Volume 7, Número 3, Set/Dez - 2003
EDITORIAL
Requisitos uniformes para manuscritos na Escola Anna Nery Revista de Enfermagem: porque, para que e como
Isaura Setenta Porto
Doutora e Professora Adjunta do Departamento de Enfermagem Médico - Cirúrgica, Escola de Enfermagem Anna Nery / UFRJ. Pesquisadora do CNPq. Editora Chefe da Escola Anna Nery Revista de Enfermagem
Em geral, quando periódicos científicos apresentam-se em um novo projeto visando sua classificação e indexação internacionais, seus editoriais limitam-se a uma abordagem conservadora no que concerne aos motivos pelos quais aderiram a essa uniformização. Neste caso, os periódicos não adotam a crítica como foco de suas análises a partir da compreensão de que esse processo também decorre de críticas internacionais aos periódicos brasileiros (Krzyzanowski e Ferreira, 1998). Pensamos que a visão crítica é essencial para uma compreensão mais abrangente da questão, ainda mais em um país cuja língua é de origem latina, diferente da língua do grupo que tomou a iniciativa para o estabelecimento dos requisitos uniformes - o inglês. O movimento contemporâneo pela classificação dos periódicos em todas as áreas de conhecimento existe há muito mais tempo em outros países mais desenvolvidos, notadamente aqueles de língua inglesa, em função do interesse em uniformizar o conteúdo de suas publicações científicas seriadas.
Esses requisitos vêm sendo aperfeiçoados desde 1978, quando foi realizada uma reunião de 12 editores de revistas médicas publicadas em língua inglesa, atualmente conhecido como Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas, com a finalidade de uniformizar diretrizes e exigências técnicas para os originais enviados para publicação (ICMJE, 1997). O que era naquela época para ser apenas um formato técnico para a uniformização de referências bibliográficas ampliou-se até abranger instruções pormenorizadas sobre preparo de originais, detalhes de estrutura de texto, elaboração de tabelas e ilustrações, formato de resumo e palavras - chave, padronização de formatação e tipo de papel, hoje conhecidas pela expressão estilo Vancouver (Blank, 1997), cuja última atualização é de 2003 (ICMJE, 2003).
Na Enfermagem brasileira, o movimento em busca de um reconhecimento internacional para seus periódicos é recente e se traduz basicamente pela busca crescente em atender a esses requisitos estabelecidos e a outros, principalmente aos critérios do SciELO e QUALIS / CAPES, que parecem significar o caminho mais curto para um periódico ser classificado em nível internacional ou ser aceito em bases de dados internacionais.
Neste sentido, a grande ambição dos periódicos nacionais em geral parece ser a indexação em bases de dados internacionais, como, por exemplo, o ISI (Institute for Scientific Information) Essa é uma ambição perfeitamente compreensível frente ao poder de divulgação que esses bancos de dados internacionais possuem, embora a maioria dos periódicos de enfermagem não tenham ainda atingido esse patamar classificatório. Para se ter uma idéia das dificuldades que os periódicos brasileiros enfrentam na busca de reconhecimento internacional, apesar de o ISI considerar-se democrático na aplicação de seus critérios para a seleção de periódicos candidatos à indexação, ele é extremamente parcial e elitista em sua avaliação entre periódicos norte-americanos e latino-americanos, por exemplo (TARGINO e GARCIA, 2000).
Entretanto, reconhecemos que a pretensão de circulação e difusão de um periódico da Enfermagem brasileira em nível internacional passa necessariamente pela adoção da língua inglesa, no seu todo ou em parte.
Essa busca de reconhecimento internacional pelos periódicos faz suscitar uma das possíveis reflexões sobre suas conseqüências para a profissão no Brasil. Entendemos que a adoção da língua inglesa nos periódicos nacionais de Enfermagem é um dos primeiros passos para esse processo de internacionalização. Outros passos encontram-se no atendimento a outros requisitos, tais como: conteúdo editorial; internacionalidade e nível de citação dos autores; freqüência de publicação; pontualidade de periodicidade; observância às condições editoriais internacionais; sistema de avaliação, revisão de pares ou sistema de arbitragem; exatidão e completeza das citações; a abrangência e demanda do periódico (Targino e Garcia, 2000) e ainda as questões da competitividade e do impacto de um periódico (FORATTINI, 1996).
Entretanto, é uma falácia pensar na crença de que um periódico classificado ou indexado internacionalmente tem assegurada de fato sua circulação e difusão internacionais. Ao contrário, somente essa caracterização não assegura essa pretensão. Para isso, também são necessárias outras iniciativas que vão muito além da classificação ou indexação internacional. Essas iniciativas dependem basicamente de uma robusta política do periódico para a sua divulgação internacional e de sua capacidade de captar assinantes e autores internacionais. Assim, essa crença não se sustenta, pois, tomando por exemplo a medicina, são 25.000 revistas no mundo e a grande maioria delas tem apenas alcance local (PROCIANOY, 2003).
O Conselho Deliberativo e a editoria chefe da Escola Anna Nery Revista de Enfermagem entendem que o caminho em busca de reconhecimento internacional de um periódico é longo e árduo. E assim, a Revista começa a aderir ao movimento mais amplo existente na Enfermagem brasileira pela internacionalização de periódicos. Porém, essa é uma adesão prudente desencadeada tanto pelas exigências de avaliação dos programas de pós - graduação em enfermagem existentes no país, como pelo desejo de contentar os nossos dois mais importantes públicos - alvos: autores e leitores.
A prudência adotada fundamenta-se na posição de Forattini (1996) quando ele diz que os periódicos científicos devem perseguir os ditames da competitividade, do impacto e da internacionalidade. Porém, devem evitar o comportamento à semelhança do "novo rico" do saber adquirido, um comportamento radical de comprar lá fora as soluções para os problemas brasileiros. Sem esse radicalismo poderemos atribuir prioridade aos problemas brasileiros, quanto mais não seja para o enriquecimento da cultura nacional, na busca do desenvolvimento de conhecimentos culturais, científicos e técnicos próprios. Por conseqüência, a adesão prudente da Revista em seu processo de internacionalização encontrase iniciada neste número, com suas novas normas para a publicação de manuscritos, cuja aplicação ocorrerá em 2004.
REFERÊNCIAS
BLANK, Danilo. Requisitos uniformes: por que agora e aqui (Comentário). Jornal de Pediatria, v. 73, n. 4, p. 211-212, 1997. Disponível em: http//www.jped.com.br. Acesso em 28 dez. 2003.
FORATTINI, Oswaldo Paulo. A tríade da publicação científica. Revista Saúde Pública, São Paulo, v. 30, n. 1, p. 3-12, fev. 1996.
______. A língua franca da ciência. Revista Saúde Pública, São Paulo, v. 31, n. 1, p. 3-8, fev. 1997.
ICMJE (Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas). Requisitos uniformes para originais submetidos a revistas biomédicas. Jornal de Pediatria, v. 73, n. 4, p. 213-224, 1997. Disponível em: http//www.jped.com.br. Acesso em 28 dez. 2003.
______. Requisitos uniformes para originais submetidos a revistas biomédicas - atualização de 2003. Disponível em: http//www.jped.com.br. Acesso em 28 dez. 2003.
KRZYZANOWSKI, Rosaly Favero; FERREIRA, Maria Cecília Gonzaga. Avaliação de periódicos científicos e técnicos brasileiros. Ciência da Informação, Brasília, v. 27, n. 2, p. 165-175, maio / ago. 1998.
PROCIANOY, Renato S. O Jornal de Pediatria para o mundo (Editorial). Jornal da Pediatria, v. 79, n. 4, p. 475, 2003.
TARGINO, Maria das Graças; GARCIA, Joana Coeli Ribeiro. Ciência brasileira na base de dados do Institute for Scientific Information (ISI). Ciência da Informação, Brasília, v. 29, n. 1, p. 103-117, jan. / abr. 2000.