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CAPES

Volume 7, Número 1, Jan/Abr - 2003

ARTIGOS DE PESQUISA

 

Perfil de enfermeiras que atuam no programa saúde da família em uma microregião do Ceará, Brasil1

 

The profile of nurses who work in the family health program located in microregion of Ceará, Brazil

 

Perfil de las enfermeras que trabajan en el programa salud de la família en una micro región de Ceará, Brasil

 

 

Escolástica Rejane Ferreira MouraI; Maria Socorro Pereira RodriguesII; Raimunda Magalhães da SilvaIII

IEnfermeira. Mestra em Enfermagem. Assessora técnica da Célula de Saúde Reprodutiva e Sexual da Secretaria de Saúde do Ceará
IIEnfermeira. Profª. Adjunta da Universidade Federal do Ceará. Dra. em Filosofia da Enfermagem
IIIProfª. Drª. titular da Universidade de Fortaleza - UNIFOR

 

 


RESUMO

Trata-se de trabalho descritivo com o objetivo de identificar e analisar o perfil de enfermeiras que atuam em uma microrregião de saúde do Ceará, Brasil. Os dados foram coletados através de questionário, de maio a julho de 2001, bem como através da observação livre com registros em diário de campo. Foram entrevistadas 30 enfermeiras que atuam no Programa Saúde da Família dos oito municípios que compõem a microrregião de saúde pesquisada. O estudo identificou que, o perfil das enfermeiras é favorável às propostas do PSF, merecendo que sejam revistas as formas de contratação, as condições de vida nos municípios e maior descentralização dos cursos de especialização, no sentido de reduzir a migração profissional e favorecer o vínculo enfermeiro-comunidade.

Palavras-chave: Enfermeiras. Programa Saúde da Família. Condições de vida. Condições de trabalho.


ABSTRACT

This is a descriptive study that aims to identify and analyse the profile of nurses who work in a health microregion of Cearà ,Brazil. The data were collected through questionaires, from May to July of 2001, as well as free observation with registration in the field diary. 30 nurses who work in the Family Health Program ( PSF), along the 8 counties which form the health microregion researched have been interviewed. The study identified that the profile of these nurses is favorable to the proposals of the Program ( PSF), which demands the conditions of hiring new nurses to be reviewed, conditions of life in the counties and a larger decentralization in the courses of specialization in order to reduce the professional migration and also favor the the link between the nurse and the community.

Keywords: Nurses. Family Health Program. Life Conditions. Work Conditions.


RESUMEN

Se trata de un estudio descriptivo con el objetivo de identificar y analizar el perfil de las enfermeras que trabajan en una micro región de salud de Ceará-Brasil. Los datos fueron recolectados de mayo a julio del 2001, a través de un cuestionario, además de la observación libre registrados en diario de campo. Se entrevistaron 30 enfermeras que actúan en el Programa Salud de la Familia (PSF) de ocho municipios que componen la micro región de salud en estudio. La investigación identificó que el perfil de las enfermeras es favorable a las propuestas del PSF, mereciendo que sean revisadas las formas de contratación, las condiciones de vida en los municipios y que halla mayor descentralización de los cursos de especialización, en el sentido de reducir la migración profesional y favorecer el vínculo enfermero-comunidad.

Palabras clave: Enfermeras. Programa Salud de la Familia. Condiciones de vida. Condiciones de trabajo.


 

 

INTRODUÇÃO

No século passado, o sistema de saúde brasileiro transitou do sanitarismo campanhista para o modelo médico-assistencial privatista, até chegar ao projeto neoliberal, nos anos 80. A dinâmica das políticas de saúde, no mesmo período, deu-se através de crescentes graus de universalização, até consolidar-se na Constituição de 1988, com o princípio do direito de todos e dever do Estado. A Carta Constitucional incorpora as linhas básicas da reforma sanitária, favorecendo o vislumbrar de uma nova lógica de organização dos serviços de saúde (MENDES, 1995). Em 1990, é promulgada a Lei Orgânica da Saúde (Lei 8.080), em que se define como princípios e diretrizes para o sistema de saúde, a universalidade do acesso aos serviços; a integralidade da assistência; a participação da comunidade; a descentralização político-administrativa, com direção única em cada esfera de governo; a ênfase na regionalização e hierarquização da rede de serviços de saúde. Mesmo que esses princípios não tenham, ainda, sido alcançados integralmente, não se pode negar os avanços advindos no processo de consolidação do SUS, destacando-se a descentralização com efetiva municipalização (CEARÁ, 1995). Segundo Mendes (1995), o processo de reforma sanitária no Brasil segue a tendência mundial , embora de maneira lenta. Sua implementação não tem sido tarefa fácil, uma vez que o modelo biomédico de organização do serviço fortemente estabelecido, associado a uma estrutura social excludente e a um modelo econômico concentrador de renda, são as maiores barreiras ao seu pleno estabelecimento.

Considerando, pois, uma série de iniciativas e de movimentos inerentes ao próprio Movimento Sanitário, no sentido de reordenamento do modelo assistencial em saúde e de consolidação do SUS, é que, em 1994, nasce o PSF, destacando seu pioneirismo no município de Quixadá - Ceará, levando os serviços de saúde para mais próximo de onde as pessoas vivem ou trabalham, que sejam resolutivos, oportunos e humanizados (SOUSA, 2000).

O PSF é, pois, uma estratégia para reverter à forma atual de prestação de assistência à saúde, através da incorporação de ações programáticas de uma forma mais abrangente e que incorpore ações intersetoriais como educação, saneamento, meio ambiente etc., promovendo qualidade de vida. O sucesso do PSF depende da garantia de um fluxo adequado dos usuários, de um nível de complexidade a outro, preservando o princípio da integralidade. O funcionamento do PSF é resultante do trabalho em equipe, na busca permanente de comunicação e troca de saber entre profissionais e a população. As atividades são realizadas nas Unidades de Saúde da Família e nos domicílios, tendo como pressuposto uma atuação diferenciada, na medida em que estabelece o vínculo e a co-responsabilidade da equipe pela saúde da comunidade. Trabalha tendo as famílias como aliadas, com definição de prioridades, desenvolvimento de ações individuais e coletivas com vistas à promoção de melhor qualidade de vida, pressupondo o conhecimento da realidade da comunidade (BRASIL, 2000).

Nas diretrizes básicas do PSF, estão estabelecidas as seguintes atribuições ao enfermeiro: discutir, junto à equipe de trabalho e com a comunidade, o conceito de cidadania, enfatizando os direitos de saúde e as bases legais que os legitimam; participar na organização e controle do processo de trabalho da unidade de saúde; desenvolver atividades de prevenção, reabilitação e tratamento e/ou encaminhamento dos indivíduos; capacitar os agentes comunitários de saúde e auxiliares de enfermagem, para o desempenho de suas funções, junto ao serviço de saúde; realizar consultas de enfermagem, para avaliação das condições de saúde individual; tratar da educação sanitária, através dos contatos com os pacientes; executar ações básicas nas áreas de atenção à criança, à mulher, ao trabalhador, no controle de tuberculose, de hanseníase, das doenças crônico-degenerativas e infecto-contagiosas, de vigilância sanitária e epidemiológica (BRASIL, 1997). Estas atividades deverão ser desenvolvidas, pelo enfermeiro, na unidade de saúde, junto à equipe do programa, e/ou na comunidade, apoiando e supervisionando o trabalho dos agentes de saúde, bem como assistindo as pessoas que necessitam de atenção em enfermagem.

Diante do exposto e considerando que a participação do enfermeiro no Sistema de Saúde, no Ceará, faz-se, de maneira crescente, como membro da equipe do PSF, cabendo a este atuar em respeito às diferentes realidades locais, torna-se relevante uma reflexão sobre o perfil do enfermeiro diante deste desafio, o que vem representar o objetivo central deste trabalho.

 

MÉTODO

Trata-se de um estudo quantitativo, de caráter descritivo. Os dados foram levantados na microrregião de Saúde de Baturité, no Ceará, incluindo seus oito municípios: Aratuba, Mulungu, Guaramiranga, Pacoti, Itapiúna, Aracoiaba, Baturité e Capistrano. Participaram da amostra 27 enfermeiras e 03 enfermeiros, ou seja, 93,8% da população de enfermeiros da microrregião pesquisada.

A coleta dos dados foi realizada através de resposta direta dada ao questionário, no período de maio a julho de 2001, permitindo o levantamento de informações a respeito das seguintes variáveis: faixa etária, local de residência, salário, tempo de trabalho no município atual, tempo de graduação, título de pós-graduação e tempo de experiência com o PSF. Ademais, realizou-se observação livre e documentou-se no diário de campo informações relevantes que se passam no contexto social dessas enfermeiras.

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (COMEPE), do Complexo Hospitalar da Universidade Federal do Ceará, na conformidade das normas que regulamentam a pesquisa em seres humanos, Resolução nº.196/96, do Conselho Nacional de Saúde - Ministério da Saúde. O consentimento de participação no estudo foi dado por todos os sujeitos pesquisados, como também foram assegurados aos mesmos, o sigilo e o anonimato.

 

APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Os resultados estão apresentados na forma descritiva, obedecendo à ordem das variáveis levantadas, ou seja, faixa etária, sexo, local de residência, salário, tempo de trabalho no município, tempo de graduação, título de pós-graduação e tempo de experiência com o PSF. Algumas informações mais subjetivas foram oriundas das anotações tomadas pelas autoras no diário de campo.

A faixa etária das enfermeiras pesquisadas variou de 25 anos até mais de 40 anos; foram encontradas 08 (26,7%) enfermeiras, na faixa etária de até 25 anos; 09 (30%), entre os 26 e os 30 anos; 10 (33,3%) entre 31 e 40 anos e apenas 03 (10%) acima dos 40 anos. Analisando esses dados de faixa etária, constatou-se que as enfermeiras que integram o PSF, na MR de Baturité, estão na faixa etária predominante de até 30 anos; 17 (56,7%), e 13 (43,3%), estão na faixa acima dos 30 anos. Esse resultado foi semelhante àquele encontrado por Andrade (1998), no âmbito do Estado, quando afirmou que 53,5% das enfermeiras do PSF tinham menos de 30 anos, resultado esse favorável à causa do PSF, por indicar que os profissionais mais jovens certamente tiveram contato com currículos aperfeiçoados, direcionados para uma atuação não especializada, e sim, mais generalista. Conforme dados registrados no diário de campo, constam nas declarações das enfermeiras que a maioria das colegas jovens das equipes estão provisoriamente no PSF pois pretendem retornar à metrópole para cursar residência ou especialização. Essa constatação é louvável se analisarmos pelo prisma de que o profissional está preocupado com seu aperfeiçoamento. Por outro lado, parece responder por uma boa parte dos motivos da migração profissional que ocorre. Essa questão poderá ser amenizada pela descentralização dos cursos de residência e de especialização, já iniciada no Ceará. Machado (2000) identificou que 58,69% dos enfermeiros que atuavam em PSF, no Brasil, estavam na faixa etária dos 30 aos 49 anos, denotando que a divergência nesse aspecto entre o referido estudo e o nosso deve-se às diferenças regionais, consideradas, portanto, significativas.

Quanto ao sexo, 27(90%) das enfermeiras atuantes na MR de Baturité pertencem ao sexo feminino. Esse dado não foge à caracterização peculiar da enfermagem, composta, quase que exclusivamente, por mulheres. Andrade (1998) e Machado (2000) identificaram esse mesmo perfil, no nível estadual e nacional, respectivamente. Sobre esse assunto, parece que ser enfermeira (fenômeno feminino) faz diferença perante a clientela. Moura (2001) encontrou nessa mesma microrregião de saúde que as gestantes demonstram maior satisfação ao serem atendidas por enfermeiras, justificando o fato de serem mulheres como elas: Ela já teve filho, né? Sabe muito. Elas são mulher igual à gente. Homem não pode entender de mulher como outra mulher. A enfermeira...deixa a gente à vontade.

Sobre o local de residência das enfermeiras, 21(70%) têm moradia no próprio município onde trabalham. Dessas, 10 residem distante de suas famílias e 06 convivem com a família. As que residem longe das famílias, principalmente aquelas que possuem filhos, terminam por enfrentar o conflito de terem que se afastar do convívio familiar por conta do emprego. Para as demais, entretanto, representa satisfação, pelo fato de terem conseguido trabalho, o que faz com que o distanciamento da família seja sublimado. As enfermeiras que residem nos municípios da MR de Baturité, sem as famílias, ficam alojadas em dependências cedidas pelas prefeituras, ou dividem, entre si, o aluguel de imóveis. Alguns municípios oferecem refeições (basicamente o almoço), em outros isso fica por conta da enfermeira. A qualidade das refeições é variável, assim como é variável, também, a opinião das enfermeiras a respeito dessas questões. Em particular, aquelas que demonstram satisfação, depõem valor preponderante ao fato de terem conseguido um emprego e, por isso, relevam questões conseqüentes.

No âmbito estadual, Andrade (1998) detectou que 41,7% das enfermeiras residiam nos municípios e/ou localidades onde trabalhavam, sendo as condições de moradia, em geral, bastante precárias. Ao comparar esses dados com os dados encontrados na MR de Baturité, fica evidente que é elevado o percentual de enfermeiras que optaram por morar nos municípios de sua atuação 21 (70%), em relação à média estadual. Acredita-se que a preferência demonstrada por um bom número de enfermeiras, em residir no município onde trabalham venha a se manter, pois a tendência é de melhoria na infra-estrutura a ser oferecida pelo PSF. Esse fato contribui para que a vinculação profissional-comunidade seja efetiva, confirmam as enfermeiras pesquisadas. Nesse sentido, Andrade (1998) acrescenta que não é exigência do Ministério da Saúde e da Secretaria Estadual da Saúde que os profissionais residam nas localidades, porém ressalta que em Cuba, país que desenvolve com êxito Programa semelhante, se preconiza que os profissionais tenham residência nas comunidades onde atuam, sendo suas moradias construídas como anexos às Unidades Básicas de Saúde. Sobre o assunto, as enfermeiras consideram positiva a opção por residência nos municípios de atuação, entretanto, não se pode desconsiderar a garantia de condições dignas, tanto de moradia, como de alimentação, transporte, segurança etc..

Com relação ao salário mensal dessas profissionais, verificou-se uma variação entre o equivalente a 6,6 e 10 salários mínimos2, predominando a média acima de 08 salários mínimos para 23 (76,7%) das enfermeiras. Já Andrade (1998), em pesquisa realizada nesse ano, concluiu que o salário das enfermeiras, no Ceará, variou entre 3,3 e um pouco mais de 10 salários mínimos, com 52% das enfermeiras perfazendo uma renda mensal superior a 08 salários mínimos. Portanto, a média salarial das enfermeiras da MR de Baturité mostrou-se nivelada com a média do Estado, 08 salários mínimos, porém alcançada por uma percentagem maior de enfermeiras (76,7%). Quanto ao menor salário, enquanto a média no Estado foi de 3,3 salários mínimos, na MR da Baturité mostrou-se duas vezes mais, ou seja, 6,6 salários mínimos. É importante destacar que esta discrepância salarial parece contribuir para a elevada migração das enfermeiras entre os diversos municípios do Ceará, em uma corrida por maiores salários, além de representar, para aquelas que alcançaram um melhor nível salarial, motivação e estímulo para continuar em suas funções, ao contrário da desmotivação que acomete as demais, conforme registros tomados pela pesquisadora no diário de campo.

Sobre o tempo de permanência no município atual, 15 (50%) das enfermeiras afirmaram estar no município há 05 meses ou menos, revelando uma recém contratação a partir do gestor eleito no último pleito municipal. Esse dado indica para uma migração profissional após nova mudança do gestor municipal, em torno da metade das enfermeiras. Outras 11(36,6%) enfermeiras estavam no município entre 01 e 04 anos e 04 (13,4%) estavam ali há 07 anos ou mais. A migração dos profissionais que integram as equipes de PSF representa uma forte ruptura com o vínculo profissional-comunidade, comprometendo a continuidade e a qualidade das ações de enfermagem. Conforme Andrade (1998), a quase totalidade das enfermeiras do PSF, no Ceará, não tem vínculo empregatício com as prefeituras, acarretando freqüentes mudanças de logradouros dessas profissionais, o que afeta a credibilidade da população acerca do programa e das próprias secretarias municipais de saúde, responsáveis por sua implantação e implementação.

Entre as modalidades de contratação sugeridas pelo Ministério da Saúde para as equipes do PSF, destacam-se: convênio com Organizações Não Governamentais (ONGs) ou cooperativas; contrato com empresas, através de licitação; contrato temporário renovável por até 04 anos; cargo efetivo, mediante concurso público; e, ainda, cargo em comissão, estabelecendo vínculo temporário com a administração pública. No Brasil, 43,67% das enfermeiras são incorporadas ao PSF via assinatura de contrato temporário, e 61,17% não possuem garantias jurídicas de direitos trabalhistas (MACHADO, 2000). Essa realidade repercute, certamente, no nível de satisfação de qualquer trabalhador, representando aspecto que necessita ser revisto com a maior brevidade no âmbito nacional, sob pena de comprometer os resultados esperados.

Quanto ao tempo de graduação, 13 (43,7%) das enfermeiras da MR de Baturité tinham entre 01 e 03 anos de graduadas; 14 (46,6%) estavam formadas há 04 ou mais anos, e apenas 03 (10%) tinham menos de 01 ano de graduação. É importante destacar que 17 (56,6%) enfermeiras já haviam cursado especialização em Saúde da Família ou em Saúde Pública, e outras 04 (13,4%) encontravam-se cursando especialização. Mostrou-se elevada a freqüência de enfermeiras, na MR de Baturité, com pós-graduação "lato sensu", principalmente em Saúde da Família, área de conhecimento que emergiu no Ceará a partir de 1994. Esse fato demonstra o compromisso das enfermeiras com a qualidade de seu desempenho profissional, o que é favorável para o alcance de bons resultados e de sua atuação e, conseqüentemente, para os melhores indicadores da saúde das comunidades nas quais atuam. No entanto, em nível estadual, essa realidade é menos satisfatória, principalmente em regiões mais distantes da grande metrópole. Isso acontece porque as enfermeiras, com especialização em Saúde da Família, têm prioridade sobre as demais, para trabalhar nas regionais mais próximas de Fortaleza, como é o caso da MR de Baturité. No âmbito estadual, segundo dados levantados por Andrade (1998), 30,8% dos enfermeiros do PSF têm especialização, predominando as áreas de saúde pública (30,3%), obstetrícia (30,3%) e saúde da família (15,2%). A mesma autora considera preocupante o fato de cerca da metade das enfermeiras que atuam nessa área não ter participado de uma capacitação específica em PSF, porém ressalta que essa situação é menos grave , no Ceará, do que em outras regiões do País, em virtude do trabalho desenvolvido pela Escola de Saúde Pública (ESP). Entretanto, Andrade (1998) reforça a necessidade de uma maior descentralização dos cursos promovidos pela ESP, através da implantação de pólos de capacitação nas diversas regiões do Estado. Segundo Machado (2000), 19,20% das enfermeiras do PSF, no Brasil, têm título de especialização, o que ainda é pouco significativo, face aos encargos inovadores que são delegados aos enfermeiros que ingressam no Programa.

Quanto ao tempo de atuação em PSF, a pesquisa revelou que estão nesse Programa: 18 (60%) enfermeiras, há 01 e 03 anos; 08 (26,7%) há 04 e 07 anos e apenas 04 (13,3%) há menos de 01 ano de atuação na área. Portanto, pode ser considerado elevado o tempo de permanência das enfermeiras no PSF a partir de 01 ano de experiência. Esses achados parecem indicar para uma certa continuidade do profissional no programa, talvez pela própria oferta do mercado de trabalho mostrar-se bem acessível. No entanto, é importante avaliar essa permanência sobre o ponto de vista da identificação, credibilidade e satisfação do profissional com a ideologia do Programa, na perspectiva de trazer melhorias para a qualidade de vida e saúde das populações adstritas. Levanta-se essa discussão, uma vez que, por ocasião da observação livre, identificou-se que a prática do PSF parece estar mantendo o modelo de saúde tradicional, voltado para a doença e tendo a consulta como ação principal.

 

CONCLUSÕES

O estudo demonstrou que o perfil das enfermeiras que atuam no PSF (56,7%) é constituído por jovens de até 30 anos, sendo 90% do sexo feminino. A garantida de condições dignas de moradia, de alimentação, transporte, segurança etc.são favoráveis à adesão das enfermeiras a residirem nos municípios de atuação. Entretanto, estas se sentem fortemente prejudicadas por diferenças salariais e ausência de vínculo empregatício, o que, em parte, responde pela contínua migração profissional (em torno de 50% após o último pleito eleitoral) que precisa ser minimizada. A maioria das enfermeiras possui especialização na área em que atuam (56,6%) e se delineia uma tendência das enfermeiras a se manterem trabalhando no PSF, visto que apenas uma só atuava nessa área há menos de 01 ano.

Diante do exposto constata-se um perfil de enfermeiras que se declara favorável à prática efetiva do PSF, merecendo que sejam revistas às formas de contratação, as condições de vida que lhes são oferecidas nos municípios e uma maior descentralização dos cursos de aperfeiçoamento profissional, a fim de que elas possam usufruir dos mesmos no próprio município onde atuam profissionalmente.

 

REFERÊNCIAS

MENDES, E.V. et al. A conformação da reforma sanitária e a construção da hegemonia do projeto neoliberal. In:____. Distrito sanitário: o processo social de mudança das práticas sanitárias do Sistema Único de Saúde. 3.ed. São Paulo: HUCITEC, 1995. cap. 1, p. 19-89.

CEARÁ. Secretaria da Saúde. Saúde da família: um novo modelo de atenção. Fortaleza: 1995. Mimeografado.

SOUSA, H. M. Programa Saúde da Família: entrevista. In: Revista Brasileira de Enfermagem, Brasília, v.53, n. especial, p. 7-16, dez. 2000.

BRASIL. Ministério da Saúde. Abrindo a porta para a dona saúde entrar. Brasília, 2000. 19 p.

BRASIL. Ministério da Saúde. Programa de Saúde da Família. Brasília, 1997

ANDRADE, F.M.O. O Programa Saúde da Família no Ceará: uma análise de sua estrutura e funcionamento. Fortaleza: [s. n], 1998. 220p.

MACHADO, M. H. (Org.). Perfil dos médicos e enfermeiros do Programa Saúde da Família no Brasil. Relatório final. Brasília: Ministério da Saúde, 2000. 146p.

MOURA, E. R. F. Assistência de enfermagem no pré-natal no contexto do Programa Saúde da Família. 2001. 140p. Dissertação (Mestrado em Enfermagem) - Faculdade de Farmácia, Odontologia, e Enfermagem, Universidade Federal do Ceará, Fortaleza, 2001.

 

NOTAS

1Parte da dissertação de mestrado intitulada "Assistência de enfermagem no pré-natal no contexto do Programa Saúde da Família" ; Programa de Pós-graduação em Enfermagem, UFC. Financiada pela FUNCAP.

2 O salário mínimo vigente no Ceará, no período da pesquisa, correspondia a cento e oitenta reais (R$ 180,00)/mês.

 

 

Recebido em 05/02/2002.
Reapresentado em 06/11/2002.
Aprovado em 09/12/2002.

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