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CAPES

Volume 6, Número 3, Dez/Dez - 2002

ARTIGOS DE PESQUISA

 

Qualidade da assistência obstétrica e perinatal em hospital amigo da criança: experiência de uma maternidade - Anápolis/GO

 

Quality on obstetrical and perinatal assistance in a baby-friendly hospital: an experience in the maternity - Anápolis/GO

 

Calidad de la asistencia obstétrica y perinatal en hospital amigo del niño: experiencia de una maternidad - Anápolis/GO

 

 

Cleusa Alves MartinsI; Sandra Valéria Martins PereiraII

IDoutora em Enfermagem, Profª Adjunto da Disciplina Materno-Infanto-Juvenil e Coordenadora do Curso de Especialização em Enfermagem Obstétrica. Faculdade de Enfermagem da Universidade Federal de Goiás-FEN/UFG
IIEnfermeira Obstétrica, Profª. do Curso de Enfermagem da Associação Educativa Evangélica de Anápolis-GO

 

 


RESUMO

A investigação desenvolveu-se em Hospital Amigo da Criança (IHAC), cujas premissas básicas são: promoção do aleitamento materno, fortalecimento dos serviços de saúde, assistência centrada no trinômio mãe-filho-pai na reconstrução do parto normal.
OBJETIVOS: identificar a qualidade da implementação dos Dez passos de Sucesso para o Aleitamento Materno (BRASIL, 1989). Abordagem metodológica qualitativa com enfoque dialético, tipo estudo de caso. Para coleta, a triangulação dos dados ¾ entrevistas com usuários do serviço, profissionais e cuidadores, observação do parto e atendimento imediato ao recém-nascido e seleção de documentos. A análise dos dados fundamentada na Auto-Avaliação do IHAC, Maternidade Segura e Programa de Acreditação Hospitalar.
CONCLUÍMOS: o processo assistencial atende às políticas de saúde do MS ¾ excelente média de aleitamento materno exclusivo, baixas taxas de cesárea, de natimortalidade e mortalidade materna. A Maternidade foi classificada como referência no Estado de Goiás (2000) e recebeu o Prêmio de Qualidade Hospitalar (2001), atendendo às expectativas dos consumidores de serviços obstétricos.

Palavras-chave: Enfermagem Obstétrica. Qualidade da Assistência Obstétrica. Maternidade Segura. Programa de Acreditação Hospitalar.


ABSTRACT

The current investigation was developed in the Baby-Friendly Hospital, whose main premises are: promoting maternal breastfeeding, improving health services, giving assistance based on the trinomial mother-child-father, and restoration of parturition.
AIM: Identify the quality on implementing the Ten Steps to the Success of Maternal Breastfeeding (Ministry of Health, 1989). Methodological Approach: qualitative, with focus on the dialectic aspect, case study. For the assessment and data triangulation - interview with service users, professionals and assistants; observation of the parturition and immediate assistance to the neonate, and document selection. The data analysis was based on the Baby-Friendly Hospital Self-Assessment, Safe Maternity and Hospital Accreditation Program.
CONCLUSION: the assistance process attends the Ministry of Health rules - excellent maternal breastfeeding rate and low number of Caesareans, natimortality, and maternal mortality rates. This maternity was considered as reference in the State of Goiás (2000) and received the prize on Hospital Quality (Prêmio de Qualidade Hospitalar) 2001, fulfilling the expectations of obstetric service users.

Keywords: Assistance of Nursing. Quality Obstetric Services. Safe Maternity. Hospital Accreditation Program.


RESUMEN

La investigación se desarrolló en el Hospital Amigo del Niño (IHAC), que tiene como premisas básicas: promoción de la lactancia materna, fortalecimiento de los servicios de salud, asistencia centrada en el trinomio mamá-hijo-papá y reconstrucción del parto normal.
OBJETIVOS: identificar la calidad de la implantación de los Diez Pasos de Éxito para la Lactancia Materna (MS, 1989). Abordaje metodológico cualitativa con enfoque dialéctico, tipo estudio de caso. Para colectar la triangulación de los datos ¾ entrevistas con usuarios del servicio, profesionales y cuidadores; observación del parto y atención inmediata al recién nacido y selección de documentos. El análisis de los datos fundamentado en la Auto Evaluación del IHAC, Maternidad Segura y Programa de Acreditación Hospitalaria. Concluimos que el proceso asistencial atiende las políticas de salud de MS: excelente promedio de lactancia materna exclusiva y bajas tasas de cesárea, de natimortalidad y mortalidad materna. La Maternidad fue clasificada como referencia en el Estado (2000) y recibió el Premio de Calidad Hospitalaria (2001), atendiendo a las expectativas de los consumidores de servicios obstétricos.

Palabras claves: Asistencia de la Enfermería. Calidad de los Servicios Obstétricos. Maternidad Segura y Programa de Acreditación Hospitalaria.


 

 

INTRODUÇÃO

O modelo de assistência obstétrica e perinatal1 até então desenvolvido por instituições de saúde tem sido questionado quanto à sua qualidade pelos próprios gestores de saúde e pela sociedade em geral. Atualmente, é prioridade nas políticas do Ministério da Saúde (MS.) e outras organizações o resgate da dignidade, saúde e cidadania das mulheres e seus filhos.

Há uma associação entre saúde, condição social, nível de escolaridade de uma mulher e o risco potencial de que seu filho morra antes de completar um ano de idade. Óbitos de lactentes ocorrem geralmente no primeiro mês, especialmente na primeira semana de vida, suas causas subjacentes estão freqüentemente relacionadas aos níveis de saúde, à qualidade da assistência recebida durante o ciclo gravídico-puerperal e aos cuidados imediatos com o recém nascido (OMS, Genebra, 1986).

Nesse sentido, o grande desafio governamental é romper com o paradigma intervencionista-medicalizador, buscando resgatar o papel de protagonista do parto que a mulher perdeu ao longo da história, evitando, assim, uma série de procedimentos que têm descaracterizado o parto como fenômeno fisiológico, atribuindo-lhe um caráter estereotipado e geralmente dependente da assistência médico-hospitalar, prejudicando a interação mãe-filho-pai e culminando na maioria das vezes no insucesso da lactação natural, nos altos índices de desmame precoce e de mortalidade perinatal, neonatal e infantil.

Assim, em Anápolis-Goiás, uma maternidade, rompendo com o modelo assistencial tradicional, adota um novo paradigma com a implantação do Projeto Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC) ¾ ampliação, adequação e melhoria do processo assistencial, desde a captação precoce da gestante no serviço de pré-natal até o apoio à nutriz, valorização da presença do pai durante o processo de gestação, parto e nascimento, realização de cesárea somente após criteriosa indicação clínica e fortalecimento das ações de saúde em todos os níveis.

A meta das políticas públicas na área materno-infantil é reduzir o coeficiente de mortalidade materna e perinatal que, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS) e o Fundo das Nações Unidas para Infância (UNICEF) apud Laurenti (2001), representam indicadores de status da mulher, seu acesso à assistência à saúde e a adequação do sistema de saúde para responder suas necessidades. Porém, existem dificuldades para estabelecer o índice de mortalidade materna, nos países em desenvolvimento, devido ao subregistro e à má informação sobre a causa da morte nos atestados de óbito, constituindo um obstáculo para a real apresentação dos dados.

A Organização Mundial de Saúde (OMS) classifica o Coeficiente de Mortalidade Materna (CMM)2 em muito baixo; baixo; médio; alto e muito alto (SILVA et al, 1999 apud MARTINS, 2001, p. 28). Segundo os autores, o CMM, no Brasil, em 1997, foi Alto ¾ 115/100 000, em Goiás, de 1989 a 1993, foi de aproximadamente 52.3/100 000 nascidos vivos. A Taxa de Mortalidade Materna no Brasil em 1997 e 1998 respectivamente, é de 67.02/100 000 e 68.00/100 000 NV; em Goiás, 46.38/100 000 e 44.00/100 000 NV (Sistema de Informações sobre Mortalidade/SIM, 2002).

O índice máximo de natimortos admitido pela Organização Mundial de Saúde é de 20/100 000 nascidos vivos. No Brasil, foi de 37/100 000 nascidos vivos que morrem antes de completarem um ano de vida (IBGE, 1998, apud MARTINS, 2001). Sendo que a mortalidade perinatal representa a metade das mortes em crianças menores de um ano (MS, 1994, p. 1). Segundo Sistema de Informações de Mortalidade (BRASIL, 2002) a Taxa de Mortalidade Neonatal Precoce3, em 1997 e 1998, no Brasil, foi de, respectivamente 17.72/1000 e 17.15/1000 NV; em Goiás, 13.93/1000 e 13.28/1000 NV; A Taxa de Mortalidade Neonatal Tardia4, no Brasil, 4.72/1000 e 4.19/1000 NV; em Goiás, 3.68/1000 e 3.52/1000 NV.

É evidente o comprometimento de associações nacionais e internacionais com a melhoria da saúde materna e perinatal. Nesse contexto, destacaram-se dois encontros internacionais: a conferência sobre Maternidade Segura, realizada em Nairobi - África (1987), quando em decorrência da situação de gravidade da mortalidade materna nos países em desenvolvimento, onde foram traçadas metas em prol da redução dessas taxas; e o encontro Spedale degli Innocenti, na Itália, em 1990, ocasião em que o Brasil assinou a Declaração de Innocenti, formalizando o compromisso de dar partida ao IHAC, o que aconteceu no país, a partir de 1992.

O placar de Hospitais Amigos da Criança apresentado pela UNICEF (2002) é: 13 127 no mundo (1998); no Brasil, 142 (janeiro, 2000), sendo que a região Nordeste é a líder nesta categoria com 86 instituições e a Centro-Oeste aparece com 16 delas (aleitamento 24 horas, 2002).

Avaliar a qualidade das ações dispensadas pelas instituições que aderiram a esses projetos é atualmente uma questão complexa, pois, embora as políticas de saúde explicitem as diretrizes de ação e bases operacionais para assistência obstétrica e perinatal, na prática existem distorções que refletem a qualidade dessa assistência. Nesse sentido, a compreensão do contexto histórico-sociopolítico e cultural, no qual os serviços de saúde se organizam nas esferas federal, estadual e municipal, permite-nos fazer uma estimativa das condições em que as mulheres vêm gestando e parindo seus filhos.

Desse modo, este estudo trará subsídios concretos sobre a qualidade da assistência obstétrica prestada pelos Hospitais Amigos da Criança, principalmente em Anápolis-Goiás, representando um importante Feedback para os profissionais e gestores da área de saúde.

Questões norteadoras

O projeto Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC) tem contribuído para melhoria da qualidade da assistência obstétrica e perinatal no país e, particularmente, em Anápolis-Goiás?

A implementação do IHAC tem influenciado na capacitação, mudança de atitude e no desenvolvimento das atividades profissionais da equipe de saúde em instituições credenciadas?

As ações implantadas na Maternidade Dr. Adalberto Pereira Silva, em Anápolis-Goiás, têm alcançado os objetivos preconizados pelo IHAC?

Com base nesses questionamentos, elaboramos os Objetivos:

Identificar em Anápolis-GO, as instituições de saúde que aderiram ao IHAC;

Avaliar a qualidade da assistência obstétrica e perinatal, assim como a postura da equipe multiprofissional, após a implantação e implementação dos Dez Passos de Sucesso para o Aleitamento Materno (BRASIL,1989), na instituição em estudo.

 

TRAJETÓRIA METODOLÓGICA

O estudo pautou-se numa abordagem metodológica qualitativa, tipo "Estudo de Caso", com enfoque histórico-dialético. A pesquisa qualitativa permite compreender o problema no meio em que ele ocorre, sem criar situações artificiais que mascaram a realidade, ou que levam a interpretações e generalizações equivocadas (TYRRELL apud GAUTHIER 1998, p. 18).

A coleta de dados foi em uma maternidade filantrópica de Anápolis-GO, credenciada junto à IHAC desde 1996, atualmente em processo de adequação para credenciamento como Maternidade Segura. Utilizamos a técnica de triangulação dos dados que tem por objetivo abranger a máxima amplitude na descrição, explicação e compreensão do foco (TRIVIÑOS, 1987). E é uma prova eficiente de validação, visto que essa técnica permite a checagem de um dado obtido numa variedade de situações, em momentos variados e com diferentes fontes de informação (MINAYO, 1993, apud GAUTHIER, 1998, p. 28).

Inicialmente, na etapa exploratória, fizemos visitas à Secretaria de saúde Municipal e à 3ª Regional de Saúde do Estado de Goiás para conhecer a rede de saúde local; em seguida, visitamos a maternidade escolhida para pesquisa, onde aplicamos um roteiro de visitas composto por 35 itens, abrangendo a observação da estrutura física e do processo assistencial, adaptado dos componentes de Donabedian5 (1996) apud Alves e Silva (2000). Num terceiro momento, realizamos entrevistas semi-estruturadas durante 10 dias consecutivos, com 20 dos diferentes atores do ciclo gravídico-puerperal ¾ gestantes que aguardavam consulta na sala de espera do consultório, casais grávidos, parturientes, puérperas do alojamento conjunto, nutrizes no grupo de apoio, e também com profissionais que lidam diretamente com a clientela. Nessa etapa, observamos, também, o processo de admissão, a assistência ao trabalho de parto e parto com respectivo cuidado ao recém-nascido, de 20 parturientes, além do processo assistencial no alojamento conjunto.

No último momento, estudamos e analisamos alguns documentos: norma de atendimento na maternidade; plano de atividades educativas para o grupo de gestantes; rotinas assistenciais dos diversos setores (pré-natal, pré-parto, centro obstétrico, alojamento conjunto, berçário de alto risco); protocolos para admissão, alta e transferência de pacientes; sistema de referência e contra-referência; atas de cursos e rotinas de educação continuada; arquivos de fotos; filmes e banco de dados estatísticos.

 

APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Identificamos, na rede de saúde local, duas instituições que aderiram à IHAC ¾ um hospital geral de grande porte e uma maternidade de pequeno porte. Optamos por desenvolver a pesquisa na instituição especializada em obstetrícia, por acreditarmos na facilidade de acesso a todos os atores do estudo.

Os conceitos de avaliação e qualidade evoluem juntos, avaliar é atribuir valor a um determinado objeto, fato ou fenômeno, classificando-o como bom ou ruim, sendo um conceito complementar ao da qualidade (ALVES e SILVA, 2000, p.17). Nessa perspectiva, elaboramos três categorias temáticas: estrutura, processo e avaliação, correspondentes aos três componentes do modelo unificado de avaliação da qualidade proposto por Donabedian (1996), e cinco subcategorias ¾ pré-natal, pré-parto, centro obstétrico, alojamento conjunto e grupo de apoio. Selecionamos também indicadores avaliativos e classificatórios, tanto da estrutura quanto do processo assistencial apresentados nos instrumentos de auto-avaliação da IHAC6 (1989), nos Oito Passos para Maternidade Segura7 (1995), nas categorias de Cianciarullo8 (1998) e no Programa de Acreditação Hospitalar9 (1999), para análise e avaliação da qualidade da assistência prestada na instituição.

A estrutura da instituição

No Brasil, hoje, cerca de 90% dos partos são realizados em ambiente hospitalares (RELATÓRIO SOBRE CENTRO DE PARTO NORMAL, 2000). Fato que reforça a necessidade de indicadores que retratem a realidade hospitalar para análise da qualidade da assistência obstétrica e perinatal, visto que em nossa cultura o processo de parição está institucionalizado.

A instituição possui um ambulatório de obstetrícia, serviço de pré-natal com Grupo de Gestantes efetivo sob a coordenação de uma equipe multidisciplinar10, Programa de atendimento à gestante HIV positiva e profilaxia da Aids vertical, Posto de Registro de Nascimento e de Coleta de material para o Teste do Pezinho. O sistema para marcação de consultas é informatizado, de fácil acesso e sem filas. Também há uma ala de internação com 56 leitos que realiza aproximadamente 300 partos mensais, dos quais aproximadamente 25% são cesarianas (Dados obtidos na instituição em 2000). Conta com cobertura diagnóstica para todas as alas durante 24h/dia ¾ laboratório de análises clínicas, citologia, cardiotocografia e ultrasonografia, prestada por um centro de diagnósticos em anexo, e serviço de referência para radiologia, transporte e hemoterapia.

Em todo o prédio há cartazes sugestivos sobre amamentação, normas escritas sobre IHAC, cartazes dos Dez Passos de Sucesso para o Aleitamento Materno, placas proibindo o uso de bicos e mamadeiras, mural de publicações, painel de fotografias da maternidade, folder e cartazes sobre a amamentação.

Processo assistencial e avaliação

As categorias processo assistencial e avaliação foram estudadas a partir de cinco subcategorias que retratam as etapas do ciclo gravídico-puerperal, em que abordamos a assistência propriamente dita, rotinas e alguns documentos.

Pré-Natal

Além das ações preconizadas no Manual de Assistência Pré-Natal (MS, 2000), destacamos no pré-natal da maternidade as atividades de educação em saúde realizadas pelo Grupo de Gestantes. Os temas abordados pelo grupo visam ao preparo do casal-grávido, família e comunidade para o acolhimento do recém-nascido: aleitamento materno, importância do pré-natal, direitos da mulher, parto humanizado, sexualidade e planejamento familiar (Dados obtidos no plano de curso do grupo de gestantes da maternidade, 2001). A freqüência de gestantes no grupo foi aproximadamente de 43/dia, um total de 10 495 no ano 2000 (dados obtidos no protocolo de Grupo de Gestantes da Maternidade, 2000).

As gestantes são preparadas para o processo de parição, reforçando os laços entre elas e os profissionais da instituição, permitindo-lhes o esclarecimento de dúvidas com conseqüentemente melhora da ansiedade e queda dos níveis da tríade medo-tensão-dor descritos por Read11 .

Vários autores dentre eles Zubaig, (1997) referem que, quando os grupos de gestante são coordenados por profissionais capacitado, aumenta a cobertura e melhora a qualidade de assistência pré-natal.

Algumas falas ilustram o pensamento dos casais-grávidos sobre os encontros no Grupo de Gestantes:

Casal-grávido A:

Comecei o pré-natal no 1º mês é a segunda vez que viemos juntos. Ele está babando [marido], gostamos de falar sobre amamentação, é ótimo!" (A. P.G, julho/2001).

Aqui a gente tem noção das coisas, senão como vou pegar no menino, "Pô"! (...) Amamentação, vai dar vitaminas e proteínas para o bebê. Se for preciso a gente vai fazer massagens, tomar sol, o "escambau"! Tem que ter paciência para o bebê mamar" (C. F.G, 2001).

Casal-grávido B:

Estou muito feliz, aguardo esse bebê há muitos anos, nove anos de espera. Tenho muito medo, até de trocarem o neném. Mas a enfermeira já conversou comigo, disse que a psicóloga daqui, vai me ajudar a ficar mais calma. Estou feliz também porque ele [o pai do neném], está me ajudando com tudo. O tratamento aqui melhorou muito! Quero ganhar o neném aqui, com meu médico. Conheci também as moças da palestra, elas são muito boas (A. M. C, julho/2001).

Vim aqui da outra vez e não entrei porque só tinha mulher, fiquei com vergonha. Hoje é a primeira vez, gostei muito, elas tratam a gente muito bem (L. J. S, julho/2001).

Os depoentes foram unânimes sobre a importância da participação do pai durante a gravidez. A totalidade considera indispensável o aleitamento materno, reconhecendo sua importância para a saúde da mãe e do bebê; a maioria disse ter gostado muito das palestras, embora alguns aleguem falta de tempo para freqüentá-las. Todos os entrevistados consideram importante o parto normal e sabem que a cesariana tem indicações clínicas; entretanto, algumas mulheres confessam ter medo das dores do parto; a maioria apresentou grande interesse pelo planejamento familiar e sexualidade.

A maioria das gestantes que aguardava consulta iniciaram o pré-natal no 1º trimestre de gravidez, o que revela uma captação precoce da gestante na comunidade e as demais começaram no 2º trimestre, atendendo, portanto, o protocolo do MS estabelecido para consulta pré-natal. Todas as clientes possuíam o cartão de pré-natal, adequadamente preenchido e a agenda da gestante do MS. Todas participaram da palestra e foram orientadas sobre o aleitamento materno. Os depoimentos das gestantes demonstram o grau de satisfação da clientela:

Minhas primas ganharam neném aqui e me falaram muito bem do tratamento. Tenho também uma vizinha que já ganhou três nenéns aqui, e gostou muito. Disse que agora da última vez foi melhor. Quero dar à luz aqui com meu médico. Ele é muito bom. As enfermeiras me pesaram e viram minha pressão, toda vez elas olham" (J. A, 37 anos, 18 semanas de gestação, 3ª consulta julho/2001)

Minha mãe fez pré-natal e ganhou menino aqui, e muitas amigas minhas me disseram que o atendimento é bom. Vim de outro hospital, lá foi muito ruim, não gostei do atendimento do outro médico. As enfermeiras me deram conselho, pediram para eu ficar calma e me ensinaram muitas coisas (L. S. P, 24 anos, 32 semanas de gestação, 6ª consulta julho/2001).

Podemos, observar, nas falas, que as gestantes procuraram a maternidade por intermédio dos parentes e/ou amigos e pretendem dar à luz com o mesmo médico, na maternidade. Algumas vieram de outra instituição em busca de melhor atendimento, o que demonstra a repercussão positiva dos serviços da maternidade na comunidade. Registramos algumas falas marcantes das Técnicas de Enfermagem do pré-natal:

É importante olhar para o casal grávido e tentar entender o significado da gravidez para eles. Pois somos o cartão de visitas, a comissão de frente faz a festa! (S. F., 2001).

Nós participamos com elas, de tudo: das alegrias, tristezas, saúde e doença. É igual ao casamento (S.F., 20001).

Precisamos de muita paciência, pois quase sempre as mulheres estão cheias de problemas e devemos ajudá-las. É bonito ver a barriga crescer. Muitas voltam para mostrar o neném (Z.F.C., 2001).

Sentimos na expressão das depoentes grande proximidade com os usuários do serviço, através da forma tão natural como falaram sobre o dia-a-dia no pré-natal.

Pré-Parto

Não entrevistamos as parturientes, tendo em vista que a maioria das mulheres neste momento apresentam-se caladas, reflexivas e voltadas para si mesmas. Por isso, optamos por uma observação sistematizada no pré-parto e utilizamos como referência os indicadores de qualidade de Cianciarullo (1998). Quase todas as práticas consideradas eficazes e que devem ser encorajadas durante o trabalho de parto são realizadas: na maioria das vezes o mesmo médico que faz o pré-natal é que faz o parto, são liberados os líquidos, o partograma é implementado para monitorar a dinâmica uterina, são prestadas informações às usuárias, há liberdade de movimento e escolha da posição, foi abolida a prática da tricotomia pubiana.

Das práticas indicadas para serem abandonadas, apenas o enema continua sendo usado com prescrição médica. Nesse sentido, ressaltamos que, apesar de o Ministério da Saúde não indicar o uso do enema, detectamos que há uma grande preocupação das parturientes quanto à possibilidade de evacuarem na hora do parto, mesmo sabendo que a equipe de saúde considera esse ato normal, ainda assim, elas sentem-se envergonhadas e freqüentemente há o pedido para fazerem "lavagem". Entre outras práticas indicadas para serem usadas com cautela, somente a aminiotomia, às vezes, ainda é praticada pelos obstetras.

Constamos que praticamente todas parturientes tinham o Cartão da Gestante preenchidos e sabiam a data provável de parto (DPP), iam dar à luz com o mesmo médico no pré-natal, com exceção daquelas que não fizeram o pré-natal na instituição, sabiam a previsão do tipo de parto e as vantagens do parto normal em relação à cesariana. A grande maioria demonstrava confiança na equipe.

Centro Obstétrico

Analisamos o processo assistencial durante o parto, de acordo com os indicadores de Cianciarullo (1998) e concluímos que:

Os 10 itens relativos às atitudes que devem ser encorajadas na prática obstétrica foram cumpridos em sua totalidade. Das quatro práticas indicadas com cautela, apenas a manobra no fundo de útero durante o período expulsivo ainda é praticada por alguns obstetras. Das quatro práticas consideradas ineficazes, nenhuma é utilizada. Dos cinco itens considerados inapropriados, o uso rotineiro de episiotomia ainda é utilizado, sendo que, em 2000, num total de 1 947 partos normais, 1 663 foram realizados com episiotomia (dados obtidos na administração da maternidade, 2001).

Observamos o processo assistencial ao recém-nascido na sala de parto: todos foram avaliados pelo pediatra com auxílio de uma técnica de enfermagem, e fizeram contato de pele com a mãe, mesmo no parto cirúrgico. Sendo que no pós-parto normal mais da metade conseguiu sugar nos primeiros momentos de vida. Todos os recém-nascidos saudáveis foram encaminhados para o alojamento conjunto com suas mães. Logo as rotinas promovem a interação mãe-filho desde o primeiro momento de vida.

Puerpério e alojamento conjunto

Observando o processo assistencial no alojamento conjunto (ALCON), detectamos que a quantidade de parto normal é proporcionalmente cinco vezes maior do que de cesariana, confirmando a estatística fornecida pela instituição nos anos 1999, 2000 e 2001 de aproximadamente 25% de média anual.

Todas as mulheres no pós-parto normal com bebês saudáveis receberam seus bebês imediatamente após o nascimento, na sala de parto, sendo que a maioria delas descreveram esse momento como emocionante, frisando que eles [bebês] sugaram logo que nasceram. Aproximadamente, a metade das cesariadas amamentou nas primeiras seis horas pós-parto e as demais amamentaram aproximadamente 10horas após o parto com ajuda do pessoal de enfermagem. Houve unanimidade no desejo de amamentar exclusivamente ao seio. As mães que estão com seus bebês internados em unidades especiais (UTI, Berçário de Médio e Alto Risco) são assistidas para manterem a lactação, mesmo afastadas de seus filhos. Não encontramos bicos, nem mamadeiras no alcon. Todos os cuidados são registrados em prontuário e ficha de observação de mamadas. Na alta, os usuários recebem o cartão da criança, diploma da mãe, cartão de aprazamento da consulta da mãe e do bebê, declaração de nascido vivo e encaminhamento para o teste do pezinho, os quais podem ser feitos imediatamente na própria instituição.

Grupo de Apoio

Aproximadamente, 12 puérperas/dia procuram esse grupo. A taxa de amamentação exclusiva ao seio, nos três primeiros meses de vida, foi de aproximadamente 76% (banco de dados da maternidade, 2001). Certamente essa taxa de aleitamento materno exclusivo é visivelmente alta, devido às ações humanizadas e sistematizadas em prol do aleitamento materno, durante todas as fases do ciclo gravídico-puerperal, como foi apresentado no decorrer deste estudo.

Esse grupo tem promovido programações especiais por ocasião da Semana Mundial de Aleitamento Materno (SMAM)12 ¾ concurso de cartazes de funcionários da instituição, concurso da história [pessoal das clientes] mais interessante sobre o aleitamento materno, carreata guiada por uma alegoria exibindo as mães [do grupo de apoio] amamentando seus bebês, fazendo o marketing da amamentação.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A ações implementadas pela Maternidade Dr. Adalberto Pereira Silva abrangem não somente os Dez Passos de Sucesso para o Aleitamento Materno, mas grande parte dos Oito Passos para Maternidade Segura, os critérios estabelecidos pelo Programa de Acreditação Hospitalar na área de obstetrícia e neonatologia e quase que a totalidade dos Indicadores de Qualidade de Cianciarullo. Evidenciamos a clareza com que o processo de mudança na qualidade da assistência prestada pela maternidade se impõe e, principalmente, como reflete na postura da equipe multiprofissional envolvendo todos os segmentos da instituição, como podemos destacar na fala de sua Diretora Presidente: pretendemos atender às exigências do MS. na íntegra (...) Estamos otimistas, pois contamos com recursos humanos capacitados e bastante envolvidos com a mudança, o que viabiliza na prática a humanização do parto e nascimento (C. B. V. , 2001).

A normatização da assistência facilita a cobertura perinatal contribuindo para interação do trinômio mãe-filho-pai fortalecendo os laços afetivos da família e conseqüentemente aumentando o sucesso do aleitamento materno exclusivo sob livre demanda. Fato comprovado no depoimento da clientela que se demonstrou satisfeita com atendimento e pela disponibilidade dos funcionários em atender bem. Além disso, os indicadores apresentados são promissores: Taxa de cesárea de 25% (1999 e 2000), CMM de 0.07% (2000), Média de Aleitamento Materno Exclusivo (três primeiros meses de vida) de 76% (2000).

A ampliação e a abrangência de seus serviços têm sido reconhecidas pela população e pelos dirigentes de saúde, sendo que instituição foi elevada à categoria de maternidade referência no Estado, em 2000, recebeu o prêmio qualidade hospitalar 2001, considerando a pesquisa de satisfação dos usuários, realizada pela secretaria de assistência à saúde (PTGM/MS nº 935, de 24 de maio de 2002). Assim, com essas medidas tem possibilitado o avanço e regulação da assistência à gestação, parto e período perinatal em todos os níveis, garantindo os direitos inalienáveis da cidadania.

 

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Placar hospital amigo da criança. Disponível em <http://wwwaleitamento.med.br/waba.htm. Acesso em 07 jul. 2002.

World Alliance for breastfeeding action (WABA). Disponível em < http://www.aleitamentomaterno.med.br/placar.htm. Consulta realizada em 23 e Jun. de 2002.

 

NOTAS

1 Assistência obstétrica é o conjunto de serviços destinados ao atendimento da gestante, parturiente e seu concepto, e particularmente aos aspectos relacionados com o momento do parto (NOVAES, 1994: p. 32). Assistência perinatal é a assistência a nascidos vivos desde o momento do parto até o 7º dia de vida (OMS, UNICEF, 1986).

2 Muito baixo até 20/100 000 nascidos vivos; médio entre 20 e 40/100 000 nascidos vivos; alto de 50 a 149/100 000 nascidos vivos; muito alto acima de 150/100 000 nascidos vivos (OMS apud MARTINS (2001, p. 28)

3Taxa de mortalidade neonatal precoce ou perinatal - óbitos entre 0 a 6 dias de nascido (MS/Funasa/CENEPI, SINASC/SIM e IBGE - pesquisas demográficas in Rede Internacional de Informações para Saúde, 2002).

4Taxa de mortalidade neonatal tardia - óbitos no período entre 7 a 27 dias de nascido (MS/Funasa/CENEPI, SINASC/SIM e IBGE - pesquisas demográficas in Rede Internacional de Informações para Saúde, 2002).

5 Avedis Donabediam, em 1996, propôs um modelo unificado de avaliação da qualidade dividindo o cuidado em saúde em três componentes: estrutura, processo e avaliação. No qual a estrutura corresponde à planta física, aos recursos humanos, rotinas e normas da instituição; o processo é a própria assistência prestada e o resultado seria o feed-back do apoio prestado pela estrutura junto com o processo assistencial. (ALVES E SILVA, 2000, p.16-17).

6 Os Dez passos de Sucesso para o Aleitamento Materno são normas exigidas para uma instituição ser credenciada ao Projeto Iniciativa Hospital Amigo da Criança (IHAC) (BRASIL, 1989: p.5-11.

7 Os Oito passos para Maternidade Segura são normas exigidas para uma instituição tornar-se Maternidade Segura. Abrangem a garantia de informação sobre saúde reprodutiva e direitos da mulher e a assistência humanizada durante todo ciclo grávido puerperal (BRASIL, 1995: p. 3).

8 As categorias adotadas por Cianciarullo (1998) são indicadores de qualidade para o atendimento humanizado em obstetrícia estão classificadas em: Categoria A - Práticas usadas e que devem ser encorajadas; Categoria B - Práticas consideradas ineficazes e que devem ser abandonadas; Categoria C - Práticas que são usadas freqüentemente, mas, são inapropriadas; Categoria D - Práticas que devem ser usadas com cautela.

9 Acreditação Hospitalar é um procedimento de avaliação dos recursos hospitalares, voluntário, periódico e reservado, que tende a garantir a qualidade da assistência por meio de padrões previamente aceitos e estabelecidos, racionalizando assim serviços de saúde baseados na qualidade da assistência (NOVAES, 1999).

10 A equipe multidisciplinar da Maternidade Dr Adalberto é composta por: médicos, técnicas de enfermagem, enfermeira obstétrica, assistente social, psicóloga, Acadêmicos de Enfermagem das Faculdades Integradas da Associação Educativa Evangélica de Anápolis/GO e de Psicologia da Faculdade Católica de Goiás (dados obtidos no setor administrativo da instituição, 2000) .

11 O método conhecido atualmente por Dick-Read, foi descrito por Read em 1942, e possui como objetivo principal "evitar a tríade medo-tensão-dor, pois baseia-se no fato que o conhecimento destrói o temor e evita a tensão, controlando a dor" (BRASIL, 2001, p.29).

12 A semana acontece todos os anos desde 1992, no período de 1 a 7 de outubro, com apoio da World Alliance for Breastfeeding Action (WABA) - Aliança Mundial para ação do Aleitamento Materno, tempo em que todo o país é mobilizado com ações que visam a promoção do aleitamento materno através de debates, palestras, concursos e distribuição de materiais educativos (WABA, 2002).

 

 

Data de Recebimento: 22/08/2002
Data de Aprovação: 22/10/2002

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