Volume 18, Número 4, Out/Dez - 2014
PESQUISA
Atenção básica à saúde masculina: possibilidades e limites
no atendimento noturno
Sharllene Vanessa Lima Cordeiro
1
Wilma Dias de Fontes
1
Renata Lívia Silva Fonsêca
1
Talita Maia Barboza
1
Camila Abrantes Cordeiro
1
1 Universidade Federal da Paraíba. João Pessoa - PB, Brasil
Recebido em 12/03/2014
Aprovado em 14/07/2014
Autor correspondente:
Sharllene Vanessa Lima Cordeiro
E-mail:
sharllenevanessa@hotmail.com
RESUMO
OBJETIVO:
Analisar as contribuições advindas com a ampliação do horário de funcionamento
das Unidades Básicas de Saúde, para o horário noturno, no que concerne ao
atendimento às necessidades de saúde da clientela masculina.
MÉTODOS:
Estudo exploratório, com abordagem qualitativa, realizado com oito enfermeiros
atuantes em Unidades Básicas de Saúde que possuem atendimento noturno no Município
de João Pessoa/PB. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevista
semiestruturada e as falas submetidas à análise de conteúdo.
RESULTADOS:
Emergiram quatro categorias: Estratégias adotadas para ampliar o atendimento nas
Unidades Básicas de Saúde; Quantitativo de atendimento noturno da população
masculina; Campos de atendimento as demandas de saúde masculina; Dificuldades
vivenciadas no atendimento noturno.
CONCLUSÃO:
Os achados revelam eficácia desta estratégia de atendimento à saúde da clientela
masculina, sobretudo aos usuários trabalhadores.
Palavras-chave: Enfermagem; Masculinidade; Saúde do Homem; Enfermagem de Atenção Primária; Enfermagem em Saúde Pública.
INTRODUÇÃO
Na literatura específica, quando se busca refletir acerca da temática "homem e saúde", algumas considerações fundamentais destacam-se, em geral, os homens padecem mais de condições severas e crônicas de saúde do que as mulheres e também morrem mais do que elas pelas principais causas de morte1.
De acordo com o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do Ministério da Saúde, em 2007, a cada três pessoas que morreram no Brasil com idades entre 20 e 59 anos, duas eram homens. Se analisarmos os óbitos de brasileiros entre 20 e 30 anos, tal proporção sobe para quatro em cada cinco mortes. De acordo com o sistema, de todos os óbitos que ocorreram no país, os homens correspondem a quase 60% e as principais causas de morte da população masculina são as doenças do aparelho circulatório, as causas externas, como homicídios e acidentes, e as neoplasias, respectivamente2.
Entretanto, apesar das taxas masculinas assumirem um peso significativo nos perfis de morbimortalidade, observa-se que os homens reprimem suas necessidades de saúde buscando menos os serviços de saúde que as mulheres e, quando o fazem é na atenção hospitalar de média e alta complexidade3.
A busca pelos serviços de saúde, quando existe, está atrelada a um quadro clínico de morbidade já cronificado com repercussões biopsicossociais para sua qualidade de vida, além de onerar, significativamente, o SUS4.
Nessa perspectiva, o Ministério da Saúde apresentou em 2008 a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), a qual tem como objetivo promover ações de saúde que colaborem, significativamente, para a compreensão da realidade singular masculina nos seus diversos contextos, possibilitando o aumento da expectativa da vida e a redução dos índices de morbimortalidade nesta população5.
Assim, vários estudos vêm discutindo a questão da saúde masculina, buscando compreender as diferentes motivações que levam os homens a não procurarem por estes serviços. Neste contexto, a pouca presença do homem nos serviços de atenção primária à saúde, leva a muitas suposições e/ou justificativas, afirmando que há barreiras socioculturais e institucionais5.
A dimensão sociocultural está relacionada à estrutura de identidade de gênero, na medida em que o homem é estimulado a manifestar-se como forte, viril e invulnerável, procurar o serviço de saúde, numa perspectiva preventiva, poderia associá-lo à fraqueza, medo e insegurança, o que implicaria em aproximá-lo das representações do universo feminino1.
O reconhecimento das questões de gênero envolvendo o acesso dos homens aos serviços de saúde requer estratégias inclusivas dos serviços de saúde junto ao grupo populacional masculino adulto.
No âmbito institucional as dificuldades relacionam-se, principalmente, aos aspectos de organização geral dos serviços, como o horário de funcionamento das unidades básicas de saúde (UBS). Este é um forte fator impeditivo, pois a imensa maioria das unidades funciona somente em horário comercial, impossibilitando o uso por parte dos homens, particularmente trabalhadores, devido à incompatibilidade entre o horário de funcionamento da unidade e o de seu trabalho6.
Desse modo, observa-se que os homens necessitam de políticas de atenção à saúde mais significativas e específicas para o reconhecimento de suas condições socioculturais7.
Poucas são as unidades de saúde que disponibilizam atendimento ampliado, aos fins de semana ou em um terceiro turno, à noite. Sendo assim, a clientela masculina que está trabalhando no mercado formal, com horários rígidos de expediente, não pode se ausentar, pois isso comprometeria a sua estabilidade no emprego. O receio em ser penalizado no trabalho por se ausentar para consulta médica, mesmo que o médico conceda atestado para tal, é um dos motivos que afasta os homens desses serviços8. Isso faz com que a busca pelos serviços de saúde acabe ficando em segundo plano.
Dessa forma, percebe-se o quanto a população masculina não está sendo incorporada como uma prioridade nas ações primárias à saúde, pois não se consegue visualizar estratégias que abordem, especificamente, as particularidades do cuidado ao homem. Tal problemática acaba dificultando a promoção de medidas preventivas à saúde masculina, o que implica numa exposição maior a situações de risco, as quais tendem a provocar agravos e doenças, aumentando assim as taxas de morbimortalidade por causas preveníveis e evitáveis.
Torna-se necessário verificar se os horários de atendimento das UBS influenciam diretamente na busca dos homens por estes serviços, objetivando, assim, a formação de dados que possam servir de meios para a elaboração de estratégias que contemplem as diferentes necessidades de saúde dos homens, de modo a facilitar e ampliar o acesso da população masculina aos serviços de saúde.
Diante do exposto, surge o seguinte questionamento: os usuários do sexo masculino têm buscado as unidades básicas de saúde que realizam atendimento no período noturno, visando atender as suas necessidades de saúde?
Neste sentido, o estudo tem como objetivos: avaliar as estratégias adotadas pelas UBS na ampliação do atendimento aos homens; verificar a frequência deste grupo populacional ao serviço durante o horário noturno; evidenciar as demandas mais frequentes de saúde do homem atendidas nas UBS; e averiguar as possibilidades e limites da assistência de enfermagem no atendimento à clientela masculina durante o período noturno.
MÉTODOS
Trata-se de uma pesquisa exploratória, com abordagem qualitativa, realizada nas Unidades Básicas de Saúde, localizadas no Município de João Pessoa - PB, que possuem horário de atendimento noturno.
A população selecionada para o estudo foi constituída pela equipe de enfermeiros atuantes no local da pesquisa, perfazendo um total de dez enfermeiros. A amostra ocorreu por acessibilidade e para tal, a inclusão dos enfermeiros na amostra ocorreu voluntariamente e foi reafirmada por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecida, resultando um quantitativo de oito enfermeiros.
A coleta de dados foi realizada durante os meses de fevereiro/março de 2013, sendo efetivada por meio da entrevista individual, guiada por um roteiro semiestruturado, contendo os dados de caracterização dos sujeitos, bem como os dados relacionados à problemática do estudo. As perguntas de corte utilizadas no estudo foram: Há alguma estratégia adotada pela unidade para ampliar o atendimento a clientela masculina? Em média, quantos homens procuram essa unidade diariamente? Quais as demandas de saúde do homem mais frequentes atendidas por esta unidade? Quais as dificuldades vivenciadas no atendimento a essa clientela durante o período noturno?
Os dados foram analisados de modo qualitativo, utilizando-se o método de análise de conteúdo apresentado por Bardin9, que envolve três etapas: pré-análise, exploração do material e análise e exploração dos dados.
Visando resguardar o anonimato das falas, cada participante foi identificado com a letra E, de enfermeiro, seguido de um número correspondente a sequência do entrevistado, sendo E1 o primeiro enfermeiro entrevistado e, assim por diante, até o enfermeiro E8.
O desenvolvimento do estudo atendeu as normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos previstas na Resolução 196/96, visando assegurar os direitos e deveres que dizem respeito à comunidade científica, aos sujeitos das pesquisas e ao Estado. A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da UFPB, sob o protocolo de nº 027/13, com número CAAE: 11140412.2.0000.5188.
RESULTADOS
Na busca de compreender as possibilidades e os limites vivenciados pelos enfermeiros da assistência de enfermagem na atenção primária em saúde no contexto do atendimento noturno à clientela masculina, optou-se por apresentar os resultados deste estudo a partir de dois enfoques: caracterização dos sujeitos investigados e os aspectos relacionados à problemática específica do estudo.
Compuseram a amostra do estudo, oito enfermeiras. Isso reafirma a feminilização que caracteriza ainda nos dias atuais, a profissão da Enfermagem e, ao mesmo tempo, a absorção desse corpo feminino na atenção primária. Estes aspectos merecem destaque quando nos referimos à assistência à saúde do homem, haja vista que isto tem representado um fator que contribui para a baixa procura masculina pelas UBS.
Quanto à idade, constatou-se que a amplitude etária variou dos 24 aos 56, com média de idade de 32 anos. Desse modo, considerou-se a referida amostra como um grupo de pessoas heterogêneas em relação a idade, uma vez que englobaram adultos jovens e maduros. Pode-se afirmar, assim, que se trata de profissionais que estão em fase produtiva, em geral, ávidos às capacitações na área de saúde do homem; fato este importante para o alcance da implementação da PNAISH, cujo planejamento é aspecto valorizado amplamente no plano de ação desta Política.
No tocante ao tempo de atuação na área da Enfermagem, constatou-se que os profissionais possuem uma média de 11 anos de experiência. Ao serem indagados se receberam alguma capacitação acerca da implantação da PNAISH, todos os sujeitos da pesquisa negaram, reafirmando, assim, a necessidade de qualificação específica para o cuidado à saúde do homem no âmbito da atenção básica, haja vista que a maioria dos entrevistados da pesquisa afirmou não sentir-se preparada para o atendimento das necessidades de saúde específicas desta clientela.
Quanto aos aspectos relacionados à problemática do estudo - possibilidades e limites na assistência de enfermagem, na atenção primária, em saúde, à clientela masculina no período noturno -, a análise das unidades temáticas oriundas dos relatos dos enfermeiros participantes da pesquisa, revelou um conjunto de quatro categorias e sete subcategorias, as quais foram discutidas com base na literatura pertinente e se encontram apresentadas a seguir:
Estratégias adotadas para ampliar o atendimento à clientela masculina nas UBS
Subcategoria: Ausência de Estratégias
[...] não há nenhuma estratégia realizada pela unidade [...] (E1, E2, E7, E8).
Subcategoria: Adoção de Estratégias de Educação Em Saúde
[...] sim, a gente faz acolhimento, tem panfletagem [...] (E3, E5).
[...] tem a educação em saúde [...] palestras, campanhas, folhetos [...] (E4).
[...] É mais no boca a boca mesmo [...] a gente também faz palestras antes de começar o atendimento [...] (E6).
Observou-se, através dos relatos das participantes da pesquisa, que as práticas de educação em saúde desses profissionais são nulas ou restritas, em virtude do déficit de estratégias que estimulem o acesso dos homens aos serviços de saúde, aspecto esse que contribui de modo significativo para a ocorrência da pouca presença dessa população nesse cenário.
Sendo a atenção básica, lócus que constitui a porta de entrada do sistema de saúde, faz-se necessário desenvolver ações que estimulem a inserção da população masculina, visando o acesso às medidas de promoção da saúde e prevenção de agravos.
É oportuno destacar que materiais educativos impressos como folhetos, panfletos e cartilhas são valiosos instrumentos no campo da educação em saúde, pelo caráter informativo dos mesmos. Porém, não podemos tomar como certo e linear a suposição de que esses meios de informação são satisfatórios, uma vez que alógica desta educação é passiva, pautada apenas na transmissão de uma mensagem, que pode ser absorvida ou não.
Em contrapartida, as práticas educativas dialogadas, como o acolhimento e a realização de palestras e campanhas educativas, valorizam as trocas interpessoais de conhecimento, uma vez que proporcionam a interação da comunidade com os serviços de saúde, através da realização dialógica estabelecida entre ambos, capaz de mobilizar força e motivá-los para um processo de mudança.
Considera-se essencial que, além dos aspectos educacionais, entre outras ações, os serviços públicos de saúde sejam organizados de modo a acolher e fazer com que o homem sinta-se parte integrante deles.
Quantitativo de atendimento noturno da população masculina nas UBS
Subcategoria: Quantitativo Inexpressivo
[...] a média é de 6 ou 7 homens, depende do dia [...] (E6, E7).
Subcategoria: Quantitativo Expressivo
[...] para a enfermagem vêm entre 10 e 15 homens [...] (E1, E2, E5).
[...] uns 12 homens em média [...] (E3, E4).
Vale salientar, na definição dessa subcategoria, considerou-se no estudo quantitativo inexpressivo a quantidade menor ou igual a dez homens atendidos, diariamente, no período noturno, e quantitativo expressivo a quantidade superior a dez homens atendidos.
Os dados revelam que há uma quantidade de homens expressiva, de acordo com este estudo, atendidos pelas unidades básicas de saúde. Essa concentração de homens, nesse horário, aponta para uma potencial eficácia dessa estratégia para o atendimento, sobretudo aos usuários trabalhadores e contribui para uma maior adesão masculina nas ações preventivas.
Ressalta-se, contudo, que o atendimento nas unidades básicas de saúde, embora abranja uma quantidade expressiva de homens, não se restringe somente a estes, uma vez que as mulheres trabalham em condições semelhantes e também fazem uso deste serviço.
Campos de atendimento às demandas de saúde masculina
Subcategoria: Doenças Crônico-Degenerativas
[...] eles vêm muito para o hiperdia [...] (E1, E8).
[...] para o acompanhamento de hipertensão arterial [...] (E2, E4).
Subcategoria: Medidas de Prevenção de Agravos
[...] imunização, porque o trabalho exige [...] (E5).
Diante do exposto, as principais demandas de saúde dos homens estão relacionadas às doenças crônico-degenerativas e às imunizações.
Todo esse quadro situacional reiterou que as demandas masculinas estão inseridas em programas, originalmente, já instituídos na atenção básica, voltados para outros seguimentos populacionais, como o Hiperdia, onde idosos e mulheres participam mais frequentemente.
Neste contexto, destaca-se que embora a população masculina tenha necessidades específicas, a PNAISH tem como característica o aspecto inclusivo, ou seja, à medida que os homens acessam a atenção primária, devem utilizar os serviços ali disponíveis e, caso suas necessidades exijam serviços mais especializados, deverão ser encaminhados aos serviços de referência.
No tocante aos usuários trabalhadores, chamou atenção o relato de um enfermeiro em relação à questão das imunizações, uma vez que se percebe que os locais de trabalho destes homens têm estimulado a ida do trabalhador às unidades de saúde.
Desse modo, percebe-se que é indispensável uma maior atuação desses profissionais em ações que possam ir além da simples vacinação, buscando esclarecer dúvidas e incentivar a população masculina para as questões do autocuidado, bem como estimular uma maior participação dessa clientela nessas unidades.
Dificuldades vivenciadas no atendimento noturno
Subcategoria: Aspectos Culturais da Masculinidade
[...] a resistência deles em se abrir para uma profissional do sexo feminino [...] (E3).
[...] eles tem vergonha em se expor pra gente [...] (E2).
Nas falas das participantes do estudo, foi destacado um sentimento de vergonha e uma postura de resistência em relatar seus problemas e receios. Uma vez que o estabelecimento de uma relação de confiança entre o profissional de saúde e o usuário perpassa por uma comunicação terapêutica eficaz, observa-se a necessidade premente de instrumentalização dos profissionais de saúde na perspectiva de buscar ultrapassar, durante a assistência e relacionamento com a população masculina, as barreiras culturais e estereótipos de gênero, enraizados no saber popular, os quais produzem práticas impeditivas no cuidado e no acesso desta clientela nos serviços de atenção primária à saúde.
Subcategoria: Déficit em Recursos Materiais
[...] falta materiais na unidade, às vezes eu mesma compro [...] (E6).
Percebe-se, então, que os estereótipos de gênero masculino enraizados há séculos em nossa sociedade patriarcal ainda é um desafio para a concretização da PNAISH. Assim, é urgente a necessidade de instrumentalização dos enfermeiros para lidar com as especificidades desta clientela.
DISCUSSÃO
As dificuldades de acesso dos homens ao serviço, não são apenas pelas percepções no que seria próprio de seu comportamento, mas também de situações que provocam nos homens a sensação de não pertencimento àquele espaço, por ser frequentado, principalmente, por mulheres e composto por uma equipe de profissionais formada, em sua maioria por mulheres3.
Ressalta-se que a caracterização dos serviços como um espaço feminilizado apresenta uma denotação negativa, que precisa ser repensada ou pode ser explorada e potencializada para uma postura mais acolhedora e inclusiva no cuidado integral do homem, considerando suas necessidades de saúde. É válido destacar que a solução desta problemática não está, exclusivamente, em aumentar os números de profissionais de saúde do sexo masculino, mas em reconstruir as atitudes desses profissionais, independente de sexo, frente à atenção às demandas de saúde do homem.
No tocante a capacitação dos profissionais, percebe-se que os mesmos não adquiriram na sua formação acadêmica instrumentalização acerca da implatação da PNAISH para o cuidado da clientela masculina, uma vez que o Plano de Ação Nacional (2009-2011) da política em foco prioriza em seu Eixo II - Elaborar estratégias que visem aumentar a demanda dos homens aos serviços de saúde; e no Eixo 6 - Qualificação dos profissionais da saúde - a necessidade de instrumentalizar os profissionais da área para a atenção à clientela masculina5.
Nesse contexto, a capacitação contínua dos profissionais da Enfermagem atuantes na atenção básica, é de responsabilidade das instituições de saúde, com o objetivo de promover a atualização de conceitos e a disponibilização de recursos aos enfermeiros, para estes lidarem com as questões sociais e técnicas inerentes a essa nova dinâmica de trabalho10.
É oportuno destacar que a construção e a divulgação recente da PNAISH influenciam, diretamente, na experiência profissional no contexto da atenção à saúde do homem, mas não exime, nem profissionais nem gestores, do compromisso social frente aos déficits que caracterizam o quadro de morbimortalidade masculina. Desse modo, a formação dos profissionais deve compreender a saúde dentro do perfil epidemiológico, considerando cada grupo populacional singularmente11.
No tocante as estratégias utilizadas pelos enfermeiros para ampliarem a demanda de homens nas unidades básicas, constata-se que, além destas serem limitadas, não consideram as especificidades e singularidades masculinas. Isto é, não são identificadas estruturas formais de reconhecimento das necessidades sociais e de saúde do homem, diferentemente dos segmentos materno-infantil e dos programas criados para doenças crônicas, como o hiperdia12.
Desse modo, os serviços de saúde têm uma deficiência em absorver a demanda apresentadas pelos homens, proporcionada pela organização dos serviços que não estimula o acesso destes e, pelo fato, das próprias campanhas de saúde pública não se voltarem para o segmento dessa população1.
Percebe-se, ainda, que há uma maior presença de homens a procura do serviço nas unidades que possuem novos horários criados, assim, como em outros serviços que mantêm atividades em funcionamento no horário de almoço. Isso se aplica, especialmente, para homens aparentando terem saído de seus trabalhos, o que endossa a discussão acerca do trabalho como aspecto que restringe o acesso e o uso dos serviços pelos homens12.
No que se refere às demandas de saúde masculinas, constata-se que algumas instituições de trabalho estimulam e/ou exigem a vacinação, abrindo espaço para que profissionais de saúde orientem os empregados a respeito das atividades e os convidem ao serviço. Em consequência, tem sido constante a presença de homens buscando as salas de vacina12.
Nesse sentido, as proposições apresentadas na PNAISH afirmam que a implementação da política, que tem caráter inclusivo, deverá ocorrer de forma integrada às demais políticas existentes na atenção básica, de forma integral e equânime5.
Quanto às dificuldades vivenciadas pelos homens frente aos cuidados prestados por profissionais do sexo feminino, caracteriza sua justificativa de autonegligência quanto à procura pelos serviços de saúde1. A Enfermagem deve ajudar para reverter a autonegligência masculina nos serviços de saúde, considerando necessário o aprofundamento, deste profissional, sobre as questões de gênero13.
No entanto, é oportuno destacar que a situação de culpabilização pelos cuidados de saúde não pode ser atribuído de modo unilateral aos homens, haja vista que as políticas públicas voltadas para a saúde coletiva, por muito tempo não atentou para as necessidades de saúde dessa clientela. Disto resultou um descompasso entre as demandas de saúde desse grupo populacional, os serviços de atenção primária à saúde e os serviços especializados.
Desse modo, as ações da Atenção Primária à Saúde devem ser voltadas para as reais necessidades da população, para que haja o reconhecimento desse espaço institucional como local de pertencimento e que suas ações sejam capazes de promover, com bases dialógicas, a identificação e minimização/resolutividade das demandas de saúde do homem, haja vista que num mundo contemporâneo a construção de um relacionamento horizontal entre os profissionais e a clientela tem sido uma exigência fundamental14.
Conhecer e entender o perfil masculino influenciará na conduta dos profissionais da enfermagem, visto que possibilitarão ações de saúde mais específicas e eficazes. Essa evolução no atendimento acabará por promover mudanças na postura desta população comumente considerada invisível15.
CONCLUSÃO
Os resultados deste estudo mostraram que a ampliação do horário de funcionamento nas UBS, também para o período noturno, aponta para uma potencial eficácia da estratégia de se criar horários alternativos para o atendimento à clientela masculina, sobretudo aos usuários trabalhadores. Contudo, percebe-se que existem fragilidades que necessitam ser superadas.
Entre elas, as unidades de atenção primárias à saúde são consideradas pouco aptas em absorver a demanda apresentada pelos homens, pois sua organização não estimula a inserção desta clientela, uma vez que próprias estratégias de saúde pública não se voltam para este segmento.
Além disso, observou-se entre os profissionais de saúde das UBS o déficit de instrumentalização profissional, no contexto da saúde do homem, para a garantia de uma assistência qualificada quanto ao atendimento de suas necessidades de saúde.
REFERÊNCIAS