ISSN (on-line): 2177-9465
ISSN (impressa): 1414-8145
Escola Anna Nery Revista de Enfermagem Escola Anna Nery Revista de Enfermagem
COPE
ABEC
BVS
CNPQ
FAPERJ
SCIELO
REDALYC
MCTI
Ministério da Educação
CAPES

Volume 11, Número 1, Jan/Mar - 2007

PESQUISA

 

Percepções maternas sobre o neonato em uso de fototerapia

 

Maternal perceptions about the newborn in use of phototherapy

 

Percepciones maternales sobre el recién nacido en uso de fototerapia

 

 

Francisca Leonilda Sampaio RodriguesI; Isolda Pereira da SilveiraII; Antonia do Carmo Soares CamposIII

IEnfermeira do Hospital Distrital Gonzaga Mota de Messejana. Especialista em Enfermagem neonatológica. E-mail: isa.silveira@terra.com.br
IIEnfermeira obstetra da Maternidade. Escola Assis Chateaubriand (MEAC) Universidade Federal do Ceará (UFC). Mestre em Enfermagem Clínico Cirúrgica. Docente do Curso de Enfermagem da Faculdade Integrada da Grande Fortaleza. E-mail: isolda_silveira@yahoo.com.br
IIIEnfermeira da UTI Neonatal da MEAC/UFC. Doutora em Enfermagem. Docente do Curso de Enfermagem da Universidade de Fortaleza UNIFOR. E-mail: ankardagostinho@terra.com.br.

 

 


RESUMO

A fototerapia é o tratamento inicial da icterícia neonatal. Objetivamos conhecer a percepção da mãe acerca da fototerapia e identificar as suas dificuldades, relacionadas ao tratamento fototerápico. Estudo descritivo com abordagem qualitativa, realizado no Alojamento Conjunto (AC) de um hospital público em Fortaleza-CE, com 8 puérperas na faixa etária entre 13 e 25 anos. Os dados foram coletados em maio e junho/2006, mediante entrevista com duas questões de pesquisa: O que representa para a senhora ver o seu filho sob fototerapia; quais são as dificuldades enfrentadas em relação aos cuidados com o seu bebê na fototerapia? Na análise das falas, identificamos as categorias: percepção da mãe com relação ao cuidado com o bebê sob a fototerapia, dificuldades enfrentadas pela mãe com seu filho em fototerapia, e a mãe após as orientações recebidas. Concluímos que existe a necessidade de repensar as orientações e assumir autenticamente os cuidados de enfermagem ao binômio mãe-filho.

Palavras-chave: Fototerapia. Mães. Recém-Nascido. Enfermagem.


ABSTRACT

Phototherapy is the initial treatment for neonatal ictericia. We aimed to know mother's perception about this treatment and to identify theirs difficulties related to the phototherapy treatment. It is a descriptive study with qualitative approach. It was conducted in the shared accommodation (SA) of a public hospital in Fortaleza-CE, with 08 puerperal women in the age group from 13 to 25 years old. The data were collected in May and June/2006, before interview with two orienteering questions's research: What does it mean for you to see your child under phototherapy; What are the difficulties faced in relation to the care with your baby under phototherapy? In the analysis of the speeches we identified the categories such as: perception of the mother about the care with her baby under phototherapy, difficulties faced by the mother with her child under phototherapy and the mother after receiving the orientations. We concluded that it is necessary to rethink the orientations and assume authentically the Nursing care to the binomial mother-son.


Keywords: Phototherapy. Mothers. Newborn. Nursing.


RESUMEN

La fototerapia es un tratamiento inicial de la ictericia neonatal. El Objetivo fue conocer la percepción de la madre sobre la fototerapia e identificar las dificultades de la madre con relación a este tratamiento. Estudio descriptivo con abordaje cualitativa. Realizado en el Alojamiento Conjunto (AC) de un hospital público en Fortaleza-CE, con 08 parturientas con edad entre 13 a 25 años. Los datos fueron colectados en mayo y junio/2006, a través de entrevista con dos cuestiones de investigacíon: ¿Qué representa para la señora observar su niño en fototerapia?¿Cualés las dificultades enfrentadas con relación a la atención con su niño en la fototerapia? En la análisis de las hablas, observamos las categorias: percepción de la madre con relación a la atención con el niño en fototerapia, dificultades sufridas por la madre, con su hijo en fototerapia, y la madre después de las orientaciones recebidas. Concluimos que hay la necesidad de pensar una vez más las orientaciones y asumir autenticamente las atenciones de Enfermería al binomio madre-hijo.

Palabras clave: Fototerapia. Madres. Recién Nacido. Enfermería.


 

 

INTRODUÇÃO

As doenças que acometem os neonatos têm sido tema de inúmeras pesquisas de Enfermagem. Dentre elas, a hiperbilirrubinemia, observada em unidades neonatais de alto e médio risco e em Alojamento Conjunto (AC), é tratada pela fototerapia, tratamento por meio da luz. O desenvolvimento da icterícia pode ser percebido pela cor amarelada da pele, considerado a evidência clínica mais visível.

No Brasil nascem cerca de 200 mil crianças com índices elevados de bilirrubina no sangue, o que equivale em média a 5% dos nascimentos 1.

A primeira referência escrita sobre a icterícia não patológica data de 1973 e se deve a Bartolomeu Metlinger, e sobre o tratamento da icterícia, a referência é devida a Michel Ettmüller, em 1708, que, em seu livro "De infantum morbis", recomenda oferecer leite humano desde o primeiro dia de vida 2.

A idéia da utilização do aparelho de fototerapia surgiu na década de 1950 pela observação de uma enfermeira, J. Ward, chefe da Unidade de prematuros de um hospital na Inglaterra 3:12.

Foi em 1956 que a enfermeira inglesa J. Ward percebeu que as crianças diminuíam o tom amarelado da pele quando expostas à luz solar, quando dormiam próximas da janela ou tomavam banho de sol no jardim do Rockford General Hospital, na cidade de Essex .1..

Os primeiros estudos sobre os efeitos da luz no metabolismo da bilirrubina foram realizados pelo doutor R.J. Cremer, considerado o pai da fototerapia. No Brasil, a fototerapia teve seu início de uso em 1960, e na cidade de São Paulo havia um modelo inglês trazido por um médico hematologista, doutor Humberto Costa Ferreira, da Faculdade de Medicina de São Paulo 3.

A icterícia aparece no período neonatal, sendo considerada benigna na maioria das vezes, cedendo nos primeiros dias após o nascimento, embora em algumas situações possa apresentar-se patológica e neste caso necessitar de tratamento médico e terapêutica precoce, sendo uma alteração creditada ao metabolismo do neonato4.

A bilirrubina é um produto final do catabolismo dos aminoácidos e hemoproteínas, sendo formada, principalmente, pelo catabolismo da hemoglobina no baço e no fígado.

A hiperbilirrubinemia tem como causa etiológica doenças hemolíticas tais como incompatibilidade sangüínea materno-fetal (Rh-ABO), cefalematomas e policitemias.

A icterícia neonatal é classificada em fisiológica e patológica, sendo considerada fisiológica quando o aumento da bilirrubina atinge 7mg/dl durante a primeira semana de vida, e patológica quando visível nas primeiras 36 horas, e com um aumento total maior que 5mg/dl 5.

Para que a avaliação da icterícia em recém-nascidos seja possível sem a necessidade de coleta de sangue, utiliza-se uma nova tecnologia não invasiva denominada BiliCheckTM. Esse procedimento é indicado para avaliação da icterícia em bebês de até 20 dias de idade. O seu resultado é imediato e permite que a quantificação da bilirrubina forneça informações necessárias para que as condutas apropriadas sejam tomadas.

A fototerapia é o tratamento inicial da hiperbilirrubinemia não conjugada em neonatos. É considerado um método não invasivo e de alto impacto na diminuição dos níveis de bilirrubinas plasmáticas, independente da maturidade do recém-nascido 6.

Contudo, para que o tratamento seja efetivo, alguns cuidados são necessários, tais como despir o neonato para que a incidência dos raios luminosos incidam sobre a maior extensão possível da superfície corporal, e proteger adequadamente os globos oculares com máscara opaca para evitar agravos à retina 7.

Embora estes procedimentos sejam comuns aos profissionais de saúde, deve-se considerar que:

Para a mãe que vivencia pela primeira vez um filho sob fototerapia, esta visão pode parecer assustadora ou, no mínimo, estranha, de acordo com sua percepção em relação ao tratamento, seus riscos e benefícios8:20.

Nesse contexto, o presente estudo tem como objetivos:

- Conhecer a percepção da mãe acerca da fototerapia e;

- Identificar as dificuldades da mãe relacionadas ao tratamento fototerápico.

 

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo descritivo com abordagem de natureza qualitativa, que responde a indagações de cunho particular, visto que corresponde a um espaço profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis 9.

Teve como cenário o Alojamento Conjunto (AC) de um hospital público de médio porte, conveniado ao Sistema Único de Saúde (SUS), em Fortaleza, Ceará.

Os sujeitos foram 8 puérperas com faixa etária entre 13 e 25 anos, sendo 3 primíparas, 3 secundíparas e 2 multíparas, independente do tipo de parto e da idade gestacional. Todas as participantes estavam acompanhando seus filhos submetidos à fototerapia. O critério de inclusão no estudo foi ser mãe de um neonato em tratamento fototerápico no AC.

Os dados foram coletados no período de maio e junho de 2006, por meio de entrevista com duas questões de pesquisa: O que representa para a senhora (nome da puérpera) ver o seu filho sob fototerapia; quais são as dificuldades enfrentadas em relação aos cuidados com o seu bebê na fototerapia? Com o consentimento prévio das participantes, utilizamos como recurso adicional um gravador para registrar os discursos. O tempo médio de duração de cada entrevista foi de 30 minutos, durante o expediente de trabalho de uma das pesquisadoras.

As falas das participantes foram organizadas em categorias e submetidas à análise de conteúdo10, que permite enfocar seus principais aspectos em suas três etapas: pré-análise (que corresponde à exploração do material), tratamento dos dados obtidos e interpretação.

A presente pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisas, dentro dos princípios basilares da Resolução 196 de 10/10/199611. Todas as participantes assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido e foram informadas do objetivo do estudo, sendo-lhes assegurados o direito à privacidade, sigilo, acesso aos dados, bem como a liberdade de se retirarem do estudo se assim o desejassem sem que este fato representasse qualquer tipo de prejuízo para si ou para o neonato. Como forma de anonimato, atribuímos nomes fictícios às participantes.

 

ANÁLISE E APRESENTAÇÃO
DOS RESULTADOS

As puérperas entrevistadas receberam nomes de pedras preciosas: Topázio, Turmalina, Ametista, Esmeralda, Brilhante, Ônix, Rubi e Ágata, pelo fato de representarem preciosidades comparadas às preciosidades existentes no ser mãe.

Com as entrevistas já realizadas e analisadas, identificamos as seguintes categorias: percepção da mãe quanto ao cuidado com o bebê sob a fototerapia; dificuldades enfrentadas pela mãe com seu filho em fototerapia; e a mãe após as orientações recebidas.

Categoria 1: Percepção da mãe quanto ao cuidado com o bebê sob fototerapia

Os sentimentos são caracterizados por estados de afetividade diante os fenômenos da vida de cada ser humano. De acordo com o autor 12:118 "a linguagem dos sentimentos pode ser positiva e negativa, proveniente das percepções ou sensações que experimentamos em nosso cotidiano". Portanto, os sentimentos podem afetar a vida cotidiana do ser humano, principalmente quando surgem situações delicadas que envolvam a família e particularmente os filhos.

Diante das falas, entendemos que, na percepção das puérperas, o temor de colocar o bebê sob a luz é um dos pontos cruciais por abalar muito todo o seu ser.

Subcategoria: Temor da luz

Cientificamente, a luz faz parte de um comprimento de onda sensível ao olho humano, de uma radiação eletromagnética pulsante ou, em um sentido mais geral, qualquer radiação eletromagnética que se situe entre as gamas infravermelha e ultravioleta 13.

A fototerapia é um aparelho que utiliza luz para fins terapêuticos, especialmente em bebês que necessitem permanecer expostos a essa luz. Entretanto, para as mães, a luz é temida e apavorante, como constatamos nas falas que seguem.

[...] o calor da luz, os olhos cobertos devem doer muito, é ruim, pois tudo é escuro (Brilhante).

[...] Tenho medo de ele não poder mais enxergar, penso que a luz está entrando nos seus olhos (Topázio).

[...] Pra mim sinto que esta luz dá muito calor ao meu filho, e fico angustiada. Passo o tempo inteiro olhando se a proteção esta bem aderida, direitinha. E nem durmo bem de tanta preocupação (Turmalina).

[...] Tive muito medo da luz. Mas depois vi que essa luz é uma cura. Ele está sofrendo, mas é o melhor, então fico conformada (Esmeralda).

[...] Sinto pena por ele ficar com o corpo quente, como se a luz fosse queimar o seu corpo, e a proteção dos olhos deve maltratar meu filho... quando vão trocar ele chora, acho que dói (Rubi).

[...] Se eu pudesse, ficaria no lugar dele, cuido o tempo todo dele. Não gosto de ver o meu filho com aquela coisa nos olhos, sinto que maltrata. Ele fica na escuridão e eu no claro (Ágata).

Nos depoimentos de Ágata, Rubi e Brilhante, a venda nos olhos do bebê maltrata. Além do mais, acreditamos no impacto enfrentado pela mãe no primeiro momento, ao ver o bebê com a venda escura nos olhos. Para elas é apavorante. No entanto, elas se conformam, por cofiarem no referido tratamento.

Topázio comenta sobre a preocupação com a luz, por temer que o seu filho não enxergue após o tratamento. Entendemos a sua preocupação e sabemos que o instinto materno é aguçado pelo fato de proteger sua cria.

Torna-se necessário fazer a proteção dos olhos com venda escura afim de não lesar a retina. Por ocasião das mamadas, pode-se retirar a venda para que a mãe se sinta menos temerosa 6.

A fototerapia não é isenta de risco, portanto, segundo a concepção de uma estudiosa no assunto:

É de responsabilidade da enfermeira o cuidado com o perfeito ajuste desta máscara, o suficiente para evitar a penetração dos raios luminosos sem causar desconforto ao RN ou pressionar os globos oculares ou impedir a circulação8:43.

A equipe de enfermagem atenta, preparada e competente está sempre pronta para atender a mãe e o neonato. Assim, concordamos com a seguinte afirmação7:110: "é fundamental que a equipe de enfermagem esteja sensibilizada para remover a proteção ocular com cuidado especial".

No relato de Rubi, há a preocupação com o calor do corpo do bebê e com o manuseio de troca da venda dos olhos que, segundo refere, deve doer.

A termorregulação é um dos importantes cuidados de enfermagem e, como tal, deve ser controlado, evitando maiores transtornos para o bebê.

Pesquisadores 4 relatam que, dentre os efeitos colaterais, a luz pode provocar eritema e a síndrome do bebê bronze, além de causar queimaduras, que geralmente são mais graves em RN prematuros, alteração do equilíbrio hídrico, choque, hipertermia, diarréias e possível lesão da retina.

Nos demais depoimentos, percebemos sentimentos de preocupação, de insegurança emocional e de temor, aliados ao sentimento maternal de amor pelo filho e até de tristeza, por todos os momentos que estão passando junto a eles.

A proteção ocular com venda estéril, apropriada, de tamanho adequado e bem ajustada, evita lesões nos fotorreceptores da retina. A fixação da proteção ocular é de extrema importância. A inadequada fixação pode trazer grande risco ao recém-nascido, isto é, lesionar a retina 7.

É interessante ressaltar que a troca da proteção ocular diária, e por ocasião das mamadas, favorece a interação do binômio mãe e filho, promove a comunicação não verbal e condição de aconchego, quando os olhos da mãe e do bebê se encontram 14.

Faz parte do cuidado de enfermagem fechar os olhos do neonato antes de colocar a venda e realizar a inspeção ocular para identificar drenagem de secreção ou abrasão.

Subcategoria: Aceitação do tratamento

Analisando essas falas, percebe-se o quanto é importante a conscientização da mãe com relação ao tratamento a que o seu filho está se submetendo. Entendemos todo o seu sofrimento, principalmente ao ver o quadro apresentado, isto é, o aparelho de fototerapia, o bebê com a venda escura nos olhos, a luz e, principalmente, a distância do aconchego dos braços da mãe.

[...] Sei que ele tem que ficar perto da luz. Vejo as enfermeiras passando e olhando se estão perto da luz (Ágata).

[...] Hoje faz três dias do tratamento. No primeiro dia chorei muito. Mas hoje sei que é para o bem dele. Sei que esta luz cura (Ônix).

[...] A luz, mesmo tendo preocupação, sei que vai curar o meu filho, porque vai sair a amarelidão e ele vai ficar bom (Turmalina).

[...] Estou consciente do tratamento, tem que ser assim. Então aceito. Queria estar com ele junto de mim (Esmeralda).

[...] É uma barreira entre nós dois, mas tenho que suportar... essa luz é para o bem dele (Ametista).

[...] Me assusta, me inquieta... sei que quanto mais tempo ficar na luz mais rápida é a cura e ele vem logo pra junto de mim (Topázio).

Diante das falas, entendemos que as mães estão conscientes sobre o tratamento em fototerapia. Percebemos o quando é difícil enfrentar a situação apresentada. Mesmo manifestando sentimentos de inquietação e de tristeza, todas foram unânimes em aceitar e saber que o tratamento é importante e necessário para a cura.

Como seres humanos, as mães experimentam sentimentos, especialmente o de amor, presente em todas as falas. O sentimento do amor é sabiamente descrito pela autora 15:95 desta maneira: "o amor implica a capacidade de estabelecer limites entre si e o outro, um contato de boa qualidade, com espontaneidade e aceitação".

Percebemos também que as mães ficam emocionadas diante das situações apresentadas de angústia e de aflição vividas com o bebê em uso da fototerapia. Nesse sentido, evidenciamos as palavras de outras autoras16quando enfatizam que as mães têm necessidade de segurança, de conversa, de orientação, de receber conforto, atenção e informação.

Não obstante, na maioria dos neonatos, a icterícia seja classificada como fisiológica benigna e autolimitada, segundo a pesquisadora 8:33:

Outros a apresentam como um sintoma de doença a ser investigada com a devida urgência, em razão da toxicidade da bilirrubina que, não estando ligada à albumina, pode facilmente atravessar a barreira hematoencefálica, atingir as células cerebrais e causar a cor amarelada do tecido cerebral, ou Kernicterus, cujos sobreviventes podem manifestar os mais variados graus de seqüelas neurológicas.

O Kernicterus, provém da deposição de bilirrubina no tecido cerebral causando lesões celulares, podendo acarretar paralisia cerebral e outras complicações 19

Vale ressaltar que a patologia citada evolui em três fases clínicas, e a fase mais crítica leva a seqüelas neurológicas residuais, que evoluem para o retardo mental, surdez neurossensorial, paralisia do olhar superior, disfunções motoras e displasia do esmalte dentário 20.

Portanto, quanto mais precocemente a icterícia for identificada e forem instituídas as medidas terapêuticas adequadas, melhor será o prognóstico. Autores5 versam sobre a progressão da icterícia, que pode ser lenta ou rápida. Quando a icterícia é fisiológica, não existe o comprometimento do estado geral do neonato; no caso da icterícia patológica, sinais como sucção débil, hipoatividade, hepatoesplenomegalia, anemia e anasarca podem se fazer presentes 8.

Categoria 2: Dificuldades enfrentadas pela mãe com seu filho sob fototerapia

No que tange às dificuldades enfrentadas, constatamos várias nesta categoria. Estas dificuldades foram oriundas de insegurança e desconhecimento antes de receberem as informações sobre o tratamento.

[...] Tive dificuldades em dar de mamar porque não podia tirar ele da luz por muito tempo para dar uma volta com ele (Topázio).

[...] É difícil manter o bebê no berço, ele chora bastante, deve ser incômodo para ele (Esmeralda).

[...] Acho difícil trocar as fraldas dele debaixo da luz (Rubi).

[...] Tive dificuldades para aceitar aquela coisa tapando os olhos do meu filho. Penso que maltrata. Sinto vontade de descobrir os seus olhos para olhar dentro dos olhinhos dele e ele olhar para mim (Turmalina).

[...] Primeiro foi a de aceitar meu filho debaixo da luz e com aquela coisa nos olhos, mas fiquei conformada, pois sei que é para a cura dele (Ônix).

[...] Dificuldade para amamentar e também com a venda é muito ruim... não podia ver os olhinhos dele. Quando tira a venda, dói e ele chora (Agata).

[...] A minha dificuldade é se estou dando de mamar em quantidade certa para encher a barriga dele, pois sei que quando ele faz xixi ou cocô é porque ele está mamando bem e soltando esta substância que faz a pele dele ficar amarela (Ametista).

Nas falas de Topázio, Ágata e Ametista, estão presentes as dificuldades quanto ao aleitamento materno. Ametista se preocupa com a quantidade do leite ingerido pelo bebê. Já Topázio demonstra dificuldades relacionadas ao bebê por não poder permanecer muito tempo fora da fototerapia, e Ágata, em amamentar com a venda nos olhos do filho. No entanto, para Rubi, a dificuldade é a troca de fraldas debaixo da luz.

Ficou evidente que estas dificuldades estão relacionadas ao próprio estado emocional no qual se encontram e ao desconhecimento de cuidar de seu filho sob fototerapia, o que as fazem temer por praticarem algo errado com o seu bebê. Dessa forma, evidencia-se a necessidade de maiores esclarecimentos e informações sobre o referido tratamento.

Categoria 3: A mãe após as orientações recebidas

A fototerapia, além de interromper o relacionamento amoroso mãe-bebê, é um tratamento que necessita de cuidados especiais e orientações específicas para quem cuida e principalmente às mães que ocupam lugar importante de ajuda no cuidado para com o seu filho.

Entendemos que apesar da situação vivenciada, as mães, quando são orientadas acerca da patologia e do tratamento, aceitam e até colaboram com o cuidado de enfermagem ao neonato sob fototerapia.

Nesse contexto, corroboramos as pesquisadoras17 quando enfatizam a extrema importância da orientação sobre todos os procedimentos realizados com o pequeno paciente, bem como sobre o aparato tecnológico ao redor dele. Para isso busca-se estar com a mãe e o RN.

[...] Sei que quanto mais eu amamentar, mais esta substância que causa amarelidão na pele sai na urina e fezes como foi dito pela enfermeira do plantão ontem à noite (Brilhante).

[...] A enfermeira falou ontem que tem que mudar o bebê de posição de vez em quando (Citrino).

[...] Recebi informações sobre a doença, isto me tranqüiliza (Ágata).

[...] Todos os dias as enfermeiras passam e me explicam como cuidar do meu filho (Topázio).

[...] A enfermeira me orientou como posicionar o bebê para que a luz penetre melhor em todo o corpo do meu filho (Ametista).

[...] A enfermeira me falou que a venda nos olhos é para proteger o meu filho da luz, e ter cuidado para não deixar a venda sair do lugar (Ônix).

[...] Recebi orientação para não me preocupar com a luz, porque ela trata da amarelidão da pele e a substância que faz mal sai pelo xixi e cocô (Esmeralda).

[...] Aprendi que o corpinho do bebê deve ficar descoberto. Agora aceito porque sei que faz bem (Turmalina).

Percebemos as dificuldades enfrentadas pelas mães durante todo o período de internação do filho, as preocupações advindas, o sofrimento diante do quadro clínico e o
desconhecimento sobre o tratamento. No entanto, entendem e mostram-se confiantes ao receberem as orientações.

Nesse sentido, concordamos plenamente com o seguinte pensamento: a disponibilidade da enfermeira é essencial, para ouvir, dialogar, apoiar e transmitir confiança 18.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Neste estudo buscou-se conhecer e analisar a percepção da mãe ao ver o seu filho sob fototerapia. Foi importante e gratificante no sentido de entender a relevância desta experiência para as mães mediante seus depoimentos.

As experiências verbalizadas pelas puérperas quanto as suas percepções sobre o tratamento fototerápico representaram paras elas situações de inquietação, de temor pela luz e de tristeza. Tais sentimentos merecem por parte dos profissionais de enfermagem atenção especial, principalmente sobre a orientação as estas mães.

Nos relatos, um dos pontos que mais causou impressão negativa do tratamento sob fototerapia está relacionado ao uso da venda ocular, que foi referida pelas mães como incômoda e que maltrata os olhos do bebê, além de privá-las da sensação conseguida através da interação "olho no olho".

Consideramos outro fato importante, atribuído pelas mães ao calor da fototerapia, o temor de queimar a pele do seu filho.

Os relatos destas mães representam as novas experiências vivenciadas com o neonato no ambiente hospitalar, onde percebemos o cuidado amoroso da mãe para com seu filho e, ao mesmo tempo, a sensação de medo para enfrentar o tratamento fototerápico, embora tenham sido orientadas pela equipe de enfermagem.

O presente estudo expõe situações problema geradas nas falas das mães; portanto, acreditamos que estas situações possam despertar para uma reflexão sobre a temática em pauta, assim como fazer repensar o nosso cotidiano com competência e humanismo.

Compete a nós profissionais de enfermagem vislumbrar uma nova caminhada, lembrando da importância das orientações durante o pré-natal sobre o tema em foco. Percebemos que o desconhecimento sobre o tratamento é unânime. É necessário valorizar a comunicação efetiva da equipe de saúde com a mãe do neonato sob fototerapia para que esta, sendo conhecedora do tratamento e de seus riscos e benefícios, possa estar-bem e estar-melhor enquanto vivencia a experiência de presenciar seu filho sob fototerapia.

Portanto, surge a necessidade de desenvolver novas formas de assistência, buscando a compreensão de cada mãe, além de repensar os ensinamentos e orientações para que possamos, finalmente, assumir autenticamente os cuidados de enfermagem ao binômio mãe-filho no sentido de proporcionar melhor qualidade da assistência.

 

Referências

1. Cobertor de luz do recém-nascido.[on-line] 2005[citado 05 nov 2005].Disponível em: <http/www.fpesp.br/cap

2. Pediatria Evangélico.[on-line] 2005 [citado 03 nov 2005]. Disponível em: www.pediatriaevangelico.com.br/cient/liv/icter.htm

3. Arone ME. Fototerapia: o uso da luz (foto) para o tratamento em recém-nascidos. Nursing 2003 jan;.56(6).

4. Cunha GW,Vilarin JN, Braga TDA. Neonatologia Instituto Materno Infantil de Pernambuco-IMIPI. Rio de Janeiro (RJ): Koogan; 2004. p.1555.

5. Tamez RN, Silva MJPS. Enfermagem na UTI neonatal: assistência ao recém nascido de alto risco.Rio de Janeiro (RJ): Guanabara Koogan; 2006.

6. Bueno M, Sacai S,Toma E. Hiperbilinerrubinemia neonatal: propostas de intervenções de Enfermagem. Acta Paul Enferm 2003 abr/jun;16(2):75-83.

7. Campos ACS.O significado de ser mãe de um recém-nascido sob fototerapia: uma abordagem humanística.[dissertação de mestrado].Fortaleza (CE): Universidade Federal do Ceará; 2003.

8. ______.Comunicação com mães de neonatos sob fototerapia: pressupostos humanísticos.[tese de doutorado].Fortaleza(CE):Universidade Federal do Ceará 2005.

9. Minayo MCS. Pesquisa social: teoria método e criatividade. Petrópolis (RJ): Vozes; 2002.

10. Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa (PO): Ed. 70; 2004.

11. Ministério da Saúde (BR).Conselho Nacional de Saúde. Resolução nº 196 de 1º de outubro 1996. Diretrizes e normas regulamentadoras envolvendo seres humanos.

12. Freitas KSS. O vôo da arte e da educação no cuidado do ser. Erechim (RS): Edirapes; 2001. 206p.

13. Wikipédia: a enciclopédia livre. [on-line] Luz. 2006 [citado 05 jun 2006] Disponível em: http://pt.wikipedia.org/

14. Oliveira ME. Assistência de enfermagem ao recém-nascido com icterícia fisiológica. In: Oliveira ME, Monticelli M, Brüggemann OM. Enfermagem obstétrica e neonatológica: textos fundamentais. Florianópolis (SC): Cidade Futura; 2002. 314p

15. Oliveira ME. Cuidando-aprendendo enfermagem com amor: uma experiência dialógica com mães/recém-nascidos pré-termo. In: Oliveira ME, Brüggemann OM. Cuidado humanizado: possibilidades e desafios para a prática da enfermagem. Florianópolis (SC): Cidade Futura; 2004.

16. Rocha RG et al. Imaginário das mães de filhos internados em uti-neonatal no pós-parto: contribuições para a enfermagem. Esc Anna Nery Rev Enfermagem 2004 ago;8(2):211-16.

17. Campos ACS, Cardoso MVLL. O recém-nascido sob fototerapia: a percepção da mãe. Revista Latino-am Enfermagem. 2004 jul/ ago;12(4):606-13.

18. Silveira IP. Partejar: a enfermeira e a humanização do cuidado de enfermagem. [dissertação de mestrado] Fortaleza (CE): Universidade Federal do Ceará; 2003.

19. Hammond BB. Cuidado imediato do recém-nascido. In: Lowdermilk DL, Perry SE, Bobak IM. O cuidado em enfermagem materna. São Paulo (SP): Artmed; 2002.

20. Gomela TL. Neonatologia: manejo básico, procedimentos, plantão, doenças e drogas. Porto Alegre (RS): Artes Médicas; 2006.

 

 

Recebido em 03/10/2006
Reapresentado em 18/03/2007
Aprovado em 21/03/2007

 

© Copyright 2024 - Escola Anna Nery Revista de Enfermagem - Todos os Direitos Reservados
GN1