abrangência, b) elaboração do diagnóstico das condições socioeconômicas e de saúde da população sob sua responsabilidade, c) identificação dos indivíduos e famílias que necessitam de atenção especial, aquelas que estão mais expostas às situações de maior risco de adoecer ou morrer.

A ênfase das atividades das equipes é a promoção da saúde, facilitado pelo vínculo entre os profissionais e as famílias, que cria um espaço privilegiado para incorporação de hábitos saudáveis. Ainda como característica marcante em SF, vale destacar a importância que é dada as ações intersetoriais, mediante as parcerias à medida que se amplia a compreensão de que a saúde é determinada por situações que dizem respeito às condições de vida.

As condições de empregabilidade na área materno-infantil do setor público: a Estratégia Saúde da Família

Superada em parte a questão do financiamento e a do modelo de gestão do SUS, Recursos Humanos em Saúde é na atualidade, sem dúvida, o desafio principal da agenda do Sistema. Com a implantação da Estratégia Saúde da Família, essa questão ficou ainda mais evidenciada. A força da cultura da doença conseqüentemente associada ao ambiente hospitalar e a figura do médico, à sofisticação dos aparelhos, a tendência à especialização, não é um privilégio do modelo assistencial. Talvez seja ainda mais intensa e presente no modelo de formação profissional, visto que um expressivo contingente de alunos faz a quase totalidade da sua formação em cenários hospitalares, onde a racionalidade do modelo hegemônico é muito forte.

O dilema está colocado e não me parece ser falso ao contrário, ele é de grande complexidade e vai exigir muita parceria, vontade política e habilidade para promover as mudanças necessárias. Embora as reformas sanitárias de países que influenciaram o Brasil, como Canadá, Espanha, Cuba, entre outros, sejam exitosas no caminho da desospitalização, no Brasil isso vai exigir muito estudo, debate, reflexão e cooperação ampla, em especial, entre os Ministérios da Saúde e da Educação. Enfoco apenas um tema desse debate, a gestão dos Hospitais Universitários que absorve sobremaneira os docentes das Universidades Públicas, dificultando ainda mais o desafio da abertura de novos cenários na área da Atenção Básica na qual a Estratégia Saúde da Família ocupa a centralidade da mesma.

Corneta, Maia & Costa (1996) lembram que a II Conferência Nacional de Recursos Humanos para a Saúde apontou e sinalizou que a abordagem da formação do trabalhador de saúde deve privilegiar alguns aspectos críticos, dentre os quais situam-se a questão dos paradigmas curriculares vigentes e sua coerência com os paradigmas assistenciais preconizados para o Sistema Único de Saúde. Ressaltam também o papel e as formas de regulação desses sistemas sobre a formação profissional em questões mais específicas, como a profissionalização da força de trabalho de nível médio e a educação continuada nos serviços de saúde.

Movido por essa preocupação, em 1996, o Ministério da Saúde buscou aproximar o ensino do serviço, através de uma estratégia denominado Pólo de Capacitação, Formação e Educação Permanente de Pessoal em Saúde da Família, constituída por concorrência pública, com recursos do programa de Reforço à Reorganização do Sistema Único de Saúde (REFORSUS). Tal estratégia partiu da constatação de que um dos maiores obstáculos ao andamento do PSF, bem como à sua ampliação, é a inadequada formação dos profissionais para o desempenho de atividades de promoção e assistência dos grupos familiares, e de que as bases técnicas e filosóficas, exigidas para sua atuação em equipe não encontravam respaldo no processo de formação, tanto no curso de graduação como da especialização em voga no mercado educacional brasileiro (BRASIL, 1996).

Na elaboração do termo de referência que subsidiou a apresentação dos projetos para a referida concorrência, o conceito de Pólo (BRASIL, 1996) é a "articulação de uma ou mais instituições voltadas para a formação, capacitação e educação permanente de recursos humanos em saúde vinculados às universidades ou constituindo instituições isoladas de educação superior, que se consorciam ou estabelecem convênios com as Secretarias de Estado de Saúde e/ou Secretarias Municipais de Saúde, para estabelecerem programas destinados ao pessoal vinculado à prestação de serviços em saúde da família no âmbito de um ou mais municípios. É, portanto, uma rede de instituições comprometidas com a integração ensino/serviço, voltadas para atender a demanda de pessoal preparado para a estratégia de saúde da família no âmbito do SUS"

No total, foram apresentados 21 projetos cuja análise resultou na aprovação de 10 deles como Pólos, 6 como Projetos de Capacitação e 5 como Projetos de Cursos. No Estado do Rio de Janeiro, foram aprovados os projetos da UFF e da UERJ, que se constituíram como núcleos do Pólo do Rio de Janeiro. Em 1998, mais dez projetos foram aprovados como Pólos, dentre os quais o da Fundação Educacional Serra dos Órgãos - FESO, em Teresópolis, passando então o Estado do Rio a contar com três núcleos financiados com recursos do REFORSUS.

Dentre as principais realizações do PCSF-RJ, encontra-se o Treinamento Introdutório pelo qual já foram capacitados mais de 3.000 profissionais das Equipes de Saúde da Família dos diversos municípios do Estado do Rio de Janeiro, na sua maioria enfermeiros. Atualmente estão sendo concluídas todas as exigências para dar início ao Programa de Especialização e de Residência em Saúde da Família, frutos de uma concorrência internacional do MS, vencidos pelo Consórcio PSF-RIO integrado pela UERJ, UNIGRANRIO, Universidade Severino Sombra (USS) e Faculdade de Medicina de Petrópolis.

Vale registrar que os Pólos têm um papel importante, pois ajudam na capacitação dos profissionais que já estão no mercado, dando-lhes um preparo introdutório centrado na reorientação do modelo assistencial com ênfase no conceito de Vigilância em Saúde e na abordagem de outros temas: Normas Operacionais Básicas e Norma Operacional de Assistência à Saúde, território, adscrição de clientela, entre outros. Soma-se a isso outras atividades de natureza investigativa como o estudo sobre perfil do profissional de Saúde da Família, atribuições, avaliação e metodologias de aprendizagem.

Embora sejam significativos os resultados e avanços alcançados em termos numéricos no que diz respeito à inserção dos trabalhadores de enfermagem em SF (mais de 20.000 enfermeiros e de 30.000 auxiliares de enfermagem no país), a situação de empregabilidade é semelhante para todos os profissionais que integram as equipes de SF.

Acrescente-se a esse número outros enfermeiros que participam do Programa de Interiorização em Saúde - PITS, cujos quantitativos ainda não está disponível.

Em 2000, o Ministério da Saúde publicou os resultados do estudo Perfil dos Médicos e Enfermeiros do Programa de Saúde no Brasil, para o qual foram entrevistados 3.131 profissionais (1.480 médicos e 1.651 enfermeiros).

No item perfil mercado de trabalho, a situação dos enfermeiros que atuam em SF é a seguinte: 1) enfermagem em saúde pública (21,93%); 2) enfermagem de unidade de saúde (11,69%); 3) gerenciamento de serviços de enfermagem (11, 14%); 4) enfermagem médico-cirúrgica (10,90%); 5) enfermagem obstétrica (3,15%); 6) enfermagem psiquiátrica e saúde mental (2,67%); 7) enfermagem materno - infantil (2,67%); enfermagem pediátrica (1,82%); 9) enfermagem do trabalho (1,51%); 10) enfermagem neonatológica (1,33%).

Dentre as modalidades de contratação sugeridas pelo Ministério da Saúde para SF destacam-se: convênio com Organizações Governamentais - ONGs e cooperativas; contrato com empresas por meio de licitação; contrato temporário, renovável por 4 anos; cargo efetivo, mediante concurso público; e ainda, cargo em comissão, estabelecendo vínculo temporário com a administração pública.

Os dados do referido estudo apontam que, no país, 45,88% dos médicos e 43,67% dos enfermeiros são incorporados à Estratégia SF por meio de contratos temporários. Ao comparar a informação entre as regiões, verifica-se a ausência de alguma padronização na forma de contratação. À exceção da Região Sul (na qual 41,77% dos médicos e 44,44% dos enfermeiros são contratados pelo estatuto do Servidor Público) e Centro Oeste (na qual cerca de 50% dos médicos e enfermeiros são contratados pelo regime celetista), nas demais regiões predominam a precariedade dos vínculos empregatícios. No Norte, mais de 67% dos médicos e 57% dos enfermeiros são contratados de forma temporária.

Somando os contratos temporários e demais formas precárias de incorporação do trabalho (por cooperativa e cargos em comissão), observa-se que no Brasil, 61,83% dos médicos e 61, 17% dos enfermeiros no SF não têm garantias jurídicas de direitos trabalhistas (MACHADO, SOUZA & SOUSA , 2000).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora sem estudos específicos e atualizados sobre essa questão, quero registrar com base na minha vivência que, hoje, a discussão sobre o tema vínculo e fixação de pessoal das equipes tem ocupado espaço considerável na agenda dos encontros, seminários, treinamentos, cursos de especializações em SF, levando-nos com ressalvas a considerar que essa é uma fragilidade que precisa urgentemente ser superada. Se ficarmos atentos ao que ocorre no cenário das profissões e ocupações, observamos que isso não acontece somente em SF. Certamente ela ganha contornos mais acentuados pelo fato de ser a área do setor saúde que desde sua criação, em 1994, tem gerado ampliação dos postos de trabalho.

Portanto, acredito que as condições de empregabilidade em Saúde da Família são uma questão que precisam ser examinadas e enfrentadas com muito vigor, à luz da conjuntura política, econômica e social, onde o desemprego e a precarização do trabalho estão ocupando, junto com a questão da violência, a centralidade dos debates para a escolha dos novos governantes - executivos e parlamentares - do país no pleito eleitoral de 2002. A saída para a crise brasileira e suas nefastas conseqüências, sem dúvida, passa pela mudança de modelo econômico, cuja atual opção de natureza liberal tem gerado enorme exclusão e desigualdade social. De qualquer forma, como diz Heloísa Machado de Souza (1999b), começar o novo é sempre o caminho mais difícil, mas é a única garantia de que, percorrida a estrada, o olhar para trás não busca explicar o que não se fez ou o que poderia ter sido e, sim, aprender com a ação, para fazer do futuro uma construção diária.

 

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