Volume 10, Número 2, Abr/Jun - 2006
ARTIGOS DE PESQUISA
Perfil do portador de lesão crônica de pele: fundamentando a autopercepção de qualidade de vida
Profile of the carrier of chronic injury of skin: basing the self-perception about quality of life
Perfil del portador de lesión crónica de la piel: fundamentando la autopercepción de calidad de vida
Ana Lucia Pazos Dias; Lolita Dopico da Silva
I Mestre pelo Programa de Mestrado da faculdade de Enfermagem da UERJ, Enfermeira do Ministério da Saúde
IIProfa. Orientadora Doutora do Programa de Mestrado em Enfermagem da FEUERJ, Enfermeira do Ministério da Saúde. E-mail: dopico@ig.com.br
RESUMO
Trata-se de estudo na temática da qualidade de vida dos pacientes com lesões crônicas de pele. O objetivo específico aqui relatado foi analisar o perfil dos portadores de lesões crônicas para fundamentar a sua autopercepção de qualidade de vida. Estudo prospectivo, observacional, com modelo de intervenção e análise quantitativa. Foi aplicado o questionário WHOQOL-bref no período de seis meses a uma população composta de 40 indivíduos que freqüentaram durante seis meses o consultório de enfermagem de um hospital público e mantiveram suas condições nutricionais e cognitivas preservadas. Os resultados mostram que: 75% são clientes acima de 51 anos; 55% são homens, 70% vivem sozinhos, 52,5% têm o primeiro ciclo do ensino fundamental; 67,5% não trabalham e 32,5% não têm qualquer tipo de renda, e 90% possuem TV a cores. Um não possui banheiro em casa, dois não têm geladeira e 4 não têm TV. Conclui-se que o consultório é freqüentado por pessoas com limitações financeiras. Isso reforça a importância de se verificar a autopercepção de qualidade de vida a partir da compreensão dos determinantes socioeconômicos do grupo estudado.
ABSTRACT
This is a study about the quality of life of the patients with chronic injuries of skin. The specific objective was to analyze the profile of the carriers of chronic injuries to base them self-perception about quality of life. Prospective, observational study, with model of intervention and quantitative analysis. The WHOQOL-bref questionnaire was applied in the period of six months to a composed population of 40 individuals that had frequented during six months the doctor's office of nursing of a public hospital and had kept its preserved nutritional and cognitive conditions. The resultsgwere: 75% are customers above 51 years; 55% are men, 70% live alone, 52.5% have the first cycle of basic education; 67.5% do not work and 32.5% do not have any type of income and 90% possess color TV. One does not possess bathroom in the house, two do not have refrigerator and 4 do not have any kind of TV. It was conclude that the doctor's office is frequented by people with financial limitations. That strengthens the importance of to verify the self-perception about quality of life from the understanding of the determinative socioeconomics of the studied group.
RESUMEN
Este es un estudio sobre la calidad de la vida de los pacientes con lesiones crónicas de la piel. El objetivo específico era analizar el perfil de los portadores de lesiones crónicas para basarlas una auto-percepción sobre la calidad de la vida. Estudio anticipado, de observación, con el modelo de la intervención y del análisis cuantitativo. El cuestionario de WHOQOL-bref fue aplicado en el período de seis meses a una población compuesta de 40 individuos que habían frecuentado durante seis meses el consultorio de la enfermera de un hospital público y resguardando sus condiciones alimenticias y cognoscitivas. Los resultados fueron: 75% son clientes sobre 51 años; 55% son hombres, viven solos el 70%, 52.5% tienen el primer ciclo de la educación básica; 67.5% no trabajan y 32.5% no hacen cualquier tipo de renta y 90% poseen TV. Uno no posee baño en casa, dos no tienen refrigerador y 4 no tienen ninguna clase de TV. Se concluye que el consultorio es frecuentado por gente con limitaciones financieras. Eso consolida la importancia de verificar la opinión sobre calidad de vida desde la comprensión de los determinantes socioeconómicos del grupo estudiado.
INTRODUÇÃO
Este artigo refere-se a um dos resultados parciais de uma dissertação de mestrado desenvolvida e aprovada no Programa de Mestrado da Faculdade de Enfermagem da UERJ. Trata-se de um estudo centrado na temática da qualidade de vida dos pacientes com lesões crônicas de pele que são atendidos em um consultório especializado de Enfermagem em um hospital público. Atualmente, as condições crônicas são responsáveis por 60% de todo o ônus financeiro decorrente de doenças do mundo, e, no ano de 2020, 80% da carga de doença dos países em desenvolvimento devem advir de problemas crônicos1. Isso faz pensar na necessidade de modificar as metas assistenciais de todo hospital público que se restringem a tratar o paciente na manifestação aguda de sua doença de forma estanque e não resolutiva. Na verdade, não há disponibilidade suficiente nas Unidades de Saúde para atenção a condições crônicas em especial ao tratamento de feridas crônicas2.
Nesse contexto estão os pacientes portadores de lesões crônicas de pele, e os mesmos acabam tentando soluções próprias, baseadas em cuidados empíricos, muitas vezes por recomendações de amigos ou familiares, ocasionando abordagens terapêuticas inadequadas, insegurança e desgaste à sua saúde. Portanto, ser portador de uma doença crônica sempre afeta a percepção de qualidade de vida.
A expressão qualidade de vida tem sido utilizada com diversos enfoques: na área política como critério de raciocínio, visando identificar as condições de vida populacionais, e, mais consistentemente, na literatura científica, partilhada por cientistas sociais e filósofos, originalmente, onde parece surgir a maioria dos esforços para dimensionar qualidade de vida. Hoje, qualidade de vida é tema de pesquisas imprescindíveis na área da saúde, visto que seus resultados contribuem para aprovar e definir tratamentos e avaliar o custo/ benefício do cuidado prestado. Uma importante organização internacional que desempenha um papel decisivo no incentivo e estudos para a qualidade de vida é a Organização Mundial de Saúde (OMS) que, em 1948, definiu a saúde como um completo estado de bem-estar físico, mental e social, e não somente ausência de enfermidade.
Atualmente, a saúde de uma pessoa avalia-se além de sua capacidade física, levando-se em conta seu contexto social e sua saúde mental. Esta idéia ao longo do tempo evoluiu para o conceito norteador do estudo realizado pelo Grupo de qualidade de vida da OMS que passou a definir qualidade de vida como: a percepção do indivíduo acerca de sua posição na vida, no contexto da cultura e sistemas de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações3:3
Assim, qualidade de vida é um construto que compreende múltiplas dimensões da vida humana. Para o grupo WHOQOL estas dimensões são: a dimensão física, a psicológica, o nível de independência, as relações sociais e o meio ambiente. Neste estudo, optou-se pela dimensão física por entendê-la com sendo, provavelmente, aquela percebida mais significativamente pelos enfermeiros nas unidades hospitalares e também nas pessoas com algum agravo à saúde, já que incorpora qualquer aspecto que pertença ao seu corpo e à sua funcionalidade.
O problema da pesquisa do estudo consistiu em saber qual é a variação que se observa no domínio físico da qualidade de vida de pacientes com lesões crônicas de pele, quando atendidos em um consultório de enfermagem? Essa variação foi avaliada aplicandose aos pacientes portadores de lesões crônicas de pele o questionário do grupo WHOQOL, o "WHOQOL-bref", que consta de 26 questões, sendo duas questões gerais de qualidade de vida, e as demais 24 representam cada uma das 24 facetas que compõem o instrumento original (WHOQOL 100)3-4.
A pesquisa teve vários objetivos específicos, entre eles analisar o perfil dos pacientes portadores de lesão crônica de pele e que freqüentam um consultório de enfermagem de hospital público. O grupo WHOQOL orienta que qualquer pesquisa que envolva a autopercepção de qualidade de vida deve vir precedida do levantamento do perfil dos sujeitos que estão opinando sobre sua qualidade de vida3-4.
METODOLOGIA
Tratou-se de um estudo prospectivo, observacional, com modelo de intervenção e análise de dados quantitativa. A pesquisa foi autorizada em dezembro de 2004 pelo Comitê de ética do próprio hospital. O estudo foi realizado com os pacientes que freqüentam um consultório de enfermagem de lesões de pele de um hospital público geral da rede federal, o Hospital Geral de Bonsucesso, no município do Rio de Janeiro. Consideraram-se população-fonte os pacientes com lesões crônicas de pele acompanhados ambulatorialmente após alta hospitalar. No consultório de enfermagem são atendidos, em média, 25 pacientes por dia, compondo uma agenda de
aproximadamente 140 pacientes com lesões crônicas e com lesões agudas. Selecionaram-se então, para esse estudo, aquelas pessoas com lesões crônicas dentro dos seguintes critérios de inclusão: a) ter lesão crônica de pele - a condição crônica impõe necessidades e co-morbidades que constituem fatores importantes na determinação da qualidade de vida; b) ter um cuidador - como os pacientes apresentam limitações para as suas atividades, a garantia da continuidade do tratamento no domicílio é assegurada com a presença de um cuidador; c) participar de todas as consultas - o seguimento regular das consultas possibilita o gerenciamento do cuidado permitindo, dessa forma, avaliação contínua para identificar as dificuldades individuais, intervindo imediatamente; d) ter cognitivo preservado - para assegurar o entendimento das orientações ministradas e também a compreensão do conteúdo do questionário ministrado; e) assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido - nenhum paciente se negou a assinar - o termo. Os critérios de exclusão foram: apresentar déficit nutricional, hemodinâmico e/ou neurológico e não permanecer com o cuidador. Assim, 40 pacientes constituíram a população do estudo.
Estratégias para Construção dos Dados A pesquisa foi desenvolvida em três etapas. A primeira consistiu na sistematização da consulta e do tratamento de feridas crônicas, o que demandou em torno de sessenta dias. Nesse período foi elaborado um protocolo para o tratamento de lesões crônicas de pele fundamentado em extensa pesquisa bibliográfica. Foi montada a infra-estrutura de um consultório de enfermagem após a Comissão de tratamento de feridas ser instituída por portaria pela direção do hospital. A segunda etapa foi o desenvolvimento das consultas de enfermagem onde se aplicava o mesmo protocolo de tratamento da ferida crônica a todos os 40 pacientes que compunham a população do estudo, e, nesse momento, se identificou o perfil dos sujeitos participantes do estudo. A terceira etapa foi a aplicação do questionário sobre qualidade de vida a esses 40 pacientes de 15 em 15 dias à medida que eles recebiam o atendimento padronizado no ambulatório de enfermagem. Essa última etapa foi realizada em um período de seis meses (dezembro de 2004 a maio de 2005), utilizando como instrumento de coleta de dados o questionário do grupo WHOQOL, o WHOQOL-bref, que consta de 26 questões, sendo duas questões gerais de qualidade de vida, e as demais 24 representam cada uma das 24 facetas que compõe o instrumento original (WHOQOL 100). As respostas para todas as questões do WHOQOL-bref foram obtidas através de uma escala de respostas do tipo Likert com uma escala de intensidade (nada - extremamente), capacidade (nada - completamente), freqüência (nunca - sempre) e avaliação (muito insatisfeito - muito satisfeito; muito ruim - muito bom). Nelas, as palavrasâncoras receberam o código 1 e 5, e as diferentes graduações entre estes dois extremos receberam o código 2, 3 e 4. Procedeu-se, então, a identificação da correlação entre os escores das facetas que compõem o domínio físico através do teste da razão de verossimilhança entre os dados de LIKERT na 1ª aplicação e as subseqüentes, acompanhada de análise exploratória das linhas de dados. Isto é, foi realizada a razão de verossimilhança entre a 1ª e a 2ª aplicação, seguida da razão entre a primeira e as sucessivas aplicações. O tempo transcorrido entre a primeira medida e a oitava foi de aproximadamente 6 meses, e, durante este tempo, cada paciente recebeu, em média, 20 intervenções, isto é, foram submetidos ao tratamento de lesões de pele no consultório de enfermagem em média 20 vezes. A pesquisa foi realizada de acordo com as resoluções do Conselho Nacional de Saúde de números 196 de outubro de 1996 e 251 de agosto de 1997. Os pacientes que participaram do estudo receberam explicação verbal acerca dos procedimentos a serem realizados e foram solicitados a assinar o termo de consentimento livre e esclarecido.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A análise dos resultados do perfil da população é imprescindível nos estudos sobre qualidade de vida e tem por finalidade avaliar e ponderar a consistência dos escores referidos pelos pacientes sobre a sua qualidade de vida, bem como determinar a sua confiabilidade. Desta forma, pode-se aumentar o alcance de compreensão dos resultados com conseqüente validação da pesquisa6-7.
Os dados que compuseram o perfil dos sujeitos foram: idade, sexo, estado conjugal, escolaridade, condição laboral, bens de consumo.
Em relação à idade, constatamos, na Tabela 1, uma população composta de 22 homens e 18 mulheres. Destes, 75% estão acima dos 51 anos, sendo que predominam os homens idosos, e a minoria da população (7,5%) está no grupo etário de 20 a 30 anos e 7,5% entre 31 e 40 anos. Por ser um estudo que foca lesões que via de regra emergem de patologias crônico-degenerativas é coerente o predomínio de idosos. Na relação entre longevidade e qualidade de vida, existem combinações de vários fatores, entre eles doenças biológicas e mentais, controle cognitivo, perdas de papéis ocupacionais e status social, competência social, produtividade, relações formais e informais com familiares e amigos e perdas afetivas. Qualidade de vida nessa idade implica, portanto, no entendimento de determinantes de bem-estar que repousa tanto no campo físico quanto mental, relacionamentos interpessoais, espiritual e material7.
Os dados na Tabela 1 também sugerem que a controvérsia que a literatura levanta de que é maior a susceptibilidade do sexo feminino às doenças crônicas não encontra exemplo disponível neste estudo. Esta discussão baseia-se no fato de que, à medida que a expectativa de vida foi aumentando, aumentaram também as diferenças de idade entre homens e mulheres, de tal forma que, em média, as mulheres vivem cinco anos mais que os homens. 7
Em relação à união estável, observa-se, na Tabela 2, que 70% da população não mantêm nenhum tipo de união estável e que estes são exatamente os que estão acima de 51 anos. Neste sentido, desde 1983, o IBGE 8 já vem revelando uma grande proporção de pessoas idosas que vivem sós. Dentre as muitas questões da terceira idade, uma delas é o sentimento da solidão e exclusão social que se associa até aos cuidados com a saúde, com a higiene pessoal e domiciliar 9. Estes fatores permeiam a qualidade de vida já que se trata de idosos que vivem sozinhos e precisam criar condições que lhes garantam o melhor equilíbrio possível nas condições em que vivem. O suporte familiar que traz o bem-estar social é um importante aspecto da avaliação de qualidade de vida. Representa segurança e apoio para lidar com as mudanças temporárias ou permanentes da idade e da condição crônica.9
A escolaridade da população foi elencada pela importância deste dado no entendimento e prosseguimento das orientações recebidas durante o atendimento no consultório de enfermagem. Neste estudo, o predomínio é de pessoas com o primeiro segmento do ensino fundamental completo (52,5%), seguido do ensino fundamental completo (15%). Há três pessoas que se declararam analfabetas (7,5%), e uma informou ter grau superior incompleto. O fato de encontrar pessoas analfabetas não era esperado, por se tratar de um centro urbano, com planejamento de ações educativas e inúmeras oportunidades de alfabetização. Um déficit na escolaridade pode interferir diretamente na continuidade do cuidado no domicílio e no desenvolvimento da consciência sanitária. Pode também interferir no atendimento às prescrições de enfermagem e na prática do autocuidado, o que se desdobra em indicadores de qualidade de vida.
A condição laboral é demonstrada na Tabela 3. Aqui houve interesse de fazer uma dupla associação. Ao saber se trabalhavam, procurou-se saber em que trabalhavam e se tinham vínculo empregatício. Os que trabalham correspondiam a 37,5%. Entre o grupo que não trabalhava, predominavam os que não tinham nenhum tipo de renda. Entre os que possuíam renda, predominava a renda da aposentadoria por invalidez.
Estas informações podem significar que a população estudada vive com uma grande insegurança financeira e que, por serem idosos ,isso agrava o quadro. Parece que uma característica deste estudo é se referir a uma população idosa de baixo poder aquisitivo. Esta condição pode levar as pessoas a se sujeitarem ao mercado de trabalho informal ou à dependência de parentes, o que sem dúvida provoca desgaste entre as relações familiares. Os custos com o adoecer e com a condição crônica torna ainda mais precárias as condições de vida e saúde da população deste estudo10.
As condições de facilidades domésticas foram analisadas através da posse de bens de consumo duráveis, identificando que alguns itens são habituais na população e apresentadas na Tabela 4. São eles geladeira (95%) e televisão a cores (90%). Outros itens como rádio com CD (55%), máquina de lavar roupas (52,5%) e videocassete (25%) foram menos freqüentes. O automóvel foi o bem que registrou menor freqüência (12,5%) e corrobora a concepção da árdua tarefa de locomoção destas pessoas.
Chama a atenção que quatro pacientes não têm televisão no domicílio. Este eletrodoméstico é uma expressiva alternativa de lazer, informação e conforto para aqueles que não podem sair de seu ambiente cotidiano com freqüência. A TV é sempre uma possibilidade de lazer e distração para as pessoas11.
O padrão de vida e a existência de fontes de lazer dentro de casa são aspectos importantes para um entendimento de qualidade de vida, principalmente para pessoas idosas e/ou com lesões crônicas e que, por conseguinte, possuem dificuldades de locomoção12. Uma moradia adequada, provida de recursos eletrodomésticos básicos e infra-estrutura sanitária pode ser relacionada com satisfação, já que foram atendidas as condições mínimas materiais para se falar em qualidade de vida8.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste perfil populacional, observa-se uma proporção de adultos, idosos e a maioria vivendo sozinhos. A taxa de participação desta população no mercado de trabalho formal é muito pequena, onde também se confirma que, à medida que aumenta a idade, diminui a presença no mercado de trabalho. No entanto, é muito provável que os adultos, inclusive os idosos, estejam em postos de trabalho informais. De qualquer forma o que chama a atenção, segundo a Tabela 3, é que 13 pacientes (32,5%) não possuem renda de qualquer tipo.
Sabe-se que há uma estreita relação entre o estado de saúde, o nível de escolaridade e a participação na força laboral 7-8. Nesta população, os homens têm escolaridade mais alta que as mulheres, e aqueles com mais idade têm uma escolaridade pior do que os mais jovens. O padrão de desigualdade educacional pela idade e sexo com certeza influencia também a presença das pessoas na força laboral, e isso, por sua vez, é relevante para influenciar a percepção de qualidade de vida12.
A idade é um importante determinante de autopercepção e saúde. As chances de os idosos relatarem uma saúde negativa são maiores do que outras faixas etárias13-14 , assim como ser portador de uma lesão crônica já foi referido em outros estudos como um forte influenciador da autopercepção de qualidade de vida principalmente em idosos8.
Segundo estudos já realizados12-13, a variável renda influencia a autopercepção de qualidade de vida. Os idosos com renda mais baixa apresentam uma percepção ruim de qualidade de vida. Por outro lado, uma renda elevada é um indicador robusto de uma boa percepção de qualidade de vida. Alguns autores já mostraram que a percepção de morbidade pode ser maior entre os estratos socioeconômicos menos favorecidos, o que pode estar relacionado, dentre outros aspectos, ao valor atribuído ao corpo, especialmente tendo em vista a necessidade de trabalhar, possivelmente mais premente entre os grupos de menor renda9-12.
Existem evidências também de que a baixa renda dos idosos atua negativamente no comportamento saudável no ambiente domiciliar, no acesso aos serviços de saúde, nos cuidados com a saúde e no acesso aos recursos materiais 10; 15. Há evidências de que os mais pobres possuem baixa adesão aos tratamentos e têm pouco acesso aos medicamentos, o que se reflete nas condições de saúde do indivíduo6-8.
A população aqui estudada tem como condição comum serem portadores de lesões crônicas de pele e referem ter vivido as dificuldades de acesso aos serviços de saúde, convivendo com o sofrimento contínuo provocado pela dor causada pela lesão, assim como com a limitação para deambulação.
Estes aspectos sem dúvida influenciam a participação destes sujeitos na sociedade e quiçá até modifiquem suas aspirações na vida. Talvez todas essas questões juntas provoquem nas pessoas estratégias adaptativas de enfrentamento, cuja lógica e coerência são próprias e inegáveis.11
Os dados revelam que a população deste estudo tem uma condição financeira talvez precária em virtude de não terem atividade laboral e/ou vínculo empregatício e, aparentemente, sem condições de mudanças no estilo de vida e um círculo difícil de ser quebrado, o que sem dúvida pode influenciar a autopercepção de qualidade de vida7.
O enfermeiro, ao identificar as necessidade de sua clientela, reconhecendo as limitações de seus pacientes, poderá agregar ao tratamento da lesão estratégias até individualizadas para promover, além do controle da lesão, o conforto, o alívio, a moderação da dor, tudo isto para ajudar a melhorar a qualidade de vida desta clientela.
A finalidade do atendimento de um consultório de enfermagem em hospital público para pacientes com lesões crônicas de pele não é sua cura terapêutica já que ela não é possível para muitas condições crônicas. No entanto, é possível que as intervenções de enfermagem contribuam para a redução da morbidade, assim como para a diminuição do impacto da doença na qualidade de vida desses indivíduos.
Referências
1. Kaplan R M. Quality of life, resource allocation, and the U.S. Health-care crisis. In: Seidl, EMF; Zannon C M L. Qualidade de vida e saúde aspectos conceituais e metodológicos Cad Saúde Pública. [on line] 2004] [citado 20 abr 2005];20(2):357-61. Disponível em: http://www.scielosp.org.br.
2. Organização Mundial da Saúde-OMS. Cuidados inovadores para Condições Crônicas: Componentes estruturais de Ação: Relatório Mundial / Organização Mundial de Saúde Brasília, [2003]. Disponível em http:www.opas.gov. Acessado em 20 de mai 2003.
3. Fleck MPA, Chachamovich E, Trentini C Aplicação da versão em português do instrumento abreviado de avaliação de qualidade de vida "WHOQOL-Bref". Rev Saúde Pública 2000;34:178-83.
4. Grupo de estudos em qualidade de vida (whoqol-group).Versão em Português dos Instrumentos de Avaliação de qualidade de Vida. [1998]. Disponível em: http://www.ufrgs.br. Acesso em: 30 set 2003.
5. Rouquayrol MZ, Almeida Filho, N. Epidemiologia & Saúde. 6ª ed. Rio de Janeiro (RJ): Medsi; 2003. 728 p.
6. Seidl EMF, Zannon CML. Qualidade de vida e saúde: aspectos conceituais e metodológicos. Cad Saúde Pública 2004;20(2):89-93.
7. Minayo MCS;HartzZMA;Buss P M. Qualidade de vida e saúde: um debate necessário. Rev Ciência e Saúde Coletiva 2000;11(5):17-18.
8. Buss PM, Promoção da saúde e qualidade de vida. Rev Ciência e Saúde Coletiva2000;1(2):145-50.
9. Morgan,G.Assesment of quality of life in palliative care.International J Palliative Nurs2000;6(8):406-10.
10. Yamada B.F.A.Qualidade de vida de pessoas com úlceras venosas crônicas. 2001, 158p. [Dissertação de Mestrado] Escola de Enfermagem/ USP; 2001.
11. Trentini M, Silva DGV, MartinsCR;AntonioMC, Tomaz CE, DuarteR. Qualidade de vida dos indivíduos com doenças cardiovasculares crônicas e diabetes mellitus. Rev Gaúcha Enferm1990;11(2):20-7
12. Cury A.Para mudar uma vida. São Paulo (SP): Academia de Inteligência;2004
13. Paschoal SMP.Autonomia e independência: a velhice e o envelhecimento em visão globalizada. São Paulo (SP): Atheneu; 2002 p. 311-23.
14. Veras RP. País jovem com cabelos brancos: a saúde do idoso no Brasil. Rio de Janeiro (RJ): Relume Dumará/UERJ; 1994.
15. Farias SNP; Zeitoune RCG.A interferência da globalização na qualidade de vida no trabalho: a percepção dos trabalhadores de enfermagem.Esc Anna Nery Rev Enferm2004,8(3):386-92
Recebido em 16/11/2005
Reapresentado em 24/05/2006
Aprovado em 07/06/2006