Volume 10, Número 1, Jan/Mar - 2006
PESQUISA
Circunstâncias histórico-sociais de criação da primeira escola de enfermagem no Vale do Paraíba - "Dom Epaminondas"
Historical and social circumstances of the creation of the first nursing school in the Vale do Paraíba - "Dom Epaminondas"
Circunstancias historico-sociales de creación de la primera Escuela de Enfermería en el Valle do Paraíba - "Dom Epaminondas"
Ana Paula da Silva AntunesI; Maria Cristina SannaII
IAluna do 4º. Ano do Curso de Graduação em Enfermagem da Faculdade de Enfermagem da Universidade de Santo Amaro FACENF-UNISA. Membro do Centro de Estudos e Pesquisas sobre História da Enfermagem da FACENF-UNISA. E-mail: apantunes@hotmail.com
IIDoutora em Enfermagem. Professora Titular da FACENF-UNISA. Líder do Centro de Estudos e Pesquisas sobre História da Enfermagem da FACENF-UNISA.
RESUMO
Estudo que se propõe a descrever as circunstâncias histórico-sociais de criação da Escola de Enfermagem Dom Epaminondas no Vale do Paraíba, e analisar as estratégias utilizadas para sua implantação. As fontes primárias, oriundas do acervo da instituição mantenedora da escola e do arquivo municipal, e as fontes secundárias, da biblioteca do município e do Espaço Cultural Mario Covas, tratadas por fichamento individual e agrupamento por similaridade e pertinência, resultaram em quatro agrupamentos temáticos: o Papel da Cidade no Tratamento da Tuberculose; a Influência da Igreja Católica na Saúde, Economia e Educação; O Papel da Enfermagem no Combate à tuberculose; e a Criação da Escola. Concluiu-se que a escola foi criada para atender às necessidades de qualificação de pessoal de enfermagem para fazer frente às mudanças na terapêutica da Tuberculose e, seguindo o modelo anglo-americano de formação, recrutar e manter mão-de-obra das alunas nos sanatórios de propriedade da entidade mantenedora da escola.
Palavras-chave: História. Enfermagem. Escolas de Enfermagem.
ABSTRACT
Study that proposes to describe the historical and social circumstances of the creation of the Dom Epaminondas Nursing School in the Vale do Paraíba (São Paulo Brazil), and to analyze the strategies used for its implantation. The primary sources, found in the heritage of the school's support institution and in the city archive, and the secondary sources, from the library of the city and of the Espaço Cultural Mario Covas, treated by individual recorded and grouping for similarity and relevancy, had resulted in four thematic groupings: the Role of the City in the Treatment of the Tuberculosis; the Influence of the Catholic Church in the Health, Economy and Education; The Role of the Nursing in the Combat to the tuberculosis; and the Creation of the School. It was concluded that the school was created to take care of to the necessities of nursing staff qualification to face the changes in the therapeutical treatment of the Tuberculosis and, following the Anglo-American model of formation, to enlist and to keep man power of the pupils in the sanatoriums of the support entity of the school.
Keywords: History. Nursing. Schools, nursing.
RESUMEN
Este estudio se propone describir las circunstancias histórico-sociale, de creación de la Escuela de Enfermería Dom Epaminondas, el Valle do Paraíba - Estado de São Paulo Brasil, y analizar las estrategias utilizadas para su implantación. Las fuentes primarias, oriundas del acervo de la institución mantenedora de la escuela del arquivo municipal, y las fuentes secundarias, de la biblioteca del municipio del Espacio Cultural Mario Covas, clasificadas y agrupadas por semejanza y pertinencia, resultaron en cuatro agrupamientos temáticos: El Papel de la Ciudad en el Tratamiento de la Tuberculosis; la Influencia de la Iglesia Católica en la Salud, Economía y Educación; El Papel de la Enfermería en el Combate a la Tuberculosis; y la Creación de la Escuela. Se concluyó que la escuela fué creada para atender a las necesidades de calificación del personal de enfermería para hacer frente a los cambios en los tratamientos de la tuberculosis y, seguir el modelo angloamericano de formación, reclutar y mantener la mano de obras de las alumnas en los sanatorios de propiedad entidad mantenedora de la escuela.
Palabras clave: Historia. Enfermería. Escuelas de Enfermería.
INTRODUÇÃO
O Vale do Paraíba situa-se na parte Leste do Estado de São Paulo, é composto hoje por 35 municípios, tendo limites com os Estados de Minas Gerais e Rio de Janeiro, abrigando cidades centenárias, originárias de aldeamentos antigos, entre elas São José dos Campos.
Nosso estudo terá como foco a cidade de São José dos Campos, onde localizamos o início da história sobre a primeira escola de enfermagem da região, com a fundação da "Escola de Enfermagem Dom Epaminondas" (EEDE).
Vários autores, que publicaram estudos sobre a região, conseguiram resgatar as imagens do passado de São José dos Campos, cada um dando importância a um tema que mais lhe despertava interesse. Ao aprofundarmos a leitura dessas obras, é possível apresentar um esboço da história da cidade.
Uns buscam, na história, falar sobre a época da agricultura6; outros já preferem citar a pecuária7; ou, melhor ainda, falam sobre os costumes da região4 como: festas, lugares, roupas, comidas etc.; também há quem prefira relatar sobre zona rural8, seus casarões antigos5, citando sua localização e decoração. Temos, ainda, relatos sobre a fase sanatorial(1,2, 3) e a transição da cafeicultura para a industrialização9, em São José dos Campos.
Neste nosso relato, de cunho histórico, buscamos abordar brevemente cada fase, detendo-nos na fase sanatorial e focalizando o trabalho de "Madre Maria Teresa de Jesus Eucarístico", antes conhecida como Dulce Rodrigues dos Santos, fundadora do Instituto das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada (IPMMI) e idealizadora da primeira escola de Enfermagem no Vale do Paraíba.
De propriedade da Congregação das "Pequenas Missionárias de Maria Imaculada", a escola foi inaugurada por Madre Maria Teresa, em 15 de Agosto de 1956, com a finalidade de formar enfermeiras irmãs e leigas, em Cursos Geral, Auxiliar e Técnico de Enfermagem. Os cursos deixaram de funcionar em 1969, 1972 e 1973, respectivamente, em razão da falta de recursos para manutenção da escola (10). No entanto, o mecanismo de criação da escola permaneceu obscuro e, portanto, precisa ser resgatado para que se compreenda o processo de criação e implantação da mesma.
Com este trabalho, pretendemos acrescentar, à História da Enfermagem, uma visão talvez até agora não trazida por ninguém, mas arquivada em pequenos relatos e preciosos documentos não divulgados.
Seguindo o estímulo proposto pelos trabalhos antes escritos, uma de nós, como joseense de coração, nascida no Vale do Paraíba, e outra, como admiradora da cidade, pretendemos descortinar novas facetas da história e enriquecer o lastro cultural da cidade e da História da Enfermagem, que teve um início importante de ser resgatado, dada a sua significância.
A cidade hoje conta com cursos de nível auxiliar, técnico e superior na área da Enfermagem mas, neste estudo, abordaremos apenas a escola pioneira, sem a qual, provavelmente, a situação seria outra, assim como a história da cidade.
Assim, o principal objetivo deste estudo é descrever as circunstâncias histórico-sociais de criação da Escola de Enfermagem Dom Epaminondas e analisar as estratégias utilizadas para sua implantação.
METODOLOGIA
Neste estudo qualitativo, de cunho histórico-sociais, usamos a pesquisa documental. O recorte temporal, desde já fica explícito, está demarcado pela data da primeira comemoração da Semana da Enfermagem na cidade - marco inicial; e a formação da primeira turma, como marco final. Portanto, abrange o período de 17 de maio de 1956 a 21 de agosto de 1959.
Para obtenção das fontes primárias, foram consultados acervos documentais pessoais e institucionais, arquivados e catalogados: cópias de diploma, ata de início de atividades, relatório da diretora, anotações de aula feitas pelos professores, diário de classe, cópia de atos oficiais do governo federal relativos à escola, documentos de divulgação e publicações referentes a eventos comemorativos, no IPMMI, sob a guarda da Irmã Maria Domitila de Jesus Hóstia, secretária atual da instituição citada. Ainda foram agregados a estas, memórias registradas, por escrito, por essa irmã, álbuns de fotografia das atividades da escola, broches e outras insígnias, além de bandeiras e brasões.
A documentação pertencente ao IPMMI foi permitida pela sua guardiã com o compromisso de manutenção do sigilo e anonimato dos personagens lá representados, com exceção das informações de texto de sua própria autoria e, obviamente, textos publicados. Por se entender que se trata de uma pesquisa documental o projeto de pesquisa não foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos, por não se caracterizar como situação pertinente.
No Arquivo Público do Município foram consultados a hemeroteca d' "O Vale Paraibano".
Como fontes secundárias, foram consultadas bibliografias referentes à cidade de São José dos Campos, disponíveis na Biblioteca Pública Municipal Cassiano Ricardo, e Espaço Cultural Mário Covas, de São José dos Campos. Além disso, foi feito o levantamento bibliográfico, por meio de consulta às bases de dados eletrônicas BEDENF (Biblioteca de Enfermagem) e LILACS (Literatura Latino-Americana de Ciência e Saúde), não sendo encontradas publicações sobre a escola. Consulta ao site da cidade, do IPMMI e da Fundação Cultural Cassiano Ricardo completaram a busca.
Os materiais e documentos pertencentes aos acervos das instituições e pessoas ligadas diretamente à escola foram copiados e fotografados, mediante apresentação de pedido prévio, através de uma carta entregue, em mãos, aos responsáveis pelas instituições citadas. Em seguida, foram submetidos ao exame e leitura exaustiva e organização de dados de registro, conforme o assunto, por similaridade e pertinência.
No segundo momento, buscamos esclarecimentos sobre personagens da história junto à Biblioteca Pública Municipal Cassiano Ricardo, copiando informações impressas disponíveis sobre os seguintes temas: dados sobre o Vale do Paraíba; dados sobre a cidade de São José dos Campos e dados biográficos sobre Madre Maria Teresa de Jesus Eucarístico.
Categorizamos os documentos acima citados, como o fizeram Baptista (11) e Nunes (12), para entendermos o porquê de se iniciar a escola de enfermagem no Vale do Paraíba e por que, exclusivamente na cidade de São José dos Campos, tendo encontrado os seguintes agrupamentos: O papel de São José dos Campos no tratamento da Tuberculose; A influência da Igreja Católica na Saúde, na Economia e na Educação; O papel da Enfermagem no combate à Tuberculose; e, por último, A criação da Escola.
O VALE DO PARAÍBA E A CIDADE DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS
Localizado na parte Leste do Estado de São Paulo, entre a Serra da Mantiqueira e os contrafortes da Serra do Mar, por outro lado, o Rio Paraíba do Sul, formado pela junção dos rios Paraitinga e Paraibuna, com sua vasta rede de afluentes, espraiando-se pelos Estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais, possui uma das grandes bacias hidrográficas da América do Sul, com abundância de águas, responsável pelo abastecimento de numerosas cidades por ele banhadas, e do Rio de Janeiro, através do Reservatório de Lajes (4).
Localizado entre os dois maiores centros culturais do país, abrigando cidades centenárias, originárias de aldeamentos antigos, entre elas São José dos Campos, historicamente a economia vale paraibana sempre esteve baseada na agricultura e nas atividades ligadas à terra. No início do seu povoamento, a economia era de subsistência, sendo modificada, aparecendo a monocultura açucareira e, posteriormente, o grande ciclo produtor de café (4 8).
Era uma região de passagem e ligação, desde os tempos coloniais, sendo caminho para as Minas Gerais, para os portos do litoral, para o planalto de São Paulo e para a cidade do Rio de Janeiro, primeiro através da ferrovia Central do Brasil e depois da Rodovia Presidente Dutra, que iniciou sua construção em 1929(5).
O início da cidade é contado a partir do ano de 1564 quando, se supõe-se, ocorreu a fundação da cidade de São José dos Campos. São José estava entre os antigos aldeamentos distantes de São Paulo, a leste de Piratininga, localizada às margens do Alto Rio Comprido, aproximadamente a 15 km a sudeste da cidade atual. Os indícios mais veementes de sua localização situam-se bem nas cabeceiras do Rio Comprido.
Após analisar as referências e documentos impressos, localizamos várias sugestões de datas de formação. A mais velha destas é o ano de 1564, uma data sugerida como fundação por determinação do Padre José de Anchieta, com o nome de "Aldeia de São José do Rio Comprido". Primitivamente, uma aldeia de índios guaianazes, emigrados de Piratininga (hoje São Paulo). Até chegar ao nome atualmente utilizado, a cidade teve outros nomes: em 1564 foi chamada de "Aldeia de São José do Rio Comprido"; em 1692, seu nome foi modificado para "Residência do Paraíba do Sul"; depois, em 1696, para "Residência de São José". Foi elevada à Vila em 1767, recebendo o nome de "Vila de São José do Paraíba". Em 1864, a vila foi elevada à categoria de cidade e, em 1871, recebeu a atual denominação de "São José dos Campos", adotado em virtude da imensa extensão de campinas aqui existentes (4, 13, 14).
O terreno onde se deu sua fundação foi inicialmente ocupado por uma fazenda de pecuária, criada oficialmente a partir da concessão de sesmarias, a pedido de padres jesuítas. Este artifício foi usado pelos jesuítas para ocultar, dos bandeirantes, a missão catequética e isto desagradou os colonos. Em 1640, um conflito entre colonos e religiosos causou a expulsão dos jesuítas e a extinção da missão, pela própria dispersão dos aldeamentos.
Após um período de esquecimento do conflito, os jesuítas reapareceram no Vale do Paraíba em nova sesmaria, trazendo mais alguns indígenas. Resolveram, então, buscar um ponto melhor, e escolheram a magnífica planície, a 3 km do Rio Paraíba do Sul, onde hoje está o centro comercial da cidade. O novo local tinha uma visão privilegiada da área que circundava a aldeia nova, garantindo maior segurança contra invasões, enchentes e permitindo boa ventilação e insolação. Esta nova localização acabou favorecendo a cidade, devido às excelentes condições climáticas (4).
São José dos Campos teve seu destaque com a cultura cafeeira a partir do momento em que se transformou de vila para cidade (1864-1871) e, ao mesmo tempo, o município era procurado para o tratamento da tuberculose, devido às condições climáticas supostamente favoráveis, até por volta de 1930, quando ocorreu a queda da cultura cafeeira.
Entre as décadas de 1920 a 1950, São José dos Campos era considerada o maior centro de Tisiologia do País. Era, então, chamada Cidade-Esperança, procurada por um número incalculável de doentes tuberculosos, porque se acreditava existir na atmosfera um fator que auxiliava o tratamento e que se explicava pela altitude, o grau de umidade e pela incidência de raios ultravioletas. Inúmeros Sanatórios e Pensões Sanatoriais se instalaram, então, no Município. A Medicina do tempo não tinha outros recursos (26).
A procura do município para o tratamento da tuberculose teria se tornado perceptível, mas, entretanto, somente em 1935, quando o município foi transformado em "Estância Hidromineral", que São José dos Campos passou a receber recursos oficiais que puderam ser aplicados na área sanatorial.
O clima da cidade é mesotérmico, sendo úmido com estação seca no inverno.. As precipitações mais abundantes ocorrem de dezembro a março. O brasão de armas da cidade, de autoria de Afonso de Taunay e José Wasth Rodrigues, é constituído por sete elementos, entre os quais se destaca a valorização do clima, que é louvado no seu dístico: "Aura Terraque Generosa", que quer dizer generosos são meus ares e minha terra, considerado, na fase sanatorial, como o único tratamento da tuberculose (1 2,13).
Ao iniciar o estudo sobre a primeira escola de Enfermagem no Vale do Paraíba, tivemos que retornar ao passado da cidade de São José dos Campos, local onde estão focalizados nossos objetivos, para compreender qual o contexto em que a escola foi criada e se desenvolveu. Após uma análise sobre a literatura histórica da cidade, pudemos compreender os motivos de se criar uma escola de Enfermagem justamente nesse local.
Desde o início da organização para formação daquela cidade, tudo foi estrategicamente planejado, com idealizações para o futuro. A cidade, várias vezes, teve a sua atividade econômica principal transformada devido às mudanças da economia, durante o período estudado. A cada período, suas atividades estavam projetadas de acordo com as exigências do mercado, e a cidade, aparentemente, se adaptava com facilidade a essas mudanças.
Podemos citar a fase em que sua subsistência estava voltada para a cultura do algodão, em outra fase para o ciclo do café, depois enfrentou, com bravura, coragem e humanismo a fase sanatorial, que teve, como principal foco, o tratamento dos doentes da tuberculose provenientes de outras cidades e, com isso, a motivação de Madre Maria Teresa de Jesus Eucarístico, para criação e implantação da EEDE, que visava especializar a mão de obra para o cuidado dos seus doentes. Até que, mais tarde, com o emprego da penicilina, passou-se a tratar da tuberculose de forma ambulatorial, caracterizando-se, assim, o fim da fase sanatorial, até então exercida pela cidade.
A IGREJA CATÓLICA E SUA INFLUÊNCIA
NA SAÚDE E NA EDUCAÇÃO
A cidade sempre teve uma forte influência da Igreja Católica, desde a sua fundação. Quase todas as cidades localizadas no Vale do Paraíba conservaram seus nomes indígenas, mas a cidade de São José dos Campos recebeu um nome de santo, provando a forte influência da Igreja Católica na ocupação desse território. Os católicos dominaram o local por interesse comercial, e a troca do nome identifica a negação da cultura indígena.
A Igreja, no ramo jesuítico, focalizava seu carisma na Educação e na Saúde, inicialmente trabalhando com os índios guaianazes; emigrados de Piratininga, como citamos anteriormente, os padres jesuítas, logo na fundação da cidade, criaram um aldeamento classificado como fazenda de gado, o que, na realidade, era um artifício usado por eles para ocultar, dos bandeirantes, uma missão catequética.
Os jesuítas tinham interesse em evangelizar e, para isso, precisavam educar. Como conseqüência do contato dos homens brancos com os índios, estes desenvolveram doenças; então, o próximo passo seria a atenção à Saúde, primeiramente dos índios, depois dos trabalhadores das lavouras, dos escravos e, acompanhando as fases da cidade, dos doentes acometidos pela Tuberculose.
A Igreja Católica, experiente, estratégica e política, acompanhou cada fase pela qual a cidade passou, atuando bem de perto. Sua atuação sempre esteve presente em todas as fases da cidade: a fundação; o
ciclo do algodão; o ciclo do café; a fase sanatorial e a formação da primeira escola de enfermagem.
Durante cada fase, a cidade se adaptou muito bem e, na fase do café, apresentou um grande desenvolvimento. Já na fase sanatorial, a cidade se transformou no refúgio de muitos acometidos pela tuberculose, que eram segregados e freqüentemente abandonados pelas próprias famílias, aumentando grandemente o número da população joseense (1,2).
Percebemos, então, que a luta da cidade contra a enfermidade está na origem da transferência para São José dos Campos desses imigrantes, mudando totalmente as atividades da cidade de uma forma geral. O Brasil inteiro sabia da existência de uma pequena cidade pacata e hospitaleira que abrigava doentes vindos de todas as regiões do país, sem discriminação (1,2).
Os doentes chegavam pela Estrada de Ferro Central do Brasil, numa pequena estação ferroviária federal e, a partir dali, passavam a ter uma vida fechada, como se estivessem esperando a morte chegar. Na ignorância sobre o mecanismo de transmissão da doença, era comum os passageiros dos trens protegerem o rosto com um lenço, quando notavam que estavam passando pela cidade. Até entre os médicos tisiólogos, havia tuberculosos (1,2).
Como o número de doentes aumentava a cada dia, houve a necessidade de providenciar espaços específicos para recebê-los, tendo sido construídos vários sanatórios. O primeiro, inaugurado em 1924, denominado Vicentina Aranha, foi a cada ano ampliado, até chegar ao tamanho que tem desde 1938, com 19.033 m2 construídos, num terreno de 488.000 m2, de propriedade da Irmandade da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo (1).
A construção de sanatórios proliferou e, junto com eles, a chegada dos médicos tisiologistas, o que causou o estabelecimento de migrantes como residentes permanentes em São José dos Campos. Estes doentes não dependiam financeiramente da economia da cidade, sendo mantidos por seus familiares, aumentando a renda per capita da cidade, que já era grande, por causa do café.
Foram surgindo tratamentos para a tuberculose que traziam esperanças, mas os que se salvavam eram poucos, sendo 60% a taxa de mortalidade. O ambiente era predominantemente jovem e a maioria dos doentes era constituída de operários e, os mais abastados, de comerciantes, mas havia também os escritores, estudantes, poetas, crianças e adultos (2).
A vivência da cidade evocava valores morais que para a época eram considerados inadequados. Numa tentativa de fuga da realidade, os doentes optavam por viver o momento presente, não aderindo ao tratamento, deixando de cuidar da alimentação e do sono, e expondo à contaminação, o que só piorava as condições para a cura (2).
Na cidade havia muita promiscuidade, o ambiente das pensões não era muito bom. As pessoas acometidas pela tuberculose sentiam que não havia mais futuro, os tratamentos eram longos, muitas vezes demoravam anos para a cura e muitas pessoas não conseguiam atingi-la. Todos os dias pessoas morriam vítimas da tuberculose. Frente a isso os doentes optavam por viver intensamente o tempo que lhes restavam, fazendo com que "a desgraça moral" tomasse conta da cidade (15). Nesse momento surgiu na cidade uma jovem chamada Dulce Rodrigues dos Santos, também acometida por tuberculose, que se preocupou com a degradação moral e suas conseqüências para o tratamento dos tuberculosos da cidade. Foi uma mulher forte, firme, corajosa e profundamente piedosa e, segundo os estudiosos de sua biografia, também cheia de ternura e muito alegre, que transformou a vida de muitas pessoas desde a sua chegada (15).
Era filha de Helena Herold, natural de Postdan, Alemanha, e Brasílio Rodrigues dos Santos; advogado e professor Catedrático da Faculdade de Direito do Largo São Francisco, político de formação abolicionista e republicana, tendo sido deputado federal e senador, nascido em São Paulo. O casal teve sete filhos, sendo Dulce a caçula. Nasceu no dia 20 de Janeiro de 1901, em São Paulo, e quando seu pai faleceu, ela tinha apenas 2 meses(10,15).
Ela cresceu aprendendo no exemplo de sua mãe os princípios cristãos, as primeiras orações, o amor a Maria e o amor para com os pobres". Estudou no Externato São José das Irmãs de Chambery, fundação da Madre Teodora Voiron. Formou-se professora na Escola Normal Caetano de Campos. Dedicada ao ensino, sua saúde foi se enfraquecendo (15).
Era o desejo de Dulce ir para o convento das irmãs carmelitas, com o propósito que ficava na cidade de Mogi das Cruzes e era considerado um lugar privilegiado, escondido e de santidade, onde as irmãs apenas oravam e não se relacionavam entre si ou com a comunidade, mas antes precisava ser curada da tuberculose. Pois no ano de 1922, com 21 anos, licenciou-se de suas atividades como professora, acometida por uma tuberculose pulmonar. Buscando recuperação, foi de forma seqüencial e cronológica às cidades paulistas Rio Claro, São José dos Campos, acompanhada da mãe e irmão; Campos do Jordão, voltando para São José dos Campos, após a morte de sua mãe.
Dulce não conseguia se conformar com a situação de sofrimento e abandono do doente nas pensões. Alugou uma casa, juntamente com duas amigas também em tratamento da tuberculose, e começou um trabalho de evangelização com os doentes. A procura foi tão grande que ela teve que alugar uma casa maior e transformá-la no primeiro pensionato da futura Congregação das Pequenas Missionárias. Neste momento, a ordem do Carmelo a chamou, mas, aconselhada pelo Padre Henrique de Barros, ela decidiu ficar em São José dos Campos e continuar o seu trabalho (10,15).
Por que será que Dulce resolveu atender ao pedido do padre e não das Carmelitas, já que este era o seu "tão esperado desejo"?
Pensamos que Dulce era uma mulher alegre, que contagiava a vida das pessoas, com grande potencial de crescimento. O convento das carmelitas era um local onde as irmãs viviam em solidão, trancadas, longe do contato com pessoas, diferente do perfil encontrado em suas fotos (16), sorrindo e acompanhada por várias pessoas, além de organizar e participar de jantares oferecidos para as autoridades e médicos da cidade e para as alunas.
Quando na direção da escola, organizava piqueniques na Fazenda Cura D'Ars e excursões para São Paulo ao Hospital das Clínicas e Faculdade de Medicina, ao Planetário do Parque do Ibirapuera, ao Instituto do Butantã.
Ficaram também cinco dias no Rio de Janeiro visitando hospitais, escolas de Enfermagem e pitorescos recantos da cidade maravilhosa, além disso, iam às cidades vizinhas de São José dos Campos, participarem de congressos e palestras (17).
Como poderia um ser humano com essas características obedecer aos preceitos e rotinas das carmelitas?
Dom Epaminondas Nunes D'Ávila e Silva, o primeiro bispo da Diocese de Taubaté, que teve uma influência muito importante na vida de Dulce, ouviu falar sobre o seu trabalho e marcou um encontro. Este terminou com um pedido do bispo para que Dulce colocasse, por escrito, o seu pensamento e o seu trabalho, o que resultou na transformação daquela obra em uma associação religiosa, iniciada por cinco jovens, denominada: "As Pequenas Missionárias de Maria Imaculada", fundada em 1936.
A figura dessa personagem foi de importância vital para a criação, implantação e desenvolvimento da escola, coincidindo, a data de encerramento de suas atividades, com o ano em que a Madre Maria Teresa faleceu.
Assim, fica demonstrada a importância da Igreja Católica, não só na vida da cidade como na história da escola.
O PAPEL DA ENFERMAGEM NA
LUTA CONTRA A TUBERCULOSE
A assistência médico-hospitalar teve origem com a criação das Santas Casas de Misericórdia. Em São José dos Campos, o Padre José de Anchieta foi o seu fundador.
Na Fase Sanatorial aumentou o número de moradores doentes na cidade, necessitando de mais mão-de-obra para atender nas pensões e sanatórios. Porém, devido ao preconceito contra o doente de Tuberculose, somente as Irmãs de caridade eram quem aceitavam trabalhar nesses locais. Os moradores eram ousados em acolher os doentes, pois a cidade não possuía estrutura médico-sanatorial para um bom atendimento até o fim dos anos 30 do século XX.
Os médicos eram quase todos tisiólogos e, alguns, cirurgiões, todos migrantes vindos de diferentes regiões do país. As enfermeiras diplomadas são mencionadas pela primeira vez nos documentos consultados de 1956, em número de dez, todas do IPMMI (17).
Os tratamentos da época visavam: higiene perfeita, superalimentação e repouso; as medicações: cálcio e óleo de fígado de bacalhau, suco de agrião, seiva de bananeira, querosene; e as técnicas cirúrgicas: o Pneumotórax Artificial, que consistia em insuflar ar entre as pleuras visando diminuir o atrito com as paredes pulmonares e, quando a doença estava adiantada, praticava-se a extração do pulmão afetado. A atuação da enfermagem era de acordo com o tratamento.
Foi o Dr. Nelson Silveira D'Ávila que, com dedicação e carinho paternal, se encarregava de transmitir conhecimentos de enfermagem às Pequenas Missionárias e às outras religiosas que a ele solicitavam ajuda. Isto acontecia durante a rotina diária de trabalho'... `Elas exercitavam as mais variadas técnicas de laboratório de análise, marcava presença na sala de cirurgia e de esterilização'... `Ele fornecia livros ligados à tisiologia e às outras disciplinas, tão necessárias para a formação de eficientes enfermeiras'. `Aprenderam a manejar o aparelho de RX e também a manipulação de receitas na farmácia(2).
Constatamos que os cuidados de enfermagem ficavam a cargo de irmãs de caridade treinadas em serviço pelos próprios médicos e depois, multiplicadoras desses conhecimentos, sem que houvesse formação planejada ou atividade de ensino voltada para o preparo dessas pessoas.
A assistência de enfermagem, que no inicio, tinha a conformação de um cuidado maternal e doméstico, próximo da idéia de recuperação da saúde no lar, aos poucos se tornou mais técnica e voltada para o apoio a procedimentos terapêuticos médicos de progressiva complexidade.
Em contraste com essa situação, os médicos, que haviam conhecido a enfermagem praticada nos países onde se formavam ou se aperfeiçoavam Inglaterra, Alemanha, Estados Unidos, tentavam preparar, nos sanatórios, pessoas que fizessem frente às novas necessidades, mas o contingente que conseguiam abranger era pequeno e o resultado nem sempre era o esperado.
Os leigos, que cuidavam dos doentes nas pensões existentes na cidade, não recebiam qualquer formação, o que nos permite afirmar que seu cuidado não era profissional, e o que ofereciam era, basicamente, a hospedagem, ainda que se possa inferir que a convivência prolongada trouxesse para essas relações a dimensão afetiva do cuidado que, provavelmente, não era encontrado em outros lugares, e que deveriam contribuir na recuperação dos tuberculosos.
Como descrito por Barreira (18), o tratamento higieno-dietético consistia de refeições hipercalóricas e hiperprotéicas, seções de repouso e exposição ao sol e ar fresco, e podia incluir psicoterapia. Isto, no nosso olhar, parece ter sido substituído em São José dos Campos, pela convivência com as famílias, nas pensões e, com as freiras, nos sanatórios.
A ESCOLA DE ENFERMAGEM
DOM EPAMINONDAS
Escrever sobre a EEDE é uma missão muito grandiosa, visando a sua tão grande importância. Após várias buscas sobre literaturas, jornais da época ou pequenos relatos encontra-se apenas citações da existência desta escola. O assunto encontrado é sempre o mesmo: ano de início e encerramento das atividades, informações de que Madre Maria Teresa de Jesus Eucarístico foi sua idealizadora e fundadora, e citações de alguns nomes mais importantes para a escola, principalmente de médicos professores, mas nenhum detalhe maior foi encontrado.
Pudemos perceber que pouco se comentou de uma escola de enfermagem que formou pessoas numa época de grande necessidade de formação profissional para atuação inicial com os doentes acometidos pela tuberculose.
Até o momento ninguém se dedicou a transmitir, mesmo que através de simples letras, os sentimentos, ideais, expectativas, dores, lutas, emoções, alegrias, tristezas e outros sentimentos das pessoas que vivenciaram a Escola de Enfermagem Dom Epaminondas, ou pelo fiel cumprimento de seus deveres e o zelo pela elevação da nobre profissão da enfermagem, visando que, após esta, outras escolas viriam.
Ao encontrarmos material referente a criação da EEDE, a emoção tornou-se evidente e a autora principal e idealizadora desta pesquisa percebeu que chegou finalmente até a porta do cofre, cheio de riquezas sobre a escola, um lugar até hoje guardado, muito bem protegido, cheio de sentimentos e lembranças. Tudo ainda está muito vivo ali dentro, encantando os olhos, com tanta riqueza contemplada, o que precipitou o desejo de relatar esta história vivida há 50 anos atrás, entre alunas, professores e demais funcionários da primeira escola de enfermagem no Vale do Paraíba.
A partir desses dados, entendemos que a criação da EEDE foi uma realização do ideal da Madre Maria Teresa, mas de onde surgiu esta iniciativa?
Os documentos dizem que a Madre Maria Teresa era não somente preocupada com a santidade das Pequenas Missionárias, mas também com a sua competência profissional (15). As irmãs recebiam chamados para trabalharem em hospitais, e essa Madre queria que fossem boas enfermeiras para poderem atender os doentes da melhor maneira.
"As religiosas da congregação eram enviadas para estudarem em Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo para se formarem enfermeiras, capacitadas para a administração de seus hospitais e o adequado e sempre mais eficiente atendimento de seus pacientes" (15).
O IPMMI, como já se delineia tinha como "pai" Dom Epaminondas e como "mãe" Madre Maria Teresa, e a sua estrutura surgiu numa época em que a tuberculose dominava a população brasileira.
Nesse contexto, o IPMMI tem até hoje, como meta principal a Saúde, inicialmente o tratamento dos doentes da tuberculose (10).
Por essa congregação, foram fundadas instituições separadas por sexo e idade para crianças tuberculosas, filhos de tuberculosos, somente homens, somente mulheres, tuberculosos, de classe socioeconômica distinta em locais diferentes. No início, pensões, depois sanatórios e, com o fim dos sanatórios, os hospitais.
As enfermeiras do IPMMI se formavam para trabalharem nas instituições do próprio Instituto. Frei Fabrício cita: "...as fundações iam surgindo e as irmãs eram enviadas como missionárias onde o Senhor chamava" (15).
Talvez como fosse um sacrifício para as irmãs saírem de São José dos Campos para estudarem nas capitais, e como esta cidade tinha doentes e riqueza suficientes para terem seus próprios órgãos formadores.
Acrescido a este fato apesar da qualificação que as Irmãs possuíam, o quantitativo de enfermeiras era insuficiente, pois supomos ser custoso o deslocamento para outras cidades.
Nesse caminhar, em 1956, a cidade progressista do Vale do Paraíba contava com algumas enfermeiras diplomadas, mas nunca tinha realizado nenhum tipo de movimento referente à Enfermagem.
Nesse ano, comemorou-se então, na cidade, pela primeira vez, a Semana da Enfermagem, em 17 de maio, durante solene sessão comemorativa do "Dia da Enfermeira", realizada no Cine Real, em São José dos Campos, foi assim que a idéia de formar uma escola tomou vulto com a presença de médicos, autoridades, enfermeiras, religiosas e leigas.
Para esse evento, vieram autoridades da Capital do Estado, São Paulo, como o Professor Flamínio Fávero, e estavam presentes entre outros Doutor Rui Dória, o Doutor Orlando Campos, uma enfermeira leiga e uma religiosa Pequena Missionária, de quem não se sabe os nomes.
O Dr. José de Carvalho Florence, patrocinador do evento, comentou com Madre Maria Teresa sobre a necessidade e a oportunidade de se criar uma Escola de Enfermagem em São José dos Campos. Esse sempre fora um sonho dessa Madre que respondeu: "... pois bem, se Deus quiser, teremos aqui, ainda este ano, a nossa Escola..." (19).
Isto pode indicar que já havia a intenção de fundar a escola, provavelmente o evento foi organizado com esta idéia, senão, por que teria a presença de tantas autoridades?
Depois da comemoração, a Madre Maria Teresa deu logo início aos trabalhos com esse objetivo. No próprio prédio do Sanatório Maria Imaculada, sede do Instituto, com várias mudanças, adaptações de espaço físico, aquisição de equipamentos para o bom funcionamento de salas de aula, laboratórios e outros.
A reforma de um pavilhão para internato de possíveis alunas leigas, tudo foi providenciado com rapidez, inteligência e eficiência. A Madre Maria Teresa buscou os caminhos legais (20) para a criação da Escola, dado que a idéia foi abraçada por um bom número de excelentes médicos, que vieram, logo depois, com a instalação da Escola, constituir seu selecionado e Voluntário Corpo Docente (17,19).
Com o apoio do Cardeal Dom Jaime de Barros Câmara, do Ministro da Educação, Dr. Clovis Salgado, do Diretor do Ensino Superior do Ministério da Educação, Dr. Jurandir Loddi e com a colaboração valiosa da grande propulsora da formação de Enfermeiras, Da. Waleska Paixão, Madre Teresa se lançou com todo o seu entusiasmo e sua visão extraordinária de administradora nata, ao lado, sobretudo, de seu espírito sobrenatural, na busca do estabelecimento oficial da Escola (5,17).
Num informativo da Escola de Enfermagem Dom Epaminondas (1960) encontramos:
A Revda. Madre Maria Teresa de Jesus Eucarístico, Fundadora e Superiora Geral do IPMMI, instituição religiosa destinada principalmente à enfermagem, nutria há muito o desejo de dotar sua congregação com uma Escola, que preparasse científica e tecnicamente as Irmãs para sua missão entre os enfermos. Outrossim, no Vale do Paraíba e suas imediações, ainda não existia Escola de Enfermagem e o campo era propício para apontar às jovens os ideais da enfermagem e fazer florecer a profissão de enfermeira(17).
De fato, a 15 de agosto do mesmo ano de 1956, dois meses após, inaugurava-se, festivamente, a EEDE, anexa ao Sanatório Maria Imaculada.
A cerimônia foi dividida em duas partes.
A primeira parte foi às 17 horas, com o Ato Oficial de inauguração e bênçãos das instalações por D. Gabriel Bueno Couto, bispo auxiliar da Diocese de Taubaté, com a presença de autoridades eclesiásticas e civis, médicos e suas famílias, e grande número de pessoas da sociedade local. A simbólica fita inaugural (21) foi cortada por D. Maria de Lourdes Florence, esposa do Dr. José de Carvalho Florence. Também foram inaugurados na sala de professores os retratos de Dom Epaminondas Nunes D'Ávila e Silva e Nelson Silveira D'Ávila, ilustre tisiólogo e cidadão benemérito de São José dos Campos, grande amigo e benfeitor do instituto, primeiro mestre das noções de enfermagem às religiosas que dava seus passos iniciais na arte de cuidar dos doentes, além de ter sido médico de Dulce e seu fiador. A comemoração terminou com um jantar oferecido às autoridades presentes, servido nas dependências da escola.
A segunda parte da inauguração foi no Cine Real à noite.
Na aula inaugural, os temas discutidos foram "Ética", com o deputado e padre Benedito Calasans, e "Enfermagem", com o Dr Mario Ramos de Oliveira, professor da FMUSP (17,19). Da solenidade participou o coral das alunas do Conservatório Musical Santa Cecília, dirigido pela Professora Margarida D'Ávila, o que demonstra o impacto que a criação da escola causou na vida da cidade.
O curso era em regime de internato, com duração de três anos, e somente aceitava mulheres. Oferecia bolsas de estudo (22) e dava preferência para as Pequenas Missionárias, mas também estudavam leigas e Irmãs de outras congregações. A primeira turma tinha 23
alunas (23), delas 16 eram irmãs e sete leigas. Das irmãs nove eram normalistas e das leigas, duas; as outras eram portadoras de certificado de ginasial apenas.
As fases do ensino eram no modelo da Escola Anna Nery, trazido pelas formadas naquela escola e em outros do padrão ananeriano.
O corpo docente voluntário era composto, em maior número, por médicos tisiologistas (24) e, alguns deles, com habilitação em técnicas cirúrgicas, todos eles jovens. A irmã Maria Gema de Jesus foi a primeira diretora e outras três irmãs foram escolhidas como professoras. A escola tinha forte ligação com a Associação Brasileira de Enfermagem, que possuía um distrito em São José, cuja diretoria era de Enfermeiras ligadas à escola (17).
O curso era de ensino teórico, prático (25) e também oferecia atividades extra curriculares. Os estágios começavam ao terminar a série preliminar, quando as alunas recebiam a touca de enfermeira e a braçadeira, que depois foi substituída pelo distintivo (26). Este era confeccionado na cor azul da enfermagem; tinha a cruz de Cristo em vermelho, o que significa o amor solidário (27). mais o triângulo amarelo, com as três pontas significando: Arte, Ciência e Ideal; como explicado por Vidal (28), e a frase "In Caritate Omnis Lex" (A Caridade é a Lei dos Homens), indicando o lema a ser adotado pelas enfermeiras formadas pela escola. Além disso, no centro do triângulo figurava a lâmpada, símbolo da Enfermagem.
Os estágios eram realizados na Santa Casa local, no Hospital e Maternidade Marina da Glória da obra de Assistência Social Pio XII, Sanatório Maria Imaculada e Sanatório Antoninho da Rocha Marmo, todos de propriedade do IPMMI.
A primeira turma teve a sua formatura junto com a segunda, matriculadas em janeiro de 1957. A cerimônia foi realizada no dia 21 de Agosto de 1959, quando 28 alunas receberam o diploma de enfermeira, entre estas 14 irmãs e três leigas da primeira turma (17). A solenidade foi dividida em duas partes: pela manhã, a missa celebrada pelo bispo Gabriel Bueno Couto, patrono da turma, e entrega do distintivo de enfermeira no próprio instituto; à noite, foi realizada a cerimônia para entrega dos diplomas (29), no Cine Paratodos.
CONCLUSÕES
A cidade tinha dinheiro para investir e queria sair daquela discriminação de ser considerada como um lugar onde se estabeleciam pessoas com doença transmissível e muitas vezes sem possibilidade de cura. A cidade economicamente vivia dos sanatórios porque as pessoas vinham de fora aumentando a economia da cidade.
As estratégias utilizadas foram o envolvimento das autoridades local, estadual e da união. O segmento educação era influenciado pelas freiras através da igreja católica. Elas preferiram ficar na cidade e se associarem à enfermagem leigo-católica legal de Waleska Paixão. Preferiam vir para São Paulo porque a sede da ABEn estava localizada nessa cidade, provando a visão estratégica típica da Igreja Católica, que é não conflitar, aliciar e compor. Por isso elas tiveram sucesso! Agora as possibilidades de estudo futuro é ver como a escola se desenvolveu.
Concluiu-se que a escola foi criada para atender às necessidades de qualificação de pessoal de enfermagem para fazer frente às mudanças na terapêutica da tuberculose e, seguindo o modelo anglo-americano de formação, recrutar e manter mão-de-obra das alunas, nos sanatórios de propriedade da entidade mantenedora da escola.
Referências
1. Bittencout T. Arquitetura sanatorial. São José dos Campos (SP): Unidades Gráficas Editora; 1998.
2. Cesco NT. São José dos Campos: uma visão da fase sanatorial. São José dos Campos(SP): Fundação Cultural Cassiano Ricardo; 1992.
3. Toledo OM. São José dos Campos, do Orlando, do bacilo de Kock. São José dos Campos( SP): JAC Gráfica e Editora; 1995.
4. Secretaria de Planejamento e Meio Ambiente (SP). Informações turísticas e cartográficas de São José dos Campos, 8ª imp. revisada e ampl. São José dos Campos(SP); 1991.
5. Pasin JL. Roteiros do Vale do Paraíba. São Paulo (SP): C.E.H.; 1975.
6. Batista CD. Aspectos do Vale do Paraíba. São Paulo (SP): Secretaria da Agricultura, Indústria e Comércio; 1941.
7. Pasin JL. Os ciclos econômicos do Vale do Paraíba. Lorena (SP): CEH Gustavo Barroso; 1968.
8. Pasin JL. A evolução sócio-econômica do Vale do Paraíba num período de trezentos anos. Lorena (SP): SHVP; 1972.
9. Junior A. São José dos Campos de 1900 a 1980. São José dos Campos (SP):Prefeitura Municipal; 1989.
10. Instituto das Pequenas Missionárias. São José dos Campos. Nossa história. [on line] [citado 07 jun 2005]. Disponível em: http://www.pequenasmissionárias.org.br/história. php
11. Baptista SS. A luta da enfermagem por um espaço na universidade. Rio de Janeiro (RJ): UFRJ; 1997.194p.
12. Nunes BMVT. As circunstâncias sócio-históricas de criação e implantação do curso de enfermagem na UFPI: 1973-1977. [tese de doutorado].Rio de Janeiro (RJ): Escola de Enfermagem Anna Nery/ UFRJ; 2001.
13. Prefeitura Municipal de São José dos Campos (SP) História da cidade. [on line] [citado 07 jun 2005]. Disponível em: http://www.sjc.com.br/cidade_historia.cfm
14. Fundação Cultural Cassiano Ricardo. São José dos Campos. Patrimônio histórico. [on line] [citado 07 jun 2005]. Disponível em http://www.fccr.org.br
15. Sciadini FP. Ser pequena para ser grande: biografia de Madre Maria Teresa de Jesus Eucarístico. São Paulo (SP): PMMI; 1996.
16. Escola de Enfermagem Dom Epaminondas. Álbum de Fotografias da Turma de 1959. Acervo do Instituto das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada. São José dos Campos (SP).
17. Escola de Enfermagem Dom Epaminondas. Boletim 1. São José dos Campos (SP); 1960.
18. Barreira IA. A enfermeira ana-néri no país do futuro: a aventura da luta contra a tuberculose. [tese de doutorado] Rio de Janeiro (RJ): Escola de Enfermagem Anna Nery / UFRJ; 1992.
19. Hóstia MDJ. Memórias registradas por escrito. São José dos Campos (SP): EDITORA este é um registro escrito de próprio punho pela irmã Maria Domitilla de Jesus Hóstia, e nunca foi publicado. Estava arquivado na sede do Instituto das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada em São José dos Campos; 2005 [separata].
20. Portaria MEC nº 300 de 03 de agosto de 1956. Autorização para o funcionamento do curso superior de Enfermagem. Diário Oficial da União de 8 de agosto de 1956. Acervo do Instituto das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada.
21. Instituto das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada. Ata de Início de Atividades. São José dos Campos (SP); 1956.
22. Escola de Enfermeiras Dom Epaminondas. Bolsas de Estudo. O Vale Paraibano 1964 ago 5.
23. Instituto das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada. Diário de Classe. São José dos Campos (SP): 1956.
24. Instituto das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada.Anotações de aula feitas pelos professores. São José dos Campos (SP);
25. Instituto das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada. Escola Dom Epaminondas Relatório da Diretora. São José dos Campos (SP); 1959.
26. Instituto das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada Escola de Enfermagem Dom Epaminondas. Insígnia. São Paulo (SP): IPNSA; [sd]). Exemplar em metal esmaltado e colorido
27. Poliano LM. Heráldica. São Paulo (SP): GRD; 1986.
28. Vidal ZC. O triângulo da enfermeira. Annaes Enferm 1934;1(3):11-12.
29. Instituto das Pequenas Missionárias de Maria Imaculada. Cópia de diploma de Amélia Isolina Tagliassachi da turma de 1962. São José dos Campos (SP).
Notas
Trabalho de Conclusão de Curso, vinculado à linha de pesquisa: História das Escolas de Enfermagem do Estado de São Paulo.
Recebido em 10/08/2005
Reapresentado em 23/11/2005
Aprovado em 01/12/2005