Volume 19, Número 2, Abr/Jun - 2015
PESQUISA
Sobrecarga de cuidadores familiares de idosos com acidente
vascular encefálico
Tatiana Ferreira da Costa
1
Kátia Nêyla de Freitas Macêdo Costa
1
Kaisy Pereira Martins
1
Maria das Graças de Melo Fernandes
1
Silmery da Silva Brito
1
1 Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa - PB, Brasil
Recebido em 24/07/2014
Aprovado em 28/04/2015
Autor correspondente:
Kaisy Pereira Martins
E-mail:
kaisyjp@hotmail.com
RESUMO
OBJETIVO:
Investigar a prevalência e associação da sobrecarga com características do
indivíduo com sequela de acidente vascular encefálico e do cuidador.
MÉTODOS:
Estudo descritivo, transversal, com abordagem quantitativa, realizado na cidade de
João Pessoa - PB. Os participantes foram 136 cuidadores familiares. Para a coleta
de dados, aplicou-se a escala de Barthel e Zarit Burden
Interview.
RESULTADOS:
Evidencia-se alta prevalência de sobrecarga entre os cuidadores (77,2%), a qual
apresentou associação estatisticamente significativa com as seguintes
características: indivíduos com sequela de acidente vascular encefálico com 65
anos ou mais, com grau de dependência muito grave, cuidadores do sexo feminino,
com faixa etária adulta e com baixo grau de escolaridade.
CONCLUSÃO:
Destaca-se a importância prática de intervenções realizadas por enfermeiros e
demais profissionais de saúde com relação às orientações e supervisões referentes
ao cuidado dispensado ao cuidador familiar de indivíduos com sequela de acidente
vascular encefálico.
Palavras-chave: Acidente Vascular Encefálico; Cuidadores; Relações Familiares.
INTRODUÇÃO
O acidente vascular encefálico (AVE) é uma síndrome clínica que consiste do desenvolvimento rápido de distúrbios clínicos focais da função cerebral, que duram mais de 24 horas ou conduzem à morte sem outra causa aparente que não uma de origem vascular1. Caracteriza-se ainda como um problema de saúde pública que se situa entre as três maiores causas de morte em muitos países, e, a principal causa de incapacidade neurológica grave, acarretando custos, medidas tanto em gastos com os cuidados de saúde como com produtividade perdida.
O acontecimento inesperado de uma doença incapacitante como o AVE, constitui um evento estressor para o paciente e a família, que vivencia, inicialmente, um desequilíbrio em sua capacidade de funcionamento normal, provocando alterações que envolvem afeto e finanças que levam a um processo de reorganização familiar.
Diante desse contexto, é necessário definir papéis entre os membros da família, sendo escolhido, na maioria das situações, apenas um membro que assume a responsabilidade dos cuidados, o cuidador principal ou cuidador informal. Este surge como parte importante das ações de manutenção da autonomia, integração e participação do indivíduo acometido nas relações familiares e na sociedade2.
No entanto, a experiência de assumir a responsabilidade de cuidar de uma pessoa dependente tem sido colocada pelos cuidadores familiares como uma tarefa exaustiva e estressante, pelo envolvimento afetivo e por ocorrer, muitas vezes, uma transformação de uma relação anterior de reciprocidade para uma relação de dependência, em que o cuidador, ao desempenhar atividades relacionadas ao bem-estar físico e psicossocial da pessoa, passa a ter restrições em relação à sua própria vida3.
Na realidade brasileira, a visibilidade do cuidador informal ainda é muito restrita, o que constitui uma problemática enfrentada pelo cuidador familiar que, no seu cotidiano, quase sem nenhum suporte social formal, vem prestando os cuidados que a situação de dependência exige3,4. Esse fato propicia a negligência por parte dos profissionais quanto às necessidades de saúde dessa população. Deste modo, o despreparo para o ato de cuidar, a falta de orientação e o suporte social expõe o cuidador a uma grande carga de estresse e sobrecarga que pode afetar sua saúde, seu bem estar e sua qualidade de vida.
Nesse sentido, esta pesquisa é relevante, uma vez que amplia os conhecimentos e a visibilidade dos problemas relacionados ao cuidador familiar. Acredita-se ainda que possa produzir implicações na assistência da Enfermagem no âmbito da atenção primária, redirecionando o olhar destes profissionais para o fenômeno multidimensional que envolve o paciente dependente, o cuidador e a família, de modo que a assistência seja voltada ao desenvolvimento de estratégias e intervenções que venham minimizar o impacto da condição de dependência sobre o cuidador.
Diante do exposto, o estudo teve como objetivo investigar a prevalência da sobrecarga de cuidadores familiares de idosos com sequela de acidente vascular encefálico, residentes em João Pessoa, Paraíba, e sua relação com as características sociodemográficas do próprio cuidador e com as características sociodemográficas e incapacidade funcional dos indivíduos.
MÉTODO
Trata-se de uma pesquisa descritiva, transversal, com abordagem quantitativa, realizada no Município de João Pessoa - PB. O universo do estudo foram os cuidadores familiares de idosos com sequela de Acidente Vascular Encefálico - AVE. A amostra do presente estudo foram 136 cuidadores, calculada a partir do total de 204 pacientes atendidos nas unidades de saúde do Município de João Pessoa - PB no ano de 2012.
No primeiro momento, realizou-se uma seleção aleatória com uma média de 40 Unidades de Saúde da Família, na qual, entrou-se em contato com os apoiadores e enfermeiros de cada Unidade, que informaram por meio dos registros, os pacientes que sofreram AVE e apresentavam sequela. Iniciou-se a coleta de dados nos domicílios dos pacientes, com acompanhamento de um agente de saúde.
Foram adotados como critérios de inclusão dos indivíduos com sequela de AVE: ter idade igual ou superior a 18 anos, apresentar pelo menos duas Atividades de Vida Diária (AVD) comprometidas, e possuir um cuidador familiar. Entre os critérios de inclusão para os cuidadores, incluiu-se: ter idade igual ou superior a 18 anos; ser o cuidador principal.
A coleta de dados foi realizada mediante entrevista no domicílio dos indivíduos com sequela de AVE e seus cuidadores, no período de abril a junho de 2013. Para tal, foram utilizados questionários semiestruturados com questões referentes às características sóciodemográficas dos indivíduos com sequela de AVE (idade, sexo, estado civil, escolaridade, situação profissional, renda pessoal) e dos cuidadores (idade, sexo, estado civil, escolaridade, situação profissional, renda pessoal, tipo de renda e grau de parentesco com o paciente). Em seguida, foi aplicada a escala de Barthel, para confirmar a inclusão dos indivíduos e a dos cuidadores na pesquisa, é a mais utilizada como medida de prognóstico, após um AVE mede a severidade da incapacidade avaliando a independência funcional por meio da mensuração da capacidade do indivíduo em desenvolver as AVD. Para avaliar e classificar a sobrecarga entre os cuidadores foi utilizado a Escala Zarit Burden Interview5 que tem por finalidade apreciar a existência de sobrecarga objetiva e subjetiva do cuidador, adaptada e validada no Brasil obedecendo aos seguintes escores: sobrecarga intensa (escore entre 61 e 88), sobrecarga moderada a severa (escores entre 41 e 60), sobrecarga moderada a leve (escores entre 21 e 40) e ausência de sobrecarga (escores inferiores a 21)6.
Para a análise estatística dos dados, foi utilizado o aplicativo SPSS (Statistical Package for Social Science) versão 18.0, sendo utilizada a aplicação da técnica de Análise de Associação por meio do Teste de qui-quadrado.
Quanto aos procedimentos éticos, foram cumpridos todos os aspectos éticos e legais que envolvem seres humanos, preconizados pela Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde7. O projeto foi encaminhado ao Comitê de Ética do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Paraíba e aprovado sob o protocolo nº 0279/13 e CAAE: 13778313.3.0000.5188. Sendo respeitado o princípio da autonomia, respeitando a privacidade, principalmente ao que se refere ao Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, instrumento indispensável para que se possa realizar pesquisa que envolve seres humanos.
RESULTADOS
Dentre as características sóciodemográficas dos idosos com sequela de AVE, verificou-se prevalência do sexo feminino (51,4%), idade média de 70,43 anos, casados (48,53%), escolaridade entre um a quatro anos de estudo (27,94%), aposentados (80,88%), renda pessoal entre dois a três salários mínimos (61,76%). No que se refere à incapacidade funcional, verificou-se que 46 (33,83%) indivíduos apresentavam dependência leve; 35 (25,74%), muito grave; 28 (20,59%) eram dependentes graves; e 27 (19,85%), dependência moderada.
Quanto às características dos cuidadores, verificou-se que a maioria era do sexo feminino (84,5%), filhos (51,47%), tinham idade média de 47,34 anos, casados (57,35%), com escolaridade entre cinco a nove anos (51,47%). Quanto à situação profissional, houve predominância de cuidadores desempregados (45,59%) com renda pessoal entre 1 a 3 salários mínimos (58,09%).
Com relação à prevalência de sobrecarga entre os cuidadores, verificou-se através da aplicação da Escala Zarit Burden Interview que 77,2% apresentaram sobrecarga. Considerando os níveis de sobrecarga, apresentados na Tabela 1, identificou-se que 79 (58,0%) dos cuidadores familiares apresentaram sobrecarga moderada a leve, 31 (22,8,%) ausência de sobrecarga e 26 (19,1%) sobrecarga moderada a severa.
Avaliação segundo a Escala de Zarit | Freq. | % |
Sobrecarga moderada a severa | 26 | 19,12 |
Sobrecarga moderada a leve | 79 | 58,09 |
Ausência de sobrecarga | 31 | 22,79 |
Analisando a relação entre a sobrecarga dos cuidadores e as características dos indivíduos com sequela de AVE, apresentadas na Tabela 2, verificou-se que houve associação estatisticamente significativa entre aqueles que cuidavam de indivíduos apenas em relação à faixa etária dos pacientes que está associada significativamente (valor-p inferior a 0,05) com o nível de sobrecarga.
Perfil sociodemográfico (pacientes) | Escala de Zarit | Significância (Valor de p) | |||||
Sobrecarga moderada a severa (n = 26) | Sobrecarga moderada a leve (n = 79) | Ausência de sobrecarga (n = 31) | |||||
Freq. | % | Freq. | % | Freq. | % | ||
Sexo | |||||||
Feminino | 10 | 38,46 | 45 | 56,96 | 15 | 48,39 | p (1) = 0,2425 |
Masculino | 16 | 61,54 | 34 | 43,04 | 16 | 51,61 | |
Faixa etária | |||||||
< 65 anos | 5 | 19,23 | 31 | 39,24 | 8 | 25,81 | p (2) = 0,0062 |
65 - 80 anos | 11 | 42,31 | 29 | 36,71 | 21 | 67,74 | |
> 80 anos | 10 | 38,46 | 19 | 24,05 | 2 | 6,45 | |
Estado civil | |||||||
Solteiro/divorciado/viúvo | 14 | 53,85 | 39 | 49,37 | 14 | 45,16 | p (1) = 0,8075 |
Casado/outro | 12 | 46,15 | 40 | 50,63 | 17 | 54,84 | |
Escolaridade | |||||||
Analfabeto/Alfabetizado | 15 | 57,69 | 37 | 46,84 | 9 | 29,03 | p (2) = 0,1652 |
Ensino Fundamental | 7 | 26,92 | 21 | 26,58 | 10 | 32,26 | |
Ensino Médio | 3 | 11,54 | 11 | 13,92 | 10 | 32,26 | |
Ensino Superior | 1 | 3,85 | 10 | 12,66 | 2 | 6,45 |
Ao se estabelecer relação entre a incapacidade funcional avaliada da escala de Barthel dos indivíduos com sequela de AVE e os níveis de sobrecarga dos cuidadores, constatou-se pouca correlação através do teste exato de Fisher, como mostra a Tabela 3. Entretanto, quando se utilizou o coeficiente de correlação (r = -0,197) entre os escores de ambas as escalas, mostraram uma associação significativa (valor-p inferior a 0,05) entre os maiores níveis de sobrecarga com maior nível de dependência (moderada para severa ou moderada para leve).
Escala de Barthel | Escala de Zarit | ||||||
Sobrecarga moderada a severa (n = 26) | Sobrecarga moderada a leve (n = 79) | Ausência de sobrecarga (n = 31) | Significância (Valor de p) | ||||
Freq. | % | Freq. | % | Freq. | % | ||
Dependência muito grave | 11 | 42,31 | 23 | 29,11 | 3 | 9,68 | |
Dependência Grave | 5 | 19,23 | 17 | 21,52 | 6 | 19,35 | p (1) = 0,1753 |
Dependência Moderada | 2 | 7,69 | 16 | 20,25 | 9 | 29,03 | r = -0,197 |
Dependência Leve | 8 | 30,77 | 23 | 29,11 | 13 | 41,94 | p (2) = 0,0215 |
Considerando características sóciodemográficos dos cuidadores e os níveis de sobrecarga entre eles, conforme ilustra a Tabela 4, foram evidenciadas diferenças estatisticamente significativas entre as maiores médias de sobrecarga (valor de p inferior a 0,05) de cuidadores do sexo feminino, apresentando uma tendência de terem maior sobrecarga que os homens. Além disso, os cuidadores adultos estão associados com os maiores índices de sobrecarga do que os cuidadores mais jovens. No que se refere à relação entre níveis mais elevados de sobrecarga e o grau de escolaridade do cuidador (p-valor 0,05), verificou-se maior sobrecarga entre os cuidadores com menor grau de escolaridade.
Perfil sociodemográfico (cuidadores) | Escala de Zarit | Significância (Valor de p) | |||||
Sobrecarga moderada a severa (n = 26) | Sobrecarga moderada a leve (n = 79) | Ausência de sobrecarga (n = 31) | |||||
Freq. | % | Freq. | % | Freq. | % | ||
Sexo | |||||||
Feminino | 26 | 100,00 | 66 | 83,54 | 23 | 74,19 | p (2) = 0,0124 |
Masculino | 0 | 0,00 | 13 | 16,46 | 8 | 25,81 | |
Faixa etária | |||||||
< 40 anos | 3 | 11,54 | 26 | 32,91 | 10 | 32,26 | p (2) = 0,0208 |
40 - 60 anos | 12 | 46,15 | 43 | 54,43 | 15 | 48,39 | |
> 60 anos | 11 | 42,31 | 10 | 12,66 | 6 | 19,35 | |
Estado civil | |||||||
Solteiro/divorciado/viúvo | 7 | 26,92 | 35 | 44,30 | 16 | 51,61 | p (1) = 0,1575 |
Casado | 19 | 73,08 | 44 | 55,70 | 15 | 48,39 | |
Escolaridade | |||||||
Analfabeto/Alfabetizado | 8 | 30,77 | 11 | 13,92 | 5 | 16,13 | p (2) = 0,0210 |
Ensino Fundamental | 11 | 42,31 | 28 | 35,44 | 4 | 12,90 | |
Ensino Médio | 5 | 19,23 | 24 | 30,38 | 16 | 51,61 | |
Ensino Superior | 2 | 7,69 | 16 | 20,25 | 6 | 19,35 |
DISCUSSÃO
Para avaliar a ocorrência de sobrecarga dos cuidadores, foi aplicada a escala de Zarit Burden Interview (ZBI), composta por 22 itens que avaliam a relação entre o cuidador e o paciente, a condição de saúde, o bem-estar psicológico, as finanças e a vida social. Nesse estudo, verificou-se que 58,09% dos cuidadores expressaram sobrecarga de moderada a leve, 22,79%, ausência de sobrecarga, e 19,12%, sobrecarga de moderada a severa.
A dependência de um membro da família representa uma situação de crise geradora de estresse, que ameaça o equilíbrio do normal funcionamento pessoal, familiar e social. Diante dessa situação, pode ocorrer uma desorganização psicossocial, frequentemente acompanhada de sentimentos negativos, como medo, culpa e ansiedade. Quando esse estado de mal-estar e de tensão não é tolerado durante um longo período, o indivíduo tende a adotar novas estratégias de enfrentamento para superar a crise, que poderão conduzir a um ajustamento não saudável, com repercussões emocionais negativas que provocam a sobrecarga2.
Alguns estudos apontaram que a sobrecarga dos familiares resulta das tarefas advindas do papel de cuidador e das mudanças ocorridas em sua vida social e profissional, pois eles priorizam as necessidades dos pacientes. Além disso, conforme esses estudos mostraram, a sobrecarga é agravada pela falta de informação a respeito da doença do paciente, do tratamento utilizado e das estratégias mais adequadas para lidar com os comportamentos problemáticos dos pacientes e para o manejo das situações de crise8,9.
Na análise das características dos indivíduos com sequela de AVE relacionadas à sobrecarga do cuidador foram verificadas maiores sobrecargas com indivíduos com idade de 65 a 80 anos, do sexo masculino, solteiro e com baixo nível de escolaridade. Vale ressaltar que apenas a faixa etária foi estatisticamente significativa (p = 0,0062).
A idade mais avançada, em si, não consiste num déficit que possa acarretar maior sobrecarga para o cuidador, no entanto, é um fator de risco importante para o surgimento de morbidades que influenciam seu nível de dependência10. Evidencia-se nos estudos que o comprometimento da autonomia do doente está diretamente ligado ao tipo de doenças crônicas incapacitantes que lhe acometerem. De tal modo, o nível de dependência do doente é um fator contribuinte para gerar estresse físico e mental, sendo a sobrecarga diretamente proporcional ao grau de dependência do ser cuidado, pois quanto mais comprometida sua autonomia, maiores são as demandas e a complexidade das atividades desenvolvidas pelo cuidadores11.
Quanto ao sexo, os homens apresentam maiores dificuldades para aceitar a condição de dependência e a necessidade de ser cuidado, contribuindo para o surgimento de sobrecarga entre os cuidadores familiares. Além disso, preocupam-se menos com a manutenção de sua saúde, o que os torna mais suscetível à ocorrência de problemas crônicos que podem evoluir com prejuízo funcional11.
O baixo grau de escolaridade é também um fator importante, que na maioria das vezes, está relacionado à baixa renda, acarretando prejuízos financeiros que sobrecarregam, significativamente, o cuidador, uma vez que, prover cuidados a outros sugere necessidades básicas como alimentação, passando pela realização de atividades físicas até necessidades específicas como aquisição e compra de medicamentos. Portanto, a limitação de recursos financeiros pode traduzir-se em fator gerador de estresse ao cuidador10,12.
Ao se estabelecer relação entre a incapacidade funcional e os níveis de sobrecarga dos cuidadores, percebeu-se que quanto maior o grau de dependência, maior a sobrecarga. Esse mesmo resultado foi encontrado em outras pesquisas12,13. A dependência refere-se ao estado em que a pessoa é incapaz de existir ou viver, de maneira satisfatória, sem a ajuda de outrem. O indivíduo que apresenta incapacidade, deficiência ou desvantagem social é uma pessoa que em algum momento ou situação é dependente para o autocuidado e necessita de um cuidador11.
Para tanto, promover estratégias de segurança, como uma simples adaptação do vaso sanitário, retirar tapetes, adotar uma nova técnica de posicionamento ou mobilização do paciente, podem ajudar e amenizar as dificuldades para a prestação dos cuidados. Além disso, o apoio de outros membros da família é um fator importante para minimizar a experiência de sobrecarga, permitindo ao cuidador uma sensação de não estar sozinho14.
No que se refere às características dos próprios cuidadores, este estudo revelou uma média de sobrecarga maior entre o sexo feminino. O resultado ora mencionado, evidencia o descrito na literatura quanto ao papel sociocultural da mulher de cuidar, seja da casa ou dos filhos. Embora, atualmente, as mudanças sociais e na composição familiar, tenham atribuídos novos papéis as mulheres, a tendência para o ato de cuidar tanto do ambiente doméstico como da saúde dos seus familiares ainda recai para as mulheres, devido ao repertório simbólico construído pela sociedade3. Nessa perspectiva, comumente a mulher assume os cuidados mesmo quando tem outro trabalho, desse modo, a sobrecarga do cuidado acaba repercutindo na redução do tempo livre e traz implicações para a vida social da mulher4.
Quanto à idade, foi evidenciado que cuidadores com faixa etária adulta, ou de meia idade tem um maior nível de sobrecarga. Isto refere ao fato que, muitas vezes, o cuidador nesta idade, tem que conciliar suas atividades diárias, que também são de sua competência, como trabalhar, cuidar da casa e dos filhos, com o cuidado prestado ao familiar dependente, ocasionando assim um acúmulo de papéis.
No tocante à relação entre os maiores níveis de sobrecarga e o baixo grau de escolaridade dos cuidadores, alguns autores ressaltam que a falta de conhecimento e informação para o ato de cuidar, muitas vezes, vinculada ao baixo nível de escolaridade, pode desencadear no cuidador sentimentos de ansiedade e angústia que repercutem negativamente no cuidado prestado, bem como na própria saúde do cuidador1,15. Em consequência, os cuidadores se tornam mais vulneráveis ao adoecimento16.
A tarefa de cuidar, por si só conduz a problemas de saúde, como sintomas de depressão ou isolamento social para o cuidador. Desse modo, muitos cuidadores necessitam de formação e educação, quanto ao cuidado, descanso e cuidados à sua saúde física e mental. Tais programas devem fornecer orientações para os cuidadores enfrentarem as mudanças na sua rotina diária. Somados ao desgaste físico dos cuidadores advindos do cuidado, ocorre o impacto emocional relacionado ao convívio com o familiar dependente, à falta de tempo para o lazer, ao sentimento de culpa e ao medo da doença para si, acrescido das dificuldades financeiras impostas frente ao abandono das atividades laborais17.
CONCLUSÃO
Verificou-se alta prevalência de sobrecarga entre os cuidadores investigados (77,2%), assim como foi constatado que algumas características sóciodemográficas dos indivíduos com sequela de AVE e dos próprios cuidadores familiares relacionaram-se com maiores médias de sobrecarga. Entre as relações estabelecidas, foram verificadas associações estatisticamente significativas entre a sobrecarga do cuidador familiar e as seguintes características: indivíduos com sequela de acidente vascular encefálico com 65 anos ou mais, com grau de dependência muito grave, cuidadores do sexo feminino, com faixa etária adulta e com baixo grau de escolaridade.
Os valores encontrados, nesta pesquisa, apontam para a necessidade de oferecer suporte ao cuidador de indivíduos com sequela de AVE, visando à redução da sobrecarga relacionada às atividades inerentes à prestação de cuidados e acessibilidade a conhecimentos. Desse modo, destaca-se a importância prática de intervenções realizadas por enfermeiros e demais profissionais de saúde com vistas à melhoria na assistência, bem como de orientações e supervisões referentes ao cuidado dispensado pelo cuidador familiar. Além disso, tais achados são relevantes para despertar a sociedade e os atores governamentais quanto à necessidade de implementação de políticas públicas e ações com vistas ao fornecimento de suportes formais e emocionais para essas pessoas.
Neste estudo, as limitações estiveram relacionadas à inexistência encontradas na literatura de estudos intervencionais no Brasil destinadas a esses cuidadores, o que leva a necessidade de mais pesquisas nessa área, bem como a validação de escalas no Brasil específicas para aplicação em familiares de pacientes acometidos por AVE, que poderão trazer dados mais fidedignos em relação a essa população.
REFERÊNCIAS