Volume 10, Número 2, Abr/Jun - 2006
RELATO DE EXPERIÊNCIA
Relação usuária-profissional de saúde: experiência de uma mulher homossexual em uma unidade de saúde de referência de Fortaleza
The health professional-user relationship: experience of a homosexual woman in a renowned Fortaleza health unit
Relación usuaria-profesional de salud: experiencia de una mujer homosexual en una unidad de salud de referencia de Fortaleza
Maria Alix Leite de AraújoI; Marli Teresinha Gimeniz GalvãoII; Micheli Morais Martins SaraivaIII; Angela Dias de AlbuquerqueIII
IEnfermeira, Doutora pelo Curso de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Ceará. Professora da Universidade de Fortaleza - UNIFOR
IIProfessora do Departamento de Enfermagem e do Curso de Pós-Graduação em Enfermagem da Universidade Federal do Ceará/
IIIConcludente do Curso de Enfermagem da Universidade de Fortaleza-(UNIFOR)
RESUMO
A relação usuária-profissional de saúde é essencial para a qualidade do atendimento, especialmente nos serviços de atenção à saúde da mulher, onde a abordagem da sexualidade deve ser objeto de considerada relevância. Tem-se como objetivo descrever a experiência vivenciada por uma mulher homossexual atendida em uma unidade de saúde. Desenvolveu-se um relato de experiência. Em virtude de a revelação da homossexualidade feminina não constituir prática comum nos serviços de saúde, optou-se por um estudo de caso mediante descrição da experiência de atendimento de uma mulher homossexual em uma unidade de saúde de referência de Fortaleza-CE no segundo semestre de 2004. Desenvolveu-se entrevista aberta com a seguinte pergunta norteadora: Fale-me da sua experiência com o atendimento na unidade de saúde. Os dados foram analisados utilizando-se duas categorias temáticas: O atendimento recebido na unidade e a comunicação com o profissional de saúde. Conforme se concluiu, foi possível iniciar uma reflexão sobre a fragilidade das relações interpessoais entre as mulheres homossexuais e os serviços de saúde. Apesar de estas terem acesso ao serviço via setor de ginecologia, o desenvolvimento do processo de comunicação é muito superficial e deixa de elucidar questões importantes do exercício da sexualidade, perdendo-se, conseqüentemente, a oportunidade de desenvolver um trabalho educativo na prevenção das DST e, inclusive, do HIV.
Palavras-chave: Homossexualidade feminina. Serviços de Saúde. Relações profissional-paciente.
ABSTRACT
The health professional-user relationship is essential for quality of care, especially in women's health services, where sexuality should be carefully approached due to its considerable relevance. The aim here is to describe the experience of a homosexual woman seen at a health center. An experience report was performed. Due to the fact that revelation of female homosexuality is not common practice in health services, a case study format was opted for based on description of the experience of treatment by a homosexual woman at a renowned healthcare center in Fortaleza, Ceará, Brazil, during the second semester of 2004. An open interview was held with the following lead question: Tell me about your experience of service at the health center. The data were analyzed using two thematic categories: (a) treatment received at the center and (b) communication with the healthcare professional. As was concluded, it was possible to begin reflecting on the fragility of interpersonal relations between homosexual women and healthcare services. Although the former have access to care through the gynecology department, the communication process is highly superficial, and fails to clarify important issues relating to sexuality, thus missing an opportunity to perform educational work in the prevention of STDs, including HIV.
Keywords: Female homosexuality. Health services. Professional-patient relations
RESUMEN
La relación usuaria-profesional de salud es esencial para la calidad de la atención, especialmente en los servicios de atención a la salud de la mujer, donde el abordaje de la sexualidad debe ser objeto de considerable relevancia. Se tiene como objetivo describir la experiencia vivenciada por una mujer homosexual atendida en una unidad de salud. Se desarrolló un relato de experiencia. Como la revelación de la homosexualidad femenina no constituye una práctica común en los servicios de salud, se optó por un estudio de caso mediante la descripción de la experiencia de atención de una mujer homosexual en una unidad de salud de referencia de Fortaleza-CE en el segundo semestre de 2004. Se desarrolló una entrevista abierta con la siguiente pregunta orientadora: Hábleme de su experiencia con la atención en la unidad de salud. Los datos fueron analizados utilizando dos categorías temáticas: a) La atención recibida en la unidad y la comunicación con el profesional de salud. Se concluyó, fue posible iniciar una reflexión sobre la fragilidad de las relaciones interpersonales entre las mujeres homosexuales y los servicios de salud. A pesar de que estas tienen acceso al servicio a través del sector de ginecología, el desarrollo del proceso de comunicación es muy superficial, y deja de elucidar cuestiones importantes sobre el ejercicio de la sexualidad, perdiendo consecuentemente la oportunidad de desarrollar un trabajo educativo de prevención de las ETS e inclusive del VIH.
Palabras clave: Enfermería. Historia de la Enfermería. Escuelas de Enfermería.
INTRODUÇÃO
A relação usuária-profissional de saúde é fundamental para a qualidade do atendimento, especialmente nos serviços de atenção à saúde da mulher, onde a abordagem da sexualidade deve ser objeto de considerada relevância.
Desde sua implantação, os programas de assistência à saúde da mulher privilegiaram pessoas heterossexuais, com enfoque particular na saúde reprodutiva. Quanto às mulheres homossexuais, suas demandas específicas ressentem-se de acolhimento face aos preconceitos sexuais dominantes na sociedade. Desse modo, elas enfrentam inúmeras barreiras para revelar sua orientação sexual nos serviços de saúde. Temem, principalmente, um provável impacto negativo na qualidade da assistência1.
A partir da mudança no perfil epidemiológico da AIDS, que passou a acometer cada vez mais mulheres em idade reprodutiva, despertou-se para a necessidade de incluir trabalhos de prevenção contra as DST/HIV na rotina dos serviços de assistência à saúde da mulher. Diante disso, o Ministério da Saúde passou a recomendar o aconselhamento na rotina desses serviços, e a abordagem deve estar voltada às necessidades de cada paciente de acordo com a sua orientação sexual2. Deve também envolver temas relacionados aos aspectos sociais e comportamentais de mulheres homossexuais, bem como garantir a qualidade do atendimento a essa população2;3. Entretanto, percebe-se uma dificuldade dos profissionais para abordar esses temas, sendo necessárias a capacitação e educação permanente dos mesmos.
O aconselhamento deve incorporar os componentes de orientação/informação, avaliação de riscos e apoio emocional4. A avaliação dos riscos pessoais para se contrair o HIV envolve a abordagem de temas delicados para a maioria dos profissionais, como o exercício da sexualidade, número de parceiros sexuais, práticas sexuais, uso de drogas especialmente intravenosas, entre outros. Ocorre que, em virtude da dificuldade da abordagem desses temas, os profissionais de saúde não reconhecem a avaliação de riscos como um dos componentes importantes do aconselhamento5, o que pode estar comprometendo esta prática nos serviços.
Para que o aconselhamento aconteça a contento, o profissional de saúde deve desenvolver a habilidade de escuta e estar aberto às demandas da mulher. O desempenho destas atividades implica em uma readequação dos serviços e preparo dos profissionais especialmente em temas relacionados à abordagem da sexualidade.
Para se trabalhar devidamente com os aspectos da sexualidade, faz-se imprescindível estabelecer o vínculo e uma relação de confiança entre o profissional de saúde e as usuárias dos serviços. Porém, a prática dos profissionais é marcada por preconceitos e tabus, ainda mais fortes quando o assunto está relacionado a sexo ou sexualidade, e, de modo especial, quando se trata de homossexualidade feminina. Evidencia-se então, uma dificuldade mútua na abordagem deste tema.
De modo geral, o profissional nada pergunta sobre a vida sexual dessas mulheres. Elas, para não se exporem, aceitam a situação sem questionar. Mas, apesar de estarem inseridas na categoria de baixo risco, elas não estão totalmente imunes à infecção pelo HIV6 e podem contrair outras DST. Daí a importância de um trabalho educativo e de promoção da saúde dessas mulheres.
Desconsiderando o estilo de vida das mulheres, o aconselhamento não está sendo realizado a contento, pois o fato de mulheres homossexuais não relatarem essas práticas faz com que este aconselhamento fique descontextualizado de suas vidas. Nesta situação, a falta de um diálogo franco pode trazer incalculáveis conseqüências, tanto para os serviços como para as próprias mulheres. Entre estas conseqüências destacam-se a falta de procura para a realização de exames de rotina, como prevenção de câncer de colo uterino e de mamas.
As mulheres homossexuais não se percebem em risco de contrair o HIV, têm pouca familiaridade com estratégias de prevenção e apresentam práticas inconsistentes de sexo seguro. Elas, a exemplo de outros segmentos populacionais, também sofrem os efeitos negativos do álcool e das drogas ilícitas na manutenção de práticas sexuais protegidas e sentem dificuldade no uso de preservativos com parceiros de ambos os sexos7.
As orientações para a prevenção que deveriam perpassar todos os atendimentos não ocorrem, ou deixam muito a desejar. No caso específico da homossexualidade feminina, muitas vezes adota-se um atendimento totalmente fictício, pois elas não revelam sua orientação sexual. Em face disto, são abordadas como heterossexuais. Mesmo assim, em algumas situações, elas sentem-se satisfeitas com o atendimento que estão recebendo, apesar de manifestarem profunda ansiedade a respeito da revelação da sua orientação sexual, pois conforme mencionado, temem atitudes preconceituosas por parte dos profissionais1.
Entretanto, os cuidados às mulheres homossexuais devem ser culturalmente apropriados aos seus valores e estilos de vida8, o que justifica a utilização de técnicas e habilidades específicas na entrevista, para a garantia mínima de uma boa anamnese e condução das orientações.
Neste contexto, o interesse pelo presente estudo adveio do interesse das pesquisadoras no trabalho de aconselhamento para DST/HIV e teve como objetivo descrever a experiência vivenciada por uma mulher homossexual em relação ao atendimento em uma unidade de saúde, bem como a comunicação com o profissional. Durante o aconselhamento, esta mulher revelou sua homossexualidade e ressaltou jamais ter tido a oportunidade de desvendá-la em outros momentos no serviço, apesar de já ser acompanhada na unidade há anos. A habilidade e a prática rotineira da pesquisadora na realização do aconselhamento e avaliação de risco e o cuidado em não emitir atitudes preconceituosas durante o atendimento tornaram o diálogo mais descontraído e favoreceram uma maior abertura da mulher assistida.
METODOLOGIA
A experiência foi motivada pela assistência à mulher em ambulatório de ginecologia em Fortaleza-CE. Trata-se de uma abordagem baseada na pesquisa convergente assistencial do tipo qualitativa. Este tipo de pesquisa articula a prática profissional com o conhecimento teórico, pois seus resultados são canalizados progressivamente durante o processo da pesquisa para situações práticas. Ao mesmo tempo, os pesquisadores formulam temas de pesquisas a partir das necessidades emergentes dos contextos da prática9.
Os dados qualitativos permitem também apreender o aspecto multidimensional dos fenômenos, capturando os diferentes significados das experiências no ambiente investigado, com vistas a auxiliar na compreensão das relações entre os indivíduos, seu contexto e suas ações. Oferece a possibilidade de o pesquisador captar a maneira pela qual os indivíduos pensam e reagem em face das questões focalizadas, bem como proporciona conhecer a dinâmica e a estrutura da situação em estudo, do ponto de vista de quem a vivência10.
Trata-se de um relato de experiência apresentado mediante estudo de caso, em decorrência de a revelação da homossexualidade feminina não constituir prática comum nos serviços de saúde. Descreve-se a vivência na comunicação entre a mulher e os profissionais de saúde durante os atendimentos em ginecologia em uma unidade de saúde de referência para diversas especialidades médicas, inclusive doenças sexualmente transmissíveis. A referida unidade funciona como campo de estágio para a disciplina de saúde da mulher de universidades pública e privada da cidade. O período de coleta de dados ocorreu nos meses de agosto e setembro de 2004.
O estudo de caso é uma exploração de um sistema delimitado ou de um caso, obtido por detalhada coleta de dados. É uma investigação aprofundada onde se busca informação relevante por meio do contato com um grupo ou indivíduo10;11. Realizou-se entrevista aberta, de acordo com a seguinte questão norteadora: Fale-me da sua experiência com o atendimento na unidade de saúde no que diz respeito à revelação da sua homossexualidade.
Os dados foram analisados utilizando-se categorias temáticas para subsidiar a discussão dos resultados. Estas visaram estabelecer significados, idéias ou expressões em torno de um conceito12 e foram assim definidas: A relação da mulher homossexual com o serviço de saúde no que diz respeito ao processo de comunicação.
Descrição do caso
Utilizou-se como sujeito do estudo uma mulher homossexual que faz anualmente acompanhamento ginecológico na referida unidade. Por ocasião da entrevista do aconselhamento, ela se sentiu bastante confortável para revelar sua homossexualidade, a partir da interação desenvolvida com a profissional que a atendeu. Ao término do atendimento, essa situação foi amplamente discutida pelos atores presentes ao atendimento, pois tratava-se de uma consulta de estágio curricular do curso de enfermagem, na disciplina de saúde da mulher. Desta forma, decidiu-se estudar mais profundamente o caso, em virtude de ser pouco explorado na literatura científica e de ampliar as contribuições para a melhoria da qualidade do atendimento nos serviços. Por ocasião do retorno à consulta, a mulher foi convidada a participar do estudo e aceitou prontamente o convite.
Foram respeitadas todas as recomendações éticas contidas na resolução nº 196/96, e no intuito de manter o anonimato do caso, utilizou-se o pseudônimo de Rubi. Foi solicitada autorização para gravação da entrevista e assinado o termo de consentimento livre e esclarecido.
ANÁLISE DOS DADOS
Rubi tem 42 anos de idade, é natural de Fortaleza-CE, terminou o ensino médio e possui trabalho fixo. Reside na periferia da cidade em um bairro situado na área de abrangência da unidade onde faz acompanhamento ginecológico de rotina anualmente. Durante os atendimentos, sempre omitiu sua orientação sexual. Quando da colheita citológica para prevenção do câncer cervicouterino, referiu múltiplas parcerias heterossexuais, sendo este o motivo do encaminhamento para o aconselhamento pré-teste anti-HIV.
O atendimento recebido na unidade
A exemplo do ocorrido na relação médico-paciente, a relação entre os outros profissionais e os usuários dos serviços de saúde tem sido focalizada como um aspecto- chave para a melhoria da atenção e desdobra-se em diversos componentes, como a personalização da assistência, a humanização do atendimento e o direito à informação13.
No âmbito dos serviços de saúde, estes componentes desenvolvem-se de forma fragmentada, e um dos motivos dessa fragmentação está na inabilidade dos profissionais para perceber as demandas dos usuários, especialmente se estas não forem verbalmente relatadas. Na prática clínica, existem motivos implícitos e explícitos que levam as usuárias à consulta. Nem sempre, porém, o motivo real é o mais importante14. Mas, a percepção pode dar significado às nossas interações com o outro por meio da habilidade para decifrar manifestações não verbais do comportamento.
A relação profissional-usuária é fria, distante, não proporcionando a interação e oportunidade para que estas se coloquem abertamente acerca da sua vida, especialmente em relação ao exercício da sexualidade. A situação a seguir ilustra essa realidade:
Entre eu e o profissional é uma consulta muito distante. Nunca houve oportunidade para isso [falar sobre sua homossexualidade].
É imperioso, portanto, que o profissional tenha habilidade para percepção dos indícios verbais e não verbais contidos na mensagem dos usuários. A partir dessa percepção e interesse em acolher as demandas da usuária é que foi possível captar as informações mais detalhadas sobre o caso.
De modo geral, os profissionais de saúde são formados dentro de um modelo biomédico, no qual os aspectos afetivos e emocionais do usuário são desconsiderados. O modelo de assistência vigente, baseado na produção, torna-se impessoal e impeditivo de uma abordagem mais ampla e holística do usuário.
Durante o atendimento, cabe ao profissional desenvolver habilidades capazes de favorecer um ambiente adequado onde as questões de difícil elucidação possam ser contempladas. Esse ambiente não significa necessariamente apenas um espaço físico apropriado, mas também um momento de integração e de inter-relação passível de contribuir para o desvelamento de problemas não explícitos e difíceis de ser relatados pela usuária15 , a exemplo da homossexualidade feminina.
Se esta condição não é contemplada, a usuária tende a omitir informações verdadeiras. Desse modo, configura-se um atendimento fictício, baseado em orientações ineficientes, descontextualizadas e não personalizadas, como mostra a fala da usuária abaixo:
...Porque as pessoas não dizem a verdade, dizem que não fazem, mas fazem muita coisa diferente... quando não se tem empatia e abertura com o profissional.
Essa situação decorre, muitas vezes, do despreparo do profissional, quase sempre dependente de influências socioculturais e experiências pessoais, oriundas da sua própria visão da saúde da mulher. Esta é vista de modo fragmentado e desconsiderando, entre outros aspectos, o exercício da sexualidade. No entanto, para o profissional tratá-la adequadamente, deve atendê-la em sua totalidade.
A falta de desenvolvimento de uma relação interpessoal compromete a qualidade da anamnese, primeira etapa para o estabelecimento do vínculo e requisito indispensável para a condução do caso e definição do diagnóstico. No caso específico de mulheres atendidas no serviço de ginecologia, cujas queixas mais comuns são os corrimentos vaginais, os quais podem ou não se configurar em infecções do trato genital, as perguntas referentes ao exercício da sexualidade são imprescindíveis.
Urge treinar os profissionais em técnicas e habilidades de abordagem da sexualidade. A partir daí, e com autorização da mulher, cabe-lhes questioná-las acerca desse tema em cada atendimento. No caso da homossexualidade feminina, se estas perguntas não são feitas, as mulheres preferem omitir tal informação. Conseqüentemente, quando esta é realizada, ocorre de forma totalmente superficial e fictícia. É o que relata o trecho abaixo:
...Chegar para o profissional e dizer que sou assim... Se o profissional não perguntar, você não precisa dizer... [referindo-se à homossexualidade].
O processo de comunicação
Descreve-se comunicação, neste estudo, como um processo comum a todas as ações de saúde que influi decisivamente na qualidade da assistência prestada àquele que necessita dos cuidados profissionais16.
O processo educativo desenvolvido nos serviços de saúde é ferramenta imprescindível no desenvolvimento de uma comunicação terapêutica, pois, no desempenho da função técnica, a competência em comunicação tem o mesmo nível de importância da competência clínica16.
Ademais, a comunicação é um processo que consiste em fazer circular informações, e é importante que o emissor e o receptor compartilhem de uma relação bilateral17, ou seja, que haja trocas e crescimento mútuo.
No caso específico de Rubi, apesar de realizar prevenção do câncer há anos na unidade, não informara até então, sua orientação sexual. Portanto, a comunicação com os profissionais era muito distante. Segundo referiu Rubi, a revelação da sua homossexualidade só foi possível porque se sentiu à vontade durante o aconselhamento pré-teste anti-HIV, pois encontrou espaço para falar abertamente e não sentir nenhuma demonstração de julgamento por parte do profissional.
Nesse atendimento eu me senti mais à vontade. Aqui eu encontrei espaço para falar, sem ter medo de ser mal tratada.
O profissional de saúde precisa conhecer e praticar as habilidades necessárias para o desenvolvimento de uma comunicação eficaz, pois percebe-se que é possível elucidar aspectos da intimidade das pessoas, desde que elas se sintam respeitadas e acolhidas.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com este estudo, foi possível iniciar uma reflexão sobre a fragilidade das relações interpessoais entre mulheres homossexuais e profissionais de saúde. Embora tenham acesso ao serviço via setor de ginecologia, o desenvolvimento do processo de comunicação é muito superficial e deixa de elucidar questões importantes do exercício da sexualidade. Perde-se, conseqüentemente, a oportunidade de desenvolver um trabalho educativo de promoção da saúde e prevenção das DST, incluindo o HIV.
Conforme percebeu-se, existe uma carência de trabalhos relacionados à abordagem da homossexualidade nos serviços de saúde, o que impossibilitou uma análise comparativa com outros estudos sobre o tema.
Pessoas homossexuais normalmente estão à margem destes serviços. Em face desta realidade, é imperativo que os órgãos governamentais responsáveis pelas políticas de saúde levem em consideração as mudanças ocorridas ao longo dos anos no comportamento sexual da sociedade e desenvolvam um processo de educação continuada com os profissionais para acolher adeqüadamente essa demanda.
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Recebido em 23/05/2005
Reapresentado em 23/03/2006
Aprovado em 06/14/2006