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Percepção da criança hospitalizada acerca do brinquedo terapêutico instrucional na terapia intravenosaa aRecorte da monografia intitulada “Impacto do brinquedo terapêutico diante da punção venosa em crianças hospitalizadas”, apresentada ao curso de graduação em Enfermagem do Centro Universitário Doutor Leão Sampaio (UNILEÃO), por Hercules Pereira Coelho, sob a orientação da Prof. Ana Paula Ribeiro de Castro, no mês de dezembro de 2019.

Percepción del niño hospitalizado acerca del juguete terapéutico instructivo en la terapia intravenosa

Resumo

Objetivo

analisar a percepção da criança hospitalizada quanto ao uso do brinquedo terapêutico instrucional no preparo para a terapia intravenosa.

Método

estudo descritivo, com abordagem qualitativa, realizado em um hospital pediátrico público no município de Juazeiro do Norte - Ceará, entre os meses de julho a setembro de 2019. Participaram do estudo 31 crianças em idade pré-escolar e escolar. Os dados foram coletados por meio de uma entrevista semiestruturada e, posteriormente, analisados por meio do software IRAMUTEQ.

Resultados

diante da percepção das crianças acerca da terapia intravenosa, foi averiguado que elas compreenderam a técnica a partir da utilização do brinquedo terapêutico instrucional. Quando a criança tem a oportunidade de brincar e dramatizar a terapia intravenosa, por meio do brinquedo terapêutico instrucional, a ansiedade, a dor, a angústia, a solidão, o medo e o choro são atenuados.

Conclusões e implicações para a prática

orientar as crianças quanto à realização da terapia intravenosa favorece sua compreensão quanto aos reais benefícios desta técnica para a sua saúde, possibilitando, ainda, a compreensão do enfermeiro quanto às condições que representam riscos para a criança e intervenha em tempo hábil por meio da utilização de estratégias que favoreçam a recuperação da saúde e a minimização de traumas subsequentes advindos da hospitalização.

Palavras-chave:
Jogos e Brinquedos; Procedimentos Clínicos; Saúde da Criança; Enfermagem Pediátrica; Criança Hospitalizada

Resumen

Objetivo

Analizar la percepción del niño hospitalizado cuanto al uso del juguete terapéutico instructivo en la preparación para la terapia intravenosa.

Método

Estudio descriptivo, con enfoque cualitativo, realizado en un hospital pediátrico público de la ciudad de Juazeiro do Norte - Ceará, entre julio y septiembre de 2019. Participaron 31 niños en edad preescolar y escolar. Los datos se recogieron mediante entrevista semiestructurada, posteriormente analizados con el software IRAMUTEQ.

Resultados

En vista de la percepción de los niños acerca de la terapia intravenosa, se encontró que ellos comprendieron la técnica a partir del uso del juguete terapéutico instructivo. Cuando tienen la oportunidad de jugar y dramatizar la terapia intravenosa, a través del juguete terapéutico instructivo, la ansiedad, el dolor, la angustia, la soledad, el miedo y el llanto son mitigados.

Conclusiones e implicaciones para la práctica

Orientar a los niños sobre la realización de la terapia intravenosa favorece su comprensión sobre los beneficios reales de esta técnica para su salud, permitiendo además que la enfermera comprenda las condiciones que suponen riesgos para el niño e intervenga de forma oportuna, mediante el uso de estrategias que favorezcan la recuperación de la salud y la minimización de traumas posteriores a la hospitalización.

Palabras clave:
Juego e Implementos de Juego; Procedimientos Clínicos; Salud del Niño; Enfermería Pediátrica; Niño Hospitalizado

Abstract

Objective

to analyze the perception of the hospitalized child regarding the use of the instructional therapeutic play in preparation for intravenous therapy.

Method

descriptive study, with a qualitative approach, performed in a public pediatric hospital in the city of Juazeiro do Norte - Ceará, between the months of July and September 2019. A total of 31 pre-school and school children participated in the study. The data were collected through a semi-structured interview, and later analyzed through IRAMUTEQ software.

Results

in view of the children's perception of intravenous therapy, it was found that they understood the technique, from the use of the instructional therapeutic play. When the child has the opportunity to play and dramatize intravenous therapy, through the instructional therapeutic play, the anxiety, the pain, the anguish, the loneliness, the fear and the crying are mitigated.

Conclusion and implications for practice

Orienting children in the performance of intravenous therapy favors their understanding of the real benefits of this technique for their health, allowing the nurse to understand the conditions that pose risks to the child, and intervene in a timely manner, through the use of strategies that favor the recovery of health and the minimization of subsequent trauma from hospitalization.

Keywords:
Games and Toys; Clinical Procedures; Child Health; Pediatric Nursing; Hospitalized Child

INTRODUÇÃO

A hospitalização é um episódio complexo na vida de qualquer ser humano, sendo ainda mais desafiador para a criança, pois pode se caracterizar como uma experiência traumática, marcada por mudanças físicas e emocionais que advêm, comumente, da mudança de ambiente, imposição de rotinas, exames e procedimentos.11 Aranha BF, Souza MA, Pedroso GER, Maia EBS, Melo LL. Using the instructional therapeutic play during admission of children to hospital: the perception of the family. Rev Gaucha Enferm. 2020;41:e20180413. http://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2020.20180413. PMid:32348422.
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Durante a hospitalização da criança, um dos procedimentos clínicos mais comuns é a Terapia Intravenosa (TIV), que compreende a inserção de cateteres periféricos e/ou centrais, a fixação, a manutenção, a administração de medicamentos por via endovenosa e a remoção.22 Ferreira APA, Cruz RSBLC, Dantas NR, Leite ADA, Oliveira JD, Sampaio KJAJ. Brinquedo terapêutico instrucional no preparo para a terapia intravenosa: percepção da criança pré-escolar hospitalizada. In: Silva MCA, organizador. A Enfermagem Centrada na Investigação Científica 2. Ponta Grossa (RR): Atena Editora; 2020. p. 16. http://dx.doi.org/10.22533/at.ed.1402009033.
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Este procedimento é, de fato, um recurso indispensável para a assistência em saúde diante do tratamento de distúrbios eletrolíticos, perdas sanguíneas, processos infecciosos e outros. No entanto, o emprego da TIV na assistência pediátrica caracteriza-se como um evento estressante, capaz de desencadear, na criança hospitalizada, sentidos de alerta, desconfiança, estresse, medo, ansiedade e dor física.33 Almeida TJC, Miranda JOF, Santos LM, Santana RCB, Camargo CL, Sobrinho CLN. Acessos venosos periféricos em crianças hospitalizadas: um estudo fotográfico. Rev enferm UFPE [on line]. 2016;10(Supl. 2):701-7. http://dx.doi.org/10.5205/reuol.6884-59404-2-SM-1.1002sup201601.
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4 Dantas FA, Nóbrega VM, Pimenta EAG, Collet N. Brinquedo Terapêutico na Administração de Medicação Endovenosa em Crianças: estudo exploratório. Online braz j nurs. 2016;15(3):453-64. http://dx.doi.org/10.17665/1676-4285.20165581.
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-55 Silva ACSS, Silva TPN, Alves DN, Amarante LH, Góes FGB, Goulart MCL. Prática clínica da equipe de enfermagem acerca da terapia intravenosa em Unidade Neonatal e Pediátrica. Rev baiana enferm. 2019;33:e33828. http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v33.33828.
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A despeito dos cuidados assistenciais durante a internação da criança, cabe ao profissional enfermeiro identificar os sinais de alterações físicas e emocionais nela, devido às ações da TIV, e manejá-los. Nesse sentido, o brincar surge como uma ferramenta incrementada para mudar a rotina inerte da internação, haja vista ser capaz de reduzir os traumas na criança, influenciar positivamente sua recuperação física e emocional e favorecer o enfrentamento dela diante de situações atípicas.44 Dantas FA, Nóbrega VM, Pimenta EAG, Collet N. Brinquedo Terapêutico na Administração de Medicação Endovenosa em Crianças: estudo exploratório. Online braz j nurs. 2016;15(3):453-64. http://dx.doi.org/10.17665/1676-4285.20165581.
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,66 Hockenberry MJ, Wilson D. Fundamentos de Enfermagem Pediátrica. 9º ed. Rio de Janeiro (RJ): Elsevier; 2014.,77 Oliveira JD, Miranda MLF, Monteiro MFV, Félix de Almeida VC. Brincar e a criança hospitalizada: visão de enfermeiras. Rev baiana enferm. 2016;30(4):1-8. http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v30i4.16414.
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Neste contexto, o Brinquedo Terapêutico (BT) visa a proporcionar o alívio das tensões e da ansiedade da criança, devendo ser aplicado sempre que ela tenha que lidar com uma situação inoportuna para a sua idade, como, por exemplo, a hospitalização.88 Lemos LMD, Pereira WJ, Andrade JS, Andrade ASA. Vamos cuidar com brinquedos? Rev Bras Enferm. 2010;63(6):950-5. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-71672010000600013. PMid:21308228.
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9 Maia EBS, Ribeiro CA, Borba RIH. Compreendendo a sensibilização do enfermeiro para o uso do brinquedo terapêutico na prática assistencial à criança. Rev Esc Enferm USP. 2011 ago;45(4):839-46. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011000400007. PMid:21876882.
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-1010 Caleffi CCF, Rocha PK, Anders JC, Souza AIJ, Burciaga VB, Serapião LS. Contribuição do brinquedo terapêutico estruturado em um modelo de cuidado de enfermagem para crianças hospitalizadas. Rev Gaúcha Enferm. 2016;37(2):e58131. http://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2016.02.58131. PMid:27253598.
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A utilização da técnica do BT pela equipe de Enfermagem é regulamentada pela Resolução nº 546/2017, do Conselho Federal de Enfermagem (COFEN), a qual afirma que “compete à equipe de enfermagem, que atua na área pediátrica, a utilização da técnica do brinquedo/brinquedo terapêutico, na assistência à criança e família hospitalizadas”, devendo contemplar as etapas do processo de Enfermagem e ser devidamente registrada no prontuário, de maneira clara, legível, concisa, datada e assinada pelo profissional.1111 Resolução n. 546 de 09 de maio de 2017 (BR). Atualiza norma para utilização da técnica do brinquedo/brinquedo terapêutico pela equipe de enfermagem na assistência à criança hospitalizada. Diário Oficial da União [periódico na internet], Brasília (DF), 17 maio 2017 [citado 2019 jul 4]. Disponível em: http://www.cofen.gov.br/wp-content/uploads/2017/05/Resolu%C3%A7%C3%A3o-546-17.pdf
http://www.cofen.gov.br/wp-content/uploa...

O BT pode ser capacitador, dramático e instrucional, sendo o BT Instrucional (BTI) o mais estudado e realizado na prática clínica dos enfermeiros ao redor do mundo. Quando preparadas com o BTI, as crianças têm a oportunidade de lidar com a experiência dolorosa antes de vivenciá-la, o que possibilita que elas se sintam mais tranquilas, confortáveis e seguras diante da realização da TIV.1212 Lemos I, Oliveira J, Gomes E, Silva K, Silva P, Fernandes G. Brinquedo terapêutico no procedimento de punção venosa: estratégia para reduzir alterações comportamentais. Rev Cuid (Bucaramanga). 2016;7(1):1163-70. http://dx.doi.org/10.15649/cuidarte.v7i1.303.
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,1313 Gomes ACDA, Figueiredo Silva ATM, Dos Santos CM, Palermo TADC. Brinquedo terapêutico no alívio da dor em crianças hospitalizadas. Perspectivas Online: Biológicas & Saúde. 2019;9(29):33-42. http://dx.doi.org/10.25242/886892920191717.
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Justifica-se a realização deste estudo pela necessidade de compreender a percepção da criança hospitalizada acerca da utilização do BTI no preparo para a TIV, ação esta que pode proporcionar, às crianças, a tranquilidade, a compreensão e o conhecimento quanto aos procedimentos que serão realizados com elas, bem como pela carência de estudos científicos primários que abordem a compreensão da criança quanto à utilização deste método terapêutico.

Embora o BTI seja tema de estudo na Enfermagem há vários anos, as pesquisas publicadas na literatura científica abordam somente a percepção da criança quanto à utilização do BT e/ou BTI sob uma visão geral e/ou durante a punção venosa, enquanto este estudo tem, como enfoque, a percepção dela quanto ao emprego do BTI na TIV como um todo.

Assim, o objetivo do estudo foi analisar a percepção da criança hospitalizada quanto ao uso do brinquedo terapêutico instrucional no preparo para a terapia intravenosa.

MÉTODO

Estudo descritivo, com abordagem qualitativa, acerca da percepção da criança hospitalizada quanto ao uso do BTI no preparo para a TIV. A pesquisa foi realizada em um hospital pediátrico público municipal de referência para o atendimento infantil no município de Juazeiro do Norte - Ceará, entre os meses de julho a setembro de 2019.

A população do estudo compreendeu as crianças hospitalizadas em idade pré-escolar (três a cinco anos) e escolar (seis a 12 anos),66 Hockenberry MJ, Wilson D. Fundamentos de Enfermagem Pediátrica. 9º ed. Rio de Janeiro (RJ): Elsevier; 2014. que estavam internadas na supracitada instituição, no momento da coleta dos dados.11 Aranha BF, Souza MA, Pedroso GER, Maia EBS, Melo LL. Using the instructional therapeutic play during admission of children to hospital: the perception of the family. Rev Gaucha Enferm. 2020;41:e20180413. http://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2020.20180413. PMid:32348422.
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Utilizaram-se, como critério de inclusão, as crianças pré-escolares e escolares internadas no setor de Pediatria, em TIV, para a administração de medicamentos e/ou hidratação venosa.

Os critérios de exclusão da pesquisa pautaram-se nos seguintes aspectos: a) crianças acompanhadas por outros familiares e/ou responsáveis, que não a genitora; b) crianças impossibilitadas de manusear os materiais do BTI e/ou de responder à entrevista semiestruturada, em detrimento de queimaduras, lesões ósseas ou cutâneas graves nos membros superiores, utilização de aparelhos gessados, deficiências auditivas e/ou visuais; c) crianças com desorientação alopsíquica ou autopsíquica, com diagnóstico de transtornos mentais, distúrbios neurológicos e/ou síndromes evidenciados por meio da análise do prontuário da criança (após a aprovação materna e da instituição de saúde), bem como por meio dos relatos maternos e d) crianças em leito de isolamento, em detrimento do risco de contaminação cruzada entre os pesquisadores e as demais crianças internadas na respectiva unidade.

Durante o período de coleta dos dados, ocorreram 58 internações de crianças em fase pré-escolar e escolar, sendo que, após a aplicação dos critérios de inclusão e exclusão, 27 crianças foram excluídas da pesquisa, sendo estas: oito crianças que receberam alta hospitalar antes da conclusão do estudo; duas crianças devido a encaminhamento para outra instituição de saúde, em detrimento de agravamento do quadro clínico, antes da conclusão do estudo; três crianças que estavam acompanhadas de outro parente, que não a genitora; cinco crianças cujas mães não consentiram a sua participação no estudo; uma criança que não aceitou participar da pesquisa; duas crianças que estavam em terapia medicamentosa somente por via oral; duas crianças por não terem conseguido realizar a intervenção com o BTI; duas crianças que não conseguiram responder à entrevista semiestruturada e duas crianças com Transtorno do Espectro Autista. Assim, participaram do estudo 31 crianças.

Optou-se, tendo em vista o alcance dos objetivos do estudo, pela fragmentação da coleta dos dados em duas etapas: a) sessão com o BTI após o primeiro contato da criança com a TIV e b) aplicação da entrevista semiestruturada após o segundo contato da criança com a TIV.

Na primeira etapa, a criança, após ser submetida à primeira TIV, foi questionada sobre onde gostaria de aprender a “dar injeção no boneco” e, a partir disso, os pesquisadores, utilizando jalecos coloridos, demonstraram o método técnico, por meio da sessão com o BTI, e dialogaram com a criança sobre a necessidade e os reais fundamentos da TIV, convidando-a a reproduzir a prática ao término da sua demonstração. Ressalta-se que, para a realização da intervenção com o BTI, foi utilizado o protocolo de preparo da criança pré-escolar para a punção venosa com a utilização do brinquedo terapêutico.1414 Martins MR, Ribeiro CA, Borba RIH, Silva CV. Protocolo de preparo da criança pré-escolar para punção venosa, com utilização do brinquedo terapêutico. Rev Lat Am Enfermagem. 2001;9(2):76-85. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-11692001000200011. PMid:12046567.
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A intervenção com o BTI foi realizada de maneira individual, utilizando-se de: bonecos de pano; seringas descartáveis (sem agulha); cateter periférico agulhado (com a capa de proteção); álcool 70%; algodão; esparadrapo; luva de procedimento; máscara de proteção e gorro. Os pesquisadores explicaram o procedimento à criança de maneira lúdica e, logo após, permitiram que a mesma dramatizasse a TIV, refazendo-a no boneco, com a finalidade de favorecer a sua compreensão acerca desta prática e do método terapêutico.1515 Pontes JE, Tabet E, Folkmann MÁ, Cunha ML, Almeida FA. Therapeutic play: preparing the child for the vaccine. Einstein (Sao Paulo). 2015 abr/jun;13(2):238-42. http://dx.doi.org/10.1590/S1679-45082015AO2967. PMid:26154545.
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Concluída a sessão com o BTI, após a criança ser submetida à segunda TIV, realizou-se a segunda etapa da coleta dos dados, por meio da aplicação da entrevista semiestruturada, a fim de compreender a experiência da criança com o procedimento e com o emprego do BTI dentro da assistência em saúde, direcionando-a a partir das seguintes questões norteadoras: “Como foi o momento que o (a) profissional lhe deu a injeção (TIV)?”; “Como foi, para você, brincar com o boneco e dar injeção nele?”; “Conte-me como você fez para dar injeção no boneco. Você aprendeu a dar injeção?”; “E, agora, você entendeu por que você precisa tomar injeção?”; “Você sentiu menos medo na hora de tomar a injeção de novo?”; “Você gostou de aprender a dar injeção no boneco?”.

Em seguida, as falas foram transcritas na íntegra e compuseram o corpus textual que foi processado pelo software de análise qualitativa Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires (IRAMUTEQ). Optou-se pela utilização do método da Classificação Hierárquica Descendente (CHD) com o intuito de classificar os Segmentos do Texto (ST) em função de seus respectivos vocábulos e reparti-los de acordo com a frequência de formas reduzidas.1616 Souza MAR, Wall ML, Thuler ACMC, Freire MHS, Santos EKA. Vivência do acompanhante da parturiente no processo de parto. Rev enferm UFPE [on line]. 2018;12(3):626-34. http://dx.doi.org/10.5205/1981-8963-v12i3a230979p626-634-2018.
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,1717 Souza MAR, Wall ML, Thuler ACMC, Lowen IMV, Peres AM. O uso do software IRAMUTEQ na análise de dados em pesquisas qualitativas. Rev Esc Enferm USP. 2018;52(0):e03353. http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2017015003353. PMid:30304198.
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A análise dos dados deu-se a partir da ideias centrais da teoria de Piaget, que define estágios de desenvolvimento da criança: sensório-motor; pré-esquemático; operações concretas e operações formais.1818 Harada MJCS, Pedreira MLG. Terapia intravenosa e infusões. São Caetano do Sul (SP): Yendis Editora; 2011. p. 121-36.

Desse modo, visando a uma melhor compreensão dos resultados, conseguinte à análise dos dados, foram observados os seis passos básicos de uma abordagem qualitativa, a saber: 1. Organização e preparo dos dados para análise; 2. Leitura minuciosa e avaliação do conteúdo transcrito; 3. Análise do processo de codificação realizado pelo IRAMUTEQ; 4. Utilizar-se do processo de codificação para descrever a ambiência ou os indivíduos e as categorias ou temas para a análise; 5. Elucidar as peculiaridades de representação da descrição e dos temas na narrativa qualitativa, embasados na literatura vigente, após a análise categórica e 6. Segmentação dos dados e apresentação dos resultados após a análise.1616 Souza MAR, Wall ML, Thuler ACMC, Freire MHS, Santos EKA. Vivência do acompanhante da parturiente no processo de parto. Rev enferm UFPE [on line]. 2018;12(3):626-34. http://dx.doi.org/10.5205/1981-8963-v12i3a230979p626-634-2018.
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,1717 Souza MAR, Wall ML, Thuler ACMC, Lowen IMV, Peres AM. O uso do software IRAMUTEQ na análise de dados em pesquisas qualitativas. Rev Esc Enferm USP. 2018;52(0):e03353. http://dx.doi.org/10.1590/s1980-220x2017015003353. PMid:30304198.
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Diante da manutenção do anonimato e da confidencialidade dos participantes do estudo, ressalta-se que a escolha dos pseudônimos foi realizada pelas crianças, mediante a apresentação, pelos pesquisadores, de uma lista com nomes de personagens de histórias infantis.

O estudo obedeceu a todos os aspectos éticos e legais estabelecidos nas normas nacionais e internacionais que regulamentam as pesquisas envolvendo seres humanos, sendo aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário Doutor Leão Sampaio (UNILEÃO) com o Parecer Consubstanciado de n°: 3.376.128 e CAAE: 11059519.5.0000.5048.

RESULTADOS

O estudo contou com a participação de 31 crianças (dez pré-escolares e 21 escolares), com idades entre três a 11 anos, sendo 18 do sexo masculino e 13 do sexo feminino, que estavam internadas em função dos seguintes diagnósticos médicos: abdome agudo; abscesso cervical; abscesso dentário; abscesso mamário; adenite mesentérica; adenite purulenta; dengue; dermatite disseminada; infecção bacteriana; linfadenopatia reacional; otite média supurativa; pneumonia adquirida na comunidade; pós-operatório de apendicectomia; síndrome nefrótica; asma; febre e gastroenterite.

Diante do processamento do corpus, os ST apresentados em cada classe foram obtidos a partir das palavras mais recorrentes, aspecto este que possibilita a análise qualitativa. O tratamento do corpus concretizou-se em zero hora, zero minuto e 28 segundos, a partir do qual foram classificados 68 ST e, destes, 52 foram aproveitados, o que constitui um aproveitamento de 76,47%. Resultado este que corrobora com diversos estudos, os quais, em suma, abonam que um bom aproveitamento do corpus textual equivale a 75% ou mais. A relação pode ser visualizada a partir do dendrograma elaborado por meio da CHD fornecida pelo software IRAMUTEQ (Figura 1).

Figura 1
Dendrograma das classes fornecido pelo software IRAMUTEQ. Juazeiro do Norte, Ceará. Brasil. 2019. Fonte: pesquisa direta, 2019.

A Figura 2 representa o dendrograma com as subdivisões que foram realizadas no corpus textual até que se alcançasse as classes finais. Ressalta-se que a leitura das classes, em função da análise da relação proposta entre elas, deve ser realizada da esquerda para a direita, na qual as divisões dos ST apresentam vocabulário das palavras com frequência média entre si e divergente entre elas.

Figura 2
Dendrograma das classes geradas pelo software IRAMUTEQ por meio da Classificação Hierárquica Descendente. Juazeiro do Norte – Ceará, Brasil. Fonte: pesquisa direta, 2019.

Assim, para a CHD, o corpus textual foi fragmentado em dois subcorpus constituintes das classes formadas pelos ST, conforme expresso: subcorpus 1 - formado pelas classes 6 (dez ST, 19,2%) e 2 (oito ST, 15,4%) e subcorpus 2 - constituído pelas classes 1 (oito ST, 15,4%) e 4 (oito ST, 15,4%) e pelas classes 5 (oito ST, 15,4%) e 3 (dez ST, 19,2%).

Conseguinte à leitura dos ST, elegeram-se, como critério de análise, as palavras que apresentaram um χ2 maior que 3,84, representando um p < 0,0001, haja vista evidenciar a interação e a força associativa entre elas. Ressalta-se que quanto menor o χ2, menor é a relação entre as variáveis. A Figura 2 apresenta o dendrograma gerado pelo software IRAMUTEQ.

Conforme expresso na figura 2, diante da primeira categoria (composta pelas classes 6 e 2), que compreende 34,6% (18 ST) do corpus total, observa-se que ela é constituída por palavras e radicais no intervalo de χ2 = 4,13 (seringa) a χ2 = 23,23 (scalp), na classe 6, e χ2 = 2,03 (legal) a χ2 = 25,66 (algodão), na classe 2. Frente à segunda categoria (composta pelas classes 1, 4, 5 e 3), que é constituída por 65,4% (34 ST), as palavras mais evidentes variaram entre: classe 1, χ2 = 2,02 (boneco) a χ2 = 16,44 (só); classe 4, χ2 = 2,02 (boneco) a χ2 = 23,83 (gosto); classe 5, χ2 = 2,02 (bom) a χ2 = 14,28 (menos) e classe 3, χ2 = 2,95 (aprender) a χ2 = 9,83 (bem).

Conforme supracitado, a partir da compreensão dos ST, foram constituídas duas categorias a) “Percepção da criança sobre o brinquedo terapêutico instrucional no preparo para a terapia intravenosa por meio de aspectos práticos e objetivos”, composta pelas classes 6 e 2 e b) “Percepção da criança sobre o brinquedo terapêutico instrucional no preparo para a terapia intravenosa por meio de aspectos cognitivos e subjetivos”, composta pelas classes 1, 4, 5 e 3.

A descrição das classes foi realizada com base na análise das palavras de maneira individual, por meio da inclusão dos ST e de sua relação com a literatura vigente, bem como por meio da observância aos pressupostos da teoria cognitivista de Piaget. Os trechos das entrevistas foram indexados, após o recorte, conforme fragmentados pelo software IRAMUTEQ, após o processamento dos dados.

CATEGORIA 1: Percepção da criança sobre o brinquedo terapêutico instrucional no preparo para a terapia intravenosa por meio de aspectos práticos e objetivos

Nesta categoria, as palavras em destaque foram: scalp; luva; máscara; colocar; touca; sangue; tirar; pegar; veia; algodão; álcool; agulha; dentre outras. Elas estão relacionadas à percepção da criança quanto à realização da TIV, compreensão anatômica corporal e assimilação do procedimento realizado no boneco com o que é realizado em si. Esta categoria diz respeito, portanto, à percepção da criança sobre o brinquedo terapêutico instrucional no preparo para a terapia intravenosa por meio de aspectos práticos e objetivos.

Diante da análise da percepção da criança quanto à realização da TIV, percebeu-se que elas entenderam a técnica de realização do procedimento, por meio da dramatização com o BTI, a partir do qual citaram as etapas necessárias e os materiais utilizados para a realização desse procedimento invasivo, conforme expresso nas seguintes falas.

[...] eu coloquei a luva, a máscara e o gorro, aí, peguei o negócio com a agulha (scalp) e a seringa e dei a injeção no boneco. (Florian, sete anos)

[...] peguei a touca e botei na cabeça, peguei a máscara e a luva, aí, eu dei a injeção no boneco [...]. (Pequeno Príncipe, três anos)

[...] primeiro, tem que achar o pulso; aí, depois, tu pega um algodão, molha com álcool, aí, passa em cima do braço para limpar e poder tirar os germes para poder achar também o pulso, né; aí, depois, pega a agulha [...]. (Rei Arthur, 11 anos)

Quando os profissionais de Enfermagem possibilitam às crianças meios que favoreçam a sua compreensão quanto à realização da TIV, como a utilização do BTI, é perceptível que, além de compreender as etapas necessárias para a realização do procedimento, elas conseguem relacionar a anatomia humana com a TIV, a partir das explicações adquiridas durante a sessão com o BTI concretizada pelos pesquisadores, conforme demonstrado nas falas a seguir.

[...] coloquei a máscara, a touca e a luva, bati no negócio, né, na veia, aí, coloquei a agulha e preguei, né [...]. (Peter Pan, oito anos)

[...] eu peguei a mangueirinha (scalp) que tinha agulha e dei a injeção no boneco, colocando o remédio na veia dele. [...] achei muito bom e aprendi a dar injeção. (Eric, três anos)

Por meio da utilização do BTI, foi possível compreender a percepção da criança após realizar o procedimento no boneco, sendo evidente que lhe explicar esta técnica, antes de realizá-la, favoreceu a promoção da tranquilidade e sua participação ativa no processo de recuperação da saúde, bem como propiciou, ainda, momentos de bem-estar, alegria, descontração e aprendizado, conforme expresso nas falas a seguir.

[...] foi legal. Eu peguei a mãozinha da boneca e procurei a veia dela; depois, passei o algodão e coloquei a borboletinha (scalp) que fura o bracinho dela. (Bailarina, nove anos)

[...] foi muito bom, eu aprendi muito. Eu peguei o braço do boneco e procurei a veia; aí, passei o algodão para limpar em cima [...]. (Finn, nove anos)

[...] foi engraçado, eu tive que preparar as coisas [...], aí, eu passei o algodão no bracinho do boneco e botei a seringa e botei o esparadrapo. (Atchim, 11 anos)

Após a realização da sessão com o BTI, por meio da entrevista semiestruturada aplicada às crianças, pôde-se perceber que algumas assimilaram o procedimento que é realizado no boneco, com a TIV que foi realizada nelas, demonstrando cuidado durante a realização da técnica, ao usar, por exemplo, agulhas pequenas para não furar o boneco todo e dar a injeção para que o “boneco” melhore da saúde.

[...] eu ia dar a vacina na boneca, aí, a agulha foi pequenininha para não furar ela toda, para não sair sangue de verdade, aí, eu botei o algodão. (Pocahontas, cinco anos)

[...] gostei, porque eu dei a injeção para o bonequinho ficar melhor. (Pequeno Príncipe, três anos)

[...] me senti uma doutora [...]. (Branca de Neve, dez anos)

Essa assimilação também foi evidenciada quando as crianças citaram a coragem e a força do “boneco” ao afirmarem que ele aguentou o procedimento sem chorar e/ou que chorou quando foi furado pela agulha durante a TIV, como citado nas falas abaixo.

[...] eu botei a injeção no braço dele (boneco), que nem eu, e ele não chorou, aguentou [...]. (Bela, seis anos)

[...] eu dei a injeção no boneco e ele chorou, eu coloquei a agulha e furei [...]. (Cebolinha, cinco anos)

CATEGORIA 02: Percepção da criança sobre o brinquedo terapêutico instrucional no preparo para a terapia intravenosa por meio de aspectos cognitivos e subjetivos

As palavras mais evidentes nesta categoria foram: só; servir; pouco; gosto; chorar; não; sim; menos; legal; entender; sentir; bem; porque e outras. Elas foram obtidas a partir da correlação das classes 1, 4, 5 e 3, as quais, em suma, suscitam a compreensão da criança quanto à importância da medicação para a sua saúde, à necessidade da TIV, à redução da dor e do medo, à participação da criança como sujeito ativo do cuidado e à aceitação do procedimento por ela. Essa categoria diz respeito, portanto, à percepção da criança sobre o brinquedo terapêutico instrucional no preparo para a terapia intravenosa por meio de aspectos cognitivos e subjetivos.

Quando os profissionais de Enfermagem orientam as crianças hospitalizadas quanto aos procedimentos aos quais serão submetidas, a exemplo da punção venosa, por meio da dramatização com o BTI, eles favorecem que essas compreendam a real necessidade e os objetivos da TIV, a partir da infusão de medicamentos por via endovenosa com a seringa, “injeção”, como forma de favorecer a recuperação de sua saúde, bem como a prevenção de agravos do quadro clínico, conforme expresso nas falas a seguir.

Aprendi sim. [...] é para melhorar e ficar bom rápido [...]. (Atchim, 11 anos)

[...] aprendi. [...] é para melhorar da saúde. (Robin Hood, seis anos)

[...] a injeção faz bem à saúde para que eu não adoeça. (Cinderela, cinco anos)

[...] aprendi sim, para não ficar doente, pois a medicação serve para ficar bom [...]. (Florian, sete anos)

[...] aprendi que [...] a injeção serve para curar. (Dunga, cinco anos)

Essa compreensão é reafirmada quando as crianças citaram a importância do uso da medicação como meio de favorecer a melhoria dos sintomas clínicos do seu quadro de afecção, conforme as falas abaixo.

Entendi sim, é para não coçar a pele da pessoa, eu tenho alergia [...]. (Pocahontas, cinco anos)

[...] para sempre melhorar da gripe e das diarreias também que você pega sempre [...]. (Aladim, sete anos)

[...] meu corpo tem uns guardiões, aí, eles ficam fracos, aí, tem que dar o medicamento para eles ficarem fortes de novo. (Rei Arthur, 11 anos)

Algumas crianças, quando questionadas sobre a necessidade da medicação para a sua saúde, expressaram o conhecimento empírico, adquirido por meio dos seus familiares e/ou até mesmo dos profissionais de Enfermagem, ao citarem a necessidade de tomar a medicação apenas como meio de obter a alta hospitalar, conforme expresso nas falas a seguir.

[...] para ir para casa [...]. (Cebolinha, cinco anos)

[...] se não tomar o remédio, não vai para casa e tem que ficar a noite inteira no hospital. (Dunga, cinco anos)

Após a sessão do BTI com as crianças, quando questionadas se sentiram menos medo após aprender a aplicar a injeção no boneco, quando o profissional de Enfermagem retornou para administrar o medicamento por meio do acesso venoso, venóclise e/ou realizar a punção venosa, elas referiram redução parcial do medo e expressaram seus sentimentos quanto à dor advinda do procedimento, conforme expresso nas falas abaixo.

[...] senti menos medo, só doeu um pouco [...]. (Branca de Neve, dez anos)

[...] senti menos medo, mas ainda continuou doendo, só que mais pouco [...]. (Bailarina, nove anos)

Senti menos medo, eu não chorei [...]. (Pocahontas, cinco anos)

Durante a realização da entrevista semiestruturada com as crianças, quando interrogadas se gostaram de aplicar a injeção no boneco, em meio às suas respostas, foi perceptível a satisfação delas em dramatizar a TIV no brinquedo, bem como a redução do medo da criança quanto ao procedimento, sendo expressos ainda sentimentos de força, alegria e autonomia ao manusear o BTI, conforme citado nas falas a seguir.

[...] gostei porque a gente aprende e, se a gente quiser ser enfermeira no futuro, aí a gente já sabe. (Rapunzel, 11 anos)

[...] gostei muito, [...] eu tinha muito medo de ver. (Bailarina, nove anos)

[...] eu gosto de brincar com a boneca e dar injeção nela. (Cinderela, cinco anos)

[...] foi muito legal dar injeção, quero fazer de novo. (Cebolinha, cinco anos)

A utilização do BTI, na assistência à criança hospitalizada, pode favorecer ainda a redução de sentimentos adversos, como o medo e a ansiedade, e possibilitar, em tempo, que a criança veja a injeção, TIV, como algo benéfico para a sua recuperação e não apenas como algo que lhe causa medo e dor, conforme expresso nas falas que se seguem.

[...] tem que deixar fazer (medicação) para ficar boa logo [...]. (Bailarina, nove anos)

É bom dar vacina em mim; agora, quando a enfermeira botar o remedinho aqui no meu braço todo dia, eu não vou chorar não [...]. (Pocahontas, cinco anos)

[...] quando a enfermeira vier dar a injeção eu não vou sentir medo. (Cebolinha, cinco anos)

[...] quando veio botar a injeção, eu não senti medo. (Rainha Elza, sete anos)

[...] senti um medo bem pequenininho do tamanho da formiguinha [...]. (Eric, três anos)

[...] a pessoa nunca quer levar, mas sempre quer dar, né. (Peter Pan, oito anos)

[...] eu criei coragem para olhar quando o enfermeiro veio me dar injeção [...]. (Finn, nove anos)

DISCUSSÃO

Diante da percepção das crianças acerca da TIV, foi averiguado que elas compreenderam a técnica a partir da utilização do BTI, resultado este que caminha ao encontro dos objetivos propostos por este instrumento, o qual é vislumbrado como uma ferramenta capaz de atenuar o sofrimento e os traumas advindos da hospitalização e da consequente realização de procedimentos invasivos.1313 Gomes ACDA, Figueiredo Silva ATM, Dos Santos CM, Palermo TADC. Brinquedo terapêutico no alívio da dor em crianças hospitalizadas. Perspectivas Online: Biológicas & Saúde. 2019;9(29):33-42. http://dx.doi.org/10.25242/886892920191717.
http://dx.doi.org/10.25242/8868929201917...
,1515 Pontes JE, Tabet E, Folkmann MÁ, Cunha ML, Almeida FA. Therapeutic play: preparing the child for the vaccine. Einstein (Sao Paulo). 2015 abr/jun;13(2):238-42. http://dx.doi.org/10.1590/S1679-45082015AO2967. PMid:26154545.
http://dx.doi.org/10.1590/S1679-45082015...
,1919 Pessoa AVC, Santos AF, Cruz DSM, Marques DKA, Lubenow JAM. Brinquedo terapêutico: preparo de crianças em idade pré-escolar para punção venosa. Revista de Ciências da Saúde Nova Esperança. 2018;16(1):64-72. http://dx.doi.org/10.17695/issn.2317-7160.v16n1a2018p64-72.
http://dx.doi.org/10.17695/issn.2317-716...

Favorecer a compreensão da criança quanto aos procedimentos aos quais será submetida e aos reais benefícios destes para a sua saúde é um dos principais objetivos da prática do BTI, o qual visa a possibilitar a dramatização do procedimento pela criança com a finalidade de reduzir os níveis de ansiedade, medo, tensão, angústia e sofrimento apresentados por ela.

Além de compreender as etapas necessárias para a realização do procedimento, por meio da utilização do BTI, as crianças conseguiram relacionar a anatomia humana com a TIV. Resultado distinto foi averiguado em estudo acerca da punção venosa no olhar da criança hospitalizada, o qual evidenciou que elas não compreendem, ao certo, o que acontece quando “se pega a veia”, no momento da punção venosa, haja vista não terem sido orientadas quanto à realização da TIV.2020 Faccioli SC, Tacla MTGM, Cândido LK, Ferrari RAP, Gabani FL. Punção venosa periférica o olhar da criança hospitalizada. Rev Eletrônica Acervo Saúde [Internet]. 2017; [citado 2019 out 6];9(4):1130-34. Disponível em: https://www.acervosaude.com.br/doc/26_2017.pdf
https://www.acervosaude.com.br/doc/26_20...
Esse fato suscita a necessidade de os profissionais da saúde prepararem as crianças para a realização dos procedimentos por meio de métodos lúdicos e estruturados, como o BTI.2121 Santos PM, Silva LF, Depianti JRB, Cursino EG, Ribeiro CA. Os cuidados de enfermagem na percepção da criança hospitalizada. Rev Bras Enferm. 2016;69(4):646-53. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167.2016690405i. PMid:27508468.
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167.2016...

Em seus estudos,1313 Gomes ACDA, Figueiredo Silva ATM, Dos Santos CM, Palermo TADC. Brinquedo terapêutico no alívio da dor em crianças hospitalizadas. Perspectivas Online: Biológicas & Saúde. 2019;9(29):33-42. http://dx.doi.org/10.25242/886892920191717.
http://dx.doi.org/10.25242/8868929201917...
,1515 Pontes JE, Tabet E, Folkmann MÁ, Cunha ML, Almeida FA. Therapeutic play: preparing the child for the vaccine. Einstein (Sao Paulo). 2015 abr/jun;13(2):238-42. http://dx.doi.org/10.1590/S1679-45082015AO2967. PMid:26154545.
http://dx.doi.org/10.1590/S1679-45082015...
afirmaram que as crianças, quando preparadas por meio do BTI para a TIV, se sentem mais tranquilas, passam a lidar e a colaborar com o tratamento e têm a oportunidade de dramatizar o procedimento ao qual serão submetidas, reduzindo, assim, os níveis de estresse.

Após a sessão com o BTI, as crianças apresentam-se mais alegres, compreendem melhor o que acontece em seu entorno e respondem mais avidamente aos estímulos e solicitações, o que favorece a interação destas com os profissionais e o ambiente.2222 Berté C, Ogradowski KRP, Zagonel IPS, Tonin L, Favero L, Almeida Jr RL. Brinquedo terapêutico no contexto da emergência pediátrica. Rev baiana enferm. 2017;31(3):e20378. http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v31i3.20378.
http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v31i3.203...
Portanto, o BTI atua como instrumento de comunicação, por meio do qual os profissionais explicam o procedimento à criança e solucionam suas dúvidas, com a finalidade de atenuar os efeitos negativos da hospitalização e da realização dos procedimentos invasivos.1010 Caleffi CCF, Rocha PK, Anders JC, Souza AIJ, Burciaga VB, Serapião LS. Contribuição do brinquedo terapêutico estruturado em um modelo de cuidado de enfermagem para crianças hospitalizadas. Rev Gaúcha Enferm. 2016;37(2):e58131. http://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2016.02.58131. PMid:27253598.
http://dx.doi.org/10.1590/1983-1447.2016...

Durante a sessão com o BTI, ao tomarem a responsabilidade de “medicar” o brinquedo, no papel de profissionais, as crianças transmitiram, para o boneco, os sentimentos, anseios e angústias que as acompanham durante a hospitalização, no momento da TIV. Essa ação possibilitou que elas assimilassem melhor o procedimento por meio da compreensão da técnica e da possibilidade de concretizá-la no BTI.66 Hockenberry MJ, Wilson D. Fundamentos de Enfermagem Pediátrica. 9º ed. Rio de Janeiro (RJ): Elsevier; 2014.

Esses aspectos são reafirmados por dois estudos,2323 Silva LD. O efeito do brinquedo terapêutico instrumental no comportamento de crianças hospitalizadas submetidas a punção venosa [dissertação]. Guarulhos (SP): Programa de Pós-graduação em Enfermagem, Universidade Guarulhos; 2015. [citado 2019 out 17]. Disponível em: http://tede.ung.br/bitstream/123456789/675/1/Lucin%EF%BF%BD%EF%BF%BDia+Dias+da+Silva.pdf
http://tede.ung.br/bitstream/123456789/6...
,2424 Canêz JB, Gabatz RIB, Hense TD, Vaz VG, Marques RS, Milbrath VM. O brinquedo terapêutico no cuidado de enfermagem à criança hospitalizada. Revista Enfermagem Atual In Derme. 2019;88(26):1-8. https://doi.org/10.31011/reaid-2019-v.88-n.26-art.129.
https://doi.org/10.31011/reaid-2019-v.88...
os quais citaram que utilizar o BTI, no preparo da criança hospitalizada para a realização da TIV, permite a expressão de comportamentos que conjeturam medos e angústias diante dos procedimentos invasivos. Este método favorece a redução dos níveis de ansiedade, medo e tensão da criança, por meio da dramatização da TIV no BTI.

Diante da compreensão da criança quanto aos reais objetivos da TIV, resultado similar foi encontrado em um estudo acerca da utilização do BTI no contexto da emergência pediátrica, o qual evidenciou, conforme os relatos maternos, que a utilização do BTI se configurou como um instrumento facilitador do processo de permanência do filho na unidade de emergência hospitalar, bem como na compreensão deste quanto à necessidade da medicação para o restabelecimento da saúde e a prevenção de doenças.2222 Berté C, Ogradowski KRP, Zagonel IPS, Tonin L, Favero L, Almeida Jr RL. Brinquedo terapêutico no contexto da emergência pediátrica. Rev baiana enferm. 2017;31(3):e20378. http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v31i3.20378.
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A administração de medicamentos por via endovenosa é um dos procedimentos mais corriqueiros no âmbito hospitalar, capaz de causar medo, anseios, angústia e choro nas crianças, sendo compreendido por elas como um evento aterrorizante e, em alguns casos, até mesmo punitivo.2020 Faccioli SC, Tacla MTGM, Cândido LK, Ferrari RAP, Gabani FL. Punção venosa periférica o olhar da criança hospitalizada. Rev Eletrônica Acervo Saúde [Internet]. 2017; [citado 2019 out 6];9(4):1130-34. Disponível em: https://www.acervosaude.com.br/doc/26_2017.pdf
https://www.acervosaude.com.br/doc/26_20...
,2323 Silva LD. O efeito do brinquedo terapêutico instrumental no comportamento de crianças hospitalizadas submetidas a punção venosa [dissertação]. Guarulhos (SP): Programa de Pós-graduação em Enfermagem, Universidade Guarulhos; 2015. [citado 2019 out 17]. Disponível em: http://tede.ung.br/bitstream/123456789/675/1/Lucin%EF%BF%BD%EF%BF%BDia+Dias+da+Silva.pdf
http://tede.ung.br/bitstream/123456789/6...
No entanto, por meio das falas, percebe-se que, mesmo diante de todas as expressões negativas apresentadas pela criança perante a TIV, elas compreendem que a medicação atua na melhoria dos sintomas clínicos da doença.

Diante das falas das crianças, no que tange à sua compreensão quanto à necessidade da medicação para a sua saúde, é possível averiguar que elas relacionam a sua submissão à TIV como fator condicional para a cura e conseguinte retorno para casa, o que remete à concepção errônea que elas detêm quanto à terapêutica medicamentosa.1515 Pontes JE, Tabet E, Folkmann MÁ, Cunha ML, Almeida FA. Therapeutic play: preparing the child for the vaccine. Einstein (Sao Paulo). 2015 abr/jun;13(2):238-42. http://dx.doi.org/10.1590/S1679-45082015AO2967. PMid:26154545.
http://dx.doi.org/10.1590/S1679-45082015...

Esse resultado foi similar ao obtido no estudo acerca do uso do brinquedo terapêutico no preparo de crianças em idade pré-escolar para a punção venosa, o qual averiguou que uma das crianças compreendia a punção venosa somente como meio de obter a cura da doença e voltar para sua residência, sem saber, ao certo, como o medicamento atua e os benefícios deste para a melhoria do seu quadro clínico.1919 Pessoa AVC, Santos AF, Cruz DSM, Marques DKA, Lubenow JAM. Brinquedo terapêutico: preparo de crianças em idade pré-escolar para punção venosa. Revista de Ciências da Saúde Nova Esperança. 2018;16(1):64-72. http://dx.doi.org/10.17695/issn.2317-7160.v16n1a2018p64-72.
http://dx.doi.org/10.17695/issn.2317-716...
,2121 Santos PM, Silva LF, Depianti JRB, Cursino EG, Ribeiro CA. Os cuidados de enfermagem na percepção da criança hospitalizada. Rev Bras Enferm. 2016;69(4):646-53. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167.2016690405i. PMid:27508468.
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167.2016...

Quando a criança tem a oportunidade de brincar e dramatizar a TIV, por meio do BTI, a dor, a solidão, o medo e o choro são atenuados. Em corroboração com os resultados de estudos contemporâneos, acerca da utilização do BTI no preparo da criança hospitalizada para a TIV,55 Silva ACSS, Silva TPN, Alves DN, Amarante LH, Góes FGB, Goulart MCL. Prática clínica da equipe de enfermagem acerca da terapia intravenosa em Unidade Neonatal e Pediátrica. Rev baiana enferm. 2019;33:e33828. http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v33.33828.
http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v33.33828...
,2121 Santos PM, Silva LF, Depianti JRB, Cursino EG, Ribeiro CA. Os cuidados de enfermagem na percepção da criança hospitalizada. Rev Bras Enferm. 2016;69(4):646-53. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167.2016690405i. PMid:27508468.
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167.2016...
,2323 Silva LD. O efeito do brinquedo terapêutico instrumental no comportamento de crianças hospitalizadas submetidas a punção venosa [dissertação]. Guarulhos (SP): Programa de Pós-graduação em Enfermagem, Universidade Guarulhos; 2015. [citado 2019 out 17]. Disponível em: http://tede.ung.br/bitstream/123456789/675/1/Lucin%EF%BF%BD%EF%BF%BDia+Dias+da+Silva.pdf
http://tede.ung.br/bitstream/123456789/6...
,2525 Silva SGT, Santos MA, Floriano CMF, Damião EBC, Campos FV, Rossato LM. Influence of therapeutic play on the anxiety of hospitalized school-age children: clinical trial. Rev Bras Enferm. 2017;70(6):1244-9. http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016-0353. PMid:29160486.
http://dx.doi.org/10.1590/0034-7167-2016...
,2626 Gomes MFP, Silva ID, Capellini VK. Nursing professionals knowledge on the use of toys in the care of hospitalized children. Rev Enferm UFPI. 2016;5(1):23-7. http://dx.doi.org/10.26694/reufpi.v5i1.4490.
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foi possível vislumbrar a expressão de respostas positivas da criança após esta técnica, das quais se podem citar: a redução do medo; a tranquilidade diante da realização do procedimento; a postura relaxada; a cooperação da criança; a maior interação com a equipe de saúde e demais crianças internadas e a redução dos níveis tensionais.

Diante da atenuação do quadro de dor advindo da TIV, um estudo averiguou que 96,9% de sua amostra total referiu menores escores de dor após a intervenção com o BTI e que apenas uma criança continuou apresentando a mesma intensidade de dor.1313 Gomes ACDA, Figueiredo Silva ATM, Dos Santos CM, Palermo TADC. Brinquedo terapêutico no alívio da dor em crianças hospitalizadas. Perspectivas Online: Biológicas & Saúde. 2019;9(29):33-42. http://dx.doi.org/10.25242/886892920191717.
http://dx.doi.org/10.25242/8868929201917...

Ao serem questionadas se gostaram de aprender a aplicar a injeção do boneco, por meio da sessão com o BTI, foi perceptível a satisfação das crianças, bem como a redução do medo e a expressão de força, alegria e autonomia. Sentimentos estes reafirmados no estudo de,2222 Berté C, Ogradowski KRP, Zagonel IPS, Tonin L, Favero L, Almeida Jr RL. Brinquedo terapêutico no contexto da emergência pediátrica. Rev baiana enferm. 2017;31(3):e20378. http://dx.doi.org/10.18471/rbe.v31i3.20378.
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no qual as genitoras das crianças hospitalizadas citaram que a utilização do BTI possibilitou, aos infantes, uma maior compreensão, aceitação do procedimento e redução do medo, bem como proporcionou, ainda, um momento de aprendizagem e distração, o que favoreceu uma maior tranquilidade e segurança às mesmas.

Pesquisa realizada com pré-escolares,2424 Canêz JB, Gabatz RIB, Hense TD, Vaz VG, Marques RS, Milbrath VM. O brinquedo terapêutico no cuidado de enfermagem à criança hospitalizada. Revista Enfermagem Atual In Derme. 2019;88(26):1-8. https://doi.org/10.31011/reaid-2019-v.88-n.26-art.129.
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acerca de como gostariam de ser tratados pela Enfermagem durante a hospitalização, destacou, entre os principais resultados, a necessidade de incluir a criança no cuidado, elucidando os procedimentos e oferecendo tempo para a exteriorização de sentimentos e desejos, ação esta que permite a expressão da autonomia do infante, maior aceitação dos procedimentos, minimização da tensão e uma melhor interação com a equipe de saúde.1919 Pessoa AVC, Santos AF, Cruz DSM, Marques DKA, Lubenow JAM. Brinquedo terapêutico: preparo de crianças em idade pré-escolar para punção venosa. Revista de Ciências da Saúde Nova Esperança. 2018;16(1):64-72. http://dx.doi.org/10.17695/issn.2317-7160.v16n1a2018p64-72.
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,2727 Figueiredo CR, Lima CA, Prado PF, Leite MTS. Brinquedo terapêutico no cuidado integral à criança hospitalizada: significados para o familiar acompanhante. Rev. Unimontes Científica [Internet]. 2015; [citado 2019 out 15];17(2):2-13. Disponível em: http://www.ruc.unimontes.br/index.php/unicientifica/article/view/401
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Após a sessão com o BTI, a maioria das crianças, em relação à atenuação dos níveis de medo, ansiedade e tensão decorrentes da prática instrucional, apresentou-se mais tranquila e segura, aspectos estes que favoreceram a sua compreensão e aceitação acerca da TIV, permitindo, à criança, responder melhor aos estímulos e às solicitações e perceber a hospitalização como menos assustadora.1313 Gomes ACDA, Figueiredo Silva ATM, Dos Santos CM, Palermo TADC. Brinquedo terapêutico no alívio da dor em crianças hospitalizadas. Perspectivas Online: Biológicas & Saúde. 2019;9(29):33-42. http://dx.doi.org/10.25242/886892920191717.
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,1515 Pontes JE, Tabet E, Folkmann MÁ, Cunha ML, Almeida FA. Therapeutic play: preparing the child for the vaccine. Einstein (Sao Paulo). 2015 abr/jun;13(2):238-42. http://dx.doi.org/10.1590/S1679-45082015AO2967. PMid:26154545.
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,2424 Canêz JB, Gabatz RIB, Hense TD, Vaz VG, Marques RS, Milbrath VM. O brinquedo terapêutico no cuidado de enfermagem à criança hospitalizada. Revista Enfermagem Atual In Derme. 2019;88(26):1-8. https://doi.org/10.31011/reaid-2019-v.88-n.26-art.129.
https://doi.org/10.31011/reaid-2019-v.88...

Desse modo, quando o profissional enfermeiro tem consciência do impacto gerado pela hospitalização sobre as reações comportamentais da criança, ele compreende e sensibiliza-se para a promoção da escuta ativa como meio de entender as particularidades, anseios, angústias, medos e desejos dela, bem como da necessidade de integrar práticas mais humanizadas à assistência à criança hospitalizada como o BTI, a contação de histórias, a ludoterapia e outras.

Segundo os estágios de desenvolvimento propostos por Piaget, as crianças de dois a sete anos estão no estágio pré-esquemático, enquanto as crianças de sete a 12 anos estão no estágio de operações concretas. No estágio pré-esquemático, no qual se incluem os pré-escolares, as crianças tendem a apresentar comportamento egocêntrico, mágico e lúdico e entendem o mundo a partir de suas próprias perspectivas. As crianças, nesse estágio, se beneficiam do BTI por ser uma atividade prática na qual exercem controle e podem manipular os objetos de acordo com seus desejos e, assim, expressar seus sentimentos e suas emoções pelo canal mais adequado, o não verbal e lúdico.1818 Harada MJCS, Pedreira MLG. Terapia intravenosa e infusões. São Caetano do Sul (SP): Yendis Editora; 2011. p. 121-36.

As crianças, no estágio de operações concretas, apresentam comportamento mais lógico e coerente com a realidade, entendem os fenômenos a partir do que veem e percebem ao redor e têm também consciência sobre os próprios pensamentos. Outra característica desse estágio é a curiosidade sobre tudo à sua volta, o que gera perguntas que já podem ser respondidas e compreendidas a partir de termos concretos. Com isso, pode-se observar que a cognição amadurece tanto quanto o aspecto emocional. Nesse estágio, o BTI continua a ser uma ferramenta útil, pois propicia a simulação de um evento que a criança não compreende, mas passa a entender à medida que o reproduz nos bonecos, por meio da dramatização da TIV com a manipulação dos materiais, geralmente, de uma forma mais próxima à sequência utilizada pelos profissionais.1818 Harada MJCS, Pedreira MLG. Terapia intravenosa e infusões. São Caetano do Sul (SP): Yendis Editora; 2011. p. 121-36.

Tem-se, como limitações do estudo, o fato deste ter avaliado a percepção da criança quanto ao BTI somente diante da TIV, não sendo consideradas, portanto, suas concepções acerca dos demais procedimentos clínicos. Isto posto, sugere-se a realização de novos estudos que abordem essa temática diante dos vários procedimentos clínicos e/ou cirúrgicos aos quais a criança é submetida no ambiente hospitalar, podendo ainda ser utilizados referenciais teóricos a fim de fundamentar a prática assistencial de Enfermagem Pediátrica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Com vistas à redução do sofrimento, sentimentos negativos e concepções errôneas da criança quanto ao ambiente hospitalar e à terapêutica medicamentosa, os resultados deste estudo apontam a utilização do brinquedo terapêutico instrucional como meio qualitativo de assistir à criança hospitalizada e promover a humanização dessa assistência.

Por meio deste estudo, foi possível compreender a percepção das crianças quanto à utilização do brinquedo terapêutico instrucional durante a assistência de Enfermagem Pediátrica, fato este evidenciado a partir da concepção de que as orientar quanto à realização da terapia intravenosa favorece a sua compreensão quanto aos reais benefícios desta técnica para a sua saúde, o que promove a redução da ansiedade, do medo, da angústia, da aflição, da tensão e da dor.

A dramatização da terapia intravenosa no brinquedo terapêutico instrucional, pela criança, possibilitou ainda a expressão dos seus sentimentos e vulnerabilidades, aspectos estes que possibilitam que o profissional de Enfermagem compreenda as condições que representam riscos para a saúde da criança e intervenha, em tempo hábil, por meio da utilização de estratégias que favoreçam a recuperação da saúde e a minimização de traumas subsequentes advindos da hospitalização.

Quando a criança é orientada quanto ao procedimento ao qual será submetida e tem a possibilidade de realizar esta técnica no brinquedo terapêutico instrucional, previamente à sua submissão, ela se sente mais tranquila e adepta à situação, haja vista compreender os reais benefícios, a necessidade, os fundamentos, os materiais utilizados e as etapas necessárias para concretização da TIV.

Por meio da implementação, pelos enfermeiros, do brinquedo terapêutico instrucional como intervenção de Enfermagem, torna-se possível a promoção da responsabilização e corresponsabilidade pelo cuidado à saúde, ainda na infância, bem como a oferta de uma assistência equânime e humanizada à criança hospitalizada.

AGRADECIMENTOS

Agradece-se à profa. Leidiane Alves Gomes, pela sua valiosa contribuição diante da análise ortográfica e gramatical do estudo, bem como pela sua imensurável colaboração na avaliação e no acompanhamento da escrita e do desenvolvimento do artigo.

  • aRecorte da monografia intitulada “Impacto do brinquedo terapêutico diante da punção venosa em crianças hospitalizadas”, apresentada ao curso de graduação em Enfermagem do Centro Universitário Doutor Leão Sampaio (UNILEÃO), por Hercules Pereira Coelho, sob a orientação da Prof. Ana Paula Ribeiro de Castro, no mês de dezembro de 2019.

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Editado por

EDITOR ASSOCIADO

Aline Cristiane Okido Cavicchioli

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Fev 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    28 Ago 2020
  • Aceito
    16 Dez 2020
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