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Mortalidade materna na população indígena e não indígena no Pará: contribuição para a vigilância de óbitos

Resumo

Objetivo:

Analisar a ocorrência da Mortalidade Materna na população geral e população indígena no estado do Pará.

Método:

Estudo com abordagem quantitativa, analítica, retrospectiva, abrangendo uma série histórica de 2005 a 2014. Para análise dos resultados, utilizou-se testes estatísticos não paramétricos, Qui-quadrado e teste G, processados no programa BioStat 5.0.

Resultados:

Foram notificados 884 óbitos maternos no estado do Pará, correspondendo a Razão de Mortalidade Materna de 60,7 por 100 mil nascidos vivos para as mulheres não indígenas e 135,8 por 100 mil nascidos vivos para as indígenas. Observou-se que o edema, a proteinúria e transtornos hipertensivos na gravidez, no parto e puerpério corresponderam a 30,5% (n = 270).

Conclusão e implicações para Prática:

Concluiu-se que a mortalidade materna ainda é um grave problema de saúde pública no Estado, demonstrando claramente que as gestantes indígenas requerem um maior cuidado, tendo em vista que apresentaram índices mais elevados na Razão de Mortalidade Materna se comparado às mulheres não indígenas.

Palavras-chave:
Mortalidade Materna; População Indígena; Vigilância em Saúde Pública

Abstract

Objective:

To analyze the occurrence of Maternal Mortality in general and in the indigenous population in the state of Pará.

Method:

A quantitative, analytical and retrospective study was performed, covering a historical series from 2005 to 2014. For the analysis of the results, non-parametric statistical tests, the Chi-square test and the G test were processed in the BioStat 5.0 software program.

Results:

A total of 884 maternal deaths were reported in the state of Pará, corresponding to a Mortality Rate of 60.7 per 100,000 live births for non-indigenous women and 135.8 per 100,000 live births for indigenous women. Oedema, proteinuria and hypertensive disorders in pregnancy, childbirth and puerperium corresponded to 30.5% (n = 270).

Conclusion and Implications for the Practice:

Maternal mortality remains a serious public health problem in the state of Pará, clearly demonstrating that indigenous pregnant women require greater care, since they showed higher Maternal Mortality Rates when compared to non-indigenous women.

Keywords:
Maternal Mortality; Indigenous Population; Public Health Surveillance

Resumen

Objetivo:

Analizar los casos de Mortalidad Materna en la población general e indígena del estado de Pará.

Método:

Estudio con abordaje cuantitativo, analítico, retrospectivo, que abarca un historial de 2005 a 2014. Para analizar los resultados, se utilizaron pruebas estadísticas no-paramétricas, el Chi-Cuadrado y la prueba G, procesados en el programa BioStat 5.0.

Resultados:

Se pudo comprobar 884 óbitos maternos, correspondientes a la Razón de Mortalidad Materna 60,7 por 100 mil nacidos vivos de no indígenas y 135,8 de 100 mil nacidos vivos de indígenas. El edema, la proteinuria y los trastornos de hipertensión en el embarazo, parto y puerperio corresponden a 30,5% (n = 270).

Conclusión e implicaciones para la práctica:

La mortalidad materna es aún un grave problema de salud pública en el estado, demostrando claramente que las indígenas requieren de una mayor atención, ya que presentaron índices más elevados de mortalidad materna si lo compara con no indígenas.

Palabras clave:
Mortalidad Materna; Población Indígena; Control en Salud Pública

INTRODUÇÃO

A mortalidade materna (MM) constitui ainda um desafio à saúde, principalmente, em países em desenvolvimento, onde os serviços de atenção à saúde da mulher não oferecem plena efetividade. Um indicador intrínseco à qualidade de vida de uma população, a MM é considerada como uma violação dos direitos humanos, principalmente, porque é uma tragédia evitável em cerca de 92% dos casos, configurando-se em um problema de saúde pública.11 Ministério da Saúde (BR). Uma análise da situação de saúde e a vigilância da saúde da mulher. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2012.

2 Botelho NM, Silva IFMM, Tavares JR, Lima LO. Causas de morte materna no Estado do Pará, Brasil. Rev Bras Ginecol Obstet [Internet]. 2014 Jul; [cited 2017 Jan 17]; 36(7):290-5. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/SO100-720320140004892
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3 Ferraz L, Bordignon M. Mortalidade materna no Brasil: uma realidade que precisa melhorar. Rev Baiana Saúde Pública [Internet]. 2012; [cited 2017 Jan 17]; 36(2):527-38. Available from: http://rbsp.sesab.ba.gov.br/index.php/rbsp/article/view/474
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4 Ministério da Saúde (BR). Guia de vigilância epidemiológica do Óbito Materno. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2009.

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-66 Marcolino DL. Saúde das mulheres indígenas no Brasil: uma revisão integrativa [Trabalho de conclusão de curso de graduação]. Porto Alegre (RS): Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2012.

Diante disso, temas ligados à saúde da mulher, relacionados ao momento gestacional e à MM, vêm conquistando espaço no cenário político internacional, sobretudo, a partir do ano de 2000, quando a temática se configurou como o "quinto Objetivo de Desenvolvimento do Milênio (ODM)", sendo umas das metas, a redução da taxa de mortalidade materna em 75% até 2015.77 United Nations. The Millennium Development Goals Report. 2014 [Internet]. New York: United Nations; 2014; [cited 2017 Jan 17]. Available from: http://www.un.org/millenniumgoals/2014%20MDG%20report/MDG%202014%20English%20web.pdf
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Estima-se que mais de 1,5 milhão de mortes maternas, nos anos de 2000 e 2015, tenham sido evitadas e verificou-se que, nesse período, o ODM alcançou metas globalmente e outras apenas em alguns países. Para os anos de 2016 e 2030, Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que substituirá o ODM, apresentou novas metas, entre elas, destaca-se a redução da razão de mortalidade materna global para menos de 70 mortes maternas por 100 mil nascidos vivos.88 United Nations. Sustainable Development Goals. 2015 [Internet]. New York: United Nations; 2015; [cited 2017 Jan 17]. Available from: https://sustainabledevelopment.un.org
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,99 Souza PJ. A mortalidade materna e os novos objetivos de desenvolvimento sustentável (2016-2030). Rev Bras Ginecol Obstet [Internet]. 2015; [cited 2017 Jan 17]; 37(12):549-51. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbgo/v37n12/0100-7203-rbgo-37-12-00549.pdf
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A MM é caracterizada pelo óbito da mulher ocasionado durante a gestação ou até 42 dias após seu término, independente do período gestacional, podendo ser causado por fatores relacionados ou agravados pela própria gestação ou por ações tomadas pela equipe médica. Pode ainda ser dividida em dois grupos: Os de causa obstétrica direta - aquelas que ocorrem por complicações obstétricas durante a gestação, parto ou puerpério, devido a intervenções, omissões ou tratamento incorreto; e os de causa obstétrica indireta - cujos fatores agravantes já são existentes na mulher antes da gravidez.11 Ministério da Saúde (BR). Uma análise da situação de saúde e a vigilância da saúde da mulher. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2012.,44 Ministério da Saúde (BR). Guia de vigilância epidemiológica do Óbito Materno. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2009.,1010 Ministério da Saúde (BR): Uma análise da situação e das doenças transmissíveis relacionadas à pobreza. Brasília (DF): Ministério da saúde; 2014.

Nos países em desenvolvimento, as complicações de causas diretas correspondem a pouco mais de dois terços em relação ao índice geral de MM, denotando a baixa qualidade da atenção obstétrica. Em contrapartida, nos países desenvolvidos este panorama se inverte.11 Ministério da Saúde (BR). Uma análise da situação de saúde e a vigilância da saúde da mulher. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2012.,44 Ministério da Saúde (BR). Guia de vigilância epidemiológica do Óbito Materno. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2009.

De acordo, com a Organização Mundial da Saúde (OMS), no ano de 2005, 536.000 mulheres, em todo o mundo, morreram vítimas de complicações relacionadas ao ciclo gravídico-puerperal e apenas 15% destas eram oriundas de países desenvolvidos, confirmando que a magnitude desse problema é predominantemente provinda de países em desenvolvimento, onde a cobertura e o acompanhamento no pré-natal, parto e puerpério são insuficientes.1010 Ministério da Saúde (BR): Uma análise da situação e das doenças transmissíveis relacionadas à pobreza. Brasília (DF): Ministério da saúde; 2014.

11 Mota SMM, Gama SG, Theme Filha MM. A investigação do óbito de mulher em idade fértil para estimar a mortalidade materna no Município de Belém, Estado do Pará, Brasil. Epidemiol Serv Saúde [Internet]. 2009 Mar; [cited 2017 Jan 17]; 18(1):55-64. Available from: http://scielo.iec.pa.gov.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-49742009000100006&lng=pt&nrm=iso
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-1212 Xavier SB. Mortalidade materna em Pernambuco: uma revisão de literatura [Monografia]. Recife (PE): Departamento de Saúde Coletiva, Centro de Pesquisas Aggeu Magalhães, Fundação Oswaldo Cruz; 2010.

Ainda segundo a OMS, para o ano de 2013 havia a estimativa de 289.000 mortes maternas em todo o mundo, apesar de tal número apresentar queda de aproximadamente 45% em relação ao ano de 1990, ainda é uma cifra alta, visto que a maioria destes óbitos seriam provavelmente preveníveis se fosse garantido o acesso universal aos serviços de saúde.1313 World Health Organization. World Health statistics [Internet] Geneva; 2014. 180 p. [cited 2017 Sep 28]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/112738/1/9789240692671_eng.pdf
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Apesar do crescente número de estudos relacionados com essa temática, a maior parte é oriunda de populações urbanas, mostrando o quão parcial tem sido a abordagem desse tema, principalmente, no Brasil, um país continental e heterogêneo em que há uma notável distinção entre populações urbanas e rurais. Outro viés, claramente observado, é que poucos estudos epidemiológicos no país consideram a raça, etnia, classe socioeconômica e a cultura em que a mulher está inserida.66 Marcolino DL. Saúde das mulheres indígenas no Brasil: uma revisão integrativa [Trabalho de conclusão de curso de graduação]. Porto Alegre (RS): Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2012.,1414 Chor D. Desigualdades em saúde no Brasil: é preciso ter raça. Cad Saúde Pública [Internet]. 2013 Jul; [cited 2017 Jan 17]; 29(7):1272-5. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2013000700002
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,1515 Coimbra Jr. CEA, Garnelo L. Questões de Saúde Reprodutiva da Mulher Indígena no Brasil. In 2003. p. 1-26. [cited 2017 Sep 28]. Available from: http://www.cesir.unir.br/pdfs/doc7.pdf
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Nota-se que em países onde a diferença econômica, cultural, social e étnica se faz presente é imprescindível estudos que abordem tais variáveis, especialmente, para que se tenha uma visão mais detalhada do contexto de ocorrência da gravidez.

De acordo com dados divulgados pelo Ministério da Saúde, entre os anos 1990 e 2010 foi constatada, no Brasil, redução da MM, de 141 para 68 óbitos por 100 mil nascidos vivos, o que representa uma queda de 51%. Apesar dos avanços identificados, esses dados não são homogêneos territorialmente, nem tampouco segundo variáveis socioeconômicas e étnicas/raciais.11 Ministério da Saúde (BR). Uma análise da situação de saúde e a vigilância da saúde da mulher. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2012.

A Região Norte, em 2013, foi responsável por 232 óbitos maternos na população em geral, porém, só no estado do Pará ocorreram 117 óbitos, denotando insuficiência na qualidade da assistência à mulher no ciclo gravídico-puerperal.1616 Ministério da Saúde (BR). DATASUS.SVS4 Dashboard: Painel de Monitoramento da Mortalidade Materna. [cited 2017 Sep 27]. Available from: http://svs.aids.gov.br/dashboard/mortalidade/materna.show.mtw
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No ano de 2010, o estado do Pará alcançou Razão de Mortalidade Materna (RMM) de 51,91 óbitos por 100.000 nascidos vivos, um dado superior ao preconizado pela OMS, que estabeleceu o índice de até 20 óbitos por 100.000 nascidos vivos.1313 World Health Organization. World Health statistics [Internet] Geneva; 2014. 180 p. [cited 2017 Sep 28]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/112738/1/9789240692671_eng.pdf
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,1717 Botelho NM, Silva IFMM, Tavares JR, Lima LO. Morte materna no estado do Pará: aspectos epidemiológicos. Rev. para. med [Internet]. 2013; [cited 2017 Jan 17]; 27(1). Available from: http://files.bvs.br/upload/S/0101-5907/2013/v27n1/a3503.pdf
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O Pará ainda permanece nos primeiros lugares entre todos os estados brasileiros e, de acordo com estudos realizados na região metropolitana, não houve redução satisfatória da MM ao longo dos anos levantando indagações acerca da efetividade das ações pactuadas para a redução da MM no estado, bem como da vontade política.22 Botelho NM, Silva IFMM, Tavares JR, Lima LO. Causas de morte materna no Estado do Pará, Brasil. Rev Bras Ginecol Obstet [Internet]. 2014 Jul; [cited 2017 Jan 17]; 36(7):290-5. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/SO100-720320140004892
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,1818 Mota SMM, Gama SGN, Theme Filha MM. Mortalidade materna no Município de Belém, Estado do Pará, em 2004: uma avaliação do Sistema de Informações sobre Mortalidade. Epidemiol Serv Saúde [Internet]. 2008 Mar; [cited 2017 Jan 17]; 17(1):33-42. Available from: http://scielo.iec.pa.gov.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1679-49742008000100004&lng=pt&nrm=iso
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,1919 Cordovil I. Hipertensão arterial na gravidez: aspectos práticos. Soc Bras Cardiol [Internet]. [cited 2017 Jan 17]; 2003;16(1). Available from: http://www.rbconline.org.br/artigo/hipertensao-arterial-na-gravidez-aspectos-praticos/
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Nesse contexto, destaca-se que a mulher indígena, está inserida em um grupo populacional com piores condições socioeconômicas, elevadas taxas de fecundidade, prematuro início da vida reprodutiva e períodos intergestacionais curtos, demandando acompanhamento no pré-natal, sobretudo para identificar e monitorar, especialmente, os casos de gravidez de médio e alto risco e, dessa forma, reduzir as complicações na hora do parto e, consequentemente, a mortalidade materna e fetal.66 Marcolino DL. Saúde das mulheres indígenas no Brasil: uma revisão integrativa [Trabalho de conclusão de curso de graduação]. Porto Alegre (RS): Universidade Federal do Rio Grande do Sul; 2012.

Diante do exposto, estabeleceu-se como objetivo geral deste estudo: Analisar a ocorrência da mortalidade materna na população geral e na população indígena, e como objetivos específicos, traçar o perfil epidemiológico e sociodemográfico do óbito materno em mulheres indígenas e não indígenas e estimar a razão de mortalidade materna entre indígenas e não indígenas.

Entende-se que é importante conhecer as especificidades regionais, assim como os diferentes contextos socioepidemiológico de ocorrências da mortalidade materna, com o intuito de subsidiar a operacionalização de políticas em saúde que visem uma melhoria na gestão do serviço e na qualidade da assistência prestada às mulheres.

MÉTODO

O presente estudo foi desenvolvido com abordagem quantitativa, analítica, e retrospectiva, realizado a partir dos dados de mortalidade materna registrados no Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), que foram disponibilizados pela Secretaria de Estado de Saúde Pública do Pará (SESPA), em uma planilha eletrônica destacando o evento segundo a variável raça/cor - indígena e não indígena, na série histórica de 10 anos correspondente ao período 2005-2014. Esses dados foram acrescidos de informações disponíveis no site DATASUS do Ministério da Saúde relativos ao número de nascidos vivos (NV) com vistas ao cálculo RMM.1616 Ministério da Saúde (BR). DATASUS.SVS4 Dashboard: Painel de Monitoramento da Mortalidade Materna. [cited 2017 Sep 27]. Available from: http://svs.aids.gov.br/dashboard/mortalidade/materna.show.mtw
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Foram estabelecidos como critérios de inclusão registros de MM de mulheres com idade entre 10 e 49 anos, residentes no estado do Pará, que evoluíram a óbito entre janeiro de 2005 e dezembro de 2014, de acordo com os critérios estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde (OMS), e com as variáveis raça/cor preenchidas.

Os dados foram agrupados de acordo com o Capítulo XV do CID-10, abrangendo os seguintes grupos: Gravidez que termina em aborto; edema, proteinúria e transtornos hipertensivos na gravidez, no parto e no puerpério; outros transtornos maternos relacionados predominantemente com a gravidez; assistência prestada à mãe por motivos ligados ao feto e à cavidade amniótica e por possíveis problemas relativos ao parto; complicações do trabalho de parto e do parto; complicações relacionadas predominantemente com o puerpério; e outras afecções obstétricas não classificadas em outra parte.

A partir de então, foi realizado o cálculo da RMM, ano a ano, na série de 2005 a 2014. Para melhor visualização dos dados, optou-se pelo agrupamento dos municípios paraenses segundo a regionalização estabelecida para a gestão de saúde. Dessa forma, os 144 municípios estão agrupados em 13 regiões, de acordo com a Resolução nº 0849 CIB-PA. A seguir, foi calculada a RMM específica para cada região, tanto para a população indígena quanto para não indígena. O número de NV com a variável raça/cor não especificada foram excluídos deste cálculo, sendo utilizado para estimar a RMM geral do estado do Pará.

Os dados obtidos foram analisados por meio dos testes estatísticos não paramétricos Qui-quadrado e teste G, para expressar associação entre as variáveis. Utilizou-se o programa BioStat 5.0, observando o p-valor < 0,05. Foram construídos intervalos de confiança individuais para população indígena e não indígena e entre as taxas de razão de mortalidade materna nessas populações e, por fim, para a variável local de ocorrência foram construídos intervalos de confiança com base na proporção de casos. Em todos os cálculos adotou-se intervalos com 95% de confiança. Projeto aprovado no Comitê de Ética em Pesquisa do Curso de Graduação de Enfermagem da Universidade do Estado do Pará, parecer número 1.348.086.

RESULTADOS

Entre o ano de 2005 e 2014, foram notificados 884 óbitos maternos de mulheres indígenas e não indígenas no Pará, com média anual de 88,4 mortes maternas ao ano. Desse total, 97,8% (n = 865) foram correspondentes a população não indígena, com média anual de 86,5 casos. A população indígena correspondeu apenas a 1,5% dos óbitos registrados (n = 13), com média de 1,3 casos ao ano. Seis óbitos maternos tiveram a variável raça/cor não preenchidas e, portanto, foram utilizadas somente para o cálculo da RMM da população total.

De acordo com a Tabela 1, a maior frequência de óbitos maternos na população do estado foi no ano de 2013, com 13% (n = 115) correspondendo a RMM de 82,5 por 100 mil NV, e a segunda maior frequência ocorreu em 2014, com 12,1% dos óbitos (n = 107). Em contrapartida, a menor frequência foi em 2009, com 74 óbitos maternos, correspondendo a 8,4%, com RMM de 51,70 por 100 mil NV. É importante ressaltar que houve um aumento expressivo na RMM nos últimos anos do período considerado neste estudo.

Tabela 1
Razão de Mortalidade Materna de indígenas e não-indígenas no estado do Pará, de janeiro de 2005 a dezembro de 2014. Pará, 2016

No que tange à morte materna da população indígena, foram notificados 13 óbitos, sendo que os anos 2012 e 2013 acumularam os maiores índices com RMM de 249,0 e 248,8 por 100 mil NV, respectivamente. Nos anos de 2006 e 2011, não houve registro de óbito materno indígena, caracterizando uma RMM nula. O número de NV indígenas para o período considerado foi de 9.575, resultando numa RMM de 135,8 por 100 mil NV.

Em relação à população não indígena, foram notificados 865 óbitos maternos, com RMM de 60,7 por 100 mil NV no período de estudo. O ano de 2013 apresentou maior número de mortes maternas, correspondendo a 110 casos (12,9%), com RMM de 80,4 por 100 mil NV. O ano de 2009 apresentou a menor RMM com 51,4 por 100 mil NV, correspondendo a 8,4% dos casos (n = 73) (Tabela 1).

Ao distribuir os óbitos de acordo com o Capítulo XV do CID-10, pôde-se observar que os problemas relacionados a edema, proteinúria e transtornos hipertensivos na gravidez, no parto e puerpério corresponderam a 30,5% (n = 270), seguidas por complicações no trabalho de parto (n = 194) e por complicações relacionadas ao puerpério (n = 149) (Tabela 2).

Tabela 2
Causas de óbitos maternos de indígenas e não indígenas segundo o Capítulo XV do CID-10, Razão de Mortalidade Materna Específica, no estado do Pará, de janeiro de 2005 a dezembro de 2014. Pará, 2016.

De acordo com a Tabela 3, 91,9% (n = 812) dos óbitos ocorreram em ambiente hospitalar, notando-se equivalência para indígenas com 92,3% (n = 12) e não indígenas com 91,8% (n = 794).

Tabela 3
Local de ocorrência de óbitos maternos entre indígenas e não indígenas no estado do Pará, de janeiro de 2005 a dezembro de 2014. Pará, 2016.

Em relação à causa da morte materna na população não indígena, 86,2% (n = 746), tiveram registro de morte obstétrica direta e 12,8% (n = 110), morte obstétrica indireta. Já na população indígena, a totalidade de óbitos correspondem a causa obstétrica direta.

De todos os óbitos, apenas 41,9% (n = 370) tiveram investigação devidamente registrada na ficha síntese, enquanto que 40,5% (n = 358) não foram investigados. É possível identificar maior cuidado desse procedimento na população indígena ao comparar com mulheres não indígenas.

Ao distribuir as mortes maternas por regiões de saúde, verifica-se que elas se concentraram principalmente na Região Metropolitana I (n = 185), seguido pela Região Carajás (n = 111), correspondendo a 20,9% e 12,6%, respectivamente, como observado na Tabela 4. Levando-se em consideração apenas a população indígena, 38,5% (n = 5) concentram-se na Região do Xingu, local distante da capital e com um número considerável de indígena.

Tabela 4
Óbitos maternos de indígenas e não indígenas por Região de Saúde no estado do Pará, de janeiro de 2005 a dezembro de 2014. Pará, 2016.

DISCUSSÃO

A MM é um indicador extremamente sensível em relação à qualidade de vida de uma população, uma vez que se refere a mortes precoces, evitáveis, que em sua quase totalidade atingem as mulheres com menor acesso aos bens sociais, bem como, demonstra a desarticulação, a desorganização e a baixa qualidade da assistência prestada à mulher durante o ciclo gravídico-puerperal.2020 Adomako J, Asare GQ, Ofosu A, Iott BE, Anthony T, Momoh AS, et al. Community-based surveillance of maternal deaths in rural Ghana. Bull World Health Organ [Internet]. 2016 Feb; [cited 2017 Jan 17]; 94(2):86-91. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Adomako+J%2C+Asare+GQ%2C+Ofosu+A%2C+et+al.+Community-based+surveillance+of+maternal+deaths+in+rural+Ghana
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21 Dandona R, Pandey A, Dandona L. A review of national health surveys in India. Bull World Health Organ [Internet]. 2016 Apr; [cited 2017 Jan 17]; 94(2):286-96. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Rakhi+D%2C+Anamika+P%2C+Lalit+Dandona.+A+review+of+national+health+surveys+in+India.+Bull+World+health+Organ
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-2222 Nakimuli A, Nakubulwa S, Kakaire O, Osinde MO, Mbalinda SN, Nabirye RC, et al. Maternal near misses from two referral hospitals in Uganda: a prospective cohort study on incidence, determinants and prognostic factors. BMC Pregnancy Childbirth [Internet]. 2016 Jan; [cited 2017 Jan 17]; 28(16):24. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Maternal+Near+Misses+from+Two+Referral+Hospitals+in+Uganda%3A+A+Prospective+Cohort+Study+on+Incidence%2C+Determinants+and+Prognostic+Factors
https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?ter...

Apesar disso, há, ainda, grandes desafios que superam análises individuais de cada caso e que remetem a uma dimensão maior que é a realidade de vida da população, potencializado pela realidade brasileira, cuja sociedade é composta por múltiplas culturas. Esse cenário remete, portanto, a imperiosidade de estudar os fatores relacionados a MM para a devida formulação de estratégias visando a redução desse evento.22 Botelho NM, Silva IFMM, Tavares JR, Lima LO. Causas de morte materna no Estado do Pará, Brasil. Rev Bras Ginecol Obstet [Internet]. 2014 Jul; [cited 2017 Jan 17]; 36(7):290-5. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/SO100-720320140004892
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25 Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento no Brasil. Objetivos de Desenvolvimento do Milênio. 3º Relatório Nacional de Acompanhamento; 2007. Available from: http://www.pnud.org.br/ODM.aspx
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26 Morse ML, Fonseca SC, Barbosa MD, Calil MB, Eyer FPC. Mortalidade materna no Brasil: o que mostra a produção científica nos últimos 30 anos? Cad Saúde Pública [Internet]. 2011 Apr; [cited 2017 Jan 17]; 27(4):623-38. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2011000400002&lng=en&nrm=iso
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-2727 Organização Mundial da Saúde (OMS). Relatório do Fórum de Mobilização pela Redução da Mortalidade Materna, Infantil e Fetal. 2013 [cited 2017 Jan 17]. Available from: file:///C:/Users/dell/Downloads/relatorio-do-forum-de-mobilizacao-pela-reducao-da--[442-040814-SES-MT].pdf

No Pará, a RMM, calculada a partir dos óbitos maternos ocorridos de janeiro de 2005 a dezembro de 2014, foi de 61,2 óbitos por 100 mil NV. Esse valor é considerado alto, tendo em vista que a média aceitável é entre 10 e 20 mortes por 100 mil NV.2828 World Health Organization (WHO). Trends in Maternal Mortality: 1990 to 2013. Estimates by WHO, UNICEF, UNFPA, The World Bank and the United Nations Population Division. World Health Organization; 2014 [Internet]. [cited 2017 Jan 17]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/112682/2/9789241507226_eng.pdf?ua=1
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É importante destacar que o valor da RMM da população total não tem uma acentuada diferença no que tange a média nacional, que é de 69 óbitos maternos por 100 mil NV,2828 World Health Organization (WHO). Trends in Maternal Mortality: 1990 to 2013. Estimates by WHO, UNICEF, UNFPA, The World Bank and the United Nations Population Division. World Health Organization; 2014 [Internet]. [cited 2017 Jan 17]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/112682/2/9789241507226_eng.pdf?ua=1
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porém, apesar das taxas estarem próximas, as regiões Norte e Nordeste, ainda assim, lideram os primeiros lugares com as maiores RMM.2626 Morse ML, Fonseca SC, Barbosa MD, Calil MB, Eyer FPC. Mortalidade materna no Brasil: o que mostra a produção científica nos últimos 30 anos? Cad Saúde Pública [Internet]. 2011 Apr; [cited 2017 Jan 17]; 27(4):623-38. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-311X2011000400002&lng=en&nrm=iso
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,2929 Teixeira NZF, Pereira WR, Barbosa DA, Vianna LAC. Mortalidade materna e sua interface com a raça em Mato Grosso. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2012;12(1):27-35.

Entre os anos de 2005 e 2012, nota-se que não houve variação importante, sobretudo, entre os anos de 2006 e 2010. Em contrapartida, nos anos dois últimos anos a RMM, teve seus valores mais altos, 82,5 e 74,8, respectivamente. Tal fato pode ser causado não necessariamente pelo aumento dos óbitos maternos nessa região, mas sim, pela melhora da notificação desses óbitos, tendo em vista que o denominador, NV, não sofreu modificações importantes nos últimos anos deste estudo.

A população indígena teve RMM 2,4 vezes maior que a RMM da população não indígena, sendo o valor mais discrepante em 2012, cuja diferença chegou a ser 4,02 vezes maior, resultados similares aos encontrados em Mato Grosso.2929 Teixeira NZF, Pereira WR, Barbosa DA, Vianna LAC. Mortalidade materna e sua interface com a raça em Mato Grosso. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2012;12(1):27-35. Apesar da população indígena ter uma contribuição equivalente a 1,5% de todos os óbitos maternos do estado, esse valor é significativo, pois, a população total indígena do Pará corresponde a somente 0,7% (cerca de 51 mil).3030 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). População residente, segundo a situação do domicílio e condição de indígena - Brasil 1991/2010 [Internet]. 2010; [cited 2015 Aug 9]. Available from: http://indigenas.ibge.gov.br/graficos-e-tabelas-2.html
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Dificuldade no acesso aos serviços básicos e especializados de saúde, baixa qualidade no atendimento e falta de capacitação dos profissionais voltados para atender aos riscos específicos aos quais mulheres indígenas estão expostas, são os principais motivos para o alto índice.2929 Teixeira NZF, Pereira WR, Barbosa DA, Vianna LAC. Mortalidade materna e sua interface com a raça em Mato Grosso. Rev Bras Saúde Mater Infant. 2012;12(1):27-35.

Quanto a distribuição de óbitos, conforme o Capítulo XV do CID-10, os problemas relacionados a edema, proteinúria e transtornos hipertensivos na gravidez, no parto e puerpério (CID O10-O16) se destacaram em relação às demais, equivalendo a um número absoluto de 270 (30,5%) casos, resultado semelhantes aos de outros estudos.3131 Lindam A, Johansson S, Stephansson O, Wikström AK, Cnattingius S. High Maternal Body Mass Index in Early Pregnancy and Risks of Stillbirth and Infant Mortality-A Population-Based Sibling Study in Sweden. Am J Epidemiol [Internet]. 2016 Jul; [cited 2017 Jan 9]; 184(2):98-105. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=High+Maternal+Body+Mass+Index+in+Early+Pregnancy+and+Risks+of+Stillbirth+and+Infant+Mortality%E2%80%94A+Population-Based+Sibling+Study+in+Sweden
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32 Mwaniki MK, Baya EJ, Mwangi-Powell F, Sidebotham P. 'Tweaking' the model for understanding and preventing maternal and neonatal morbidity and mortality in Low Income Countries: "inserting new ideas into a timeless wine skin". BMC Pregnancy Childbirth [Internet]. 2016 Jan; [cited 2017 Jan 9]; 16:14. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Mwaniki+MK%2C+Baya+EJ%2C+Mwangi+PF%2C+Sidebotham+P.+BMC+Pregnancy+Childbirth.+%5BInternet%5D2016+%5Bcited+2017+Jan+9%5D%3B16%3A14.+Available+from%3A+doi%3A10.1186%2Fs12884-016-0803-5
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33 Ntambue AM, Malonga FK, Dramaix-Wilmet M, Ngatu RN, Donnen P. Better than nothing? maternal, newborn, and child health services and perinatal mortality, Lubumbashi, democratic republic of the Congo: a cohort study. BMC Pregnancy Childbirth [Internet]. 2016 Apr; [cited 2017 Jan 9]; 16:89. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Better+than+nothing%3F+maternal%2C+newborn%2C+and+child+health+services+and+perinatal+mortality%2C+Lubumbashi%2C+Democratic+Republic+of+the+Congo%3A+a+cohort+study
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-3434 Nascimento FM, Dantas MFS, Bezerra RLA, Nery IS. Perfil da mortalidade materna em maternidade pública de Teresina - PI, no Período de 1996 a 2000: uma Contribuição da Enfermagem. Esc Anna Nery [Internet]. 2007 Sep; [cited 2017 Jan 9]; 11(3):472-8. Available from: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1414-81452007000300012&lng=en&nrm=iso. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-81452007000300012
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Nesse conjunto estão, predominantemente, as doenças hipertensivas. Complicações no trabalho de parto, cujo número absoluto foi de 194 (CID O60 - O75) e complicações relacionadas ao puerpério (n = 149) (CID O85-O92), também tiveram um valor bastante significativo. Resultado semelhante encontrado em estudo de revisão sistemática, que identificou as principais causas de morte materna como a Hipertensão arterial, infecção puerperal e hemorragias, sendo que a maioria dos artigos relacionados a fatores risco eram do continente africano com 29 artigos e a América Latina representou apenas 13,8% de artigos com essa abordagem.3535 Reis LGC. Eventos adversos durante o trabalho de parto e o parto em serviços obstétricos: desenvolvimento e aplicação de método de detecção [Dissertação]. Rio de Janeiro (RJ): Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca; 2012.

Esse resultado converge, com estudo3636 Nakimuli A, Nakubulwa S, Kakaire O, Osinde MO, Mbalinda SN, Kakande N, et al. The burden of maternal morbidity and mortality attributable to hypertensive disorders in pregnancy: a prospective cohort study from Uganda. BMC Pregnancy Childbirth [Internet]. 2016 Aug; [cited 2015 Aug 9]; 16:205. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=The+burden+of+maternal+morbidity+and+mortality+attributable+to+hypertensive+disorders+in+pregnancy%3A+a+prospective+cohort+study+from+Uganda
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realizado em Uganda, em que a razão de desfecho materno grave específica foi de 9,37 por 1.000 NV para todos os transtornos hipertensivos, concluiu-se que existe alta morbidade atribuível aos transtornos hipertensivos na gravidez, os pesquisadores destacaram que algumas das complicações associadas à morbidade podem ser reconhecidas precocemente, é possível prevenir a morbidade grave por meio da intervenção precoce com parto, terapia anti-hipertensiva e tratamento profilático com sulfato de magnésio.

Isto mostra a real necessidade de ações imediatas dos organismos e saúde no que tange a priorização da assistência pré-natal, visando a melhoria das condições de saúde locais, sobretudo, às populações mais vulneráveis, pois sabe-se que dessa forma pode-se contribuir para a detecção de gravidez de risco e prevenção das complicações relacionadas à mesma, evitando morte materna.33 Ferraz L, Bordignon M. Mortalidade materna no Brasil: uma realidade que precisa melhorar. Rev Baiana Saúde Pública [Internet]. 2012; [cited 2017 Jan 17]; 36(2):527-38. Available from: http://rbsp.sesab.ba.gov.br/index.php/rbsp/article/view/474
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,88 United Nations. Sustainable Development Goals. 2015 [Internet]. New York: United Nations; 2015; [cited 2017 Jan 17]. Available from: https://sustainabledevelopment.un.org
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,1313 World Health Organization. World Health statistics [Internet] Geneva; 2014. 180 p. [cited 2017 Sep 28]. Available from: http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/112738/1/9789240692671_eng.pdf
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,1717 Botelho NM, Silva IFMM, Tavares JR, Lima LO. Morte materna no estado do Pará: aspectos epidemiológicos. Rev. para. med [Internet]. 2013; [cited 2017 Jan 17]; 27(1). Available from: http://files.bvs.br/upload/S/0101-5907/2013/v27n1/a3503.pdf
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,3737 Gastaud ALGS. A mortalidade materna e a mortalidade infantil em Mato Grosso do Sul, Brasil, de 2000 a 2002. 2007 [Tese]. Campo Grande: Universidade Federal de Mato Grosso do Sul; 2007.

38 Souza FFB, Borges AKP, Silva DS, Yan L. Levantamento das doenças nos indígenas da ilha do Bananal, 2003-2013. In: 10 Seminário de Iniciação Científica da UFT; 2014 Nov 25-28; Palmas, TO, Brasil. 5 p.

39 Ferreira MEV, Matsuo T, Souza RKT. Aspectos demográficos e mortalidade de populações indígenas do Estado do Mato Grosso do Sul, Brasil. Cad Saúde Pública. 2011;27(12):2327-39.
-4040 Moran M. The Grand Convergence: Closing the Divide between Public Health Funding and Global Health Needs. PLoS Biol [Internet]. 2016 Mar; [cited 2017 Jan 9]; 14(3):e1002363. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Moran+M.+The+Grand+Convergence%3A+Closing+the+Divide+between+Public+Health+Funding+and+Global+Health+Needs. doi: 10.1371/journal.pbio.1002363
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Houve predominância (86,2%) de mortes maternas por causas obstétricas diretas - 100% se tratando especificamente da população indígena -, confirmando a permanência de importantes entraves que impossibilitam a redução da RMM no estado, como a carência do planejamento familiar e a assistência pré-natal inadequada. No que tange às mortes por causas indiretas, a superlotação no serviço hospitalar de referência, muitas vezes, presente apenas nas regiões de maior porte, bem como as deficiências estruturais e ausência de pessoal qualificado, acarretam na precariedade no atendimento às gestantes e puérperas gerando morte materna.55 Carreno I, Bonilha ALL, Costa JSD. Perfil epidemiológico das mortes maternas ocorridas no Rio Grande do Sul, Brasil: 2004-2007. Rev Bras Epidemiol [Internet]. 2012 Jan; [cited 2017 Jan 17]; 15(2):396-406. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S1415-790X2012000200017
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Comparando as taxas de mortalidade materna no estado no Pará com outros estados, é possível identificar dois pontos importantes, o sub-registro e a subinformação deste evento no Pará, posto que, estudos realizados em outras regiões, onde os estados apresentam um padrão socioeconômico mais desenvolvido e fazem um trabalho de investigação do óbito materno por meio dos Comitês de Mortalidade Materna (CMM), identificaram que a RMM é superior à observada no Pará, refletindo melhor vigilância do óbito materno nessas localidades, em detrimento das demais regiões.55 Carreno I, Bonilha ALL, Costa JSD. Perfil epidemiológico das mortes maternas ocorridas no Rio Grande do Sul, Brasil: 2004-2007. Rev Bras Epidemiol [Internet]. 2012 Jan; [cited 2017 Jan 17]; 15(2):396-406. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S1415-790X2012000200017
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,4040 Moran M. The Grand Convergence: Closing the Divide between Public Health Funding and Global Health Needs. PLoS Biol [Internet]. 2016 Mar; [cited 2017 Jan 9]; 14(3):e1002363. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Moran+M.+The+Grand+Convergence%3A+Closing+the+Divide+between+Public+Health+Funding+and+Global+Health+Needs. doi: 10.1371/journal.pbio.1002363
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41 Melo ECP, Knupp VMAO. Mortalidade materna no município do Rio de Janeiro: magnitude e distribuição. Esc Anna Nery. 2008;12(4):773-80.

42 Novo JLVG, Gianini RJ. Mortalidade materna por eclâmpsia. Rev Bras Saúde Mater Infant [Internet]. 2010 Apr; [cited 2017 Sep 27]; 10(2):209-17. Available from: http://dx.doi.org/10.1590/S1519-38292010000200008
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-4343 Souza J. Mortalidade materna e desenvolvimento: a transição obstétrica no Brasil. Rev Bras Ginecol Obstet [Internet]. 2013; [cited 2017 Sep 27]; 35(12):533-5. Available from: http://www.scielo.br/pdf/rbgo/v35n12/01.pdf
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Também, de acordo com estudo4444 Jenny LS, Robin LD. Preeclampsia, of mice and women. Physiological Genomics. [Internet] 2016 Aug; [cited 2017 May 9]; 48(8):565-72. Available from: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/?term=Preeclampsia%2C+of+mice+and+women.+Physiological+Genomics. DOI: 10.1152/physiolgenomics.00125.201
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realizado nos Estados Unidos, é importante gerenciar e tratar a Pré-eclâmpsia para evitar perdas maternas e fetais, sendo essa considerada pelos pesquisadores uma desordem devastadora da gravidez que afeta até 8% das mulheres grávidas nos Estados Unidos.

Do total de óbitos estudados, apenas 41,9% foram investigados conforme preconiza a Política de Saúde. Isso mostra a necessidade de implementação de medidas para a redução da MM no estado do Pará mediante a identificação dos fatores desencadeantes dessas mortes, bem como a atuação dos Comitês de Mortalidade Materna na investigação sistemática dos óbitos maternos.88 United Nations. Sustainable Development Goals. 2015 [Internet]. New York: United Nations; 2015; [cited 2017 Jan 17]. Available from: https://sustainabledevelopment.un.org
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Trata-se de uma medida importante para oferecer subsídios para as políticas públicas de prevenção do óbito materno por meio da melhoria da qualidade da assistência à gravidez, parto e puerpério nas diversas regiões do estado.

As Regiões de Saúde Marajó I e Marajó II, responsáveis por 92,1 e 90,0 óbitos maternos para cada mil NV, respectivamente, apresentam mais baixas condições de vida e muita dificuldade de acesso aos serviços de saúde em razão das características geográficas, pois se trata de população ribeirinha. Nessa região encontramos municípios com os menores índices de desenvolvimento humano do país.3030 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). População residente, segundo a situação do domicílio e condição de indígena - Brasil 1991/2010 [Internet]. 2010; [cited 2015 Aug 9]. Available from: http://indigenas.ibge.gov.br/graficos-e-tabelas-2.html
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É importante ressaltar que no estado há características populacionais muito díspares, com cobertura populacional de 43% pela Estratégia Saúde da Família, mesmo que bastante heterogênea. Muitas vezes, o acesso aos serviços de saúde é inviabilizado porque são proporcionados somente nos municípios de maior porte e ainda que de forma deficiente.

Embora apresente um vasto panorama da MM no Pará, as possíveis limitações deste estudo dizem respeito à subnotificação e/ou incompletudes no Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM).

CONCLUSÃO E IMPLICAÇÕES PARA PRÁTICA

Neste estudo foi possível identificar que a mortalidade materna ainda é um grave problema de saúde pública no estado do Pará, haja vista que o valor médio da RMM é muito significativo, principalmente, na população indígena. A MM atinge mulheres jovens, com baixa escolaridade e tem ocorrência significativa na área hospitalar com predomínio das causas diretas. Ressalta-se que, apenas 42% de todos os óbitos foram investigados de forma correta, mostrando que a MM no estado ainda não é tema prioritário e, dessa forma, carece de maior investigação.

Diante disso, é fundamental não medir esforços para a redução da morte materna no Pará tendo em vista que são evitáveis a partir de medidas preventivas básicas, tais como: um pré-natal de qualidade, qualificação profissional, melhora da estrutura assistencial e de cobertura.

É importante destacar a necessidade de elaborar estudos mais específicos relacionando as causas de mortalidade materna e as questões raciais para que sejam criadas e aperfeiçoadas as formas de redução de mortalidade materna para o grupo mais suscetível.

Assim, faz-se necessário a implementação das ações na atenção primária em saúde, no período gestacional, tendo em vista o predomínio de óbitos por causas evitáveis, especialmente da população indígena.

Foi encontrado alto percentual de dados ignorados no SIM em diversas variáveis, o que evidencia limitação do Sistema de Informação. Dessa forma, o registro dos dados nestas bases de notificação no Brasil, sobretudo no estado do Pará, é questionável, devido ao déficit de treinamento dos profissionais, fato que causa um preenchimento incorreto, gerando má qualidade de informações.

Apesar das limitações, as informações encontradas nesta pesquisa podem contribuir para subsidiar a formulação de estratégias visando a redução imediata da RMM em todo o estado, permitindo refinar o foco de atenção para áreas prioritárias que carecem de intervenção, demonstrando claramente que as mulheres grávidas, especialmente, dos povos indígenas do estado do Pará, requerem maior cuidado tendo em vista índices mais elevados na RMM.

REFERENCES

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    2017

Histórico

  • Recebido
    04 Jun 2017
  • Aceito
    28 Ago 2017
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