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CAPES

Volume 18, Número 4, Out/Dez - 2014



DOI: 10.5935/1414-8145.20140103

PESQUISA

O gênero masculino e os cuidados de saúde: a experiência de homens de um centro de saúde

Daniele Natália Pacharone Bertolini 1
Janete Pessuto Simonetti 1


1 Universidade Estadual Paulista. Botucatu - SP, Brasil

Recebido em 30/03/2014
Aprovado em 03/09/2014

Autor correspondente:
Janete Pessuto Simonetti
E-mail: janepessuto@gmail.com

RESUMO

Compreender como os homens de um Centro de Saúde se comportam quanto aos cuidados com a saúde. Estudo qualitativo, realizado em um Centro de Saúde Escola que selecionou por conveniência e entrevistou 15 indivíduos do gênero masculino, adultos e organizou os dados conforme o Discurso do Sujeito Coletivo. Emergiram quatro ideias centrais que retratam os motivos para procurar o serviço, problemas de saúde, atitudes diante desses problemas e participação nas atividades da unidade. Esses indivíduos são assíduos, se preocupam em seguir as recomendações recebidas e utilizam o atendimento individual, preferencialmente, por falta de tempo, mas demonstram interesse em participar de atividades em grupo. Isto deve ser utilizado pelo serviço como oportunidade de intensificar a participação deles em grupo específico já existente para homens, que oferece um espaço de acolhimento e escuta de problemas diversos, sendo uma forma de reintegração desses indivíduos junto ao serviço de saúde.


Palavras-chave: Saúde do Homem; Centros de Saúde; Enfermagem; Assistência à Saúde.

INTRODUÇÃO

O lançamento da Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH) em 2009, tendo como objetivo geral melhorar as condições de saúde da população masculina, vislumbrou reduzir a morbidade e a mortalidade, focando sua atenção nos fatores de risco para este seguimento populacional, bem como oferecer condições para aumentar o acesso aos serviços de saúde e ações integrais de saúde1. Isso vem chamando a atenção para esta temática, estimulando o desenvolvimento desta pesquisa, assim como de outros estudos2-7.

De acordo com dados recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), tendo como referência o dia 1º de julho de 2014, estima-se que, atualmente, o Brasil tem 202,7 milhões de habitantes; a expectativa de vida, no geral, passou de 74,1 em 2011 para 74,6 anos em 2012 e, em relação ao sexo, para os homens passou de 70,6 (2011) para 71 anos (2012) e para as mulheres subiu de 77,7 para 78,3 anos no mesmo período8.

Em relação à mortalidade, na faixa etária entre 20 e 59 anos, as principais causas de óbito no Brasil foram: causas externas, doenças do aparelho circulatório, neoplasias, doenças do aparelho digestivo2,9. Os homens morrem em situações de acidentes e violência, levando-os à morte prematura, não havendo tempo para o adoecimento, como ocorre com as mulheres, que morrem por neoplasia, doenças do sangue, doenças endócrinas, dentre outras9. Em âmbito internacional, a disparidade entre saúde do homem e da mulher, também é observada, como em Singapura, onde os homens morrem mais cedo e sofrem de doenças como câncer, doença cardíaca, doença cerebrovascular, doenças sexualmente transmissíveis. As questões de saúde mental também foram significativas, em que os homens tiveram maiores taxa de suicídio do que as mulheres. Essas condições resultam em anos de vida produtivos perdidos e, além disso, os homens, mais do que as mulheres, têm estilos de vida pouco saudáveis que predispõem a doenças crônicas10.

Quanto aos hábitos de vida pouco saudáveis e presença de doenças crônicas, no Brasil, houve aumento significativo da prevalência de obesidade, excesso de peso, insuficiente atividade física no tempo livre, sedentarismo, hipertensão arterial e diabetes com o aumento da idade2. Dessa forma, pode-se dizer que os homens adentram no sistema de saúde por meio da atenção especializada, e tem como consequência o agravo da morbidade pelo retardamento na atenção e maior custo para o Sistema Único de Saúde (SUS). É necessário fortalecer e qualificar a atenção primária, garantindo assim, a promoção da saúde e a prevenção aos agravos evitáveis1.

Há vários trabalhos que buscaram compreender os motivos desses homens chegarem aos serviços já com doenças crônicas instaladas. Por parte dos profissionais, percebe-se a valorização das mulheres em detrimento dos homens, já que estes seriam mais propensos às práticas curativas e menos aptos à prevenção11. Há diversas representações e estereótipos relacionados aos gêneros, tais como: "homens são mais fortes"; "o corpo feminino tem particularidades que demandam mais cuidado"; "mulheres são naturalmente cuidadoras". Assim sendo, a invisibilidade do gênero masculino é produzida por meio de uma expectativa dos profissionais de que homens não cuidam nem de si nem de outras pessoas e, portanto, não procuram os serviços ou o fazem de formas menos autênticas. Quando os profissionais não reconhecem estes indivíduos como potenciais sujeitos de cuidado, deixam de estimulá-los às práticas de promoção e prevenção da saúde ou não reconhecem casos em que eles demonstram tais comportamentos3.

Entretanto, quando os homens são questionados quanto aos motivos que os levam a não procurar atendimento nas unidades básicas de saúde, surgem aspectos que não se associam somente ao gênero como: horário inadequado de funcionamento dos serviços que ocorre durante a jornada de trabalho, medo de ser portador de uma doença grave, falta de especialistas, demora no atendimento. Tais fatores podem ser minimizados se os serviços oferecerem novas estratégias de atendimento a este seguimento populacional4-6.

Pensando no tema homem versus saúde, a questão que norteou este estudo foi: como os homens têm se comportado em relação aos cuidados com sua saúde?

O objetivo da pesquisa foi compreender como os homens de um Centro de Saúde se comportam quanto aos cuidados com a saúde.

MÉTODO

A presente pesquisa está inserida na linha qualitativa, em que os dados foram organizados na forma do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC). Foi realizada em um Centro de Saúde Escola, Unidade Auxiliar de uma Universidade do interior do Estado de São Paulo, interligado com a rede Municipal de Saúde como uma Unidade Básica de Saúde (UBS). De acordo com dados do último censo, este município tem cerca de 130 mil habitantes e a referida UBS é responsável por aproximadamente 25 mil habitantes que residem em sua área de abrangência, em sua maioria.

A constituição da amostra foi por conveniência e com base na saturação das respostas foram selecionados 15 sujeitos do gênero masculino, maiores de 18 anos, que aceitaram participar desta pesquisa e que compareceram na UBS para um atendimento eventual ou para um atendimento pré-agendado, no período de julho a setembro de 2010, quando ocorreu a coleta de dados. Foram aplicados os procedimentos éticos necessários, e este trabalho foi aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa, em abril de 2010, com número de Protocolo 3479-2010. Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, em duas vias, como é preconizado.

Para a coleta de dados foram realizadas entrevistas individuais por uma das pesquisadoras, gravadas em aparelho eletrônico, com duração de aproximadamente 30 minutos, que foram transcritas na íntegra e após esta etapa foram apagadas. Foram feitas três questões norteadoras, que estimularam os sujeitos a falarem sobre: os motivos que os fizeram procurar pelo serviço, quais os cuidados que têm ou não com sua saúde e como é a frequência aos retornos agendados, seja na modalidade individual ou em grupo, para o acompanhamento dos tratamentos propostos.

Os dados obtidos foram organizados com base na proposta do DSC, uma estratégia metodológica que propõe a organização dos mesmos utilizando-se 4 figuras12: Ideia Central: é a afirmação que traduz o essencial do conteúdo do discurso explicitado nos depoimentos; Expressões - Chave: permitem resgatar a essência do conteúdo do discurso, por meio da transcrição literal de partes dos depoimentos. Deve-se voltar às questões da pesquisa ao selecionar tais expressões. A construção do DSC se baseia nesta figura; Discurso do Sujeito Coletivo (DSC): não se utiliza o agrupamento em categorias. Nessa figura se busca resgatar o discurso, usando os próprios discursos. Não há uma categoria unificadora, mas sim se busca "reconstruir, com pedaços dos discursos individuais, como em um quebra-cabeça, tantos discursos-síntese quantos se julgue necessário para expressar uma dada figura, ou seja, um dado pensar ou representação social sobre um fenômeno"12:19.

A construção do DSC parte da seleção das principais ideias centrais, que são selecionadas por meio das expressões - chave, originárias dos discursos de cada indivíduo, sendo concluído, de forma sintética, como se os vários discursos fossem um só. O agrupamento dos diversos discursos em um DSC deve ser feito com base na semelhança dos discursos. Quando houver diferentes ideias é obrigatória a separação em discursos diferentes12.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os discursos produzidos pelos participantes, com base nas questões que nortearam a pesquisa, foram organizados utilizando-se a estratégia metodológica do Discurso do Sujeito Coletivo (DSC), sendo que emergiram 4 ideias centrais.

Ideia Central 1: Motivos que os levaram a procurar pelo serviço: cuidar da saúde, realizar exames, fazer acompanhamento, consultas extra e de rotina.

Discurso do Sujeito Coletivo

É o benefício que o pobre tem pra cuidar da saúde. Para mim tem sido ótimo o tratamento. Procurei para ser atendido para minha saúde melhorar. Nesse sentido, se a gente não procura cuidar da saúde vamos para pior. Eu tive dois infartos, agora eu faço acompanhamento aqui, para me tratar, para ficar melhor e também para tentar parar com os vícios. Fui encaminhado pela minha médica para pedir exames para dar continuidade no meu tratamento de asma e de bronquite. Tive retorno com a Enfermagem, para seguir as minhas condições de pressão alta, fazer acompanhamento, ver como está a minha saúde, quanto ao coração, medir triglicérides, colesterol, enfim, o geral, para poder dar uma boa manutenção ao corpo. Vim para fazer acompanhamento do diabetes, saber resultado de exames, consulta de rotina. Para ver a pressão, se está controlando. Vim na consulta marcada, em grupo. E hoje procurei para ver o que realmente está acontecendo, porque me mandaram para cá, em uma consulta extra, porque ontem eu estava bem mal, fiquei ruim da cabeça e de repente me deu uma tontura, virou minha boca e eu desmaiei. Eu sempre venho nas consultas. Eu faço o possível para não perder. Uma vez ou outra a gente esquece. Toda vez que é marcada a consulta, eu venho. Passo pela geriatra, passo pelas enfermeiras, faço exames de sangue, urina, sempre que solicitado. Todas as vezes que foi marcado participei (E1, E2, E3, E4, E5, E6, E7, E8, E9, E10, E11, E12, E13, E14, E15).

Os motivos que levaram os homens a procurarem pelo serviço, na maior parte do discurso, estão relacionados a procedimentos para o acompanhamento de doenças como diabetes, hipertensão arterial, problemas cardiovasculares, doença respiratória, controle pressórico, doenças crônicas já instaladas e que requerem acompanhamento constante. Eles demonstram em suas falas compromisso com os retornos, comparecimento para a realização de exames, controle dos níveis de pressão arterial, aspectos estes importantes para o controle de fatores de risco e prevenção de agravos, sendo um dos pontos fortes da PNAISH1 e buscam atendimento quando não estão bem. De acordo com o relato de doenças crônicas já presentes, estes achados estão em consonância com dados da literatura que trazem que, quando esse homem chega ao serviço de saúde, já chega com demandas de níveis de especialidades1.

Ressalta-se que a equipe de saúde tem um papel fundamental nesse serviço, para que estes homens continuem com esse compromisso de cuidar de sua saúde, pois como encontrado em outro trabalho3, se estes não forem reconhecidos pelos profissionais como responsáveis pelo seu cuidado, a equipe não fornecerá as ferramentas necessárias para o aprimoramento das práticas de promoção e prevenção da saúde.

O vínculo com a equipe de saúde e o acolhimento são aspectos importantes para que os homens se sintam atendidos em suas necessidades. Seja para uma necessidade bastante específica, relacionada à manifestação de uma doença já instalada, seja para dar suporte a sua família, ou ainda, a satisfação com uma nova tecnologia de saúde que melhorou sua qualidade de vida7. Para que os homens mudem o seu comportamento perante questões do processo saúde-doença, os profissionais podem interferir adotando estratégias que estimulem esta procura, por meio de um acolhimento mais efetivo4.

Outro estudo13 que analisou essa participação do gênero masculino junto à Atenção Primária levantou a falta de tempo como uma das dificuldades mencionadas pelos homens para não participarem, inclusive, de campanhas específicas para eles, como no caso de rastreamento de câncer de próstata. Considerar este ponto é importante para o planejamento das ações de saúde, já que as unidades básicas, geralmente, funcionam no período diurno, coincidindo com o horário de trabalho desses indivíduos4-6,13.

Apesar de não ter sido objeto deste estudo, a avaliação do serviço e da equipe, neste DSC, o tratamento oferecido pelo serviço é considerado ótimo. Na literatura, pesquisas que avaliaram serviços obtiveram como sugestões de usuários homens: aumento da oferta de atendimento, mais atenção por parte do profissional, maior facilidade na marcação de consultas e melhor remuneração dos profissionais de saúde, visando melhorias na qualidade da assistência. Houve também algumas reivindicações, como melhorar o atendimento do usuário homem nas campanhas, realização de reuniões de esclarecimentos, criação de setores separados do atendimento a mulheres e crianças, atendimento de urologia, revelando que não há igual preocupação, como nos casos das mulheres, que têm o acompanhamento ginecológico do especialista6.

Ideia Central 2: Problemas de saúde que acometem os homens: problemas respiratórios, problemas ortopédicos, hipertensão arterial, diabetes e dislipidemia.

Discurso do Sujeito Coletivo

Tenho mais problemas respiratórios. Porque o coração, todos os médicos falam que é bom, que o meu problema é o pulmão. E é só isso, graças a Deus que é só isso. Acho que o problema meu é hipertensão, problema de sistema nervoso, tinha problema de úlcera, mas já fui curado, perdi uma vista, quebrei o fêmur e a perna encurtou, do resto normal. Vou levando a vida normal. Pressão alta, que está sendo controlada, acompanhamento de próstata, que está super controlado, apesar de que não estou tomando medicamento nenhum, mas só com a alimentação está abaixando bem o PSA e o restante está normal. A pressão mantém normal, mas de vez em quando sobe. A gente esquece de tomar o remédio, muitas vezes dá um problema, mas é só. Tenho pressão alta. Pouquinho de colesterol, diabetes. Tenho colesterol, um pouco (E1, E2, E4, E5, E6, E7, E8, E9).

Pelo relato dos participantes, nota-se que há doenças crônicas já instaladas e diagnosticadas, sendo papel da Atenção Primária à Saúde (APS) oferecer ações de saúde, tanto no individual como no coletivo, pautadas na promoção e proteção, além de prevenção de agravos, diagnóstico, tratamento, reabilitação e manutenção da saúde14. Muitas vezes a sociedade desconhece a forma de acessar as ações e os serviços de saúde e, aquilo que a população não conhece, não tem como ser defendido por ela. A Atenção Primária tem capacidade para que a sociedade defina seus direitos, incorpore seus conceitos e possa receber o mesmo tipo de atenção à saúde. Quando os serviços são cumpridos pela APS, com base nos princípios do SUS, isto reflete, diretamente, nos custos da União, com redução de hospitalizações, de consultas para um mesmo problema de saúde, de exames complementares, permitindo o aumento das ações de prevenção que irão influenciar na melhor adesão aos tratamentos e na satisfação da população14.

Atento ao crescente número de doenças crônicas, o Ministério da Saúde tem implementado diversas políticas para o enfrentamento dessas doenças, dentre elas, a Política de Promoção da Saúde, que intensifica ações na esfera da alimentação saudável, atividade física, prevenção do uso de tabaco e álcool, objetivando a prevenção das mesmas, bem como de seus fatores de risco15.

As causas de morte por doenças crônicas no Brasil, de um modo geral, são: doenças do aparelho circulatório (31,3%), câncer (16,3%), doença respiratória crônica (5,8%) e diabetes (5,2%)15. Com base nesses dados, destaca-se a relevância da inserção dos participantes, desta pesquisa, na inserção de ações assistenciais, bem como o estímulo a esta participação junto ao serviço de saúde, buscando assim, a prevenção de agravos e morte prematura.

Estes resultados estão em concordância com parte dos dados de outro estudo, que detectou que as principais queixas de saúde dos homens, de acordo com os profissionais, estão relacionadas a sintomas agudos percebidos e que dificultam as atividades de trabalho, além de doenças cardiovasculares, hipertensão e diabetes e questões da ordem da sexualidade. A abordagem do homem no serviço não é uma dificuldade, mas sim a mudança da atitude masculina em relação à sua própria saúde16.

Ideia Central 3: Seguem as recomendações para tratamento em relação à alimentação, prática de atividade física e uso de medicamentos.

Discurso do Sujeito Coletivo

Procuro sempre vir e fazer o que os médicos me mandam. Não posso comer sal, tem muitas coisas que eu não posso comer. Mas do resto, faço o que eu posso, não tenho exagero de nada, a parte de comida gordurosa é muito pouco que eu faço, bastante salada, bastante verdura, carne branca, peixe, enfim, alimentação parece que está, a meu ver, dentro do padrão. Procuro sempre me cuidar com relação à alimentação, porque já estou em uma idade avançada. Antes não, agora estou tendo cuidado. Estou evitando comer carne gorda, gordura, sal. Coisas que eu comia, bebia, larguei mão. Procuro fazer o acompanhamento certinho. Evito alimentação doce, que eu use o açúcar. Todo dia eu faço um pouco de atividade física. Qualquer coisa que me chamam: caminhada, andar de bicicleta, jogar bola, correr, andar, qualquer coisa eu faço. Cuido do diabetes, tomo remédio conforme a médica manda. Procuro ter cuidados com a saúde dentro do possível. Tomo o medicamento certinho e me sinto muito bem (E1, E2, E3, E4, E5, E6, E7, E8, E9, E10, E11, E12, E 13, E14, E15).

Os participantes mencionaram alguns cuidados de saúde que são preventivos e comuns aos agravos de algumas doenças crônicas15, visto que no DSC 2 eles citaram problemas de saúde como hipertensão arterial, diabetes, dislipidemia, doença respiratória. Referiram que pararam com alguns comportamentos, principalmente, os relacionados à alimentação, pois, certamente, foram orientados pelos profissionais que os têm assistido, após o diagnóstico dessas doenças.

Em 2011, foi lançado pelo MS o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas não Transmissíveis (DCNT), que tem por objetivo preparar o país para enfrentar e deter as seguintes doenças: acidente vascular cerebral, infarto, hipertensão arterial, câncer, diabetes e doenças respiratórias crônicas. Estas enfermidades correspondem a cerca de 70% das mortes no Brasil e atingem com maior ênfase as camadas pobres da população, com baixa renda e escolaridade. Nos últimos 10 anos, houve uma queda aproximada de 20% nas taxas de mortalidade pelas DCNT, podendo estar relacionada com a expansão da atenção primária que cobre cerca de 60% da população brasileira, melhoria da assistência e menor consumo de tabaco desde 199015.

De acordo com dados do MS, alguns fatores de risco para doenças cardiovasculares, relacionados aos hábitos de vida, bem como doenças que podem se agravar na presença deles, são mais prevalentes com o aumento da idade dos homens, sendo: insuficiente atividade física no tempo livre, sedentarismo, hipertensão arterial e diabetes. Por outro lado, o consumo de forma abusiva de bebidas alcoólicas, refrigerantes e gorduras saturadas diminui e o tabagismo e alguns hábitos alimentares (baixo consumo de frutas, legumes, verduras e feijão) não se alteram1,2. Outro estudo do MS (Vigitel, 2010) detectou nas capitais brasileiras, na população em geral, 15,1% de fumantes, 14,9% de adeptos com regularidade a atividade física, 34,2% de consumidores de carne com gorduras, 29,9% de consumidores regulares de frutas e hortaliças, 18% de consumidores de bebida alcoólica, 48,1% de pessoas com excesso de peso e 15% já com obesidade instalada15.

No DSC 3 nota-se que os homens do estudo têm se atentado mais à prática da atividade física e aumentado a ingestão de alimentos como verduras, contrariamente aos dados do MS1,2 e em concordância quanto aos cuidados com a alimentação rica em gorduras e ingestão de bebidas alcoólicas.

Outra pesquisa detectou comportamentos opostos aos aqui apresentados, pois homens que procuraram as unidades de saúde por algum problema já instalado, revelaram manter o hábito de fumar e beber, os maus hábitos alimentares, a ausência ou insuficiência de atividades físicas e a pequena procura aos serviços de saúde17.

Pelo fato deste serviço oferecer atividades em grupo para homens que frequentam a unidade, durante a entrevista foi feita uma questão relacionada à inserção desses indivíduos neste tipo de modalidade de assistência.

Ideia Central 4: Participação em atendimentos individual e em grupo.

Discurso do Sujeito Coletivo

Grupo que eu estou participando é a segunda vez. Do resto, eu venho nas consultas individuais. O que está sendo feito, está bom demais. Sempre estou aqui participando do serviço, pois isso resolve adiantando um pouquinho coisas na vida da gente. A nossa vida é uma escola. E aprendendo uns com os outros, propriamente, são horas que viemos até aqui e sentimos confiança mais um no outro. Compartilhar, acompanhar, cuidar da saúde. Acho que agora está na hora de cuidar mesmo da saúde. Não participo de grupo. Tenho realmente a minha vida muito corrida, estou sempre em viagem, vou a uma série de lugares, visito parentes fora de Botucatu. Eu não queria assumir nenhum compromisso pra depois ficar faltando. Além das consultas, não participo de nada. Falta tempo. Trabalho a semana inteira. Só participo de consulta individual. Interesse em participar em grupo até há, o problema é eu conseguir conciliar o horário da empresa com o horário dos grupos daqui (E6, E7, E8, E9, E11, E12, E14, E15, E2, E3, E4, E10, E13).

Nota-se nas falas dos entrevistados que as duas modalidades de assistência são utilizadas e não há uma restrição ao grupo por não se interessarem por esse tipo de atendimento, mas sim, pela falta de tempo e pela dificuldade de conciliar seus compromissos com os horários. A forma de funcionamento desses grupos é baseada em um número específico de reuniões que podem ocorrem semanal ou mensalmente, dependendo dos indivíduos que o compuserem. Já as consultas individuais acabam sendo a estratégia preferida, pois irão ocorrer em um período de tempo mais espaçado, dependendo das demandas desses homens, causando assim menos transtornos principalmente para aqueles que trabalham. Todavia, esta é uma modalidade que é bastante empregada na Atenção Primária, buscando facilitar a compreensão do processo saúde-doença, por meio de orientações.

De acordo com a literatura, o uso de processo educativo deve ser voltado para as necessidades do indivíduo, valorizando seus conhecimentos prévios e estimulando a busca pela compreensão do processo saúde doença. Isto para que o mesmo seja capaz de prevenir as possíveis complicações e fazer um tratamento adequado, participando de forma ativa, neste processo, sendo também responsável pela sua saúde e pelas decisões de mudança de estilo de vida ou não18.

Entende-se que cabe ao profissional da saúde ter a percepção de quando realizar os atendimentos em grupo ou individual, levando em conta a individualidade da demanda e as possibilidades do usuário. Uma forma de facilitar esta participação poderá ser o oferecimento desta modalidade de assistência em horário alternativo, que facilite o acesso desses homens, principalmente pelo fato de terem demonstrado interesse em participar, como observado no DSC 4.

Assim, como neste serviço, estratégias inovadoras de saúde pública com os homens, formadas por uma compreensão do gênero, estão sendo desenvolvidas, permitindo, de maneira bem sucedida e criativa, envolver os homens em atividades de promoção de saúde18.

Ao se comparar os homens jovens com os idosos, estes últimos procuram mais cuidar de sua própria saúde, devido a doenças já instaladas. A promoção e prevenção continuam sendo os principais aspectos da saúde masculina que necessitam ser explorados, devendo ser estimuladas em todas as idades.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A saúde do homem vem ganhando destaque, de forma tímida, mas algumas iniciativas dos órgãos federais têm demonstrado a importância de se estudar e pensar em estratégias que tenham como foco o gênero masculino.

Ao buscar a compreensão de homens frente aos cuidados com sua saúde, este trabalho traz comportamentos um pouco diferentes do esperado em relação aos homens, conforme a literatura apresentada, pois os discursos que emergiram de suas falas refletem indivíduos que usam o serviço de saúde, são assíduos e se preocupam em seguir as recomendações dos profissionais. Traz a prática de hábitos saudáveis, como alimentação adequada com redução de gorduras e aumento da ingestão de verduras, realização de exercícios físicos, comportamentos que contribuem para o controle de doenças crônicas já presentes na vida deles.

Em relação à participação nas atividades de atendimento oferecidas pelo serviço, os participantes referiram que o atendimento individual foi o mais utilizado. Alguns demonstraram disponibilidade e interesse em participar de outras estratégias, como a de grupo. Outros, porém, referiram dificuldades para organizarem seus compromissos de trabalho, visto que atividades em grupos, na opinião deles, tomam mais tempo.

Acredita-se que esse interesse em participar da estratégia em grupo mencionado por eles, deve ser utilizado pelo serviço como uma oportunidade de intensificar uma iniciativa que já está sendo colocada em prática: o atendimento em grupo para homens que procuram o serviço. Este grupo foi criado pela alta demanda de casos novos ocorridos na unidade do estudo, constituída por usuários do gênero masculino que estavam afastados da unidade por abandono do tratamento, por casos novos de indivíduos pertencentes à área ou transferidos de outras áreas de abrangência. Este grupo vem funcionando como um espaço de acolhimento e escuta de problemas de diversas esferas, bem como para reintegrar esses indivíduos junto ao serviço de saúde. A flexibilidade de horários fora dos convencionais poderá aumentar esta participação, visto que esta unidade já oferece alguns atendimentos noturnos, o que não traria grandes dificuldades, principalmente, em relação a recursos humanos e seria um facilitador para incentivar estes indivíduos.

Quanto ao descompasso dos achados com os da literatura, já que, principalmente, as dificuldades que o homem tem em cuidar de sua saúde não apareceram neste grupo, talvez tenha relação com as questões norteadoras da entrevista, devendo esta temática ser mais explorada com outras pesquisas. Outro aspecto que deve ser considerado é o de se fazer uma avaliação da trajetória destes homens dentro desta unidade de saúde, com base nos registros de seus prontuários. Avaliar a participação deles neste grupo já existente, certamente, trará contribuições para as questões da saúde neste gênero.

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