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ISSN (impressa): 1414-8145
Escola Anna Nery Revista de Enfermagem Escola Anna Nery Revista de Enfermagem
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Ministério da Educação
CAPES

Volume 21, Número 2, Abr/Jun - 2017



DOI: 10.5935/1414-8145.20170035

PESQUISA

Percepções de profissionais de enfermagem acerca da integração do técnico de enfermagem na sistematização da assistência

Pétala Tuani Candido de Oliveira Salvador 1
Cláudia Cristiane Filgueira Martins Rodrigues 1
Manacés dos Santos Bezerril 1
Larissa de Lima Ferreira 1
Flávia Barreto Tavares Chiavone 1
Lílian de Andrade Virgílio 1
Viviane Euzébia Pereira Santos 1


1 Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Natal, RN, Brasil

Recebido em 17/10/2016
Aprovado em 27/02/2017

Autor correspondente:
Pétala Tuani Candido de Oliveira Salvador
E-mail: petalatuani@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Descrever as percepções de docentes e de profissionais da assistência acerca da integração do técnico de enfermagem na Sistematização da Assistência de Enfermagem (SAE).
MÉTODOS: Trata-se de estudo descritivo, de abordagem qualitativa. Participaram sete docentes e 13 técnicos de enfermagem vinculados a um hospital universitário do Nordeste brasileiro. A coleta de dados ocorreu a partir da técnica do grupo focal e o conteúdo textual foi submetido à análise lexicográfica.
RESULTADOS: As percepções dos docentes resultaram na análise de quatro classes: potencialidades da integração do técnico na SAE; entraves e fragilidades; formação dos técnicos; e ensino em serviço como primordial. Quanto às opiniões dos técnicos, três classes foram analisadas: representações subjetivas; potencialidades da SAE; e possibilidades de contribuição do técnico de enfermagem.
CONCLUSÃO: Docentes e profissionais da assistência descrevem as potencialidades da integração do técnico de enfermagem na SAE e a reconhecem como condicionante para efetivação deste método de trabalho.


Palavras-chave: Enfermagem; Planejamento de Assistência ao Paciente; Processos de Enfermagem; Técnicos de Enfermagem

INTRODUÇÃO

Em busca de sua consolidação enquanto ciência do cuidar, a enfermagem ainda procura a estruturação de seus valores profissionais.1 Nesse processo, a Sistematização da Assistência de En fermagem (SAE) emerge como uma estrutura conceitual sólida que objetiva profissionalizar a assistência ao paciente por meio de instrumentos de trabalho que auxiliem na tomada de decisão para execução de cuidado científico, holístico e contínuo.2,3

Com uma realidade de efetivação desigual no contexto brasileiro, muitos pesquisadores já buscaram estudar os benefícios da utilização da SAE nos cenários de saúde. Comprovou-se que o uso da SAE possibilita uma melhora efetiva da qualidade da assistência, valoriza a cientificidade da profissão, além de garantir vantagens, como promoção da integração entre a equipe de enfermagem e demais membros da equipe de saúde; fornecimento de condições para a avaliação dos cuidados prestados; possibilidade de atendimento no âmbito individualizado e holístico; além da oferta de condições essenciais para o progresso e a autonomia da profissão.2,4,5

Nesse sentido, a SAE proporciona ações tanto na área assistencial quanto administrativa, facilitando a organização do trabalho e dos serviços da equipe de enfermagem.5,6 Nesse panorama, a capacitação e o envolvimento de toda a equipe de enfermagem ganham destaque. Enfatiza-se, neste estudo, a relevância da integração dos técnicos de enfermagem no processo de concretização da SAE.

Para que a SAE alcance resultados satisfatórios e se solidifique, é necessário domínio do tema pela equipe de enfermagem.3,4,7 Sabe-se que os técnicos de enfermagem são importantes nesse processo, já que devem participar juntamente com o enfermeiro da implementação do plano de cuidados, pois todos podem contribuir, no momento oportuno, com informações ou atividades que favorecerão o cuidado ao paciente.4

Todavia, sabe-se que o processo formativo dos técnicos de enfermagem demonstra-se deficitário no que concerne à SAE, sendo, muitas vezes, essa temática incluída apenas na formação dos profissionais de nível superior.4,8,9

Diante disso, é fundamental estabelecer programas de capacitação dos profissionais nos serviços para compensar as lacunas na formação, pois a falta de compreensão dos técnicos de enfermagem quanto à finalidade da SAE e as suas competências no processo de sistematização da assistência dificultam a adesão e a participação desses profissionais.9

A fim de contribuir para a melhor apreensão desse fenômeno - a participação do técnico de enfermagem na SAE - definiu-se a seguinte questão de pesquisa: como os docentes e os profissionais da assistência compreendem a integração do técnico de enfermagem na SAE?

Objetiva-se descrever as percepções de docentes e de profissionais da assistência acerca da integração do técnico de enfermagem na Sistematização da Assistência de Enfermagem.

MÉTODOS

Trata-se de estudo descritivo, de abordagem qualitativa. Participaram sete docentes do Curso Técnico de Enfermagem de uma universidade pública do Nordeste do Brasil e 13 técnicos de enfermagem vinculados ao hospital universitário dessa mesma instituição de ensino superior.

A coleta de dados ocorreu a partir da técnica do grupo focal,10 em fevereiro de 2013, com os profissionais da assistência (técnicos de enfermagem) e, em fevereiro de 2015, com os docentes.

Ressalta-se que o estudo com os técnicos de enfermagem integrou pesquisa que buscou compreender a tipificação desses profissionais acerca da SAE, revelando o processo de ensino como aspecto basilar da problemática de integração do técnico de enfermagem na SAE.

Assim, o estudo com os docentes constituiu um desdobramento dos resultados da pesquisa com os profissionais da assistência, que denotou a relevância de compreender a percepção dos docentes para que se pudesse apontar melhorias no processo de ensino do técnico de enfermagem. Desse fato decorre o tempo que separa os dois momentos de coleta de dados.

Para os técnicos de enfermagem, foi considerado como critério de inclusão: atuar no hospital universitário em estudo em cuidados assistenciais diretos aos pacientes.

Quanto aos docentes, foram incluídos: professores efetivos que atuassem por pelo menos seis meses no Curso Técnico de Enfermagem, tempo considerado adequado para ambientação e conhecimento do projeto pedagógico do curso.

Além disso, para ambos os participantes, seguiu-se a recomendação literária de que os grupos focais devem ter, para garantir sua eficácia, a participação de 6 a 15 pessoas.10

Previamente à execução do estudo, foram afixados no hospital convites aos técnicos de enfermagem, com solicitação de demonstração de interesse e contato para posterior seleção. Quarenta e quatro profissionais demonstraram interesse em participar. Realizou-se um sorteio de 15 profissionais por meio da ferramenta ALEATORIOENTRE do Microsoft Excel 2010. Destes, dois não compareceram ao encontro de coleta de dados, de modo que 13 técnicos de enfermagem totalizaram a amostra da pesquisa.

Quanto aos docentes, 14 foram convidados para participar do estudo, os quais consistiam na população que atendia aos critérios de inclusão da pesquisa. Destes, sete compareceram e totalizaram a amostra da pesquisa.

Ressalta-se que não foram incluídos no estudo apenas os técnicos de enfermagem que haviam concluído seu curso na instituição em que os docentes investigados atuavam. Desse modo, não há uma relação direta entre os docentes e os técnicos de enfermagem que fizeram parte da pesquisa.

Os grupos focais objetivaram conhecer a percepção dos profissionais acerca da integração do técnico de enfermagem na SAE. Desse modo, no encontro de coleta de dados com os profissionais da assistência, a pergunta norteadora foi "Em sua prática profissional, como você idealiza sua participação na SAE?". Já no grupo focal com os docentes, os mesmos foram convidados a refletir a partir da seguinte questão: "O que você pensa acerca da integração do técnico de enfermagem na SAE?".

Cada grupo focal contou com uma equipe de pesquisa previamente treinada, composta por um mediador, um relator e dois colaboradores responsáveis pelo registro fotográfico e gravação do áudio, conforme anuência dos participantes.

Para atender ao critério de cientificidade, quanto à fidedignidade dos dados, os pesquisadores foram previamente treinados quanto à: coleta de dados, isto a partir da simulação de um grupo focal, em que a vivência da técnica de coleta de dados permitiu a padronização das funções de cada um nas seções de coleta; e análise de dados, com capacitação para uso do software utilizado.

As falas dos grupos focais foram transcritas e o conteúdo textual foi submetido à análise lexicográfica, com auxílio do software Interface de R pour Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionneires (IRAMUTEQ).

Utilizou-se a Classificação Hierárquica Descendente e a análise de similitude como métodos de tratamento dos dados.11 Os dados foram analisados à luz de literatura atual e pertinente e as equipes que participaram das duas seções do grupo focal contribuíram para a análise dos dados. Além disso, foi utilizado questionário com dados sociodemográficos e profissionais para caracterização dos participantes.

O estudo seguiu os princípios éticos e legais que regem a pesquisa científica com seres humanos, preconizados na Resolução nº 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde. Foi analisado pelo Comitê de Ética em Pesquisa e aprovado pelos Pareceres nº 98.424, de 31 de agosto de 2012, CAAE nº 05906912.0.0000.5537, e nº 925.408, de 18 de dezembro de 2014, CAAE nº 39640914.8.0000.5537. Obteve-se, assim, anuência dos participantes de cada etapa do estudo, com a garantia do caráter voluntário e do anonimato dos mesmos.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Participaram do estudo sete docentes do Curso Técnico em Enfermagem, do sexo feminino (7; 100,0%), com média de idade de 50,0 ± 11,6 anos (mínimo de 34 e máximo de 61 anos), com formação mínima de mestrado (7; 100,0%), com experiência no ensino técnico superior a 10 anos (4; 57,2%), porém com um contexto em que o ensino da SAE aos técnicos de enfermagem não foi vivenciado (6; 85,8%).

Contou-se, ainda, com a colaboração de 13 técnicos de enfermagem, com predomínio de mulheres (12; 92,3%), com média de idade de 26,9 ± 8,6 anos (mínimo de 23 e máximo de 53 anos), que atuavam nos setores de internação clínica e cirúrgica e possuíam um período de 4 meses a 2 anos de finalização da formação técnica. Destacou-se que 11 técnicos de enfermagem (84,6%) haviam concluído seu curso há dois anos.

A análise do corpus proveniente dos grupos focais com os docentes e os técnicos de enfermagem denotou 9.239 ocorrências de palavras, distribuídas em 1.543 formas. Por meio da Classificação Hierárquica Descendente, foram analisados 251 segmentos de texto, com retenção de 92,96% do corpus para construção das sete classes advindas das partições de conteúdo (Quadro 1).

Quadro 1. Dendograma resultante da Classificação Hierárquica Descendente do corpus textual. Natal - RN, 2016
Repartição Classe Análise lexicográfica Variável significativa*
Palavra χ2 %
Percepções dos profissionais da docência 1 - Potencialidades da integração do técnico de enfermagem na SAE: efetivação do trabalho em equipe e do cuidado integral (19,92%) Importante 20,11 72,73 Docente
Serviço 15,50 83,33
Valorizar 12,21 100,00
Resultar 12,21 100,00
Inserir 12,21 100,00
2 - Entraves e fragilidades: necessidades de mudança (10,76%) Processo 45,24 52,17
Complexo 32,72 100,00
Necessidade 30,40 66,67
Contexto 25,19 100,00
Precisar 14,04 31,03
3 - Formação dos técnicos de enfermagem no âmbito da SAE: necessária mudança curricular (15,94%) Aluno 27,66 62,50
Professor 26,17 85,71
Conhecimento 21,52 75,00
Construir 21,44 100,00
Pensar 19,90 42,42
4 - Ensino em serviço como elemento primordial (12,35%) Precisar 46,96 51,72
Teoria 36,21 100,00
Equipe 9,80 30,00
Planejamento 8,27 66,67
Coordenação 8,27 66,67
Percepções dos profissionais da assistência 5 - Representações subjetivas acerca da SAE (15,14%) Significar 29,70 72,73 Técnico de enfermagem
Representar 21,06 47,83
Cuidar 18,30 58,33
Esperança 16,71 80,00
Agir 11,34 75,00
6 - Potencialidades da SAE: em busca da qualidade do cuidado (11,16%) Prestar 32,37 100,00
Carinho 32,31 83,33
Respeito 26,39 71,43
Dever 23,24 42,86
Qualidade 19,11 66,67
7 - Possibilidades de contribuição do técnico de enfermagem: integração desejada (14,74%) Procurar 41,65 100,00
Aprender 19,05 58,33
Melhor 12,47 50,00
Correto 11,74 75,00
Entender 8,17 50,00

* p < 0,0001.

Quadro 1. Dendograma resultante da Classificação Hierárquica Descendente do corpus textual. Natal - RN, 2016

Percepções dos profissionais da docência

As classes de 1 a 4 agrupam as percepções dos profissionais da docência, que revelam as potencialidades e fragilidades para consolidar a integração do técnico de enfermagem na SAE e destacam o processo formativo, tanto inicial quanto continuado, como elemento que pode contribuir para que esta integração aconteça.

A classe 1, com 19,92% do corpus analisado, denota as "Potencialidades da integração do técnico de enfermagem na SAE", com destaque para a efetivação do trabalho em equipe e do cuidado integral, conforme destacado nas falas dos docentes.

Seria um caminho que poderia até resultar nesse cuidado integral da pessoa e que seria romper o tecnicismo (Docente 6).

O processo precisa ser entendido como um trabalho em equipe desde o primeiro momento (Docente 2).

Precisa que tenha essa coordenação realmente do enfermeiro, que esse enfermeiro seja realmente um líder, que vivencie tudo isso, mas precisa que toda a equipe seja integrada (Docente 3).

Realça-se, nesse contexto, a interdependência entre a equipe de enfermagem como algo imperativo e que pode fazer a diferença tanto nas relações interpessoais no trabalho quanto no resultado do cuidado prestado ao paciente.12

O trabalho em equipe, assim, emerge como resultado de um processo complexo, em que há necessidade de integrar os trabalhadores de diferentes áreas e níveis de formação, de modo a promover "teias de ações" realizadas por uma variedade de profissionais e que necessitam de articulação.12

Compreende-se, então, que a participação de todos os profissionais de enfermagem na efetivação da SAE constitui elemento basilar, para que se afirme o poder clínico da enfermagem, isso a partir da articulação da equipe de enfermagem em prol de um cuidado integral, individualizado e resolutivo.

Para tanto, é necessário que se supere o simples agrupamento dos membros da equipe de enfermagem, tendo em vista uma real participação de todos a partir da superação da dicotomia que ainda caracteriza a enfermagem: de um lado, aqueles ou aquele que planeja(m); e de outro, aqueles que executam, o que provoca uma problemática cisão do processo de cuidar.8

Estudo que objetivou analisar a viabilidade de implantação da SAE em um serviço de urgência e emergência hospitalar revelou que técnicos e auxiliares se veem como meros executores (cuidadores) no âmbito da SAE, de modo que se percebem desprovidos de capacidade reflexiva e poder de decisão na assistência prestada.1

Em busca de ultrapassar essa visão reducionista da integração do técnico de enfermagem na SAE, o destaque das palavras importante, serviço, valorizar, resultar e inserir (Quadro 1) sugerem o quanto os docentes compreendem o técnico de enfermagem como um profissional que pode contribuir na efetivação na SAE e que, portanto, precisa ter sua integração consolidada no âmbito desse método de trabalho.

É importante para ele [técnico de enfermagem] se sentir parte desse processo, ele também tem que aprender e também tem que contribuir (Docente 5).

O técnico em enfermagem, assim como o enfermeiro, tem papel muito importante nesse processo, visto que é uma categoria que tem contato direto e continuo com o usuário do serviço de saúde (Docente 4).

Sabe-se que a SAE apresenta atividades privativas do enfermeiro, todavia, apreende-se que a divisão do trabalho não impede que, na realização da atividade ou no trabalho real, ocorra a fusão de papéis entre os membros da equipe de enfermagem, a troca de informações e, com isso, a possibilidade de formação e cooperação no trabalho.13

Em contrapartida às potencialidades destacadas na classe 1, os docentes também revelam preocupações acerca dos "Entraves e fragilidades" para que a integração do técnico de enfermagem na SAE se consolide, o que pode ser compreendido através da classe 2, que agrupou 10,76% dos segmentos de texto analisados.

Os vocábulos complexo, necessidade, contexto e precisar exemplificam as angústias dos docentes sobre como essa integração poderá ser efetivada, isto diante de um contexto laboral e formativo dos técnicos de enfermagem que, para os profissionais da docência, representam aspectos que dificultam esse processo.

Tenho consciência da importância da participação do técnico de enfermagem na SAE, mas não tenho maturidade ainda de como esse processo de ensino vai acontecer [...] para gente ter no ensino, nós precisamos ter na assistência também (Docente 2).

O contexto de dificuldade que gravita em torno dessa assistência é bastante vasto: a necessidade de vários vínculos [...] uma equipe sacrificada que, via de regra, terá pouca ou nenhuma disponibilidade e vontade para novos aprendizados (Docente 2).

É enfático que a implantação total ou parcial da SAE não tem representação em uma grande parcela das instituições de saúde no Brasil.2 Várias são as causas apontadas para esse fato, tais como: déficit organizacional, sobrecarga laboral, desvalorização cultural da SAE, falta de hábito e dificuldade para aquisição de habilidade, além da resistência de se trabalhar com novas metodologias.2,4,14

Esses obstáculos também são apontados por estudos internacionais, como os realizados na Etiópia3 e na Bolívia7 que enfatizaram a escassez de recursos, a escassez de tempo e a falta de conhecimento adequado como principais obstáculos para a aplicação do processo de enfermagem sistematizado.

Diante disso, os docentes revelam uma preocupação acerca da não consolidação da SAE na prática assistencial, o que, para eles, irá interferir negativamente na busca de um processo de ensino que incorpore tal temática, o que poderá tanto influir em um ensino carente de uma articulação teoria-prática quanto na formação de profissionais que irão se frustrar ao encontrar uma realidade em que a SAE não se efetiva.

Estudo que buscou avaliar a aplicação do processo de enfermagem e seus fatores de influência no âmbito do Mekelle Zone Hospitals, na Etiópia concluiu que o conhecimento é um dos fatores mais determinantes para a aplicação do processo de enfermagem e indicou que havia um problema na aplicação do processo de enfermagem devido a variações entre o que os enfermeiros eram ensinados na escola e o que eles estavam aplicando na prática assistencial.3

Do mesmo modo, pesquisa que objetivou compreender o processo interacional planejamento-execução da SAE de um hospital universitário do interior paulista, denotou que os profissionais não legitimam a SAE em seu ambiente de trabalho, isso em face de um processo de implantação da SAE que não contou com condições favoráveis para o sucesso da proposta.14

Essa não legitimação da SAE confirma a preocupação dos docentes quanto ao contexto laboral dos técnicos de enfermagem, permeado por entraves que podem contribuir negativamente com a disponibilidade e vontade para novos aprendizados, conforme destacado pelo Docente 2.

Em confirmação a tais fragilidades, um estudo que buscou avaliar o processo de implantação da SAE em uma unidade pediátrica de um hospital universitário mostrou que, ao serem questionados sobre os fatores que dificultavam e facilitavam a implantação da SAE, os profissionais de ambas as categorias mencionaram a sobrecarga de trabalho relacionada ao número insuficiente de profissionais (30% dos enfermeiros e 23,3% dos técnicos), a sobrecarga de trabalho relacionada aos desvios e a indefinição da função do enfermeiro na unidade (20% dos enfermeiros e 18,6% dos técnicos) e o pouco tempo para a assistência (20% dos enfermeiros e 18,6% dos técnicos). Os técnicos de enfermagem (14%) também identificaram como fator dificultador a burocracia para a implantação da SAE.9

Todavia, ao mesmo tempo em que refletem acerca das dificuldades para efetivar a integração do técnico de enfermagem, os docentes apontam necessidades de mudança, pois defendem que caminhos devem ser traçados para que os entraves sejam ultrapassados:

Porque se não pensar em formas e tentar outras e outras formas para ver como é que isso muda a gente não sai do caminho (Docente 7).

Dentre os meios para superação das fragilidades apontadas na classe 2, os docentes destacaram o processo formativo dos técnicos de enfermagem, isso a partir da classe 3, "Formação dos técnicos de enfermagem no âmbito da SAE: necessária mudança curricular", que integrou 15,94% do corpus textual e apresentou em destaque as palavras aluno, professor, conhecimento, construir e pensar.

Os docentes refletiram, então, que a SAE precisa ser incluída no currículo dos Cursos Técnicos de Enfermagem e, para isso, a visão tecnicista de formação dos técnicos de enfermagem precisa ser superada, conforme destacado nas falas dos participantes do estudo.

Para ele [o técnico de enfermagem] se sentir parte desse processo, ele também tem que aprender e também tem que contribuir e aí a importância da formação (Docente 5).

Para construir isso ele [o docente] teria que fazer o aluno saber pensar para poder fazer, porque o fazer pelo fazer, a técnica pela técnica não seria a proposta, esse fazer pensar seria esse conhecimento (Docente 7).

Estudo que objetivou compreender o típico ideal de técnicos de enfermagem acerca da SAE concluiu que o processo formativo do técnico de enfermagem precisa ser revisto no que concerne à SAE, sendo a temática incluída de forma fundamental em seu currículo.8

Do mesmo modo, pesquisa que teve como escopo avaliar o processo de implantação da SAE em uma unidade pediátrica de um hospital universitário verificou que a SAE precisa ser mais abordada nos cursos de enfermagem de nível médio, isso porque a SAE está presente nos currículos dos cursos de graduação em Enfermagem, mas pouca ou nenhuma informação é oferecida nos cursos técnicos.9

Para tanto, conforme destacado pelo Docente 7, é preciso superar a visão tecnicista na formação dos técnicos de enfermagem: o fazer pelo fazer, a técnica pela técnica não seria a proposta.

A visão tecnicista afasta o profissional da realidade, enfoca apenas os aspectos biológicos e técnicos da assistência à saúde. Assim, os cuidados realizados pelos profissionais da saúde muitas vezes são desenvolvidos de forma mecânica, norteados por tarefas e seguem rigidamente normas e prescrições.2

Nesse ínterim, para que o técnico de enfermagem seja capacitado a se envolver e participar da SAE, é funda mental a reflexão sobre essas ações no sentido de ultrapassar a prática centrada na habilidade técnica.2,13

Conforme já destacado na discussão da classe 1, no âmbito da formação dos técnicos de enfermagem acerca da SAE, os docentes realçaram um aspecto que os preocupam: a ausência da consolidação da SAE no contexto assistencial. Isto, para eles, prejudica a integração ensino/serviço e a articulação teoria/prática, o que poderia ser um entrave para a compreensão desse profissional em formação.

Mas não adianta ser apenas um conteúdo teórico e que não é uma coisa fácil [...] não adianta, nenhum conteúdo de ensino se aprende só na teoria, nenhum (Docente 3).

Não adianta só ter agora na escola porque quando esse aluno formado chegar e não encontrar campo fértil para ele trabalhar, essa SAE vai se perder, então o processo se perde (Docente 2).

Nesse ínterim, os docentes destacaram que os serviços de saúde precisam integrar esse processo de mudança. Na classe 4, por conseguinte, os profissionais da docência denotaram o "Ensino em serviço como elemento primordial". Essa classe agrupou 12,35% do conteúdo textual e colocou em destaque os vocábulos precisar, teoria, equipe, planejamento e coordenação.

Precisa que toda a equipe seja integrada e que tenha exatamente essa relação teoria/prática, não ter só o conteúdo, ele [o técnico de enfermagem] precisa vivenciar, ele precisa viver, ele precisa conhecer, ele precisa participar. Como colocar no plano de curso? Como se ensinar? Como em outros cenários vai ocorrer? Então, realmente é um momento de se pensar, se discutir e rever muita coisa (Docente 3).

Sabe-se que a organização e a utilização da SAE exigem inúmeros conhecimentos dos profissionais que a desenvolvem. Assim, a respon sabilidade sobre esses saberes e competências deve ser compartilhada entre a equipe de enfermagem e a instituição, aliada aos pro cessos de educação permanente em serviço,2 sobretudo para compensar um processo de formação dos técnicos de enfermagem em que a SAE não foi contemplada.

Nessa perspectiva, pesquisa que teve o escopo de identificar os obstáculos e facilitadores encontrados na implementação do processo de enfermagem no departamento de Santa Cruz, Bolívia, tanto em hospitais quanto em universidades, revelou como principais facilitadores: o envolvimento dos profissionais de enfermagem, a cooperação universidade-hospital e o apoio dado pelas instituições de formação na capacitação dos profissionais no âmbito do serviço.7

Outrossim, estudo que objetivou descrever a experiência de implementação da SAE em uma Unidade de Terapia Intensiva demonstrou que o processo de capacitação dos profissionais em serviço acerca da SAE incidiu em melhor aceitação e redução do nível de resistência.4

Em suma, denota-se que a capacitação dos profissionais técnicos de nível médio deve acontecer como um continuum, visto que a formação fragmentada e teórica impossibilita uma atualização e favorece uma atuação apenas com base em procedimentos técnicos.15

O ensino em serviço, desse modo, é fundamental para que os técnicos de enfermagem tenham clareza e subsídios científicos para melhor desenvolvimento da SAE, de modo a incorporar, valorizar essas ações e reconhecer esse processo como diferencial.4

Percepções dos profissionais da assistência

As classes de 5 a 7 integram as percepções dos técnicos de enfermagem, as quais denotam uma visão mais subjetiva acerca da SAE e reiteram a importância de integrar o técnico de enfermagem neste método de trabalho, o que é apontado enquanto um desejo dos profissionais da assistência.

A classe 5 foi denominada "Representações subjetivas acerca da SAE". E, agrupou 15,14% do corpus textual analisado e denotou como vocábulos significativos: representar, cuidar, esperança e agir. Compreende-se, por meio dessa classe, que apesar de os técnicos de enfermagem não terem formação científica acerca da SAE, eles a subjetivam como algo benéfico que deveria ser consolidado, o que pode ser visualizado nas falas desses profissionais.

SAE para mim é um papel direcionado a toda a equipe de enfermagem [...] nós devemos ter uma visão holística do paciente, ou seja, ver o paciente como um todo (Técnico de Enfermagem 4).

É o respeito, o amor, a dedicação, são as técnicas certas de fazer [...] a participação do técnico de enfermagem na SAE deve ser feita com um bom atendimento ao paciente, anotar tudo no prontuário (Técnico de Enfermagem 10).

O desconhecimento acerca da temática SAE reflete um processo formativo dos técnicos de enfermagem em que tal abordagem foi deficitária ou mesmo inexistiu. Esse aspecto é confirmado por outras pesquisas, que revelam um grande despreparo da equipe, sobretudo dos técnicos de enfermagem, sobretudo decorrente de um conhecimento escasso sobre a SAE.1,8,9,14

A não integração do técnico de enfermagem na SAE também pode contribuir para a perpetuação desse desconhecimento, o que pode ser observado através dos resultados de uma pesquisa que objetivou avaliar o processo de implantação da SAE em uma unidade pediátrica, a qual denotou que a participação no processo inicial de implantação foi de 90% dos enfermeiros e de 23,26% dos técnicos de enfermagem.9

Como consequência desse fato, o desconhecimento sobre o tema gera nos técnicos de enfermagem a desconsideração e a perda do sentido da ação.14

Todavia, foi possível apreender que os técnicos denotam uma percepção positiva acerca da SAE, de modo que eles elucidaram na classe 6 as "Potencialidades da SAE: em busca da qualidade do cuidado". As palavras prestar, carinho, respeito, dever e qualidade revelam tais percepções, o que pode ser sintetizado na fala do Técnico de Enfermagem 4: "SAE é a forma como essa assistência é prestada, a qualidade dela".

E diante da concepção positiva e subjetiva acerca da SAE, por meio da classe 7, "Possibilidades de contribuição do técnico de enfermagem: integração desejada", os técnicos de enfermagem denotam sua vontade de participar desse método de trabalho. As palavras procurar, aprender, melhor, correto e entender demonstram o anseio dos profissionais da assistência de serem capacitados para serem integrados na SAE.

No meu ponto de vista, eu acredito que nós temos que procurar desenvolver isso [a SAE], que a gente que tem que procurar cursos [...] procurando desenvolver mais os nossos conhecimentos (Técnico de Enfermagem 9).

E se a gente escolheu a profissão, a gente tem que dar o melhor de si, ser um profissional altruísta, fazer o melhor para o paciente, pensando nele da melhor forma possível (Técnico de Enfermagem 10).

Compreende-se que o trabalho em saúde requer uma boa interação entre os membros da equipe e não pode estar dissociado de uma interação social, o que também é afirmado no que diz respeito à motivação no trabalho, de modo que o relacionamento interpessoal e o envolvimento nas ações da equipe constituiu um fator que contribui para o trabalho em enfermagem.7,12

O técnico de enfermagem necessita desse reconhecimento e, para tanto, é preciso que sua integração na SAE seja consolidada, o que envolve a capacitação e o envolvimento dos mesmos nesse processo. As falas dos participantes denotam esse desejo de participação.

Esta pesquisa avança ao apontar que os técnicos de enfermagem se demonstram motivados a participar da SAE e a buscar novos conhecimentos para que essa integração se efetive. Trata-se de informação relevante e que denota a essencialidade de rever o processo formativo desses profissionais e incluí-los, definitivamente, no processo de consolidação da SAE.

Estudo que contemplou um contexto em que tal participação é consolidada demonstrou que os técnicos de enfermagem se sentem mais valorizados, porque a SAE permite conhecer melhor o paciente e informar aos demais profissionais a historicidade do mesmo de uma forma clara e verdadeira, o que resulta em melhor comunicação entre a equipe multiprofissional.5

Análise de similitude do corpus textual

A análise de similitude da percepção dos docentes e dos técnicos de enfermagem acerca da integração do técnico na SAE permite compreender as semelhanças e diferenças na visão desses dois grupos de profissionais.

Enquanto semelhança apreende-se que tanto docentes quanto técnicos de enfermagem compreendem as potencialidades da integração do técnico de enfermagem na SAE e a reconhecem como condição fundamental para efetivação deste método de trabalho.

Isto pode ser visualizado pelo destaque do vocábulo TER em ambas as representações gráficas (Figura 1), o que denota a concepção de que a integração do técnico de enfermagem na SAE é necessária e condicionante fundamental para sua efetivação. A ligação da palavra TER com o vocábulo FAZER nas duas figuras revela que essa integração é urgente e necessária, de modo que caminhos de mudança devem ser buscados para que isso se concretize.

Figura 1. Análise de similitude da percepção dos docentes (A) e dos técnicos de enfermagem (B) acerca da integração do técnico de enfermagem na SAE. Natal - RN, 2016.

Estudos denotam que os profissionais de nível técnico da área de saúde desempenham papel fundamental na constituição e no desenvolvimento do atendimento em saúde.12,13,15

Desse modo, é imprescindível para o sucesso da implantação da SAE enfatizar a relevância da participação de toda a equipe de saúde em um processo de trabalho integrado.1 Enfatiza-se, portanto, que, para que seja possível uma melhor operacionalização da assistência de enfermagem por meio da implementação da SAE, é preciso fortalecer a contribuição de todos os membros da equipe de enfermagem.4

No que concerne às percepções distintas entre os grupos participantes do estudo, apreende-se que na análise de similitude dos docentes o aspecto formativo dos técnicos de enfermagem aparece como elemento principal e, portanto, como o caminho para a mudança na visão dos docentes.

Ao analisar a Figura 1A, ganham destaque as seguintes ligações entre os vocábulos: ir-aluno; ser-professor; não-saber-ensinar; SAE-processo-ensino; e gente-acontecer. Apreende-se, assim, que os docentes se reconhecem enquanto sujeito que deve contribuir para a efetivação do técnico de enfermagem na SAE, isto a partir de uma necessária mudança curricular no processo de formação desses profissionais.

Em contrapartida, ao analisar o gráfico representativo da percepção dos técnicos de enfermagem (Figura 1B), é possível compreender dois aspectos complementares: de um lado o desconhecimento científico acerca da SAE, resultante de uma formação em que tal temática não foi contemplada (destaque dos vocábulos COMO, NÃO, PORQUE); e, de outro, uma representação subjetiva e benéfica acerca desse método de trabalho, permeada pelo anseio de participar desse processo (ligações paciente-dever-equipe e gente-aprender).

Como elemento central das problemáticas destacadas, denota-se o processo formativo dos técnicos de enfermagem, o qual pode ser a causa ou elemento de reforço da perpetuação da não integração do técnico de enfermagem na SAE.

Ressaltou-se, por conseguinte, que o processo formativo do técnico de enfermagem precisa ser revisto. Além disso, essas discussões também necessitam ser tecidas na formação dos enfermeiros, já que a SAE deve ser resultante de um processo integrador de toda a categoria profissional da enfermagem.8,16

CONCLUSÕES

Concluiu-se que tanto docentes quanto técnicos de enfermagem compreendem as potencialidades da integração do técnico de enfermagem na SAE e a reconhecem como condicionante fundamental para sua efetivação.

Para os docentes, o aspecto formativo dos técnicos de enfermagem aparece como elemento principal e, portanto, como o caminho para a mudança. Quanto aos técnicos de enfermagem, foi possível denotar dois aspectos complementares: de um lado o desconhecimento científico acerca da SAE, resultante de uma formação em que tal temática não foi contemplada; e, de outro, uma representação subjetiva e benéfica acerca desse método de trabalho, permeada pelo anseio de participar desse processo.

Enfatiza-se que o contexto em que os participantes do estudo estão inseridos influenciou as suas percepções, de modo que os resultados apresentados não podem ser generalizados para outros cenários, aspecto que constitui a limitação desta pesquisa. Ressalta-se que o hospital universitário em que os técnicos de enfermagem atuam e os docentes estão vinculados em atividades práticas está em fase de implementação da SAE, o que pode ter influenciado nos resultados da pesquisa.

Sugere-se, assim, que o estudo seja replicado em outros espaços, como mecanismo de incentivo para se disseminar a reflexão e a investigação sobre o fenômeno pesquisado - a participação do técnico de enfermagem na SAE.

Enquanto potencialidades do método utilizado, denota-se que a análise das semelhanças e diferenças entre as percepções dos dois grupos de sujeitos pesquisados proporcionou uma visão mais abrangente sobre a temática, apontando o aspecto formativo dos técnicos de enfermagem como elemento que precisa ser repensado no que concerne à SAE e revelando que os técnicos de enfermagem se sentem motivados a participar da SAE e a buscar novos conhecimentos para a concretização dessa integração.

Nesse processo, o uso do IRAMUTEQ como mecanismo de tratamento dos dados foi revelado como inovador e como importante apoio para a visualização das percepções dos sujeitos de pesquisa por meio de uma análise lexicográfica. A análise de similitude constitui estratégia interessante para apreciação da síntese de percepção dos sujeitos da pesquisa, isso a partir de elementos gráficos que enriquecem a análise dos dados.

Espera-se contribuir com a efetiva integração do técnico de enfermagem na SAE e, portanto, com a consolidação deste método de trabalho enquanto um processo sólido e resultante de um trabalho em equipe.

AGRADECIMENTOS

Ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico - CNPq Brasil pela bolsa de doutoramento sanduíche das autoras Pétala Tuani Candido de Oliveira Salvador e Cláudia Cristiane Filgueira Martins Rodrigues; e pela bolsa de Produtividade em Pesquisa CNPq - PQ2 (2016-2019) da autora Viviane Euzébia Pereira Santos.

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