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Volume 4, Número 1, Jan/Abr - 2000

OPNIÃO

 

A prática da enfermagem em pediatria: reflexões na virada do milênio

 

 

Isabel Cristina dos Santos Oliveira

Doutora em Enfermagem. Professora Adjunta do Departamento de Enfermagem Médico-Cirúrgica da EEAN-UFRJ

 

 

Considerando que o século xx foi marcado por grandes transformações em diferentes áreas do conhecimento no cerne da sociedade, acredito como enfermeira pediatra e docente por mais de 20 anos que a assistência à criança em diferentes cenários passou por uma série de mudanças importantes e, muitas vezes, necessárias em função dos determinantes histórico-sociais, econômicos e políticos do país.

Assim, o início do século xx caracterizou-se por um período de transição quanto à assistência à criança, deixando de ser, predominantemente, uma assistência social e filantrópica em favor de uma assistência à saúde com subvenção particular e/ou pública.

Com a institucionalização da enfermagem moderna nos moldes do sistema nightingale na década de 20, as enfermeiras atuavam nos consultórios de higiene infantil, orientando as mães quanto aos cuidados com a gestação, parto, pós-parto, puerpério e, também, com os seus filhos, além das visitas domiciliares às famílias, como uma das ações do Serviço de Higiene Infantil do Departamento Nacional de Saúde Pública (DNSP).

Apesar da predominância das ações preventivas nos anos 30, o cuidado à criança era influenciado pelo modelo curativo advindo do movimento trabalhista, que resultou numa medicina previdenciária. Entre as décadas de 30 e 50, constata-se a criação de hospitais especializados no atendimento à criança no âmbito federal e estadual. Alguns são referências no atendimento à criança até os dias atuais, como o Instituto Fernandes Figueira e o Hospital Municipal Jesus, localizados no Rio de Janeiro.

Diante da criação dos hospitais pediátricos e de enfermarias de pediatria em hospitais gerais, a enfermagem encontrava-se na premência de se desenvolver na área de pediatria para acompanhar as especialidades médicas nesse campo. Esta nova necessidade era suprida através da experiência prática, pois somente nos anos 70 ocorreu o treinamento específico através do surgimento de cursos de especialização em enfermagem pediátrica

Nos anos 50, com a posição central do hospital na prestação de saúde, concentrando diversas especialidades, e apoiado na maior utilização de medicamentos e emprêgo mais intensivo de equipamentos, alguns fatores interferem diretamente na assistência à criança, dentre eles, os procedimentos invasivos, as cirurgias de grande porte e a presença da mãe ou responsável na unidade de internação.

Esse último aspecto constitui-se numa questão polêmica até o fim dos anos 60 e ao longo dos anos subsequentes, quando os pais foram sendo aceitos gradativamente. Somente nos anos 90, o Estatuto da Criança e do Adolescente preconizou a permanência em tempo integral de um dos pais ou responsável, contudo as repercussões dessa lei ainda necessitam ser estudadas, tendo em vista uma nova atitude por parte da equipe de saúde, em destaque a de enfermagem, e também as condições fisicas e recursos humanos e financeiros dos hospitais brasileiros.

Com a implantação da ditadura no pais na metade dos anos 60, ocorreram reformas administrativas em diferentes setores. Na saúde, inúmeros órgãos foram desativados, inclusive o Departamento Nacional da Criança (DNCr), que foi criado em 1940 e extinto em 1969. Esse Departamento foi uma conquista para o atendimento exclusivo das crianças, entretanto, sua existência, durante 29 anos, foi principalmente de caráter normativo quanto às ações preventivas, com pouca ou nenhuma influência no âmbito hospitalar. Com a extinção do DNCr, o atendimento à criança foi atribuido à Coordenação Materno-Infantil do Ministério da Saúde (atual Divisão Nacional de Saúde Materno-Infantil).

Devido à crescente importação de equipamentos nos anos 70 , tornou-se mais constante a utilização de incubadoras e respiradores, dentre outros, tanto nas enfermarias quanto nas Unidades de Cuidados Intensivos. Com isto, as enfermarias passaram a sistematizar a assistência prestada pela equipe de enfermagem, ou seja, a aquisição dos conhecimentos teórico-práticos acerca dos equipamentos ocorreu a partir da prática adquirida durante a assistência à criança dependente dos equipamentos. Esse fato é relevante na medida que, no final da década de 60 e inicio dos anos 70, foram organizadas as primeiras Unidades de Tratamento Intensivo.

Em 1984, durante o período de democratização do pais, os problemas políticos, econômicos e sociais foram discutidos. Nesse contexto, o Ministério da Saúde traça diretrizes voltadas para os grupos mais vulneráveis, de acordo com a Declaração de Alma-Ata, elaborado em1978, instituindo o Programa de Assistência Integral à Saúde da Criança (PAISC), com cinco ações básicas: acompanhamento do crescimento e desenvolvimento, aleitamento materno e orientação ao desmame, controle de infecções respiratórias agudas, controle de doenças preveníveis por imunizações e controle de doenças diarréicas. A participação efetiva da enfermagem junto à população infantil ocorreu através da atuação em serviços de diferentes regiões do país, desenvolvendo como atividade prioritária a consulta de enfermagem, principalmente até cinco anos de idade, entre outras.

Nos anos 90, os avanços tecnológicos influenciaram fortemente no processo de diagnostico e terapêutico, contribuindo para a maior sobrevida das crianças, especialmente os prematuros e portadores de enfermidades cronico-degenerativas, contudo, na atualidade, é questionável o impacto dessa diversidade de tecnologias na qualidade de vida dessas crianças.

Para compreender a nossa realidade, as enfermeiras necessitam enfrentar os desafios inerentes à profissão e também participarem nas discussões da sociedade dentro do atual momento politico brasileiro.

Vale ressaltar que não tive a pretensão de discutir em profundidade os pontos abordados, pois não era essa a finalidade. Contudo, o texto tem por objetivo apresentar um panorama da prática da enfermagem na assistência à criança no século xx. São apenas reflexões...

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