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Escola Anna Nery Revista de Enfermagem Escola Anna Nery Revista de Enfermagem
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CAPES

Volume 6

INTRODUÇÃO

Desde o nascimento a criança requer assistência criteriosa, que se inicia com a concepção, através das medidas de proteção, promoção e apoio à mãe, a guardiã da vida intra-uterina do seu bebê até o nascimento. Na tentativa de preservar a integridade da mãe e do bebê são adotadas medidas para o acompanhamento prénatal até o nascimento .

No entanto o recém-nascido humano, é um dos animais mais dependentes de cuidados, pois caso não se faça nada por ele, até que venha à atingir condições de autocuidar-se, muito provavelmente ele morrerá por privação desses cuidados essenciais a vida - o cuidado dos primeiros anos de vida.

Em se tratando de acidentes com crianças, seja ela recém nascidos, lactentes, pré- escolares e escolares, a enfermagem deve prepararse para atender ou ensinar outrem a fazer os primeiros socorros. Nesse sentido, o presente curso tem por propósito apresentar as situações mais corriqueiras de acidentes na infância e qual intervenção está indicada para elas.

Não se trata de esgotar um tema que requer treinamento intenso, porém contribuir com a socialização de um conhecimento que salva vidas e previne o surgimento de seqüelas. A simplicidade inerente a ação reduz a complexificação do caso, portanto trata-se de um conhecimento que deve ser difundido com os pais e responsáveis pelo cuidado a criança.

A enfermagem como profissão tem a responsabilidade de traçar linhas sólidas de orientação no sentido de criar padrões qualitativos nos domínios da formação e da prática. O presente curso, apresenta as bases teóricas e práticas que ajudam na resolução rápida e segura do atendimento pré-hospitalar de crianças em situação de emergência. Deste modo, visa fomentar a consciência dos profissionais de enfermagem sobre um ambiente terapêutico seguro, preparado para suprir as necessidades individuais de cada criança, mesmo fora do ambiente hospitalar.

As situações acidentais corriqueiras na vida da criança

Os recém-nascidos e lactentes (0 à 24 meses de idade) podem ser acometidos por peque-nos engasgos causado por refluxos, que levam a aspirações em volumes pequenos ou maciços de resíduos alimentares. A ingestão de pequenos objetos (moedas e botões, por exemplos); as quedas da própria altura e de móveis, como berço, mesa, sofá etc; as queimaduras provocadas por ferro de passar roupas e panelas com alimentos ou líquidas quentes, são todas situações que no ambiente doméstico são causas corriqueiras de acidentes.

As crianças na idade pré-escolares (mais de 24 meses até seis de idade), podem vir a envolver-se com acidentes idênticos aos já mencionados acima, porém a probabilidade de fraturas por quedas torna-se maior, pois nesta esta faixa etária ela já está inserida em um grupo escolar, andam de bicicletas, participam de brincadeiras e jogos de correr, pular e jogar bola.

Dos sete anos aos doze anos de idade, tanto as queimaduras como as fraturas podem ser freqüentes nessa faixa de idade. Entretanto, os atropelamentos, os choques elétricos, os afo-gamentos, as intoxicações exógenas (ingestão de substâncias medicamentosas ou tóxicas) e os ferimentos ocasionados por arma branca (faca) e projétil de armas de fogo (PAF) são parte de uma realidade constante na vida dessas crianças.

O agir...

O mais importante em qualquer uma dessas situações é, em primeiro lugar, manter a calma e pensar nas possibilidades que ocasionaram o acidente. Em seguida, agir rapidamente. Uma avaliação da cena do acidente visa, principalmente, evitar que a pessoa que se propõe a realizar o atendimento não venha a se tornar mais uma vítima.

O segundo passo é tentar estabilizar a vítima, mantendo-a posicionada de forma a facilitar a ação do socorrista. Proceder à identificação do grau de consciência e da presença de respiração e pulsação; caso, à primeira vista não se perceba a respiração convém inspecionar o motivo de sua ausência explorando as vias aéreas superiores (VAS) para provável obstrução, que pode ser mecânica (corpo estranho ou queda da língua) e ou secreções (sangue, vômitos etc). Muitas vítimas de acidentes automobilísticos morrem mais por obstrução das VAS, que impedem a vítima de respirar, do que suas próprias fraturas ou traumas. Em crianças, a queda de língua funciona como um obstáculo a entrada e a saída de ar, e geralmente é um dos problemas mais importantes de asfixia.

De acordo com Santos et al (1999) "as causas mais comuns de obstrução alta de VAS em crianças com nível de consciência diminuído são a queda de língua sobre a parede posterior da faringe e corpos estranho..."

O terceiro passo é a busca por socorro especializado, o mais breve possível. A primeiras medidas são paliativas e tem por objetivo a preservação da vida por um período determinado.

No caso da criança encontrar-se inconsciente e com ausência de atividade cardíaca e respiratória. Deve-se iniciar ¡mediatamente as manobras de reanimação cardiopulmonar.

Os protocolos usados no socorro de emergência são simples, pois se tratam de atividades coordenadas e que na sua grande maioria podem ser executadas por no mínimo um socorrista e no máximo dois. Surgirão situações, no entanto, que um socorrista não pode atuar sozinho, pois a manobra de estabilização cervical, por exemplo, necessita de uma pessoa para segurar a cabeça da vítima, enquanto a outra coloca o colar cervical ou um dispositivo improvisado para assegurar a estabilização da coluna cervical.

Em um atendimento, de natureza desconhecida ou, principalmente, em acidentes automobilísticos em que a criança ou qualquer outra vítima estiver inconsciente, devemos nos preocupar com a hipótese de lesões cervicais. Portanto, a estabilização com manobras adequadas serão sempre necessárias, uma vez que o objetivo de quem atende é preservar a vítima, e nunca causar um segundo trauma. Se a pessoa que procede ao atendimento for um profissional da área de saúde, ela poderá realizar a avaliação neurológica segundo a Escala de Coma de Glasgow Pediátrica (Figura 1), e assim precisar qual é o nível de consciência que a criança está apresentando, e conseqüentemente estimar a gravidade do trauma.

 


Figura 1. Escala de Glasgow Pediátrica

 

Avaliação da pontuação: A pontuação mínima é 3 e a máxima é 15. A pontuação obtida é somada e reflete a condição neurológica da criança. O coma é definido com pontuações menores que 8.

As medidas adotadas são específicas para cada situação, porém a verificação do nível de consciência e os passos do ABC (em inglês) são indicadas para o início de qualquer abordagem junto à vítima, denominado de exame primário:

A (Airway): abertura das VAS;

B (Breathing): verificação da respiração

C (circulation): avaliação da circulação através da verificação do pulso.

Depois de concluídas essas etapas com êxito é que avançaremos a segunda etapa ou exame secundário. Ele destina-se a avaliação pupilar, exposição da vítima para inspeção céfalocaudal, avaliação do enchimento capilar e de extremidades quanto ao pulso, presença de feridas, sangramentos e deformidades acompanhas por fraturas.

A avaliação do nível da lesão central (Figura 2) e a verificação do tipo de trauma (Figura 3) podem ser associadas à avaliação neurológica e ao ABC, auxiliando o socorrista na avaliação secundária da vítima.

 


Figura 2 : Resposta reflexa segundo o nível da lesão central

 

 


Figura 3 : Escala de avaliação de trauma na criança

 

Avaliação da Pontuação: A pontuação mínima pode chegar a - 5 e a máxima a + 10. Quanto menor a pontuação maiores são as necessidades de entubação e assistência ventilatória e pior será o prognóstico neurológico.

A manobra de desobstrução das vias áreas superiores, com elevação modificada da mandíbula , é indicada no caso de suspeita de trauma cervical. Após a abertura das VAS, deve-se ouvir e sentir a respiração através da observação do tórax da criança (elevação de 0,5 a 1 cm no caso de recém-nascidos), sendo recomendado como parâmetros normais, as respirações de 30 a 40 ¡rpm para recém nascidos e lactentes; de 20 a 30 irpm para crianças maiores; e de 15 a 20 irpm para os adolescentes.

A circulação em recém-nascidos e lactentes é avaliada palpando-se o pulso braquial para facilitar o manejo.

É necessário manter a observação rigorosa das freqüências respiratórias e cardíacas, além da coloração da pele, a um intervalo de 15 a 30 segundos até que se restabeleça o padrão respiratório e cardíaco.

No caso de parada cardiorespiratória, até que o socorro especializado chegue, o socorrista, pode iniciar as manobrar de reanimação obedecendo as seguintes etapas, para cada faixa etária:

1) Lactente inconsciente- vias áreas livres sem respiração- realizar respiração artificial (com a quantidade de ar suficiente para preencher as bochechas do que atua como ventilador artificial). Posicione a cabeça e o pescoço do lactente, mantendo-a em ligeira extensão. Ventile o ar concentrado nas bochechas entre o nariz e a boca do lactente por cinco vezes. Verifique o pulso bra-quial; se estiver lento, realize compressões no tórax, abaixo da linha dos mamilos com dois dedos. Em se tratando de recém-nascido, faça três compressões de aproximadamente dois cm para uma ventilação(instilar a quantidade de ar nas bochechas uma vez). Repetir este processo por pelo menos um minuto e checar o pulso braquial. Se o pulso permanecer lento, repetir massagem e ventilação; chame socorro especializado ou peça alguém para fazê-lo (Figura 4). Continue a reanimação até o socorro chegar.

 

 

2) No caso de crianças maiores de dois anos, a massagem cardíaca e a ventilação poderão ser executadas com a mãos espalmadas sobre a altura da linha mamilar. Comprime-se 2 cm na sequência de cinco compressões para uma ventilação boca-a-boca de 20 ciclos de respiração artificial, por um minuto. Em seguida, verificar o pulso carotídeo. (Figura 4)

A reanimação cardiopulmonar figura-se como uma das medidas simples no atendimento pré-hospitalar na infância, portanto, em seu protocolo deve-se respeitar os critérios de avaliação e o método de assistência para eliminar os riscos de morte e a prevenção de danos cerebrais irreversíveis.

Síntese provisória

Na prática de emergência pré-hospitalar na infância, as responsabilidades da enfermagem são asseguradas por certas medidas como descritas anteriormente, que colocam à prova, tanto a capacidade motora como a cognitiva do profissional, que precisa pensar e agir com muita rapidez, porém com movimentos precisos que não provoquem dano adicional. A competência do enfermeiro e da enfermeira, portanto, é a chave para um trabalho de qualidade.

A avaliação é o primeiro passo no atendimento pré-hospitalar na infância e requer do profissional de enfermagem uma profunda capacidade de observação. A avaliação é um valioso recurso de informação e de comunicação.

Entre os elementos essenciais ao exercício da enfermagem, na prestação direta de cuidados a criança vítima de acidente, está a manutenção ou restauração das funções vitais (respiração, circulação, atividade e comunicação); a observação e o registro da alteração do comportamento da vítima, do seu estado físico e emocional, bem como dos fatores ambientais. Além disso, são importantes a avaliação e a implementação de planos de auxílio, com base nos protocolos de atendimento e outros fatores que influenciam a criança e sua família.. E ainda a integração nos próprios serviços da comunidade.

Ao desempenhar estas funções, o enfermeiro e a enfermeira atuam como agentes responsáveis por uma equipe incumbida de cuidados pré-hospitalares, interpretando e cumprindo as instruções de protocolos internacionais. Entretanto, sempre deve agir com independência e juízo crítico quando as situações da vítima requererem e os princípios que regem o exercício da profissão o indicarem.

Os fenômenos sociais que afetam a enfermagem estão intimamente relacionados com a dificuldade em corresponder à exigência crescente da opinião pública no sentido de ser criado um sistema de prestação de serviços em que o atendimento pré-hospitalar seja prontamente acessível a qualquer pessoa. O incentivo reside em procurar meio de providenciar um apoio competente que abranja os progressos mais modernos no campo da investigação médica e científica, meios que conduzirão ao aperfeiçoamento dos cuidados direcionados a criança em situação de emergência.

 

BIBLIOGRAFIA

BRITO, I. J.; DEHOUL, M. S.; NASCIMENTO, M. A. L. Os enfermeiros na "hora de ouro". Rev. Sociedade Brasileira de Enfermeiros Pediatras, v.1, n.1, p. 91 -95.

SANTOS, R. R. Manual de Socorro de Emergência. São Paulo: Atheneu, 1999.369p.

Primeiros Socorros de Urgência para criança: como agir com rapidez e eficiência. Rio de Janeiro: Globo. Ano 2, n. 17-A, 27 p.

BRASIL, Ministério da Saúde. Manual do Parto, Aborto e Puerpério Assistência Humanizada à Mulher. Brasília (DF), 2001.130p.

WONG; D.. Whaley's Enfermagem Pediátrica - Conceitos e princípios Básicos. Rio de Janeiro; Guanabara Koogan.1998.p. 107-128; 142; 174.

CAMPBELL, J. E. Basic trauma Life Support for paramedics and Advanced EMS providers. 3 ed. AlabamaAmerican college of Emergency Physicians, 1995, p. 374.

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