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CAPES

Volume 18, Número 4, Out/Dez - 2014



DOI: 10.5935/1414-8145.20140084

PESQUISA

Análise da tendência da mortalidade masculina no Rio de Janeiro: contribuição da enfermagem

Elisabete Pimenta Araújo Paz 1
Raphael Mendonça Guimarães 1
Camila Drumond Muzi 2
Maria Alice Santos Tavares 2
Camila Alves Bahia 3
Andréia Rodrigues Gonçalves Ayres 4


1 Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro - RJ, Brasil
2 Instituto Nacional do Câncer. Rio de Janeiro - RJ, Brasil
3 Secretaria de Vigilância em Saúde/MS. Rio de Janeiro - RJ, Brasil
4 Hospital Universitário Gaffrée e Guinle. Rio de Janeiro - RJ, Brasil

Recebido em 31/03/2014
Aprovado em 24/06/2014

Autor correspondente:
Elisabete Pimenta Araújo Paz
E-mail: bete.paz@gmail.com

RESUMO

OBJETIVO: Analisar a tendência de mortalidade entre homens no Município do Rio de Janeiro, por grupo de causas, entre 1996 e 2011.
MÉTODOS: Estudo descritivo de série temporal, utilizando dados de óbitos masculinos de residentes no Município do Rio de Janeiro, no período de 1996 a 2011, para grandes grupos de causas. Os dados foram analisados com os softwares Excel 2010 e Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 22.0.
RESULTADOS: A tendência da mortalidade por grandes grupos de causas entre homens no Município do Rio de Janeiro está decrescendo, com diferença entre os grupos de causas. Porém, estes homens seguem adoecidos com o passar dos anos.
CONCLUSÃO: A Política Nacional de Atenção à Saúde do Homem deve estar mais sensível a esta realidade, ofertando uma atenção em saúde capaz de reconhecer mais integralmente as necessidades de saúde desse público.


Palavras-chave: Enfermagem em Saúde Pública; Saúde do Homem; Epidemiologia; Atenção Primária à Saúde.

INTRODUÇÃO

Mudanças de cunho social, aliadas a transformações da estrutura demográfica, proporcionaram à população masculina uma mudança no perfil de morbimortalidade deste grupo. Conhecida como transição epidemiológica, esta mudança representou uma diminuição na mortalidade por agravos agudos e um incremento relativo das condições crônicas. O Brasil, particularmente, possui um perfil atípico, em que a situação de saúde é de tripla carga de doenças, onde coexistem as infecciosas, parasitárias e problemas de saúde reprodutiva, com causas externas e doenças crônicas1. O Município do Rio de Janeiro, a segunda capital brasileira em população, compartilha do mesmo perfil nacional. Esta modificação no perfil de saúde da população masculina se traduz em mudanças no padrão de utilização dos serviços de saúde e no aumento de gastos, considerando a necessidade de incorporação tecnológica para o tratamento das mesmas, ainda que, historicamente, o grupo dos homens apresente menor adesão aos serviços de saúde, principalmente à atenção básica2.

Ao longo do recém-iniciado século XXI, a saúde do homem tem sido alvo de intensos debates dentro das instâncias de vigilância e atenção à saúde, em todos os níveis de ação (federal, estadual e municipal). A principal resposta política a esta nova demanda é a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem (PNAISH), instituída pela Portaria nº 1.994, de 27 de agosto de 20093. Segundo o seu documento-base, a PNAISH possui como principal objetivo promover a melhoria das condições de saúde da população masculina do Brasil, contribuindo, de modo efetivo, para a redução da morbidade e mortalidade dessa população, por meio do enfrentamento racional dos fatores de risco e ao acesso facilitado às ações e serviços de assistência integral à saúde4.

A análise da tendência secular das doenças permite não só estabelecer hipóteses sobre os fatores envolvidos nos processos responsáveis pelas mesmas, mas também avaliar as medidas e as ações de saúde pública, bem como o reflexo da melhora da qualidade de vida na saúde da população, entre outros fatores.

O objetivo deste artigo é analisar a tendência de mortalidade entre homens no Município do Rio de Janeiro, por grupo de causas, entre 1996 e 2011, com vistas a subsidiar as ações assistenciais da Política de Saúde do Homem na rede de serviços de saúde.

MATERIAIS E MÉTODO

Foi realizado um estudo descritivo de série temporal, utilizando dados de óbitos do sexo masculino, residentes no Município do Rio de Janeiro, no período de 1996 a 2011.

Os óbitos por grupos de causa foram obtidos diretamente do banco de dados Sistema de Informação de Mortalidade, um banco de dados do Sistema Único de Saúde (SUS) de natureza pública, gratuito e de acesso aberto, sendo organizado e mantido pelo Ministério da Saúde do governo brasileiro (DATASUS/MS)5. O corte temporal, a partir de 1996, foi escolhido devido à mudança de codificação internacional, passando a valer, a partir de 1996, a CID-10 (Classificação Internacional de Doenças - 10). A fim de evitar diferenças no padrão de codificação, optou-se por trabalhar somente uma CID. Foram considerados os seguintes grupos de causas: Doenças Infecciosas e Parasitárias, Neoplasias, Doenças do metabolismo, Doenças do Aparelho Circulatório, Doenças do Aparelho Respiratório, e Causas Externas.

Primeiramente, as taxas de mortalidade foram calculadas para cada grupo. Posteriormente, essas taxas foram padronizadas utilizando-se a população média no período, conforme proposto por Segi6. Em seguida, foram obtidos diagramas de dispersão das taxas de mortalidade segundo os anos-calendário de estudo com o intuito de visualizar a distribuição das taxas ao longo do tempo.

Para a realização do processo de modelagem, as taxas padronizadas de mortalidade por grupo de causas entre os homens foram analisadas como variável dependente (y), e os anos do estudo como variável independente (x). Para a análise da tendência, optou-se pelos modelos de regressão linear, através da regressão linear simples. Para tal, a variável tempo foi centralizada no ponto médio da série histórica, de acordo com a metodologia de Kleinbaum et al7.

A escolha do melhor modelo foi baseada no nível de significância (p) e na análise de resíduos. A significância estatística do modelo de tendência foi admitida ao se obter p < 0,05. A análise dos dados deste estudo foi realizada com o auxílio dos softwares Excel 2010 e Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) versão 22.0.

RESULTADOS

Foram analisados todos os óbitos nos grupos de causas selecionados, observando-se a contribuição de cada grupo de causa para o total da mortalidade, bem como a tendência temporal da taxa de mortalidade para cada um deles. De uma forma geral, a contribuição de cada uma delas manteve-se semelhante em todo o período. As causas externas apresentaram maior declínio na contribuição ao longo do período, com uma redução de 6,03%, ao passo que as neoplasias aumentaram sua contribuição na mortalidade proporcional em 4,13% (Figura 1).

Figura 1. Mortalidade proporcional segundo grupo de causas entre homens no Município do Rio de Janeiro, 1996-2011. DAC: Doenças do Aparelho Circulatório; DAR: Doenças do Aparelho Respiratório.

Analisando a tendência das taxas de mortalidade por grupos de causa, foi observado que a tendência para todos foi de declínio. Destaca-se que, no período, as causas externas, que em 1996 ocupavam o segundo lugar em causas de mortalidade, caíram para terceiro lugar desde 2010, sendo substituídas pelas neoplasias (Figura 2).

Figura 2. Série histórica das taxas de mortalidade padronizadas entre homens segundo grupos de causa no Município do Rio de Janeiro, 1996 a 2011. DIP: Doenças Infecciosas e Parasitárias; DAC: Doenças do Aparelho Circulatório; DAR: Doenças do Aparelho Respiratório.

As causas externas apresentaram a maior queda em suas taxas (48,74% no período). Este mesmo grupo apresentou, ainda, os modelos mais explicativos (aqueles, cujo coeficiente de determinação era mais alto e, portanto, apresentavam maior linearidade na queda), (R2 = 0,90) seguido das doenças do aparelho circulatório (R2 = 0,87). Em todos os grupos, apesar das flutuações, houve um declínio na taxa de mortalidade (Tabela 1).

Tabela 1. Taxas de mortalidade padronizadas entre homens segundo grupos de causas, no Município do Rio de Janeiro, de 1996 a 2011
Grupo de Causas Modelo R2 (%) p valor Tendência Redução de Taxa (%)
Causas Externas y = 209,27-5,54x 0,90 < 0,001 Decrescente e constante -48,74
Doenças Infecciosas e Parasitárias y = 71,57-1,69x 0,61 < 0,001 Decrescente e constante -40,39
Doenças do Aparelho Circulatório y = 331,44-7,62x 0,87 < 0,001 Decrescente e constante -36,56
Doenças do Aparelho Respiratório y = 128,31-3,07x 0,79 < 0,001 Decrescente e constante -30,38
Neoplasias y = 161,51-1,98x 0,82 < 0,001 Decrescente e constante -15,78
Doenças Metabólicas y = 50,55-0,39x 0,59 < 0,001 Decrescente e constante -14,15

p: nível de significância; R2: coeficiente de determinação.

Tabela 1. Taxas de mortalidade padronizadas entre homens segundo grupos de causas, no Município do Rio de Janeiro, de 1996 a 2011

DISCUSSÃO

É inegável o papel da transição epidemiológica no Município do Rio de Janeiro. Entretanto, há que se pensar que a redução da mortalidade não acompanha, necessariamente, a redução da incidência e prevalência das doenças e agravos. Ora, se estas medidas de frequência não possuem a mesma velocidade, o que surge é uma demanda crescente por serviços de saúde, seja pela cura das doenças transmissíveis, seja pelo tratamento paliativo ou redução de danos das doenças crônicas.

A redução das taxas de mortalidade, envolvendo as doenças do aparelho circulatório, encontrada neste estudo, estão de acordo com as encontradas para o Brasil (redução de 20% na taxa de mortalidade na última década, principalmente, em relação às doenças do aparelho circulatório e respiratórias crônicas)8. Dados da Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico9 mostram que 25,4% dos homens adultos (≥ 18 anos) entrevistados do Rio de Janeiro, referiram diagnóstico médico de hipertensão arterial10.

Essa redução pode ter sido influenciada pelas ações resultantes do Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT), lançado pelo Ministério da Saúde em 2011, com vistas a preparar o país para enfrentar e deter, nos próximos dez anos, as DCNT, doenças do aparelho circulatório (acidente vascular cerebral, infarto, hipertensão arterial), câncer, diabetes e doenças respiratórias. Algumas das ações decorrentes do plano são voltadas para alimentação (acordos com a indústria alimentícia para a redução do teor das gorduras trans, além de acordos voluntários de metas de redução de sal em 10% ao ano em pães, macarrão e, até o final de 2011, nos demais grupos de alimentos); expansão da atenção primária (pela ampliação do acesso, considerando que ações de promoção, vigilância em saúde, prevenção, assistência, além do acompanhamento longitudinal dos usuários são fundamentais para a melhoria da resposta ao tratamento dos usuários com DCNT); distribuição gratuita de medicamentos para hipertensão arterial e diabetes com dispensação até abril de 2011, mais de 3,7 milhões de tratamentos, aumentando em 70% o acesso de medicamentos para indivíduos hipertensos e diabéticos); além da promoção da atividade física nas unidades básicas e praças públicas, com a implantação do programa Academia Carioca e intervenções que dificultam o acesso ao álcool e tabaco8.

Nessa mesma linha, no Brasil, os processos de transição demográfica, epidemiológica e nutricional, contribuíram para o maior risco da população de desenvolvimento de doenças crônicas; porém em relação às doenças metabólicas, a Transição Nutricional, é a que mais está relacionada ao aumento progressivo do sobrepeso, obesidade e consequentes doenças metabólicas, pois envolve as mudanças ocorridas no padrão alimentar e no sedentarismo da vida moderna10.

A tendência à diminuição das taxas de mortalidade onde a causa básica estava relacionada às doenças metabólicas também pode ter sido influenciada pelas ações do Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das DCNT, já que o diabetes possui quatro fatores de risco em comum com outras doenças de crônicas (doenças do aparelho circulatório, câncer e doenças respiratórias crônicas), sendo eles tabagismo, inatividade física, alimentação não saudável e etilismo. Todos estes fatores são alvo de intervenções, como o incentivo à diminuição do consumo de gorduras polinsaturadas, e da ingestão de alimentos ricos em gorduras saturadas para redução do colesterol, e promoção da prática de atividade física em articulação com a Atenção Primária à Saúde8.

Dados apresentados pelo Vigitel 2012 mostram que dos homens adultos (≥ 18 anos) entrevistados do Rio de Janeiro, 54,7% referiram excesso de sobrepeso (IMC ≥ 25 kg/m2); 17,1% referiram obesidade (IMC ≥ 30 kg/m2); 43,2% referiram que praticam o nível recomendado de atividade física, e 7,1% referiram diagnóstico médico de diabetes9.

O estudo do câncer e sua distribuição demográfica refletem as condições de vida das populações e do desenvolvimento da sociedade. Alguns fatores têm interferido, diretamente, na configuração epidemiológica do câncer, tal como a expectativa de vida ao nascer, a composição etária e migração interna da população.

O caso da mortalidade por câncer no Município do Rio de Janeiro reflete todos esses paradigmas por contemplar um perfil epidemiológico misto, com altas taxas de mortalidades para tumores comuns a países desenvolvidos e não desenvolvidos. As neoplasias malignas são a segunda causa de morte no Rio de Janeiro, tendo causado cerca de 19 mil óbitos no estado somente em 2012. Dados do Instituto Nacional do Câncer estimaram 47.820 novos casos de câncer para 2013 e mais de 20 mil mortes11.

A redução da mortalidade por neoplasias no período de 2006 a 2011 no Rio de Janeiro, particularmente, e outros estados da federação foi reflexo de inúmeras ações de âmbito nacional para a prevenção e diagnóstico precoce, além da melhoria no acesso e das medidas terapêuticas. Na tentativa de melhorar este quadro, a SES-RJ lançou em dezembro de 2013 o Plano Estadual de Controle, Prevenção e Atenção ao Câncer (PECC) com vistas à análise atual da atenção ao câncer no estado e elaborar propostas para um novo modelo de atenção oncológica, com ações de promoção e prevenção da doença, diagnóstico precoce, tratamento cirúrgico, radioterápico e quimioterápico, registro da doença, educação, atenção básica, regulação, cuidados paliativos e sistemas de informação12.

Para tal, o PECC irá contar com uma plataforma online para ajudar a mapear a doença no estado, o Geocâncer. No futuro, esta base possibilitará o acesso a informações sobre a doença e nos próximos 10 anos, poderá ajudar a diminuir o tempo entre o diagnóstico e o início do tratamento, a fim de aumentar as chances de cura e controle da doença, e facilitar o acesso em todas as regiões do estado, com organização a distribuição geográfica dos serviços, contribuindo para melhorar o resultado dos tratamentos e a qualidade de vida dos pacientes.

A importante diminuição dos óbitos por doenças infecciosas, em especial pela diarreia, teve influência inegável nas rápidas e significativas transformações da estrutura demográfica e nas mudanças dos padrões de morbimortalidade no século XX. Embora as doenças infecciosas tenham reduzido drasticamente nas últimas décadas, ainda persistem como problema de saúde pública.

As coberturas vacinais têm demostrado, a despeito da queda em alguns períodos pontuais, sucesso na prevenção primária de muitas doenças como a hepatite B, a coqueluche e o sarampo. Além disso, medidas de combate às doenças de veiculação hídrica e relacionadas às questões de saneamento (como diarreias) têm se mostrado eficiente. Entretanto, algumas destas doenças, apesar de infecciosas, tornam-se crônicas, e ainda se mostram de difícil controle, contribuindo assim pela sua grande carga. Em especial no Município do Rio de Janeiro, cujos níveis de prevalência de infecção por HIV são altos, a incidência e mortalidade da tuberculose mantêm-se altas comparadas ao restante do país. Esta relação ganha grande relevância, pois requerem tratamentos prolongados e, frequentemente, estão associadas a ambientes ocupacionais insalubres ou hábitos de vida por vezes relacionados ao sexo masculino13.

Sobre as doenças do aparelho circulatório, tem-se que o Brasil ocupa a oitava posição mundial em prevalência de asma, com estimativas para crianças e adolescentes escolares variando de menos que 10 a mais do que 20% em diversas cidades estudadas, dependendo da região e da faixa etária consideradas. Estimativas sobre a prevalência de doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC) têm sido baseadas, primariamente, nas estatísticas de mortalidade, o que configura um subdiagnóstico. Ainda assim, essas estimativas mostram que a morbimortalidade por DPOC está se elevando em muitas regiões. A DPOC afeta 210 milhões de pessoas é a quarta causa de mortalidade e representa 4,8% dos óbitos em todo o mundo14.

Não se tem notícias de análise atual a respeito do comportamento dos subtipos de doenças respiratórias no Município do Rio de Janeiro. Acredita-se, contudo, que siga um padrão nacional, a exemplo do que foi encontrado em Salvador, cujas internações sofreram redução entre 1998 e 2009, com destaque para a queda regular da asma, queda com estacionamento das pneumonias e estabilidade das DPOC. Um conjunto delas, especialmente, as DPOC, tem relação direta com exposições tipicamente masculinas, como o tabagismo (cuja prevalência é maior no sexo masculino que no feminino) e as exposições ocupacionais (com destaque para aquelas relacionadas à construção civil, tipicamente, masculinas)15.

Os acidentes e violências vêm ganhando cada vez mais importância no perfil epidemiológico do nosso país. Em 1930, as causas externas ocupavam a sexta posição da classificação de mortes por causas definidas da população brasileira, representando 2,6% dos óbitos, passando a ocupar o terceiro lugar entre todos os óbitos com causas conhecidas em 2002 (14,9% dos óbitos totais). É preciso ainda considerar as diferenças em relação ao sexo e idade, daí a importância do trabalho da vigilância em saúde.

Em estudo cujo objetivo foi avaliar a mortalidade por causas externas em homens residentes em Minas Gerais, no período de 1999 a 2008, identificando o comportamento desse grupamento de causas ao longo de série temporal, observou um incremento da mortalidade masculina em todos os anos do período estudado, passando de 82,7 óbitos/100.000, em 1999, para 95,7 óbitos/100.000, em 2008, representando aumento de 15,7% no risco de morte por causas externas. Os adultos jovens (20 a 39 anos) foram os mais acometidos pelas causas externas. Em relação aos acidentes de transporte, nota-se aumento dos coeficientes de mortalidade, principalmente, entre 2000 a 2007. Houve elevação das taxas de suicídio e homicídio16. Entretanto, no último ano da observação, tem-se a redução das taxas, aproximando-se então dos resultados encontrados no nosso estudo.

Os sistemas de atenção à saúde são respostas sociais deliberadas às necessidades de saúde da população. Assim, ao se discutir uma proposta de organização do Sistema Único de Saúde (SUS), deve-se começar por analisar que necessidades de saúde se expressam na população brasileira. A situação de saúde dos brasileiros é analisada nos seus aspectos demográficos e epidemiológicos17.

No plano geral, o que se observa é a redução dos índices de morbimortalidade masculinos, considerados altos em relação aos femininos, fruto de uma melhora da condição de saúde dos homens. Porém, homens buscam menos os serviços de saúde do que as mulheres e, quando o fazem em geral já se encontram com a enfermidade agravada, muitas vezes, em um estágio onde não há mais cura. Desta forma, as atribuições da Política de Saúde do Homem vão muito mais ao encontro de organizar, implantar, qualificar e humanizar a atenção integral à saúde do homem, dentro dos princípios que regem o SUS em todo território brasileiro, procurando facilitar o acesso dessa população aos serviços de atendimento integral à saúde na atenção primária, o que confere à política um caráter mais abrangente no cuidado à saúde do homem18.

Na medida em que os homens vivem cada vez mais situações de cronicidade de uma doença, aumenta sua necessidade ou demandas de saúde, o que nem sempre se traduz acolhida pelos serviços. Em que pese o reconhecimento dessa necessidade por parte do usuário, é necessário e primordial que as unidades de atenção básica tenham disponibilidade para atender a essas necessidades. Considerando que muitas delas são crônicas, a busca pelo serviço de saúde não é por cura, e sim por cuidados, nem sempre de alta tecnologia, mas de maior complexidade, e que exigem do profissional de saúde habilidade técnico-científica para lidar com estas demandas, mas, principalmente, de uma postura humanizada de acolhimento efetivo à população. À medida que os serviços oferecidos correspondam à variedade das necessidades de saúde dos homens, é factível que eles se vinculem mais às unidades e aos profissionais das equipes.

Nesse aspecto, o respeito à autonomia dos homens configura uma das etapas do plano de cuidados individualizado. Esta tarefa inclui a sensibilização do homem para continuidade ao tratamento em unidades primárias de atenção à saúde, caracterizando a longitudinalidade do cuidado, com práticas mais ativas menos prescritivas neste processo, valorizando-se a correponsabilização pelo equilíbrio da saúde. Nestas unidades, os enfermeiros, notadamente, têm maior autonomia profissional, principalmente, ao recepcionar os homens que chegam para o acolhimento e estabelecem a classificação de risco. Porém, nem sempre conseguem fazer o acompanhamento longitudinal de cada usuário, pois de modo geral, os homens procuram as unidades com demandas agudas, e poucos se vinculam aos serviços ou equipes.

A PNAISH reconhece que o homem acessa o sistema de saúde por meio da atenção especializada. Neste sentido, é fundamental que haja estratégias de acolhimento das demandas da saúde destes homens na atenção básica, especialmente, se pensarmos na saúde da família como organizadora da rede de atenção à saúde. Neste sentido, a contribuição do enfermeiro, é visível face ao seu papel de articulador dos membros da equipe, acolhedor das demandas, classificador das gravidades das demandas e muitas vezes por ser o profissional que, de imediato, orienta ou estabelece estratégias para a resolução dos problemas de saúde identificados.

Vale ressaltar a importância, ainda, de ações de enfermagem nos diversos tipos de prevenção: o enfermeiro se coloca nas estratégias de redução da exposição a fatores de risco como o tabagismo e o etilismo, bem como realiza ações educativas para modificar hábitos como o sedentarismo e a nutrição inadequada; opera no sentido de promover o diagnóstico precoce em áreas como o combate ao câncer do colo do útero e de mama; participa das ações de reabilitação no âmbito da saúde pública, em áreas como a redução do consumo de álcool e drogas; e finalmente, sistematiza conduta nas ações paliativas. Todas estas ações podem e são organizadas dentro da oferta de serviços da atenção básica, que hoje se tornou um dos campos mais atrativos para o trabalho do enfermeiro, com estreitamento do vínculo com a população e a possibilidade do acompanhamento longitudinal da saúde nos diferentes ciclos de vida.

Portanto, é fundamental que se pense nos principais obstáculos para a inserção no homem na rotina dos serviços de saúde, considerando as especificidades do homem no seu processo saúde-doença, e os desafios para o seu enfrentamento pela Enfermagem na Atenção Básica.

CONCLUSÃO

A realização do estudo permitiu observar que a tendência da mortalidade por grandes grupos de causas entre homens no Município do Rio de Janeiro está decrescendo. Entretanto, a literatura não aponta a mesma situação para a incidência das doenças, o que faz supor que mais adultos masculinos estão adoecendo e sobrevivendo mais tempo, entretanto, doentes. Esta realidade exige dos serviços de saúde, em particular da atenção básica, uma postura diferenciada com relação ao acolhimento e do vínculo destes sujeitos, com vistas a potencializar o cuidado a este grupo populacional, que, historicamente, possui adesão mais difícil a qualquer intervenção em saúde.

A informação epidemiológica é, portanto, a base do planejamento de saúde. Neste sentido, este artigo fala a favor de ter em mente uma análise de situação de saúde minuciosa a respeito da saúde do homem no Município do Rio de Janeiro, para que a Política de fato seja implementada com poder de resolutividade a este grupo demográfico que, além de possuir um perfil epidemiológico diferenciado, historicamente, apresenta maior dificuldade de acesso ao serviço de saúde.

É preciso, pois que o serviço esteja atento para a realidade masculina, que é a de dificuldade em acesso institucional para compatibilizar seus horários de trabalho com aqueles oferecidos pelas agendas dos consultórios e grupos de educação em saúde, a dificuldade de reconhecimento de sua própria situação de vulnerabilidade e a adesão a qualquer tipo de tratamento que envolva mudança dos hábitos de vida e interação social.

A Política Nacional de Atenção à Saúde do Homem viabilizada nas unidades de saúde pode e deve ser mais sensível a esta realidade, de forma que os serviços possam ofertar uma atenção em saúde capaz de reconhecer mais, integralmente, as necessidades de saúde desse público específico. É imperativo reconhecer as limitações das abordagens centradas especificamente em doenças, estimular busca ativa destes homens, favorecendo práticas de promoção à saúde, romper as barreiras de acesso, e com criatividade e sensibilidade que este grupo requer, por em prática os princípios de equidade e integralidade do Sistema de Saúde.

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