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CAPES

Volume 20, Número 4, Out/Dez - 2016



DOI: 10.5935/1414-8145.20160097

PESQUISA

Relação entre fragilidade física e fatores sociodemográficos e clínicos dos idosos que realizam teste para habilitação veicular

Maria Helena Lenardt 1
Clovis Cechinel 1
Maria Angelica Binotto 1
Nathalia Hammerschmidt Kolb Carneiro 1
Tânia Maria Lourenço 1


1 Universidade Federal do Paraná. Curitiba, PR, Brasil

Recebido em 30/05/2016
Aprovado em 07/09/2016

Autor correspondente:
Clovis Cechinel
E-mail: cechinelc@hotmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Investigar a associação entre a condição da fragilidade física e características sociodemográficas e clínicas de idosos que se submetem ao teste de habilitação veicular.
MÉTODOS: Estudo quantitativo transversal, realizado nas clínicas de medicina de tráfego. Critérios de inclusão do idoso: ter idade igual ou superior a 60 anos; estar agendado para os testes de habilitação e apresentar capacidade cognitiva e física para a realização dos testes. A amostra foi constituída por 172 idosos no período amostral de janeiro a julho de 2015. Foram aplicados testes para avaliação da fragilidade física e questionário sociodemográfico e clínico.
RESULTADOS: 56,4% dos candidatos são pré-frágeis e houve associação significativa entre fragilidade física e estado civil (p = 0,0327) e uso de bebidas alcóolicas (p = 0,0417).
CONCLUSÃO: A prevalência de pré-fragilidade evidencia a necessidade de sua gestão, com o objetivo de atenuar o declínio funcional e consequentemente contribuir para uma direção veicular mais segura.


Palavras-chave: Idoso fragilizado; Aptidão física; Exame para habilitação de motoristas; Dados demográficos; Patologia

INTRODUÇÃO

A direção veicular é uma tarefa complexa, que requer capacidade para realizar uma série de movimentos, quaisquer que sejam as condições do clima e das vias, em um ambiente que muda continuamente1. Existem inúmeras condições médicas que influenciam a direção veicular, sendo a fragilidade física um foco importante para avaliação, principalmente, nas pessoas idosas.

Pesquisadores definem fragilidade de diferentes formas, muitas dessas definições se baseiam na força e comprometimento físico no idoso2,3, outras em associações com doenças crônicas, doença renal, acidente vascular encefálico, insuficiência cardíaca, osteoartrose de quadril e joelho e depressão4,5.

O presente estudo trata da fragilidade física, definida como uma síndrome médica com múltiplas causas e determinantes que se caracteriza pela diminuição da força, resistência e redução da função fisiológica que aumenta a vulnerabilidade do indivíduo e desenvolve maior dependência e/ou morte6.

A avaliação da fragilidade consiste na mensuração de cinco características biológicas dos idosos, que incluem a redução da velocidade da marcha e da força de preensão manual, perda de peso não intencional, diminuição do nível de atividade física e o autorrelato de fadiga/exaustão. O idoso que apresentar três ou mais dessas características é considerado frágil, aquele que apresentar uma ou duas se encontra em um estágio prévio (pré-fragilidade) e aquele que não apresentar nenhum dos componentes é considerado não frágil2.

O fenótipo de fragilidade foi operacionalizado por meio do Cardiovascular Health Study (CHS), que acompanhou 5317 idosos maiores de 65 anos, com avaliações anuais e vigilância dos seguintes desfechos: doenças, hospitalizações, quedas, incapacidade e mortalidade. O estudo mostrou que 6,9% da população estudada era frágil2.

A literatura nacional e internacional não trazem trabalhos sobre a associação entre fragilidade física e direção veicular, razão pela qual torna-se importante o entendimento dessa síndrome médica neste contexto, a fim de otimizar oportunidades ao idoso e garantir uma direção veicular mais segura. Os profissionais da área da geriatria e gerontologia de modo multiprofissional podem assumir um papel importante na identificação dos idosos pré-frágies e frágeis, atuando na prevenção, estabilização e até mesmo na reversão da condição de fragilidade.

A fragilidade, frequentemente, se associa a algumas características sociodemográficas como: idade avançada7, baixa escolaridade7, baixa renda8, sexo feminino9, ausência de suporte social10 e condições socioeconômicas e de saúde desfavoráveis11, que, muitas vezes, são ignoradas pelas equipes de saúde e pelos médicos do tráfego. Associa-se, também, a fatores clínicos como quedas12, hospitalizações13, número de doenças14 e uso de medicações15, sendo que esses dois últimos, podem comprometer adicionalmente a capacidade de condução veicular.

Diversas patologias prejudicam a capacidade de direção veicular, afetando subsistemas: visão (catarata, retinopatia diabética, degeneração macular, glaucoma), cardiovascular (angina de peito, insuficiência cardiaca), respiratório (apneia do sono, doença pulmonar obstrutiva crônica), neurológico (deficits cognitivos, demência, Parkinson), psiquiátrica (depressão, psicose), metabólica e músculo-esquelético16.

Diante do exposto, o estudo tem como objetivo investigar a associação entre a condição de fragilidade física e as características sociodemográficas e clínicas de idosos que se submetem ao teste de habilitação veicular.

MÉTODOS

Trata-se de estudo quantitativo de corte transversal, sendo a amostra constituída durante o período amostral de 31 de janeiro a 31 de julho de 2015. O estudo foi desenvolvido nas clínicas de trânsito onde são realizados os exames de aptidão física e mental e/ou avaliação psicológica para direção veicular, na cidade de Curitiba/PR. Os critérios de inclusão das clínicas foram: estar credenciada para realização de exames de aptidão física e mental e/ou avaliação psicológica; possuir espaço físico adequado para a realização dos testes.

No momento do delineamento do projeto, identificaram-se 54 clínicas regularmente credenciadas, que foram sequenciadas para o estudo por meio de um sorteio simples (seleção aleatória). Para tanto, registrou-se o nome e o endereço das clínicas em papéis e procedeu-se o sorteio. Após este, as clínicas foram classificadas com letras e números crescentes, de C1 a C54, e nessasequência foram avaliadas, utilizando-se os critérios de inclusão.

Considerando a inexistência de dados referentes ao número de idosos atendidos por clínica e a distribuição imparcial e equitativa dos idosos nas clínicas, adotou-se um número padrão (35 idosos) para ser coletado em todas as clínicas. Procedeu-se a coleta de dados nas clínicas C1, C3, C4, C5, C6, com inclusão de um número máximo de 35 candidatos por clínica. A clínica C2 foi excluída por não apresentar espaço físico adequado para a realização dos testes.

Quando foi obtido o aceite de 35 idosos por clínica, a coleta passou a ser realizada na próxima clínica do sorteio. Foram abordados mais de 35 idosos por clínica, pois nem todos os idosos aceitaram participar da pesquisa. Na última clínica, em razão do término do período amostral, obteve-se apenas 32 idosos participantes. No total, foram abordados 189 idosos e, destes, 17 recusaram a participar do estudo, o que resultou em um quantitativo de 172 idosos.

O fluxograma das etapas de composição da amostra dos idosos por clínica pode ser observado na Figura 1.

Figura 1. Fluxograma de etapas de composição da amostra por clínicas. Curitiba, Paraná, Brasil, 2015.

Os critérios de inclusão do idoso foram: ter idade igual ou superior a 60 anos; estar agendado para os testes de habilitação veicular; ser capaz de responder aos questionários do estudo. Critérios de exclusão: apresentar doenças, problemas e sintomas físicos que por qualquer motivo, impeçam a aplicação dos questionários e a realização dos testes.

Inicialmente, verificou-se no sistema de agendamento da clínica a idade dos usuários, com o objetivo de selecionar os potenciais participantes da amostra. A coleta dos dados foi realizada em duas etapas: aplicação de um instrumento, onde constam as seguintes variáveis: caracterização socioeconômica (sexo, idade, escolaridade, com quem reside, situação financeira, status referente ao trabalho) e caracterização clínica (problemas de saúde, histórico de quedas, vertigens, ingestão de bebidas alcoólicas, uso de cigarros, uso de tecnologias assistivas (muleta, andador, bengala), uso de medicamentos e o número de hospitalizações.

Na segunda etapa, foram aplicados os testes referentes à avaliação cognitiva e da síndrome da fragilidade. A avaliação do fenótipo de fragilidade física foi mensurado por meio de seus componentes: a força de preensão manual foi medida com um dinamômetro hidráulico da marca Jamar®. Foram considerados frágeis para esse componente, após ajuste para sexo e Índice de Massa Corporal, os valores que estiveram no quintil mais baixo2. Para avaliar a velocidade da marcha, foi aferido o tempo, em segundos, para o participante percorrer em linha reta e a passo usual, um trajeto de 4,6 m. Após ajuste para sexo e estatura, os valores que estiveram no quintil mais baixo foram considerados frágeis2.

A perda de peso foi verificada pela resposta a duas questões: (1) "O (A) senhor(a) perdeu peso nos últimos 12 meses?" (2) "Quantos quilos?". Foi considerado frágil o idoso que declarou perda de peso corporal ≥ 4,5 quilogramas (kg) nos últimos 12 meses2.

O componente fadiga/exaustão foi avaliado com o item 7 e 20 da Escala de depressão CES-D. As respostas foram categorizadas de 0 a 3, de acordo com a frequência. Uma resposta "2" ou "3" para qualquer uma dessas perguntas categoriza o idoso como frágil para este componente2.

A investigação do nível de atividade física foi realizada por meio do Minesota Leisure Activity Questionnaire, após ajuste para sexo e altura, os valores que estiveram no quintil mais baixo foram marcadores de fragilidade2.

Previamente a aplicação dos testes, realizaram-se treinamentos teóricos e práticos com os pesquisadores, com o intuito de padronizar a execução da coleta e assegurar a confiabilidade interna dos dados.

Os dados foram organizados e analisados no programa computacional Excel® 2015 e no Statistical PacKage for Social Sciences (SPSS) versão 20.0. Foi utilizada estatística descritiva e os testes não paramétricos Qui-quadrado e Cochan para avaliar a associação entre as variáveis de interesse e a fragilidade física. Considerou-se o p < 0,05 com significância estatística.

O estudo recebeu parecer favorável do Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do Setor de Ciências da Saúde, sendo aprovado sob o registro CAAE 34689914.8.0000.0102, parecer favorável CEP/SD 833460. Foram observados os princípios éticos de participação voluntária e consentida de cada sujeito/clínica, conforme as recomendações contidas na Resolução nº. 466 do Conselho Nacional da Saúde, de 12 de dezembro de 2012.

O acesso às clínicas credenciadas, bem como ao formulário de Registro Nacional de Condutores Habilitados (RENACH) foi realizada por meio dos ofícios 2383/2014 COOOHA/DIMP e 5103.2014 COOHA/SEME de autorização das clínicas e do órgão que as habilita.

RESULTADOS

Foram convidados a participar do estudo 189 idosos, 17 deles se recusaram a participar. A amostra foi constituída por 172 idosos, idade média de 67,73 ± 6,55 anos, sendo n = 120 (70,67%) do sexo masculino e n = 52 (29,23%) do feminino. Nenhum deles apresentou-se como frágil (n = 0; 0%); os pré-frágeis foram n = 97 (56,40%) e n = 75 (43,60%) como não frágeis. A idade da amostra se apresentou homogênea, coeficiente de variação 9,68%, com padrão de concentração entre 60 a 72 anos, aproximadamente 75% da amostra. Não houve associação entre fragilidade física e idade (p = 0,0765).

Observa-se na Tabela 1 que é significativo o percentual de idosos casados ou com companheiro n = 118 (68,60%), morando com cônjuge com ou sem filhos n = 117 (68,02%), raça branca n = 152 (88,37%), e nível de escolaridade elevado (acima de ensino médio completo) n = 103 (46,33%). A variável renda individual predominou entre 1 a 5 salários mínimos n = 89 (51,74%). A permanência no mercado de trabalho, formal e ou informal ocorreu em n = 90 (52,32%). No presente estudo, a associação entre a fragilidade e as características sociodemográficas mostrou-se significativa apenas para o estado civil (p = 0,0327).

Tabela 1. Associação entre nível de fragilidade física dos idosos e as características sociodemográficas. Curitiba, Paraná, Brasil, 2015
Variável Classificação Pré-frágeis % Não frágeis % Total Valor de p
Sexo Masculino 67 69,07 53 70,67 120 0,8214*
Feminino 30 30,93 22 29,33 52  
Estado Civil Casado(a) 64 65,98 51 68 115 0,0327**
Divorciado(a) 7 7,22 14 18,67 21  
Solteiro(a) 6 6,19 3 4 9  
Viúvo(a) 17 17,53 7 9,33 24  
Vive com companheiro(a) 3 3,09 0 0 3  
Com quem mora Cônjuge e Netos 7 7,22 1 1,33 8 0,2326**
Cônjuge 35 36,08 36 48 71  
Cônjuge e Filhos 27 27,84 19 25,33 46  
Mora sozinho 18 18,56 11 14,67 29  
Filhos 10 10,31 8 10,67 18  
Escolaridade*** Analfabeto/Fundamental incomp. 11 1,03 6 0 17 0,6598*
Fundamental Compl./Fundamental Incomp. 16 11,34 12 12 28  
Fundamental Compl./Médio Incomp. 12 10,31 12 14,67 24  
Médio Compl./Superior Incomp. 29 23,71 17 16 46  
Superior Compl. 29 29,90 28 37,33 57  
Renda Sem renda 7 7,22 5 6,67 12 0,9687*
> 0 SM a ≤ 1 SM 10 10,31 5 6,67 15  
> 1 SM a ≤ 3 SM 33 34,02 28 37,33 61  
> 3 SM a ≤ 5 SM 15 15,46 13 17,33 28  
> 5 SM a ≤ 10 SM 18 18,56 13 17,33 31  
> 10 SM 14 14,43 11 14,67 25  
Raça Branca 87 89,69 65 86,67 152 0,7142**
Mulata, parda 5 5,15 5 6,67 10  
Preta 4 4,12 2 2,67 6  
Amarela, oriental 1 1,03 3 4 4  
Trabalha Sim 47 48,45 43 57,33 90 0,5079*
Não 50 51,55 32 42,67 82  
Aposentado Sim 70 72,16 53 70,67 123 0,8291*
Não 27 27,84 22 29,33 49  
Pensão Sim 18 18,56 8 10,67 143 0,2151*
Não 77 79,38 66 88 26 0,3147**
NR 2 2,06 1 1,33 3  

* Teste Qui-quadrado, p < 0,05;

** Teste Cochran - teste G, p < 0,05;

*** Incomp: Incompleto; Compl.: Completo;

a indicado teste G valor de p 0,3147 - o primeiro valor p testou somente as respostas válidas (Sim e Não); este valor p testou incluindo a categoria NR;

Negrito: variáveis significativas.

Tabela 1. Associação entre nível de fragilidade física dos idosos e as características sociodemográficas. Curitiba, Paraná, Brasil, 2015

Na Tabela 2 nota-se umelevado percentual de indivíduos que declararam doenças n=117 (66,67%). Entre as doenças crônicas não transmissíveis as prevalentes foram a Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS), o Diabete Mellitus (DM) e a dislipidemia em ambos os subgrupos, com as prevalências de 46,39%, 16,49% e 14,43% nos pré-frágeis e 36%, 16% e 14,67% nos não frágeis, respectivamente. Não houve associação entre fragilidade física e doenças, e hábitos de vida, exceto entre consumo de álcool (p = 0,0417).

Tabela 2. Associação entre nível de fragilidade física dos idosos e as doenças e os hábitos autorrelatados. Curitiba, Paraná, Brasil, 2015
Variável Classificação Pré-frágeis % Não frágeis % Total Valor de p
Doenças Sim 67 69,07 50 66,67 117 0,7373*
Não 30 30,93 25 33,33 55  
Infarto do miocárdio Sim 6 6,19 1 1,33 7 0,0888**
Não 91 93,81 74 98,67 165  
Angina Sim 2 2,06 0 0 2 0,1286**
Não 95 97,94 75 100 170  
Insuficiência cardíaca congestiva Sim 1 1,03 1 1,33 2 0,8550**
Não 96 98,97 74 98,67 170  
Doença vascular periférica Sim 0 0 1 1,33 1 0,1966**
Não 97 100 74 98,67 171  
Enfisema crônico Sim 2 2,06 2 2,67 4 0,7949**
Não 95 97,94 73 97,33 168  
Artrite Sim 6 6,19 4 5,33 10 0,8121**
Não 91 93,81 71 94,67 162  
Câncer Sim 4 4,12 5 6,67 9 0,4600**
Não 93 95,88 70 93,33 163  
Diabetes Sim 16 16,49 12 16 28 0,9305*
Não 81 83,51 63 84 144  
Hipertensão Sim 45 46,39 27 36,00 72 0,1707*
Não 52 53,61 48 64,00 100  
Hipotiroidismo Sim 14 14,43 8 10,67 22 0,4633*
Não 83 85,57 67 89,33 150  
Dislipidemia Sim 14 14,43 11 14,67 25 0,9656*
Não 83 85,57 64 85,33 147  
Ingestão de bebida alcoólica Sim 11 11,34 17 22,67 29 0,0417 **
Não 86 88,66 57 76,00 143  
Fuma Sim 6 6,19 9 12 15 0,1802*
Não 91 93,81 66 88 157  
Ex-Fumante Sim 18 18,56 16 21,33 34 0,6502*
Não 79 81,44 59 78,67 138  

* Teste Qui-quadrado, p < 0,05;

** Teste Cochran - teste G, p < 0,05.

Tabela 2. Associação entre nível de fragilidade física dos idosos e as doenças e os hábitos autorrelatados. Curitiba, Paraná, Brasil, 2015

Na Tabela 3 constata-se que é baixa a prevalência de quedas, tonturas e uso de tecnologias assistivas, e não houve associação entre fragilidade e essas variáveis.

Tabela 3. Associação entre fragilidade física e variáveis de interesse. Curitiba, Paraná, Brasil, 2015
Variáveis Classificação Pré-frágeis % Não frágeis % Total Valor de p
Queda Sim 4 4,12 8 10,67 12 0,0949*
Não 93 95,88 67 89,33 160  
Tontura Sim 1 1,03 1 1,33 2 0,8550**
Não 96 98,97 74 98,67 170  
Tecnologia Assistiva Sim 2 2,06 1 1,33 3 0,7074a**
Não 94 96,91 74 98,67 168 0,5244*
NR 1 1,03 0 0 1  

* Teste Qui-quadrado, p < 0,05;

** Teste Cochran - teste G, p < 0,05;

a indicado teste G valor de p 0,7074 - o primeiro valor p testou somente as respostas válidas (Sim e Não); o segundo valor p testou incluindo a categoria NR.

Tabela 3. Associação entre fragilidade física e variáveis de interesse. Curitiba, Paraná, Brasil, 2015

Na Tabela 4 observa-se que 43,30% dos idosos pré-frágeis utilizavam de 2 a 4 medicamentos, número este superior aos não frágeis (40%). Em todos os subgrupos existe uma superioridade numérica da frequência do número de medicamentos nos pré-fragéis. A polifarmácia foi visualizada em 5,34% não frágeis e 6,19% nos pré-frágeis. Ao se associar a quantidade de medicamentos utilizados à fragilidade física não houve significância estatística (p = 0,7516).

Tabela 4. Associação entre fragilidade física dos idosos e o número de medicações. Curitiba, Paraná, Brasil, 2015
Número de medicações Pré-frágeis % Não frágeis % Total Valor de p
Não utiliza medicamentos 25 25,77 25 33,33 50 0,7516
Utilizam 1 medicamento 24 24,74 16 21,33 40  
Utilizam 2 a 4 medicamentos 42 43,30 30 40,00 72  
Polifarmácia (5 ou mais medicamentos) 6 6,19 4 5,34 10  

* Teste Cochran - teste G, p < 0,05.

Tabela 4. Associação entre fragilidade física dos idosos e o número de medicações. Curitiba, Paraná, Brasil, 2015

DISCUSSÃO

A ausência de idosos frágeis, divergem de estudos desenvolvidos17,18 em idosos da comunidade que evidenciam percentuais de 4,9% e 15,3%. A ausência de idosos frágeis no presente estudo justifica-se pelas características clínica dos mesmos e pelo motivo que os levam as clínicas, que é a obtenção da carteira nacional de habilitação.

Apesar de não se ter observado a presença de idosos frágeis, a prevalência de pré-fragilidade foi de 56,40% significativamente superior aos estudos internacionais17-20 que apresentaram percentuais de 42,3%, 47,6%, 40% e 45,5%.

Ao comparar os resultados do grupo de idosos pré-frágeis aos de estudos nacionais observam-se percentuais bastante próximos. No estudo sobre Fragilidade em Idosos Brasileiros (Estudo FIBRA)9 pólo Unicamp, a pré-fragilidade variou entre 47,7% em Ivoti e 55,5% em Parnaíba. Ainda, o estudo conduzido em Belo Horizonte - MG8 com o objetivo de investigar os aspectos associados à fragilidade revelou 46,3% de idosos pré-frágeis, e o desenvolvido em Curitiba - PR21, que avaliou a qualidade de vida em idosos na Atenção Primária à Saúde, mostrou 56,7% de pré-frágeis.

Alguns estudos nacionais também obtiveram valores de pré-fragilidade superiores ao do presente estudo, que foram o FIBRA - Santa Cruz/RN22, que investigou características, prevalências e fatores associados à fragilidade em 391 idosos, e mostrou 60,1% de pré-frágeis. O estudo conduzido em Lafaiete Coutinho/Bahia23, município com baixo índice de desenvolvimento humano (IDH), avaliou a fragilidade em idosos cadastrados na Estratégia Saúde da Família e revelou 58,7% dos idosos na condição de pré-fragilidade.

O expressivo percentual de idosos pré-frágeis identificados no presente estudo evidencia a importância de intervenções nesse estágio, com vistas a maior possibilidade e efetividade da interrupção e ou reversão do quadro e consequente manutenção de uma direção segura por um tempo maior. A identificação durante o exame de habilitação veicular poderia direcionar a avaliações mais frequentes, as quais podem estabelecer prazos menores para a validade da carteira de habilitação. Ademais, autores evidenciam que idosos pré-frágeis tendem a responder melhor a ações de intervenções do que os frágeis24.

O gerenciamento da fragilidade física compreende quatro intervenções de caráter multiprofissional, que só se viabilizam desse modo, e compreendem a realização de exercícios (resistência e aeróbicos), suporte calórico e proteico, uso de vitamina D e redução da polifarmácia6.

A idade dos idosos com frequência está relacionada à fragilidade física, no entanto, no presente estudo a mesma não apresentou grau de relacionamento (p = 0,0765). Em uma revisão sistemática, cujo objetivo foi destacar a prevalência de fragilidade em idosos da comunidade com idade superior a 65 anos, encontraram associação significativa entre idade e fragilidade (valor de p < 0,001)25. O estudo conduzido na cidade do México com 1.933 idosos da comunidade mostrou associação (p < 0,001)8. Ainda, houve associação significativa (p < 0,01) entre idade e fragilidade em um grande estudo populacional com 7.439 idosos realizado nos Estados Unidos da América18.

Apesar do déficit de estudos nacionais sobre a temática, dois estudos apontam resultados semelhantes aos internacionais. O estudo FIBRA revelou associação significativa entre fragilidade e idade (p = 0,027)9. Outro estudo21 com uma amostra constituída por 203 idosos usuários da Atenção Básica de Saúde, do mesmo modo, mostrou grau de relacionamento com valor de p < 0,01.

O presente estudo revelou que 66,86% dos idosos são jovens-idosos, com idade compreendida entre 60-69 anos, sendo a idade média de 67,73 ± 6,55 anos. Destes, a maioria era casada e ou morando junto, houve associação estatística entre fragilidade física e o estado civil (p = 0,0327). Este é um dado para futuras investigações, uma vez que este estudo, do tipo transversal, não dá margem para inferir a respeito. Corrobora a esses dados, o estudo realizado na província de Limburg no Sul da Holanda com 8.684 participantes que possuíam idade superior a 65 anos, que encontrou 68,8% de idosos casados e ou morando juntos26.

Constata-se no presente estudo que a prevalência de viúvos aumenta de 9,33% nos não frágeis para 17,53% nos pré-frágeis, dados semelhantes foram encontrados em outro estudo26 cuja prevalência foi de 17,5% nos não frágeis para 37,7% nos frágeis. Outra pesquisa27, desta vez realizada na Espanha com 640 idosos, avaliou a prevalência de fragilidade e os fatores associados aponta a viuvez associada à fragilidade.

As doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) estiveram presentes em 68,02% dos idosos, a maior distribuição foi para a Hipertensão Arterial Sistêmica (HAS) 41,86% e o Diabetes Mellitus (DM) 16,27%. Não houve grau significativo de relacionamento entre a fragilidade física e HAS (p = 0,1707). Dado semelhante foi encontrado em Barueri e Cuiabá no estudo realizado com 761 idosos da comunidade, no qual o valor de (p = 0,115)28.

O Cardiovascular Health Study (CHS) evidenciou distribuições de frequências semelhantes 42,9% para HAS e 15,8% para DM, e mostrou associação estatística entre esses componentes e a fragilidade (p < 0,001)2. Um estudo do tipo longitudinal18, realizado nos EUA, com 7.439 pacientes idosos e idade ≥ a 65 anos mostrou percentuais superiores, 64,1% HAS e 23,8% DM, com associação estatística entre essas patologias e a fragilidade física.

Em razão da alta incidência de HAS em idosos, a mesma é considerada uma condição de risco para uma direção segura, devido a isso, o órgão responsável pela avaliação dos motoristas orienta determinadas condutas de acordo com os níveis pressóricos. As orientações obedecem ao Consenso estabelecido pela Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (ABRAMET)29.

Apesar de não haver grau de relacionamento significativo entre DM e fragilidade física neste estudo (p = 0,9305), e divergir dos estudos2,28 torna-se necessária a discussão do tema, pois 16,27% dos avaliados autorrelataram DM e esta se apresenta como uma condição de risco para direção segura, principalmente se for do tipo I.

A variável "uso de medicamentos" (p = 0,8948) não apresentou associação significativa com a fragilidade física, todavia observou-se que 70,94% utilizavam medicamentos e 5,81% polifarmácia. O valor mais próximo observado na literatura foi o estudo epidemiológico30 de base populacional sobre uso de medicamentos realizado na Região Metropolitana de Belo Horizonte com 1.598 idosos. Observou-se que 72,1% faziam uso de medicamentos, e entre estes, 14,3% de polifarmácia. Dados semelhantes foram encontrados no estudo com 811 idosos de 60 anos ou mais de um município no Sul do Brasil, que observou que 72,3% utilizavam algum tipo de medicamento, e 13,9% de polifarmácia31.

O Estudo SABE32 no Município de São Paulo, encontrou números bem superiores, ao avaliar 1.115 idosos com idade ≥ 65 anos, 89% fazia o uso de medicamentos, sendo a polifarmácia encontrada em 36%. Corrobora a esses dados o estudo conduzido com idosos no Município do Rio de Janeiro-RJ33, o qual apontou 85% dos idosos utilizavam medicações, sendo a polifarmácia observada em 32,7%.

Quanto à polifarmácia, os resultados encontrados no presente estudo são justificáveis em razão da menor média de idade da população estudada e da própria omissão, por parte dos candidatos, uma vez que a polifarmácia podeinfluenciar o julgamento do médico de tráfego no teste de habilitação veicular.

A prevalência de quedas foi de 6,97%, sendo 4,12% no grupo de idosos não frágeis e 10,67% no pré-frágil, significativamente menor ao encontrada em estudos sobre fragilidade. No presente estudo não houve associação estatística significativa (p = 0,0949). A prevalência de quedas em um estudo populacional18 nos Estados Unidos da América com 7.439 idosos e idades ≥ 65 anos foi de 30,5%, sendo 18,1% nos não frágeis e 32,9% nos pré-frágeis e o nível de significância estatística foi de p < 0,001. No estudo SABE32 no Município de São Paulo quase metade (49,7%) dos idosos referiram queda nos últimos 12 meses.

O resultado referente ao sintoma tontura mostrou, igualmente, um percentual bastante baixo (1,16%) e divergente da literatura vigente. Observou-se o sintoma em 24% dos 1.087 idosos americanos com idade superior a 72 anos em NewHaven/Connecticut34. Em outro estudo35 com 620 idosos (idades >65 anos) que foram recrutados de forma randomizada do escritório de registros e acompanhados por dois anos obteve-se 29,2% de idosos que referiram tontura nos últimos 6 meses, sendo que a mesma aumentou com a idade. A frequência foi de 27% em idosos com 70 anos e 54% após os 90 anos.

A presença de tontura é determinada na avaliação das clínicas de trânsito por meio de uma pergunta específica e caso a resposta seja positiva, o examinador deverá solicitar um exame otoneurológico para avaliação da condição de segurança para direção veicular36, razão esta suficiente para justificar a baixa prevalência na população analisada.

Referente aos hábitos de vida, observou-se que a frequência entre os idosos não-frágeis, naqueles que consomem bebidas alcoólicas foi o dobro da observada em pré-frágeis n=22,67% e n = 11,34%, respectivamente. Houve associação significativa (p = 0,0417) entre o consumo de bebidas alcoólicas e fragilidade física. Um estudo conduzido na Espanha com 2.086 participantes avaliou a associação entre fragilidade e o consumo de bebidas alcoólicas e encontrou que o consumo de álcool, apenas durante as refeições e no padrão de consumo Mediterrâneo associa-se a um menor risco de fragilidade física37.

CONCLUSÃO

Conclui-se que a fragilidade física não foi observada neste estudo, no entanto, 56,4% dos candidatos à carteira de habilitação veicular se encontravam numa condição prévia (pré-fragilidade). Houve associação significativa entre fragilidade física e estado civil e o uso de bebidas alcóolicas.

A alta prevalência de pré-frágeis sinaliza a necessidade de um efetivo gerenciamento dessa síndrome médica, que deve iniciar, pelo menos, ao longo da avaliação da aptidão física e mental para direção veicular, a fim de manter as habilidades específicas de condução e performance de condução ideal. O gerenciamento da fragilidade física só será alcançado por meio da integração de serviços e de profissionais comprometidos com a interdisciplinaridade.

O entendimento de algumas relações de causa e efeito entre as variáveis são dificultadas por se tratar de estudo transversal, logo estudos longitudinais podem explorar melhor essas relações e evidenciar a evolução dos idosos quanto à fragilidade e direção veicular segura.

Salienta-se que a omissão de dados, por parte dos idosos, é passível de interferência nos resultados da avaliação da fragilidade física. No entanto, espera-se que os achados do presente estudo atenuem a escassez de investigações sobre a temática e tragam novas luzes sobre o conhecimento de fatores relacionados à fragilidade física e direção veicular.

AGRADECIMENTOS

Á Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES; bolsa de Doutorado: Maria Angélica Binotto e Nathalia Hammerschmidt Kolb Carneiro) e a Fundação Araucária de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Estado do Paraná (Edital 09/2015, protocolo 45784 Programa Bolsa-Sênior Maria Helena Lenard).

 

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