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Escola Anna Nery Revista de Enfermagem Escola Anna Nery Revista de Enfermagem
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Ministério da Educação
CAPES

Volume 13, Número 1, Jan/Mar - 2009

PESQUISA

Ações participativas em uma comunidade virtual de enfermagem

 

Participating actions in a nursing virtual community

 

Acciones participativas en una comunidad virtual de enfemería

 

Jaqueline Santos de Andrade MartinsI; Marcos Antônio Gomes BrandãoII; Viviane Modesto FerrazIII; Cristiane Casquilha RochaIV; Daniele da Nóbrega FernandesV

I Mestranda em Enfermagem pela Escola de Enfermagem Anna Nery/UFRJ. Bolsista pela CAPES. Membro do Núcleo de Pesquisa em Fundamentos do Cuidado de Enfermagem (Nuclearte). Membro do Grupo de Estudos em Aprendizagem e Cognição (GEAC). Brasil. E-mail: jaqueenfermagem0401@yahoo.com.br,
II Doutor em Enfermagem. Professor Adjunto do Departamento de Enfermagem Fundamental da Escola de Enfermagem Anna Nery/UFRJ. Pesquisador Permanente do Grupo de Estudos em Aprendizagem e Cognição (GEAC). Orientador do TCC de Graduação e do mestrado. Brasil. E-mail: marcosagbrandao@yahoo.com.br,
III Mestre em Tecnologia Educacional nas Ciências da Saúde. Enfermeira Intensivista do Hospital Pró-Cardíaco RJ, Brasil. Professora substituta do Departamento de Enfermagem Fundamental da Escola de Enfermagem Anna Nery/UFRJ. Pesquisadora Permanente do GEAC. Brasil. E-mail: vimferraz@yahoo.com.br,
IV Mestranda em Educação em Ciências e Saúde pelo Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde (NUTES/UFRJ). Fonoaudióloga. Membro do Grupo de Estudos em Aprendizagem e Cognição (GEAC). Brasil. E-mail: cristianecasquilha@yahoo.com.br,
V Acadêmica do 6º período do Curso de Graduação em Enfermagem e Obstetrícia pela EEAN/UFRJ. Bolsista de iniciação científica FAPERJ. Membro do Grupo de Estudos em Aprendizagem e Cognição (GEAC).Brasil. e-mail: dannynitrj@yahoo.com.br

 

 


RESUMO

O estudo aborda a interação no âmbito da Enfermagem em ambientes virtuais, ressaltando sua importância para o cuidado e aprendizagem da profissão. Objetivos: Propor uma categorização de ações participativas expressas em mensagens de identidades virtuais de uma comunidade de enfermagem; e verificar a distribuição das categorias de ações participativas, de modo a correlacioná-las com o processo de interação na comunidade virtual. Métodos: Estudo exploratório de abordagem quantitativa, com análise de conteúdo textual e estatística descritiva. Verificaram-se nove categorias para as ações participativas. Resultados: As categorias para as ações participativas mais prevalentes foram comentário, questionamento e resposta, sendo denominadas tríade da conversação. Conclusão: Pontua-se a validade em tomar as ações participativas como elementos básicos indicativos de interações e transações na perspectiva sistêmica aplicada à Enfermagem. Esta compreensão traz contribuições para uma melhor caracterização de ambientes, indivíduos e suas relações no espaço virtual da Internet.

Palavras-chave: Comunicação. Relações Interpessoais. Internet. Cuidados de Enfermagem.


ABSTRACT

This study is about interaction of nursing on virtual environments and their importance for nursing care and learning this profession. Objectives: To propose a categorization for participating actions in messages produced by virtual identity of the nursing community; and to verify the distribution of the participating actions, to correlate with the process of interaction in a nursing virtual community. Methods: This is an exploratory study of quantitative approach, with descriptive statistics. Held inspectional reading email messages and through the nine categories were proposed for the participating actions. Results: Commentary, questioning and answer were prevalent categories. These actions were named "triad for conversation". We made the test of kappa, obtaining result in a moderate agreement that guided the discussion to two possible hypotheses for future studies. Conclusion: Believed that exist a possibility to take the participating actions as basics elements that indicate interaction and transaction in the systemic perspective applied in nursing. This comprehension contributes for the better characterization of ambient, individual and his connections on the virtual space in the internet.

Keywords:Communication. Interpersonal relations. Internet. Nursing care.


RESUMEN

Este estudio se ocupa de la interacción de la enfermería en ambientes virtuales y su importancia para la atención y el aprendizaje de la enfermería. Objetivos: Proponer una clasificación de las cuotas de participación que se expresa en los mensajes de participación en una comunidad virtual de la enfermería, y comprobar la distribución de las categorías de acciones participativas con el fin de caracterizar la interacción en la comunidad virtual. Métodos: Estudio exploratorio de enfoque cuantitativo, con análise del contenido y con estadísticas descriptivas. Resultados: Las nueve categorías más prevalentes para el tipo de participación fueron comentarios, preguntas y respuestas que se llamaron "tríada de la conversación". Conclusión: Hay una validad del acciones participativas en la interacción y transición. Este entendimiento trae contribuciones para la mejor caracterización de los entornos, personas y su relaciones en la internet.

Palabras clave: Comunicación. Relaciones interpersonales. Internet. Atención de enfermería.


 

 

INTRODUÇÃO

A Enfermagem é uma profissão que tem sua essência no cuidado comumente apresentado na perspectiva de uma visão holística e,, como ponto de destaque, seu aspecto humanizado. O cuidado humanístico tem foco na interação e no desfrutar de criatividade, emoção e intuição que fazem parte do lado artístico e do aspecto emocional, ainda que não negue os aspectos técnico-científicos 1.

O ato de prestar o cuidado ultrapassa o domínio do conhecimento técnico-científico da Enfermagem, tendo a relação de reciprocidade manifestada na interação como um ponto-chave para o elo que o enfermeiro conseguirá estabelecer com o paciente. Daí a dimensão afetiva que emerge, caracterizada pela ação de ouvir, falar e expressar, tem sido também entendida genericamente como "interação".

Na perspectiva sistêmica e interacional, a enfermagem pode ser entendida como sendo um processo interpessoal de ação, reação, interação e transação que envolve o auxílio ao indivíduo para atender suas necessidades básicas de vida diária e ajudá-lo a enfrentar o processo doença 2.

A interação pode ser compreendida também como um processo de interferências mútuas (ação e reação) dos diversos elementos constituintes de um dado sistema 2.

Por fim, a interação se apresenta como elemento fortemente relacionado à comunicação, sendo base para o cuidado de enfermagem. Os seres humanos utilizam a comunicação e a linguagem como principais recursos para estabelecer interações (ações e reações decorrentes das influências da comunicação) com outros humanos. Ainda mais, ao cuidarmos de um paciente, realizamos não somente uma ação técnica, mas também uma ação sensível, envolvendo além da sensibilidade, a liberdade, a subjetividade, a intuição e a comunicação 3.

Em concordância com a afirmativa posta acima, percebemos que o cuidado de enfermagem está vinculado e mediado pela interação que o enfermeiro consegue estabelecer com o paciente por meio da comunicação, sendo ela verbal ou não-verbal, dependendo da situação em que ambos se encontram.

Percebe-se que, na prática do enfermeiro, tanto assistencial quanto como líder ou chefe, a comunicação deixa de ser exercitada no seu pleno alcance, prevalecendo o cuidado técnico. Isso pode desfavorecer a interação entre profissional e paciente, que é vital para o alcance dos objetivos de cuidar, ainda mais sabendo que a comunicação é condição fundamental da vida humana, englobando os procedimentos por meio dos quais um ser pode afetar o outro 4.

Além da preponderância de um cuidado técnico, outro fator que impossibilita o desenvolvimento de estratégias de comunicação no cenário presencial é a realidade diária de muitas tarefas rotineiras, que, aliadas à complexidade do ambiente, fazem com que a equipe de enfermagem, na maioria das vezes, esqueça de tocar, conversar e ouvir o ser humano que está diante de si 5.

Sendo assim, com o predomínio da perspectiva tecnicista do cuidado, torna-se mais difícil para a Enfermagem dominar plenamente as estratégias de comunicação. Tal situação aponta para um tipo de questionamento: Mas quais seriam as alternativas para se estudar o processo de comunicação no interesse da Enfermagem?

A priori, verificamos duas possibilidades: A primeira é investigar quais as práticas que os enfermeiros utilizam para estabelecer a relação nos ambientes de cuidado, mesmo com o predomínio do cuidado técnico. A segunda alternativa é buscar ambientes onde se possa investigar a interação e comunicação sem uma destacada interferência do cuidado de foco tecnicista.

A opção aqui assumida é a segunda. Mais especificamente, buscamos investigar o processo de interação e comunicação em ambientes virtuais, que estejam focados na enfermagem e na discussão do seu cuidado.

A inserção da temática de interação em ambientes virtuais no campo de conhecimento da Enfermagem se faz clara considerando-se a natureza dos fundamentos de enfermagem. A comunicação é claramente reconhecida como instrumento básico da disciplina, sendo já amplamente descrita em contextos presenciais de cuidado. No entanto, na emergência dos ambientes virtuais, não existe suficiente investigação sobre os elementos básicos da comunicação de enfermagem nestes locais de Internet.

Ainda são temas não explorados na investigação de enfermagem: as condutas de participação, a expressão de estados afetivos, os padrões de comunicação/interação, e os aspectos motivacionais da interação em ambientes virtuais de enfermagem.

Partimos da premissa de que a interação é essencial ao cuidado de enfermagem e dela não podemos abrir mão sem descaracterizar a natureza da disciplina. Consideremos também a crescente "virtualização" da realidade, inclusive para as situações de interesse da Enfermagem, a saber: o ensino-aprendizagem (Educação a Distância) e o cuidado (Telessaúde), que gera necessidade de compreensão sobre como se caracterizam os processos interativos entre humanos em cenários virtuais.

Consideramos que a era digital tende a promover a aproximação de pessoas, reduzir distâncias e favorecer parcerias; sendo assim, não haveria porque temer a diminuição do contato humano como decorrência da supervalorização tecnológica 6. Contudo, há de se considerar o risco de esta visão conduzir a um posicionamento ingênuo diante da tecnologia. A pesquisa de enfermagem nesta interface com a informática pode ser um recurso para garantir um posicionamento crítico e reflexivo, preservando a disciplina do risco apontado.

Ainda mais, a virtualização das relações que ocorrem na Internet pode ser fato novo; porém, outros tipos virtuais já são antigos e consagrados, dentre eles os promovidos pelo uso do telefone e da escrita.

Logo, o termo relações virtuais na Internet está vinculado à comunicação mediada por computadores que também pode ser chamada de "telemática" comunicação à distância através da informática 7.

Para nós é um elemento essencial investigar o material textual produzido pelo sujeito que caracteriza a sua mensagem, o que denominamos de "ação participativa". As ações participativas são definidas em nosso estudo como o tipo de ação que objetiva dar cunho de conteúdo à mensagem e é comunicada como a principal idéia de uma mensagem eletrônica. Representa, então, a intenção que teve o produtor da mensagem ao escrevê-la, como, por exemplo, produzir questões ou comentários.

Para fins deste estudo, elegemos investigar as ações participativas de associados de uma determinada comunidade virtual de enfermagem (CVE). A CVE é apresentada como um agregado de identidades virtuais1, que se autodefinem como parte integrante do corpo social de enfermagem que tem por objetivo, tanto individual quanto coletivo, a interação colaborativa e/ou cooperativa, visando à construção de conhecimento e troca de experiências relacionadas à enfermagem 8. O corpo social aqui mencionado inclui acadêmicos, técnicos, auxiliares e enfermeiros de serviço e de ensino e pesquisa.

Há também uma presumida vantagem em se investigar a ação participativa no contexto da comunicação virtual, pois o ambiente de registro textual (das mensagens eletrônicas) possibilita aos comunicantes analisar detalhadamente o registro escrito da fala do interlocutor. Isso faz com que os interlocutores tenham melhor capacidade de responder, já que operam com mais controle sobre o conteúdo da conversa 7.

Tendo em vista que o ambiente virtual é propício ao estudo de estratégias de comunicação, estudaremos os tipos de ações participativas desenvolvidas pelas identidades virtuais, com vista a responder ao problema de pesquisa que se apresenta assim: quais as características da interação expressas em ações participativas de identidades virtuais em uma comunidade virtual de enfermagem?

Considerando o problema de pesquisa, traçamos como objetivos:

■ Propor uma categorização de ações participativas expressas nas mensagens de identidades virtuais de uma comunidade de enfermagem.

■ Verificar a distribuição das categorias de ações participativas, de modo a correlacioná-las com o processo de interação na comunidade virtual.

 

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo exploratório de abordagem quantitativa, com estatística descritiva, utilizando como procedimento metodológico o survey interseccional que pode ter três objetivos distintos, descrever, explicar ou explorar uma determinada população 9. No estudo optamos por descrever um tipo de fenômeno encontrado nesta comunidade, a saber: as ações participativas.

O cenário de estudo foi uma Comunidade Virtual de Enfermagem fundada há quase seis anos por um pesquisador da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Hospeda-se em uma lista de discussão de filiação aberta, ou seja, qualquer internauta interessado em participar desta comunidade pode se cadastrar sem que haja um convite específico do moderador. Atualmente, possui 309 filiados (dados de abril de 2008). Cabe ressaltar que os participantes são livres tanto para se cadastrar na comunidade quanto para se desvincular dela, não havendo tempo específico de permanência.

As identidades virtuais que se autodefinem do corpo da enfermagem e participam como membros da comunidade virtual de enfermagem se comunicam de forma assíncrona através de e-mails distribuídos a todos os filiados e que ficam disponíveis posteriormente no website da lista, conforme a dinâmica de funcionamento das listas de discussões.

O material de estudo foi obtido de 206 mensagens postadas durante as primeiras seis quinzenas de existência desta comunidade. De análise preliminar, verificou-se que 12 destas mensagens eram automáticas e 7 repetidas; então, foram consideradas válidas para o objetivo de classificação 187 mensagens. Destaca-se que as mensagens constituem um corpus que está armazenado num banco de dados de pesquisa. A coleta de dados ocorreu de forma direta utilizando-se como técnica a linguístico-textual. O período de coleta de dados ficou compreendido entre junho e julho de 2006.

O critério de corte em seis quinzenas que produziu a amostra pesquisada foi determinado pela dinâmica das conversações na comunidade. Em estudo anterior8 verificou-se que, até a sexta quinzena desde a fundação da lista de discussão, a relação de mensagens produzidas e de proponentes de debates permanecia relativamente constante. Após esse período verifica-se um aumento significativo destas variáveis, indicando uma ampliação na participação. Portanto, julgou-se apropriado caracterizá-la como etapa distinta para análise de ações participativas na interação.

Para a análise do texto das mensagens, primeiramente realizamos uma leitura inspecional, a saber, uma leitura orientada para a pesquisa de uma dada informação 10, como que realizando uma pré-análise. O propósito foi identificar conteúdos característicos de ações participativas.

Prosseguindo na análise, seguiu-se para a adaptação de um estudo anterior, realizado no âmbito da equipe de pesquisa 11 com a comunidade. Nele o autor caracterizou a participação na comunidade utilizando somente as três categorias mencionadas anteriormente na análise por unidades semânticas.

O principal aspecto de adaptação do estudo foi proceder à análise de conteúdo da mensagem sem perder a sua dimensão de um todo. A mensagem foi considerada uma unidade única, onde se buscava a idéia principal, ou seja, a categoria de ação participativa que predominava em um significado nuclear.

Com a análise da mensagem como uma unidade, almejávamos evitar que a análise em unidades semânticas levasse a uma fragmentação de algumas mensagens com consequente perda de significado mais amplo. Isso derivava de experiência anterior de onde se sabia que era possível depreender uma única unidade de significado de grande parcela das mensagens. Aí estava justificada a possibilidade de tratar a mensagem como uma unidade.

O procedimento de análise permitiu a verificação de nove categorias de ações participativas, sendo que três destas seguiram adaptação de estudo anterior11, 16 e as demais foram propostas pela primeira autora. Estas categorias que tiveram os descritores produzidos pela primeira autora serão descritas no capítulo de apresentação e discussão dos resultados.

Visto que existia a possibilidade de influência da variável interobservador na classificação de uma dada ação participativa na mensagem, selecionamos as de números pares válidas, o que totalizou 94 mensagens, para serem classificadas por três juízes.

Os juízes foram três pesquisadores da equipe que estuda esta comunidade. Aos mesmos foram fornecidas orientações quanto à classificação, que incluiu as definições propostas, apresentadas no capítulo de apresentação e discussão dos resultados. Visto que não havia exigência de perícia de conhecimento na classificação, o único critério de eleição dos juízes foi a familiaridade com mensagens eletrônicas.

Os resultados da classificação dos três juízes e da pesquisadora que propôs as categorias e a definição foram confrontados e submetidos ao teste de kappa. O kappa é uma medida de concordância interobservador e mede o grau de concordância além do que seria esperado pelo acaso. Esta medida de concordância tem como valor máximo o 1, em que este representa total concordância e os valores próximos e até abaixo de 0 indicam nenhuma concordância, ou a concordância foi exatamente esperada pelo acaso. Um eventual valor de kappa menor que zero, negativo, sugere que a concordância encontrada foi menor do que aquela esperada pelo acaso. Sugere, portanto, discordância, mas seu valor não tem interpretação como intensidade de discordância 12.

Os aspectos éticos que nortearam a utilização do material de análise e a divulgação dos resultados de pesquisa sobre a comunidade virtual pelos pesquisadores seguiram as orientações determinadas pelo moderador-fundador da comunidade estudada, segundo às quais, ao se filiar à comunidade, o participante recebe automaticamente um e-mail comunicando o uso das mensagens para pesquisa, as características e ontologia da comunidade e as reflexões trazidas nas publicações de pesquisadores da área 13-14-15 para estudos desenvolvidos na Internet.

Ainda para obter apreciação especializada na questão, o Projeto de Pesquisa denominado "Análise Exploratória de uma Comunidade Virtual de Enfermagem", que produziu o banco de dados utilizado e engloba os procedimentos de pesquisa adotado em nosso estudo, foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa em Enfermagem da Escola de Enfermagem Anna Nery obtendo parecer favorável aos procedimentos éticos propostos. O projeto foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa e consta da relação de projetos aprovados, disponível no Sistema Nacional de Ética em Pesquisa (SISNEP), sob o número: DOC. SISNEP FR-58786.

 

APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

A partir da análise do conteúdo das mensagens, foram propostas nove categorias de ações participativas, com o intuito de alcançarmos o primeiro objetivo deste estudo:

* Questionamento - definido como perguntas voltadas ao debate de tópicos, ao pedido de esclarecimento, e para solucionar dúvidas e mal entendidos.

* Comentário - adição de opinião ou parecer sobre determinado tópico ou posicionamento apresentado. Inclui a contra-argumentação, para argumentações que forem contrárias a outra argumentação.

* Resposta - argumentação, para responder a uma pergunta por meio de uma posição e uma explicação; apresentação de algum caso ou situação para exemplificar e fornecer resposta ao questionamento.

* Saudação/Parabenização - mensagens nas quais há um cumprimento, seja para dar boas vindas a participantes, ou para parabenizar algum filiado/participante.

* Suporte - mensagens em que o moderador explica o funcionamento da comunidade.

* Apresentação - mensagens voltadas à introdução de novos participantes na comunidade. Nelas os participantes escrevem sobre si e/ou se descrevem apresentando características pessoais e/ou qual é sua inserção dentro e/ou fora da comunidade, e/ou informando sobre si, e apresentando seus interesses, data de aniversário ou demais dados que se voltem a dar uma percepção de identidade pessoal. Também se aplica quando a apresentação de um filiado ou participante é feita por outro.

* Convite para Interação - convites para que se estabeleça um processo de comunicação entre os participantes e filiados, como por exemplo: participação em chats, em conversações/debates que estejam em vigor na comunidade.

* Convite Genérico - qualquer outro tipo de convite que não esteja relacionado com interação na comunidade, como por exemplo, convite para uma festa.

* Genérica - para mensagens que não se enquadram em nenhuma das demais categorias.

Três dessas categorias utilizadas já haviam sido propostas por Mckenzie & Murphy 16, conforme mencionado anteriormente, em estudos onde consideravam uma classificação para a participação em comunidades virtuais que envolvem categorias conforme o conteúdo da mensagem, sendo elas: questionamento, comentário e resposta. No entanto, tais autores apresentam a classificação e sua definição baseando-se em cursos formais de educação à distância, o que impõe algumas limitações ao uso na comunidade virtual pesquisada, em especial, por conta da característica de liberdade de conversação sem a proposição explícita de um objetivo educacional formal e comum, ainda que os participantes pudessem compartilhar similares interesses de aprendizagem.

Sendo assim, foi desenvolvida uma adaptação das definições da classificação proposta pelos citados autores11,16 de modo a garantir maior adequação às características da interação no cenário pesquisado.

No que concerne ao segundo objetivo de pesquisa, a análise das 187 mensagens, consideradas válidas para o estudo, pela primeira autora, demonstrou uma distribuição com predomínio da categoria denominada comentário. Na Tabela 1, verifica-se a distribuição das ações participativas tomando por base as categorias construídas.

 

 

Com vistas a verificar em que medida poderiam ser consideradas válidas as categorizações e as definições propostas para as ações participativas, optou-se por submeter uma amostra de mensagens aos juízes e solicitar que os mesmos classificassem a ação participativa predominante, utilizando as categorias e definições apresentadas. Da classificação, a concordância entre primeira autora e os três juízes indicou um resultado geral para o teste de kappa de 0,53 (intervalo de confiança de 95%), conforme descrito no Quadro 1.

 

Interpretando este resultado de kappa e utilizando a descrição apropriada 12 para esta interpretação, afirma-se que houve uma concordância moderada.

Partindo para uma interpretação comparativa de cada categoria à análise dos juízes, apresentamos a Tabela 2 para visualizar a diferenciação na classificação das ações participativas.

 

 

As principais divergências observadas na classificação realizada pelos juízes estão nas categorias: convite para interação, que o juiz 3 classificou como 12% das mensagens e os demais juízes 1 e 2 como 18% e 19%, respectivamente; a categoria questionamento foi classificada pelo juiz 1 como 16% das mensagens e juízes 2 e 3 como 8,5% e 11%, respectivamente; a categoria genérica foi classificada pelos juízes 1 e 2 como 14% e pelo juiz 3 como 7%. Porém, a categoria que teve maior porcentagem de discordância foi a categoria resposta, que foi classificada em 25% das mensagens pelo juiz 3 e em 6,4% e 12% pelos juízes 1 e 2, respectivamente.

Optamos por discutir os resultados em duas etapas. Primeiro correlacionando os resultados das ações participativas com a interação em comunidade virtual, a fim de alcançarmos o segundo objetivo proposto para o estudo; e em seguida analisaremos os resultados obtidos na concordância entre juízes.

Apresenta-se, então, uma pergunta: é possível presumir que houve interação entre as identidades virtuais durante as seis quinzenas investigadas na comunidade virtual?

A resposta é afirmativa quando verificamos que as categorias que obtiveram maiores percentuais de mensagens foram a de comentário, de questionamento e de resposta, aquelas descritas pelos autores McKenzie e Murphy (ver Tabela 1). Podemos afirmar que estas categorias fazem parte de uma tríade de ações que têm estreita relação com a conversação, visto que em um meio onde pessoas questionam, respondem e comentam há trocas de informações e um processo de interação é estabelecido. E este processo pode ser, inclusive, observado no cotidiano presencial onde os indivíduos, para estabelecerem as relações de conversação, geralmente questionam, de modo a obter respostas e comentários, criando assim um círculo que expressa, em última análise, a própria interação social.

Em estudo preliminar17, verificamos associação entre as mensagens pertencentes a debates ou diálogos e as que compõem a tríade de conversação. Foi evidenciado que, entre as quatro categorias de participação que mais tinham associação com mensagens de conversação, estavam as três que aqui denominamos tríade de conversação, como observado na Tabela 3.

 

 

Ainda na análise da Tabela 3, verificamos que uma categoria que também obteve um percentual elevado indicativo de participação foi a de apresentação, fato que pode ser explicado devido à "Semana do Olá", na qual os participantes da comunidade foram motivados a estabelecerem interação com os demais por meio da apresentação pessoal.

Tais resultados podem representar um argumento favorável à idéia de que uma comunidade virtual pode constituir-se em ambiente propício a diálogos e trocas deles decorrentes, o que em última instância é vital ao desenvolvimento dos aspectos básicos da interação de enfermagem, dentre eles os referentes ao aprender e ao relacionar-se.

Por exemplo, na perspectiva construtivista, o processo de gênese do conhecimento envolve a participação do outro, em especial, com o uso da linguagem, no processo social. Obviamente que, a depender da orientação teórica da aprendizagem, este processo de construção com o outro assumirá característica diferente 18.

Retornamos ao conceito sistêmico aplicado à Enfermagem2, no qual os seres humanos são considerados sistemas abertos. Tais sistemas mantêm a interação com outros sistemas por meio de trocas. Reconhecidamente uma delas é a de informação. Sendo assim, as ações participativas representam os indicativos dos compartilhamentos interativos entre os participantes. Supomos que a classificação e o mapeamento destas interações são fatores indispensáveis a uma compreensão da natureza das relações em ambientes virtuais. Como finalidade, vislumbramos a facilitação das interações em ambientes destinados ao cuidado remoto em situações de telessaúde.

Ambientes de telessaúde caracterizam-se como um espaço onde profissionais de saúde podem prestar atendimento ao paciente de forma virtual e remota, tanto por telefone como também através da Internet. E buscar compreender como as relações interativas acontecem neste cenário pode facilitar esse processo de cuidado de forma virtual.

Iniciando a discussão sobre a concordância entre juízes, reiteramos que o resultado obtido no teste de kappa foi moderado, visto que a concordância foi de 0,53 para um intervalo de confiança de 95%. Com isso, buscaremos apresentar hipóteses teóricas para esse nível não elevado de concordância, pois esperávamos uma concordância quase perfeita, o que representaria um kappa corte de 0,8 a 1,0.

A primeira hipótese vislumbrada é a de que a metodologia de considerar a mensagem como uma unidade não foi adequada. Assim, as mensagens analisadas como unidades únicas interpretadas de acordo com a visão do observador poderiam possuir mais de uma idéia principal, com consequente multiplicidade de ações participativas. Deste modo, diferentes juízes poderiam selecionar diferentes ações participativas como a de predominância na mensagem.

Considerando a hipótese apresentada, a análise das mensagens como unidade única realmente não seria apropriada para o estudo, requerendo a fragmentação das mesmas em unidades semânticas. Neste caso, recomenda-se o desenvolvimento de um estudo futuro que possa explorar as unidades semânticas das mensagens. Esta afirmativa de investigar fenômenos em unidades semânticas encontra justificativa na metodologia empregada por outros autores 11,16.

A segunda hipótese para justificar a concordância moderada entre os juízes seria a de que as categorias propostas para este estudo não demonstrariam a necessária clareza de classificação e/ou de definição. Este fato também só poderá ser confirmado em estudos posteriores com a proposição de uma nova descrição e/ou em ensaios comparativos entre diferentes descrições.

 

CONCLUSÃO

Duas foram as questões principais apresentadas no estudo: (a) quais as características da interação expressas em ações participativas de identidades virtuais em uma comunidade virtual de enfermagem; e (b) é possível presumir que houve interação entre as identidades virtuais durante as seis quinzenas investigadas na comunidade virtual?

No que concerne à primeira questão de pesquisa, as nove categorias de participação demonstraram uma amplitude de características na interação, o que permite afirmar que é possível ter um determinado nível de descrição da natureza do processo interativo pelo tipo de participação expresso na mensagem.

Em relação à segunda questão, a interação no sentido da reciprocidade ocorreu, e é mais bem demonstrada pela denominada tríade da conversação. Da interpretação dos achados é possível argumentar que, ao invés de serem mensagens descontextualizadas, os textos nelas contidos guardaram uma destacada intertextualidade que caracterizava um ciclo de ações e reações que comportaram diferentes dimensões de um agir no virtual, aqui denominadas ações participativas.

Também é possível concluir que a concordância moderada entre os juízes foi uma questão inesperada, e de certo modo limitante à generalização dos achados. Tal traço determina a necessidade de maior investigação das hipóteses explicativas propostas.

No entanto, em um caráter mais amplo, pontua-se que existe uma validade em tomar as ações participativas como elementos básicos indicativos de interações e até mesmo de transações na perspectiva sistêmica aplicada à Enfermagem2. Presumivelmente, esta compreensão traz contribuições para uma melhor caracterização de ambientes, indivíduos e suas relações no espaço virtual da Internet.

Considerando que a Enfermagem é uma profissão dependente do processo de comunicação, deve a mesma buscar pela compreensão desses elementos (interação, comunicação e participação) em todos os ambientes em que a profissão possa estar. Daí torna-se justificável a pesquisa da participação nas comunidades virtuais diante do crescente movimento de virtualização da realidade que segue sem delimitar claras fronteiras e, também, das possibilidades presentes e futuras da Telessaúde e da Educação a Distância.

 

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1 Maneira pela qual denominamos os sujeitos de nossa pesquisa, visto que em comunidades virtuais, como a estudada, não há obrigatoriedade de correlação de uma mesma pessoa a uma única identidade virtual.

 

 

Recebido em 30/04/2008
Reapresentado em 15/08/2008
Aprovado em 28/11/2008

 

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